quinta-feira, 28 de fevereiro de 2019

Carnaval carioca em crise? Chora tamborim...

Entre os anos 1970 e a primeira metade da década de 1980, bastava ao carioca que quisesse ignorar o Carnaval manter distância do desfile das Escolas de Samba. Ou evitar a Rio Branco e a Cinelândia, onde o Bola Preta, os blocos de embalo, como Bohêmios de Irajá, Bafo da Onça, Cacique de Ramos, blocos de sujos e foliões fantasiados davam alguma vida ao Centro da cidade.

Para quem preferisse pegar um cineminha, ir a um museu ou visitar a titia, melhor não passar na Visconde de Pirajá, território da Banda de Ipanema, que sempre arrastou uma multidão, ou desviar dos pequenos blocos de bairros, como Cachorro Cansado, no Flamengo, e mais uns poucos resistentes.

No mais, carnaval era ver na TV, ir ao Sambódromo ou comprar as edições especiais de Manchete e Fatos & Fotos. Ah, sim, os bailes também persistiam, mas aconteciam em ambientes fechados. Em muitos bairros da Zona Sul, as ruas mais pareciam um feriadão comum para ser curtido na praia e nos botecos.

A partir de 1986 e com mais força nos anos 1990, as ruas foram retomadas. Surgiram dezenas de blocos - autênticos e sem bandeiras comerciais, simples iniciativas de moradores, de vizinhos e de frequentadores de botecos - e milhares de cariocas foram atrás das baterias. Blocos tradicionais, como o Bola Preta, foram revigorados. Na outra ponta da folia, o espetáculo das escolas de samba tornou-se mega, uma superprodução quase hollywoodiana.

As multidões dispostas a brincar o carnaval não foram embora, ao contrário, mas tudo isso  parece agora em crise. 

O Globo de hoje revela que volta a ser discutida uma proposta para passar para uma empresa privada o desfile das escolas de samba hoje comandado pela Liesa. Já houve uma tentativa nesse sentido. A negociação não será fácil. Não é como um empresário contratar um show e exibi-lo no Sambódromo. Embora o samba há muito já tenha se profissionalizado - carnavalescos, destaques, mestres de bateria, madrinhas e rainhas, intérpretes, compositores etc são contratados - a grande massa dos mais de 2 mil e tantos desfilantes das grandes escolas ou está ali de graça ou paga para entrar em alas. Digamos que um concessionário assuma o Sambódromo e apenas contrate as escolas para participar do desfile. Os desfilantes terão direito a um cachê do show? Ou continuarão a sambar apenas pelo amor às cores da sua escola? Independentemente do novo formato e do debate sobre quem paga o que e quem recebe o que, o fato é que o espetáculo do Sambódromo precisa de uma injeção de autenticidade, modernizar não significa artificializar. Até a criação dos sambas da maioria das escolas é industrial ou fast food, foi terceirizada, com os compositores das comunidades perdendo a vez para fornecedores de letras e músicas por encomenda.

Muita água deve rolar. É hora de agir e não esquecer que na primeira metade do século passado ninguém imaginava que Democráticos, Fenianos e Tenente do Diabo fossem acabar. As Grandes Sociedades eram as estrelas do Carnaval e foram desbancadas exatamente pelas Escolas de Samba.

Coincidentemente, o mesmo Globo noticia que um impasse entre autoridades e organizadores de blocos está levando ao cancelamento de alguns desfiles. Como consequência do sucesso, que cada vez atrai mais turistas, observa-se que carnaval de rua cresceu demais e que é preciso equilibrar a folia com o funcionamento da cidade. Acredita-se que a maioria dos blocos admite que organização, estrutura, segurança etc devem estar em harmonia com a diversão.

Ocorre que ao se recuperar por iniciativa dos cariocas, o carnaval de rua despertou a atenção de empresários que viram no extraordinário palco da cidade uma oportunidade para promover cantores, shows, bailes, celebridades, eventos e marcas. Vieram os blocos chamados comerciais, como Favorita, Preta Gil, Chora me Liga, entre outros. Alguns foram desestimulados, mas chegaram a fazer tentativas de impor ao Rio o "abadá" baiano, o avental que equivale a privatizar a rua e cobrar um arremedo de ingresso aos foliões. As autoridades criaram a Arena dos Blocos, na Barra, para receber esse tipo de show, mas nem todos os empresários aderiram. Ou, talvez por força de prestígio, conseguiram permanecer na Zona Sul e no Centro da cidade. Em 2018, foram quase 600 desfiles de blocos. Esse ano, o número caiu para pouco mais de 500.

A Prefeitura pretende tirar das ruas mais blocos ano que vem.

Que o critério de eliminação pelo menos privilegie as manifestações autênticas dos bairros e controle a ofensiva dos chamados blocos comerciais.

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2019

Chapado por dinheiro público - O terrível vício dos propinômanos...

por O.V. Pochê

O ex-governador Sérgio Cabral finalmente revelou o motivo pelo qual cobrava propina adoidado.

Era vício.

Não podia ver uma obra que ia lá faturar um por fora.

Precisava de ajuda então, mas ninguém se tocou em apoiá-lo.

Se um pastor desses que exorciza safadeza por módica quantia houvesse lhe estendido a mão na época em que ele estava doidão por grana, o Estado do Rio de Janeiro teria economizado pra mais de bilhão de reais. 

Fez falta também um instituição do tipo Corruptos Anônimos, onde Cabral e seus parceiros da política, da justiça e do empresariado pudessem reconhecer o vício e cumprir os doze passos para se livrar da terrível síndrome de embolsar dinheiro público.

Não sabe se Cabral tentou se curar, se passou por crises de abstinência dramáticas, se se debatia angustiado, se babava pelos corredores do palácio até que alguém lhe comprasse uma joia, um diamante que fosse, uma privada sofisticada, algo que finalmente o acalmasse.  Não há registro de um médico caridoso que tenha lhe receitado doses decrescentes de propina como terapia para desintoxicar o corpo sedento por reais, dólares, mansões e lanchas.

Cabral sofreu calado, guardou para si o drama de manter contas na Suíça para alimentar seu vício.

E nós aqui pensando que o Sérgio Cabral que protagonizou a "farra dos guardanapos" em Paris era apenas um brasileiro que comemorava a Légion d'Honneur com que a França lhe enfeitou o peito. Nada disso. Ali estava um homem chapado pelo seu vício. Um ser humano rendido aos seus mais íntimos demônios.

Então tá. Se a moda pega, os corruptos de ontem e os "laranjas" da "nova era", que estão estreando agora, vão revindicar o direito a rehab. Não são corruptos, são propinômanos.

Jornalistas criam força-tarefa para revelar documentos que foram classificados como sigilosos. Escondeu por quê?


