quinta-feira, 22 de outubro de 2009

Bala perdida

Viver é muito perigoso, já dizia Guimarães Rosa. Viver no Rio de Janeiro nos dias de hoje é muito mais perigoso do que pensava o nosso laureado escritor. A bala perdida vai te encontrar dormindo em sua cama, saindo do cinema depois da última sessão ou chupando um picolé no quiosque do MacDonald ou mesmo flertando com a lourinha sentada ao seu lado no onibus 119. A bala perdida não tem hora certa nem lugar marcado. Ela chega nos momentos mais imprevisiveis que se pode imaginar. Não tem a história daquele cidadão que cansado da vida e por ser maluco mesmo queria se matar, mas não pelas próprias mãos resolveu se suicidar morto por bala perdida. Bem informado, sabia os dias e as horas que o BOPE ia invadir os "morros dos macacos"do Rio e corria para ficar entre o fogo cruzado entre o BOPE e os bandidos. Mas, as balas perdidas se recusavam a encontrar o senhor suicida. Elas, durantes essas ações mataram mais uns tres ou quatro pessoas, inclusive um menino de dez anos, que era puxado pela mão por sua mãe que fugia das balas que cruzavam as ruas onde ocorria o confronto. O senhor suicida permanecia muito vivo e muito irritado, quase perdendo a paciência por não conseguir atingir o seu objetivo. Durante à noite, onde se podia ver as balas traçantes, iluminadas, cortando o breu da noite, o senhor suicida corria atrás delas na esperança de se chocar com uma delas no meio do caminho. Nada dava certo. O senhor suicida começou a ficar famoso. A imprensa falada, escrita e televisiva passou a perseguir esse maluco na esperança de focar o momento decisivo desse encontro fatal que se tornaria a maior foto e a maior reportagem do século XXI. Em todo confronto entre a polícia e a bandidagem dos morros e no meio o senhor suicida, lá estava a mídia com toda a sua parafernália na espera desse momento. Na verdade alguns repórteres e fotógrafos foram atingidos por bala perdida. Um deles morreu no ato com uma bala perdida na cabeça. Alguns editores pensaram em contratar um atirador profissional para que no meio da ação, o atirador encondido em um terraço de um prédio qualquer, acertasse o senhor suicida e a sua reportagem estaria feita.
A tentativa foi feita mas o atirador profissional errou. Um dos jornais contratou uma enfermeira para acompanhar o senhor suicida e aonde ele ia ela ia atrás. A enfermeira era uma mulher bonita, nos seus quarenta anos e cumpriu fielmente o seu contrato,
No último confronto da polícia e os bandidos o senhor suicida não apareceu, esse confronto foi, na opinião dos entendidos o que mais teve bala perdida, Uma delas atingiu um cameraman jogando-o a tres metros de distância.
Desesperada, a Mídia procurou por todos os cantos da cidade o paradeiro do maluco suicida. O suicida não foi encontrado. No dia seguinte vieram a saber que o senhor suicida tinha fugido com a enfermeira e se achava escondido na prais de Búzios, em Cabo Frio, gozando alegremente das delícias do amor com a sua nova obsessão, a enfermeira Deollinda.

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