Diante da derrota na Câmara e da iminente rejeição pelo Senado, o governo desistiu do suspeito decreto que ampliava para milhares de funcionários a prerrogativa de tornar sigilosos documentos oficiais.

Apesar da medida que ampliava o top secret ter sido cancelada, a legislação ainda permite aos burocratas empurrar pra baixo do tapete uma série de documentos de vários setores públicos.

Segundo o blog Jornalismo nas Américas, em matéria assinada por Alessandra Monnerat, "entre junho de 2017 e maio de 2018, mais de 73 mil documentos foram colocados sob sigilo pelo governo brasileiro, mas há pouca transparência em relação aos motivos dessa classificação.

Diante disso, um grupo de jornalistas do site Fique Sabendo "se propôs à hercúlea tarefa de revelar qual o teor de documentos que tiveram o sigilo levantado nos últimos anos — e descobrir qual a justificativa dada por funcionários para reservar essas informações do olho público".

Em um primeiro levantamento, foram encontradas "curiosidades" que ganharam carimbo de sigilo. Exemplo: pesquisas da Universidade Federal do Mato Grosso sobre violência contra travestis e documentos sobre zika vírus.

Por aí se vê como a burocracia tende a impedir a transparência, sem justificativa aparente.

LEIA A MATÉRIA NO BLOG JORNALISMO NAS AMÉRICAS, AQUI

domingo, 24 de fevereiro de 2019

Carnaval 2019 - Simpatia é Quase Amor - 35 anos no cordão da liberdade

Simpatia 2019 na Vieira Souto. Foto de Fernando Maia/Riotur
Nos 35 anos do bloco, homenagem a Marielle abre o desfile. Foto bqvMANCHETE

E encerra a maratona já ao cair da tarde. Foto bqvMANCHETE
No espírito do samba de Beto Fininho, Janjão, Jorgito, Leandro Fregonesi, Melinho e Mestre Penha, o Simpatia ocupou a Vieira Souto e fez Ipanema cantar a liberdade e a democracia: "Vou pelas ruas da cidade/no cordão da liberdade/já são tantos carnavais/ Sou de Ipanema a simpatia/minha alma é harmonia/ todos nós somos iguais" (...) ""O mar banhava os botequins/ A poesia aplaudia o sol de por/ 35 anos se passaram/ e ninguém cala o Simpatia é quase Amor". E no refrão, espaço para a crítica bem-humorada: "Fui tomar a saideira/Acho que bebi demais/Vi Jesus na goiabeira/De amarelo e lilás".

sábado, 23 de fevereiro de 2019

Me aqueça nesse inverno - Alô, madame Damares, Roberto Carlos veste rosa!


Xurxil na Amazônia...

por O. V. Pochê 

"Iremos até ao fim. Lutaremos em Paracaima. Lutaremos nos rios e oceanos, lutaremos com confiança crescente e força crescente no ar, defenderemos nosso país, qualquer que seja o custo. Lutaremos nas praias, lutaremos nos terrenos, lutaremos no caminhões com ajuda humanitária,  lutaremos nos campos e nas ruas, lutaremos nas colinas; nunca nos renderemos". 

Há que jure que ouviu essa frase ser pronunciada no gabinete de crise que gerencia os problemas na fronteira do Brasil com a Venezuela. Não se engane, embora o Brasil ande meio maluco, é fake news. Trata apenas de um trecho adaptado do famoso discurso de Winston Churchill na Câmara dos Comuns, em 1940. Também não é verdade que um dos caminhões brasileiros de carga com a ajuda aos venezuelano foi roubado pelo PCC.

Na capa da Carta Capital: a troika que manda...


Jornal Nacional: e o estagiário não apurou direito...

JN divulga como autêntica declaração do general Augusto Heleno publicada no twitter sobre possível reação armada do Brasil contra a Venezuela. O perfil não foi checado, era falso e William Bonner pede desculpas. Foi ontem. Falhas à parte, a situação na fronteira da Venezuela é tensa. Teme-se que o Brasil embarque em uma operação do tipo "Tempestade na Amazônia". Uma das novidades na política do Planalto é que o Brasil tem agora seus "falcões", o time que deseja botar pra quebrar e marchar até Caracas.
Veja a gafe do JN AQUI

Aposentadoria vira auxilio funeral. A charge abaixo é do Jornalistas Livres


quinta-feira, 21 de fevereiro de 2019

Fotografia - World Press Photo 2019 anuncia os indicados para premiação mundial

Foto de John Moore, uma das indicadas para o World Press Photo 2019, retrata o drama da pequena imigrante detida na fronteira do México com os dos Estados Unidos.e forçada a se separar da mãe. 

O World Press Photo 2019 anuncia os fotógrafos indicados para a disputa das melhores imagens globais de 2018, em várias categorias. O resultado do concurso será anunciado no dia 11 de abril.
VEJA NO SITE DA ORGANIZAÇÃO, AQUI

O meio é o Mercado

A entidade chamada Mercado é cada vez mais onipresente em todos os setores. No ramo jornalístico um exemplo foi a trajetória da Abril. Quando os Civita venderam 30% das ações para um fundo americano, inicialmente, e para sul-africanos, depois, com direito a um assento na diretoria, foi inoculado no DNA da editora o vírus do Mercado. Mesmo no nível de editores de redação, quando por ocasião de alguma medida drástica como corte de custos ou de pessoal, vinha junto a justificativa: "o acionista está pressionando por melhores resultados". Esse tipo de interferência enlouquecia os gestores, que passavam a improvisar "reformulações" que quase sempre davam errado e podiam se refletir na qualidade do jornalismo praticado. Vê-se que não deu certo e levou a Abril a pique.

O Mercado também dita o rumo das editorias de economia da grande mídia, o que dá para entender já que os controladores dos principais veículos estão integrados à especulação financeira e suas demandas. Considerando o conceito de Economia como ciência social que busca a racionalização dos recursos utilizados pela população e o consequente bem-estar da sociedade, é fácil constatar que a grande mídia não tem editorias nem colunistas de Economia, apenas editoria e formadores de opinião de Mercado.

Mercado pinta, borda e derruba governos. Mercado pode, por exemplo, como no caso do Brasil, impor um cartel de bancos que manda a competitividade pro espaço e dita altas taxas de serviço e de juros. Mercado tem força para ir buscar no caixa público recursos que eventualmente perde em crises que ele mesmo provoca, como durante o caos especulativo de 2008. Mercado governa. Mercado faz cabeças e pode conduzir o comportamento da sociedade. Está nos jornais hoje, a informação de que o Flamengo recusou acordo com Ministério Público e Defensoria Pública sobre a reparação aos familiares dos dez jogadores mortos em um contêiner-dormitório. As famílias pedem um total de R$57 milhões e o clube oferece R$5 milhões. A diferença é grande e, sem acordo, o Flamengo vai tentar nova negociação no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro que imagina ser mais favorável. Um diretor afirmou ao Globo que "o MP não representa as famílias e estava agindo com uma postura em tom ameaçador". Já há alguns anos o Flamengo é dirigido por executivos oriundos, em sua maioria, do Mercado. Uma administração que admitiu privilegiar a contabilidade. Há quase seis anos o time não ganha título relevante, mas está com as finanças em dia. Talvez seja essa mentalidade - a de minimizar o prejuízo e baixar a cotação da tragédia, típica de "homens do Mercado" - que conduz a linha de negociação com as famílias vítimas da absurdo incêndio do contêiner-dormitório que tinha apenas uma porta de saída.

A reforma da Previdência é uma forte demanda do Mercado e, segundo sua porta-voz, a grande mídia, o futuro mamão-com-açúcar dos brasileiros depende de sete guardiões: reforma trabalhista, já feita em parte, reforma tributária, a caminho, pacote de privatização ampla, a caminho, reforma orçamentária, política do Estado mínimo, em andamento, abertura irrestrita do comércio exterior, à vista... e reforma da Previdência. Quando tudo isso for feito, pregam o Mercado e a mídia, até o vendedor do carro do ovo terá a vida mansa de um norueguês (*). 

Os jornais noticiam a chegada do projeto da reforma da Previdência ao Congresso. Dão grande espaço ao acontecimento, isso talvez seja comparável apenas ao número de páginas que teria a seleção brasileira quando e se hexacampeã. A reforma é elogiada em editorial, colunas e reportagens. Destaca a suposta "redução de privilégios", mas os analistas não explicam porque consideram "privilégio" um benefício pago a um idoso ou julgam ser "mordomia" um abono salarial, nem porque alardeiam reduzir o déficit do sistema ao mesmo tempo em que aliviam patrões de contribuições como a dos 8% para o FGTS de quem se aposenta e continua trabalhando. Passam ao largo da crítica em nome de uma defesa mística do cálice sagrado. O governo anuncia que a reforma trará uma economia de R$ 1,1 trilhão em dez anos. Mas o Mercado acredita que essa suposta economia ficará em torno de R$ 500 bilhões. Só a dívida dos sonegadores da Previdência chega a R$ 590 bilhões e crescendo. O governo diz que mandará ao Congresso em 30 dias um projeto de lei para agilizar a cobrança. Diz também que outro PL enquadrará categorias que ficaram de fora. O Congresso tem ampla maioria de empresários, muitos eleitos com o apoio  do Mercado, além de diversos outros grupos de pressão. Aprovará?

Dizem que são grandes as chances de deputados e senadores - que pra variar receberão agrados do governo - aprovarem a reforma. Assim como são enormes as chances de bancadas de setores corporativos defenderem seus interesses, livrarem a cara e deixarem a conta com o velhinho de pijama. Isso sem falar que o caixa do governo é único, mas poderes endinheirados como Judiciário e Legislativo, que mamam na chupeta das aposentadorias milionárias, não estão sendo chamados a colaborar com a "vaquinha" que, segundo promete o ministro Paulo Guedes, vai fazer com que o Mercado despeje investimentos no Brasil.

Paulo Guedes diz que a Previdência é um "avião destinado a cair". Um projeto que mexe com um e não mexe com todos não vai salvar o avião. Apenas dará paraquedas a uma minoria e direito a salto em queda livre para a maioria.

(*) A Noruega ocupa a primeira posição no ranking global de IDH 2018 (Índice de Desenvolvimento Humano). O Brasil está no 79° lugar. Comparando com o Brasileirão, que é disputado por 20 clubes, o patropi estaria na quarta divisão mundial.

ATUALIZAÇÃO em 22/2/2019 - Quando à citação à negociação do Flamengo com os familiares da tragédia do Ninho do Urubu, ontem houve a rodada de conversas no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. A postura e a proposta do Flamengo revoltaram os parentes dos meninos mortos no incêndio contêiner-dormitório que virou uma armadilha mortal. 

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2019

E la nave va


Deu no Jornalistas Livres: terra arrasada...


O Brasil Bizarro passando na sua timeline. É a reedição do shockdoc Mondo Cane

por O. V. Pochê 

Nos anos 1960, fazia sucesso nos cinemas o documentário italiano Mondo Cane (*). Era um longa metragem colorido que registrava bizarrices através do mundo. Os críticos logo criaram um termo para enquadrar a novidade: shockumentary. O filme era sensacionalista ao extremo, focalizava curiosidades, violência, hábitos e culturas exóticas, o grotesco e o incomum.  Só usava cenas reais que faziam jus ao título. A Netflix, quem sabe, podia se inspirar no Brasil atual e lançar uma série sobre o mundo paralelo em que estamos mergulhados.

O Brasil perdeu o sentido e isso rende um Mondo Cane só nosso. Sintam a bizarrice dos fatos:

* Dinheiro bronzeado mostra seu valor - Paulo Vieira de Souza, apontado como operador do esquema de corrupção do PSDB, guardava em uma casa e em um apartamento cerca de R$ 100 milhões em cédulas. Ao contrário do político baiano Geddel Vieira de Lima (não são parentes, apesar do Vieira em comum), que mantinha em um apartamento R$ 55 milhões em notas acondicionadas de qualquer jeito em malas e caixas de papelão, o contador do tesouro dos tucanos tinha especial carinho pela grana. Ele se dava ao paciente trabalho de expor as cédulas ao sol, como se fossem finas folhas de chá, para evitar mofo e ataque de traças, pegar um bronze ou, talvez, pelo simples prazer quase orgástico de olhar a dinheirama acumulada. Daria uma cena ótima. Lembra Peter Sellers em "Muito Além do Jardim" que se isola do mundo - seu único contato com o exterior é a TV - e passa os dias a cuidar do jardim, recolher folhas secas, manejar a terra e as plantas.

* Retardados - O Brasil acaba de passar por sua primeira grande crise política que se desenrolou inteiramente nas redes sociais. A baixaria passou na timeline do país. WhatApp e twitter foram as tribunas em tempo real de um medíocre jogo de poder. Tanto nas gravações divulgadas quanto nas mensagens do ministro defenestrado, do paipai e do pimpolho, o conteúdo é de briga de adolescente. Tal qual teenager que desiste de "ficar". Após o bate-boca, os contendores bloquearam contas, mudaram fotos de perfis, eliminaram álbuns de imagens onde apareciam juntos e revisaram likes e deslikes. A crise que evoluiu em dois dedos - os de teclar - também daria um cena didática e inusitada.

* O massacre do contêiner - Mondo Cane tinha cenas reais de tragédias. Não havia a profusão de imagens que os smartphones proporcionam hoje, mas sequências de incêndios, inundações e avalanches tinham lá seu espaço. No Brasil, um clube de futebol, o Flamengo, alojou garotos em contêineres que tinham apenas uma mísera porta de saída. Um incêndio devastou o precário dormitório que se transformou em um forno de gás e chamas e fez dez vítimas fatais. Uma cena forte. O Brasil Bizarro tem disso.

* A goiabeira sagrada - Monde Cane focalizava, às vezes, seitas e misticismo em regiões remotas. O Brasil Bizarro também teve seu recente episódio transcendental. Uma ministra da "nova era" revelou que certa vez deparou-se com ninguém menos do que Jesus trepado em uma goiabeira. É a filmagem da cena pronta. A ministra não chegou a ser original. Em 1917, a mãe de Jesus apareceu para três pequenos pastores em Fátima, Portugal. Nossa Senhora, segundo os meninos, escalava uma azinheira. Em Portugal, a árvore virou local de peregrinação. O doc Mondo Cane, ou Brasil Bizarro, relacionaria as duas aparições e mostraria ao mundo a goiabeira sagrada que o nosso jornalismo investigativo ainda não localizou. 

* Curso de engenharia à distância - Ainda na linha dos desastres, o novo Mondo Cane poderia dedicar uma sequência à engenharia cabocla. O povo gosta de cinema-catástrofe. Ciclovias que desabam, viadutos que racham, lama de barragens que desce encostas, prédios que se implodem, estádio que ameaça desabar e é interditado poucos meses depois de inaugurado... nem precisa filmar, tudo isso foi registrado em vídeos amadores.

* Fogo na Cultura - Nessa mesma linha, o novo Mondo Cane poderia abordar a mania que os brasileiros têm de tocar fogo em museus. Se não acendem o pavio efetivamente, deixam rolar por pura negligência. São cenas impactantes para o shockdoc.

* Tempestade na Floresta - Essa cena o novo Mondo Cane tem que esperar para ver se acontece. Mas não é impossível. Com Donald Trump à frente é cada vez maior a ameaça de invasão à Venezuela. Brasil e Colômbia, princialmente, seriam acionados pelos falcões de Trump. Esses países estão esperando Bogotá cair de maduro. Se não, a coalizão cucaracha vai agir. Dizem que os dois prováveis aliados dos americanos só teriam munição para uma hora de guerra e pouca vacina contra febre amarela, malária, dengue, zika e chikungunya. Nada que Tio Sam não resolva. As câmeras do Mondo Cane vão adorar.

* Territórios ocupados -  Uma das coisas que o Brasil se orgulha é do seu imenso território, que se manteve íntegro e soberano apesar de invasões francesas, holandesas, paraguaia. A República era una e indivisível. Não mais. O novo Mondo Cane mostrará que em várias regiões organizações criminosas que dominam territórios que já pertenceram ao Brasil têm armas, exércitos, leis, taxas, serviços, setores de importação e exportação, estrutura financeira, religião, políticos e justiça próprios. Se instituir  passaporte e criar bandeira e hino podem reivindicar uma cadeira na ONU..

*Ciência dos 'doidim' - A parcela de brasileiros que acredita que a Terra é plana já existia mas era, digamos, tímida. Agora eles chegaram ao poder, têm representantes no primeiro escalão. Fazem reuniões, seminários, planejam levar a teoria às escolas e preparam excursões náuticas para explorar o fim do mapa mundi, o local onde, segundo eles, a água do mar desaba em um uma cachoeira infinita. Mondo Cane poderá acompanhar uma dessas expedições.

Difícil vai ser editar esse shockdoc. O Brasil Bizarro escreve diariamente novos capítulos do seu roteiro surreal.

(*) Apesar do estilo tosco, "Mondo Cane" foi indicado ao Oscar de Melhor Canção Original de 1963. "More", de Riz Ortolani e Nino Oliviero, contrastava com a violência e até o mau gosto do documentário.  
Ouça AQUI

 

terça-feira, 19 de fevereiro de 2019

Deu no G1 - Esse jogo não é um a um



por O. V. Pochê 

A EA Sports elegeu recentemente os melhores zagueiros do 2018: Bonucci,Thiago Silva, Hummels, Godín, Boateng, Piqué, Alderweireld e David Luiz.

O juri que escalou essas feras não conhece os advogados de Michel Temmer. Por eles, não passa nada. Formariam a retranca mais poderosa do mundo.

Reveja o último lance: o inquérito que apura um jantar no Jaburu em que, segundo denúncias, a sobremesa foi um quindim de R$10 milhões ofertado pela Odebrecht, foi enviado à Justiça Eleitoral.

É como mandar Íbis de Pernambuco, com a camisa da Justiça Eleitoral, jogar contra o Manchester United, representando as cores de Temer. Detalhe: com mando de campo dos Red Devils, jogo no Old Trafford e juiz inglês.

Duvida?

Ouça Jackson do Pandeiro AQUI

Mídia: Quem vai podar o laranjal? Só a Folha deixa a fofoca de lado e remete hoje à origem da crise Bebiano


O nome da crise é corrupção. Pimpolhos, telefonemas, gravações, foro íntimo, ciúmes freudianos, traição, roupa suja, espionagem, X-9 no Planalto, humilhação e tudo o mais que saiu do balaio da comadre fofoqueira renderia um samba-canção. Só que o buraco é mais em cima.

O imbroglio envolvendo Gustavo Bebiano foi deflagrado pela Folha de São Paulo ao denunciar um esquema de desvio de verbas eleitorais por candidaturas laranjas do PSL, partido de Bolsonaro, presidido, na época, pelo agora ex-ministro. Os indícios são de apropriação de dinheiro público, o que deveria ser investigado e não minimizado. Aparentemente, o novo laranjal entrou no bonde do caso Queiroz, também em ponto morto.

A fofoca armada por Carlos Bolsonaro, que acusou Bebiano de mentir ao dizer que havia falado com o presidente por telefone, desviou o foco e favoreceu o governo. Os principais veículos da grande mídia, com exceção da Folha, embarcaram na jogada. A partir daí, tudo se transformou em um bate-boca de baixíssima categoria. Picuinha no clã que tutela o patriarca tem sido a rotina.  Mas foi este enfoque que prevaleceu entre os comentaristas políticos por mais de uma semana. Carlos jogou a isca e a mídia deixou-se pescar.

Confirmada a demissão de Bebiano, que sai elogiado por Bolsonaro, a Folha, hoje, foi novamente a única a colocar no principal título de capa a referência ao laranjal do PSL.

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019

Fotografia - Morreu ontem o último personagem da famosa e polêmica foto "The Kiss"

Na foto da capa da Life,  de Alfred Eisenstaedt, a enfermeira Greta Zimmerman aparece já rendida ao beijo do marinheiro George Mendonsa. . 


Em quadro anterior, a foto de Eisenstaedt mostra que Greta Zimmerman tenta resistir ao mata-leão de Mendonsa. 
por Ed Sá 

No último domingo, morreu o ex-marinheiro George Mendonsa, aos 95 anos, o último dos três personagens envolvidos em uma das mais famosas fotos da Segunda Guerra, celebrizada como "The Kiss".

O fotógrafo Alfred Eisenstaedt faleceu em 1995, aos 96 anos. A mulher, a enfermeira Greta Zimmer Friedman, morreu em 2016, aos 92 anos. Em comum, a longevidade, o trio passou dos noventa, e a polêmica.

A foto foi feita no dia 14 de agosto de 1945, quando o Japão anunciava sua rendição e a multidão comemorava a vitória na Times Square em Nova York. Eisenstaedt fazia a cobertura para a Life quando Mendonsa agarrou Greta, praticamente deu-lhe um mata-leão e tascou um longo beijo registrado em uma sequência de fotos na qual vê-se que ela tenta escapar, mas acaba se rendendo ao marujo parrudo.

Era um dia feliz e a mídia preferiu apenas o suposto e ocasional romantismo da cena. A Life colocou na capa a foto em que a enfermeira aparece sem reação, como se estivesse inebriada. Em fotograma anterior ela leva a mão ao pescoço do rapaz mas não tem força para afastá-lo.

O casal só voltou a se encontrar 67 anos depois durante uma entrevista para a CBS.

Hoje, em tempos de "não é não", a foto seria um símbolo de assédio sexual.

Foto Sarasota Police Department

ATUALIZAÇÃO EM 24/2/2019 - Uma estátua inspirada na foto de Alfred Einsenstaed foi vandalizda em Sarasota, na Flórida, dias depois da morte do ex-marinheiro George Mendonsa. Ativistas do movimento Me Too, que denúncia casos de assédio sexual, gravaram em tinta um protesto contra o beijo forçado em Greta Zimmer.

A rede social como ela é. E se Nelson Rodrigues navegasse na internet...

Reprodução Twitter


por Ed Sá 

Nelson Rodrigues morreu em 1980. Na época, o mundo ainda estava longe de trocar relacionamentos por conexões digitais. De 1950 a 1961, ele escreveu na Última Hora a coluna "A vida como ela é", crônicas sobre dramas cotidianos, de preferência adultérios, crimes passionais, cobiça da mulher do próximo, crises de ciúmes em velórios e virgens seduzidas e abandonadas.

Nelson lia as notícias na página policial e a partir daí fazia um retrofit literário de pecados e paixões.

A coluna fez sucesso e, nos anos 1970, ganhou um revival durante pouco mais de um ano na revista Fatos & Fotos.

O post acima foi publicado ontem no twitter. Observem que é um conto contemporâneo real em poucos caracteres.

A dinâmica da rede social produz milhares semelhantes a esse, por hora, talvez. Fico imaginado como Nelson Rodrigues lidaria com os pequenos dramas em proporções diluvianas que hoje trafegam no Facebook, WhatsApp, Instagram, Twitter e outro outdoors da condição humana.

domingo, 17 de fevereiro de 2019

Imprensa que Eu Gamo 2019: tem que respeitar...




Foto Divulgação

Passaporte para a folia. Fotos bqvManchete

O Imprensa que eu Gamo 2019 espalhou Democracia nas ruas de Laranjeiras. Cerca de 10 mil pessoas cantaram o refrão "nesse mar de lama não vou me calar/eu sou imprensa, tem que respeitar/ninguém vai censurar a nossa alegria/a pauta hoje é democracia.

Ramiro Alves lembrado no bloco.

O bloco homenageou o seu diretor Ramiro Alves, ex-editor de política do Globo, que faleceu em agosto do ano passado.

sábado, 16 de fevereiro de 2019

No baile colonial da "sinhá" Donata Meireles quem dançou foi a Vogue


A matéria é do Meio & Mensagem. Segundo o site, "a 15ª edição do tradicional Baile de carnaval da Vogue está adiada. A decisão foi tomada pela editora Globo Condé Nast após o desconforto manifestado pelos patrocinadores em relação aos acontecimentos recentes envolvendo a ex-editora da publicação, Donata Meirelles, que pediu demissão da revista nesta semana. O evento, que estava marcado para o próximo dia 21, acabou impactado pela polêmica envolvendo Donata Meirelles, que recebeu muitas críticas por conta do receptivo e da decoração de sua festa de aniversário, realizada em Salvador no último fim de semana. Muitas pessoas apontaram que a vestimenta das recepcionistas e o posicionamento delas nas fotos com os convidados fariam referência ao período colonial brasileiro e à escravidão".
LEIA A MATÉRIA COMPLETA, CLIQUE AQUI

Na capa da Veja: a mais bizarra das crises políticas

O Veja vem com a capa sobre a mais nova crise que sacode o Planalto. "Paipai" explode o ministro Bebiano, depois que um dos seus filhos acendeu o estopim nas redes sociais.
A chamada de capa procede: "Veneno". Lembra o clima do Palácio de Inverno e as intrigas de Rasputin, que não tinha cargo oficial na corte do czar mas era o crupiê que dava as cartas nas conspirações de gabinete. 

Na capa da Carta Capital, o Papa Guerrilheiro. Selva!


O Brasil treina há década para lutar na selva amazônica. Aparentemente, há duas frentes de ação no horizonte: uma possível invasão à Venezuela para rifar Maduro e uma operação de defesa com o "perigoso"  Sínodo dos Bispos para em outubro. O encontro, que tem o título de "Amazônia: novos caminhos para a Igreja e para uma ecologia integral”, preocupa o governo brasileiro, que já espiona os bispos e tenta descobrir seus planos. A edição da Carta Capital trata da segunda "ameaça", a dos "exércitos" do Vaticano, que o governo vê como uma nova "cruzada" contra a pátria. .

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2019

Bibi Ferreira (1922-2019) - Quando a Contigo! celebrou o talento da grande dama do teatro

Revista Contigo!/Foto de Renata Xavier/Reprodução

por José Esmeraldo Gonçalves

Em 2011, a Contigo! homenageou Bibi Ferreira no Teatro Poeira, em Botafogo. A noite era do 5° Prêmio Contigo de Teatro, mas se transformou em uma celebração do talento e da trajetória de Bibi.

A reverência da classe artística, no momento em que a eterna dama do teatro subiu ao palco, deu à fotógrafa Renata Xavier a oportunidade de registrar a imagem mais sugestiva e emocionante, aquela que abriu a edição especial da revista. Aos 89 anos, Bibi permanecia ativa com atriz e cantora, seduzindo todas as gerações. No palco, quando os aplausos cessaram, ela falou sobre a carreira, os momentos marcantes, os obstáculos e a força para superá-los.

Tribuna da Imprensa - 1973 - Reprodução

Enquanto Bibi ecoava em cada frase seu amor pelo teatro, rebobinei algumas lembranças dos encontros que, como repórter, tive com ela. Em 1974, cobri para a Tribuna da Imprensa, os ensaios do espetáculo "Brasileiro, Profissão Esperança", no Canecão, com Clara Nunes e Paulo Gracindo, que Bibi dirigiu. Com muita firmeza, mas sem perder a serenidade, ela às vezes interrompia a cantora e o ator. Não lhes dizia didaticamente o que fazer. Mais parecia atrair Clara e Gracindo para a sua proposta cênica sem lhes tirar o espaço próprio de criação. Lembro que havia uma preocupação no ar: como dar ao espetáculo o clima intimista que as canções e o roteiro pediam em espaços tão vastos como o palco e a platéia do Canecão? (*). Durante os ensaios, Bibi observava constantemente a iluminação. Ali estava precisamente um dos seus segredos. A luz que incidia em Paulo Gracindo e Clara Nunes, projetada sobre um fundo de palco negro e vazio, dava ao público a sensação de "viajar" a uma pequena boate de Copacabana dos anos 1950, ouvindo "Ninguém me ama", "A noite do meu bem", "Fim de caso" e outras canções que se alternavam com o texto de Paulo Pontes. Acho que aquele "Brasileiro Profissão Esperança, sob a direção de Bibi, poderia ser levado até ao Maracanã que não perderia o clima.

Em 1975, no Teatro Tereza Rachel, dessa vez como espectador, reencontrei Bibi como a Joana, amante de Jasão, o casal que pontificava a tragédia urbana ambientada na favela carioca. Era "Gota d'água", escrita por Chico Buarque e Paulo Pontes. Sob ameaça da censura em plena ditadura, a peça só estreou porque os autores negociaram alguns cortes. A "tesoura" não teve o poder de conter o impacto da montagem. Ao fim, o público deixava o teatro ainda sob choque.

No ano seguinte, 1976, fui entrevistá-la para a Fatos & Fotos, em Copacabana, em um apartamento na Barata Ribeiro, se não me engano, onde Bibi morava com Paulo Pontes e vivia um momento delicado. O dramaturgo lutava contra um câncer. Após uma breve separação, a atriz havia voltado para o companheiro a quem apoiou até o fim. Paulo Pontes morreu no fim de dezembro daquele mesmo ano. Ali era a Bibi vivendo seu drama da vida real.

Prêmio Contigo! de Teatro homenageia Bibi Ferreira. Na foto de Dario Zalis, Danielle Winits,
José Mayer, Sophie Charlotte, José  Esmeraldo (então chefe de redação da revista) e Lília Cabral 

Reprodução/Contigo!

Ao final daquele Prêmio Contigo, enquanto os fotógrafos se preparavam para fazer a foto de capa, Sergio Zalis, diretor da revista, literalmente me levou a subir ao palco, onde me vi junto a Bibi Ferreira, Danielle Winits, José Mayer, Sophie Charlotte e Lilia Cabral. Eu não sabia, mas Sergio queria aquela foto para ilustrar o editorial que ele escrevia para a seção Carta, a "conversa com o leitor" da Contigo!. Dario Zalis fotografou.

Na hora foi um surpresa. Hoje, junto às pequenas lembranças da grande Bibi Ferreira, tenho  a imagem do grupo onde só eu destoo como um desses privilégios que a profissão proporcionou.

(*) Bibi Ferreira dirigiu também no Canecão "Brasileiro, Profissão Esperança" , com Ítalo Rossi e Maria Bethânia. Existe um DVD gravado ao vivo em Porto Alegre, com a atriz fazendo dupla com Gracindo Jr. no mesmo espetáculo.

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2019

Brasil acima de todos, a tosquice acima de tudo

por O.V.Pochê

Que o Brasil vive dias toscos, é só abrir a janela para comprovar. Parece que um fenômeno bestialógico abriu fendas na terra e das profundezas emergiram o bizarro, o grotesco e o surreal. Como dizia a carta-canção de Chico Buarque nos anos de chumbo, "muita mutreta pra levar a situação.Que a gente vai levando de teimoso e de pirraça. E a gente vai tomando que, também, sem a cachaça. Ninguém segura esse rojão"

Sinta o drama:

* O ministro Paulo Guedes acordou ontem pensando que era John Kennedy e afanou um pensamento do  presidente americano. Em discurso para servidores, Guedes fez uma pausa dramática antes de dizer: "Todos os dias, vem gente de todo o Brasil para pedir coisas ao Brasil. Mas eu pergunto: o que eles podem dar ao Brasil?". A frase de Kennedy cujo conceito Guedes chupou foi: "Não pergunte o que seu país pode fazer por você. Pergunte o que você pode fazer pelo seu país". Se era para copidescar a frase, teria sido melhor Guedes se inspirar em Orson Welles, que foi mais original ao recriar a mesma declaração de Kennedy: "Não pergunte o que você pode fazer pelo seu país. Pergunte o que tem para o almoço".

* O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, também conhecido como ministro da Mineração, extraiu do intestino uma frase para desqualificar Chico Mendes, o líder ambientalista assassinado em 1968. "Que diferença faz quem é Chico Mendes?" (...) "O fato é que é irrelevante". A diarreia do ministro, que é réu por improbidade administrativa em ação pública ambiental, provocou reações no Brasil e no mundo.

* O Flamengo faz de um conjunto contêineres com uma só porta de saída alojamento para garotos da sua divisão de base. Acabou em tragédia.

* O general Heleno Nunes tem pesadelos recorrentes com a Nova Cruzada. Ele acha que a Amazônia é a nova Terra Santa e o Papa Francisco e os Cavaleiros Templários estão prontos para invadi-la. O general acha que o Sínodo sobre Amazônia, que o Vaticano realizará em outubro, é um Cavalo de Troia para ocupar a floresta. As fronteiras já estão avisadas para barrar Ricardo Coração de Leão e Godofredo de Bulhão.

*  O ministro da Educação, Velez Rodriguez, colocou no seu currículo livro em "coautoria" com o escritor francês Tocqueville morto em 1859. A curiosa observação é do professor Rafael Mafei, da USP.

* Nova modalidade de salvação se espalha pelo país. Desde que um pastor instalou em estacionamento de uma igreja um drive in para oração, esse tipo de marketing da fé tem crescido. O fiel não precisa sair do carro, molha a mão do religioso e descola um conselho ou uma cura expressa.

* As redes sociais estão informando que Bolsonaro acaba de deixar o hospital.

* Professora de uma escola pública de Campinas (SP) estava obrigando alunos a rezar e anotar versículos da bíblia independentemente de a criança ser ou não cristã. A tosquice fundamentalista foi punida. Uma das alunas, que candomblecista, se recusou a participar e passou a sofre bullying. A mãe da criança processou a escola. O Tribunal de Justiça de São Paulo determinou que o Estado deverá pagar uma indenização à aluna de R$8 mil. Só que sobrou pro contribuinte. Essa quantia não deveria sair do Estado mas da sacolinha da professora.


terça-feira, 12 de fevereiro de 2019

Ricardo Boechat: uma ausência

Em 1993, Manchete foi encontrar Ricardo Boechat na redação do Globo.
O colunista posou  para o fotógrafo Orlando Abrunhosa na mesa de trabalho,
que era sua trincheira. 
O jornalismo perdeu Ricardo Boechat no momento em que seu trabalho era mais importante.

O Brasil está precisando de indignação.

Muita.

E Boechat foi, na grande mídia, um dos poucos que não não se deixou calar e deu voz à justa indignação sem selecionar os alvos.

Em 1993, a Revista Manchete reuniu em uma matéria de várias páginas os principais colunistas da época. O título: "A guerra dos colunistas". O subtítulo: "Obrigados pela crise a dar menos importância às dondocas e badalações, eles partem para o jornalismo mais in do Brasil".

Boechat, um dos focalizados, comentou a mudança que motivava a pauta da revista.

- "O colunista teve que se transformar em repórter apurador", disse ele ao repórter Jorge Eduardo Antunes, sem sequer observar que sua obstinação pela notícia era um dos fatores da evolução do colunismo.

A força das redes sociais era então uma miragem, os fatos não eram acessados com um clique e os jornais impressos ainda eram a fonte mais disputada de notícias de várias áreas. Como apurador, Boechat era um cão farejador que se desafiava a contar o que nem sempre podia ser desvendado.

A internet provocou uma crise de identidade no jornalismo impresso, abalou a mídia, e Boechat, como tantos outros profissionais, teve que se reinventar. Firmou-se como âncora na TV aberta, sem  se empolgar com sites, canais de You Tube e redes sociais. Curiosamente, foi encontrar seu melhor público em um veículo cuja força é hoje subestimada: o rádio e o seu programa nas manhãs da Bandeirantes, de grande repercussão.


Ricardo Boechat recebeu justas homenagens. Uma, talvez, simbolize a missão cumprida junto ao público, a razão de ser do jornalismo. Foi a manifestação espontânea dos taxistas, dos quais a voz de Boechat foi passageira e, agora, torna-se ausência e saudade.

VEJA O VÍDEO DA HOMENAGEM DOS TAXISTAS, EM SÃO PAULO. CLIQUE AQUI

Na capa da Revista do Brasil, a festa dos sem-impostos...

Na capa da Revista do Brasil, um tema do qual a velha mídia costuma passar ao largo: os três maiores bancos privados do Brasil (Itaú, Bradesco e Santander) pagaram aos seus acionistas, em 2018, quase 37 bilhões de reais.

Essa gigantesca mufunfa não é tributada.

Pense nisso ao receber seu salário já com desconto de Imposto de Renda.

Com base em dados da Confederação dos Trabalhadores no Ramo Financeiro, a revista mostra que o leão do fisco é mansinho quando se trata de magnata. Só nessa transação, o governo deixa de arrecadar quase 5 bilhões de reais.

Exerça pelo menos o seu direito de ficar indignado ao ver a tramoia em andamento da reforma da Previdência, do arrocho de aposentadores e benefícios. Isso vai ser fácil para as facções políticas. Mas cobrar impostos sobre dividendos e corrigir injustiças do sistema tributários, que ferra mais quem ganha menos, não se fala. Ao defender a reforma da providência, políticos, tecnocratas e colunistas de economia, mensageiros do mercado, acenam que o projeto acabará com as aposentadorias milionárias de privilegiados, marajás e categorias poderosas. Você sabe que isso dificilmente vai acontecer. No fim, vai sobrar para os de baixa renda e os idosos, que não conseguirão pagar nem o boleto da funerária.

Nenhum governo mexeu na facção dos dispensados de impostos.

Não por acaso, o sistema financeiro, que tem bancada própria no Congresso, é um dos maiores contribuintes para os caixas das eleições.

Pegou a visão ?

domingo, 10 de fevereiro de 2019

Fotografia: Há 60 anos, Ethan Russel fez a última foto dos Beatles

Reprodução/The Guardian

A última foto do Beatles juntos foi feita em 22 de agosto de 1969. O autor da imagem: Ethan Russell. O cenário: uma propriedade rural de John Lennon, perto de Ascot. Em matéria publicada hoje pelo Guardian, Russell recorda o dia. Os Beatles já estavam em crise: "Eu poderia pedir para eles sorrirem, mas seria totalmente falso e eu estou feliz por não ter feito isso".
Durante 10 anos, até 1978, o americano Ethan Russell fotografou outras estrelas e bandas de rock, como Rolling Stones, Jimi Hendrix, The Who.
Leia no Guardian, AQUI 

Diretora da Vogue faz festa na Bahia e rede social vê racismo em noite temática de sinhás e mucamas

Donata Meireles, diretora da Vogue Brasil, em modelito sinhá&mucamas. Reprodução Instagram
Repercute nas redes sociais uma bizarra festa de aniversário de Donata Meireles, que acumula o ofício de socialite com o de diretora da Revista Vogue Brasil.

Tão logo começaram a circular na web, as fotos da festa dos 50 anos da Meireles provocaram reações. O regabofe parecia ter o Brasil Colônia como "conceito", como costumam rotular os marqueteiros. Se Debret fosse convidado para a festa, realizada no Palácio da Aclamação, em Salvador, teria se sentido à vontade entre suas fontes de inspiração: só faltou o pelourinho, havia "mucamas", "sinhás", tronos e abanadores.

Como lembrancinha da volta ao passado, convidados posavam em tronos ao lado de "escravas". Aniversariante e convivas talvez esperassem likes e carinhas alegres a enfeitar as postagens rede social afora. Foi aí que entrou areia no coco e o acarajé passou do ponto. O bombardeio foi de críticas que assinalaram teor "racista' da badalação. A aniversariante pediu desculpas. se "causamos uma impressão diferente". Taoquei, mas entre mucamas, abanadores e tronos, que impressão deveria ser passada?

Houve quem gostasse. Segundo a colunista Paula Saldanha, do site GPSLifetime, "a brasilidade vibrou" na noite e "quem embalou os convidados foi o nativo Caetano Veloso". A coluna não informa se Caetano cantou "eu sou neguinha".


sábado, 9 de fevereiro de 2019

Barraco na mídia: jornal tenta chantagear executivo




por Flávio Sépia 

O jornal National Enquirer, tabloide popular que circula nos Estados Unidos desde o fim do anos 20 do século passado, nunca teve boa fama. Antes da Segunda Guerra chegou a assumir uma linha pró-fascista. Especializou-se, depois, com mais ênfase, em cobertura de crimes, acontecimentos sobrenaturais, discos voadores e celebridades. Nos anos 1970, era a bíblia da fofoca e um fenômeno nas bancas. Enquanto a revista People, na mesma década, focalizava os famosos de uma maneira, digamos, mais amistosa, o National Enquirer investia na baixaria sem medo de ser feliz.

A Fatos & Fotos fez acordo de utilização de matérias no Brasil com as duas publicações, não ao mesmo tempo: a People, entre 1975 e 1978; Enquirer de 1979 até 1981, talvez. A parceria com a People funcionou, havia naturalmente forte interesse do leitor brasileiro na "intimidade" dos astros e estrelas de Hollywood. Já a dobradinha com o National Enquirer não decolou, embora o absurdo às vezes fosse cômico e divertisse os redatores que traduziam as matérias. Era baixíssimo o nível de gossips e escândalos dos famosos e dos personagens freaks que eles adoravam "investigar": algo do tipo a mulher com duas vaginas do Kentucky ou o pastor abduzido que pregou para extraterrestres em uma galáxia distante.

Precisou Donald Trump chegar ao poder para o National Enquirer, quem diria, entrar no radar da luta política que divide os Estados Unidos e virar assunto sério do Globo de hoje.

O National Enquirer, que é da American Media que, por sua vez, pertence a David Pecker, antigo parça de Trump, colocou repórteres e fotógrafos para acompanhar Jeff Bezos, dono da Amazon e do Washington Post, com o objetivo de flagrá-lo ao lado de uma suposta amante: a jornalista Lauren Sanchez, ex-apresentadora de TV.

Bezos denuncia que, de posse de "fotos íntimas", o National Enquirer ameaçou publicá-las caso ele não desmentisse publicamente que via "motivação política" na obstinação do tabloide em torno da sua vida pessoal. 

Trump é crítico da Amazon e se incomoda profundamente com a cobertura política do Washington Post. Por isso, Bezos vê na relação entre o presidente e o Pecker a motivação do tabloide para segui-lo por cinco estados em busca das tais fotos íntimas. Em artigo publicado no seu blog, Bezos explica porque apesar de ameaçado pelo Enquirer decidiu não ceder à chantagem. "Se eu, na minha posição, não posso enfrentar esse tipo de extorsão, quantas pessoas poderiam?", escreveu ele, negando-se a entrar no jogo do amigo de Trump.

A American Media de Pecker já foi utilizada por Trump como "laranja" na intermediação dos pagamentos com que  tentou comprar o silêncio da ex-modelo da playboy Karen Mc Dougal e da atriz pornô Stephanie Clifford, que supostamente tiveram casos com o atual inquilino da Casa Branca. Clifford acabou revelando em livro, como prova de que sabe do que está falando, que Trump tem um pau abaixo do tamanho médio, nada que possa ser chamado de "Trump Tower" e em um estranho formato de cogumelo. Depois de classificar como "nada impressionante" o sexo com o magnata, ela insinuou que Trump tem déficit de atenção durante a trepada e às vezes parece se desligar do que está fazendo. Trump e Pecker agiram para impedir que essas revelações cogumelianas contaminassem a campanha eleitoral.

Os escândalos políticos em Washington costumam ter esses detalhes fálicos, são bem produzidos e roteirizados, quase hollywoodianos. Remember a estagiária Monica Lewisky, que também teria vazado uma característica do pênis de Bill Clinton: seria torto e desgovernado, a ponto de tornar difícil uma performance do tipo "garganta profunda". 

E pensar que Itamar Franco pagou caro por se envolver em um tosco escândalo carnavalesco por simplesmente posar ao lado de uma vagina esfuziante que até fora do seu campo de visão estava: só os fotógrafos viam a desejada comissão de frente enquanto Itamar sorria inocente.

Ô coitado!

    

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2019

Fotomemória: Boca de Anjo no palco do povo...

por Guina Araújo Ramos (do blog Bonecos da História

A série "Bonecos da [minha] História [no Fotojornalismo]" recupera uma figura que foi bastante conhecida, em especial dos fotógrafos, nas praças e nas feiras mais populares no Rio de Janeiro na década de 1970, um pouco menos, um pouco mais.

Foi o povão que lhe deu o nome artístico: Boca de Anjo.

Boca de Anjo - Rio, 1976 - Foto Guina Araújo Ramos

A espetaculosa figura me reapareceu há poucos dias no Facebook, numa postagem do perfil de Ricardo Beliel, colega que conheço desde os tempos em que me iniciei como fotojornalista nas revistas da Bloch Editores, em 1977, quando nos classificamos para o Curso Bloch de Fotografia, um dos caminhos mais valorizados, na época, para entrar na profissão (neste ano, por exemplo, foram mais de 800 candidatos para 30 vagas).

Na postagem, Ricardo Beliel, com uma foto de 1973 (uma entre tantas de alta qualidade que compõem o seu acervo), identifica o artista de rua como Boca de Anjo, apelido que é confirmado por outros colegas. Eu até já me esquecera disso, mas relembrei ter ouvido o nome à época. Agora, no entanto, gastei bastante tempo na Internet, mas não consegui qualquer outra referência a ele, e muito menos cheguei à sua verdadeira identidade.

Eu o fotografei em 1976, ele e os seus malabares de (quase sempre) fogo, numa roda de encantados espectadores, num domingo qualquer de sol, nas proximidades da antiga feira nordestina do Campo de São Cristóvão, junto à obra de um acesso à Linha Vermelha (as barras de aço ao fundo), em frente ao Colégio Pedro II, numa área geralmente vazia da grande praça do Campo, perto do início da Rua São Luiz Gonzaga, aquela que sai dali e bem que vai para Benfica...

Na época, fui algumas vezes à feira, como exercício fotográfico para os seguidos cursos que fiz no Senac da Rua Mal. Floriano, mas também por iniciativa própria (e com amigos), que era a grande, única do tipo, feira popular do Rio de Janeiro. A feira de São Cristóvão, a original, era montada, nos domingos de manhã, em torno do elegante pavilhão de exposições, desde a época da sua construção, no final dos anos 1950. Depois de várias ameaças de proibição, acabou oficializada nos anos 1990 e transferida, na década seguinte, devidamente “reciclada”, para o interior do pavilhão.

Não apenas nós dois fotografamos Boca de Anjo... Imediatamente, colegas da época (como Januário Garcia, Marco Antonio Cavalcanti, Rogério Marques, Custódio Coimbra) se manifestaram, pois o conheciam, tanto dali quanto do Largo da Carioca. E sempre fazendo a mesma performance, vestido com um “roupão” típico de palhaços, controlando os malabares de fogo e, ao mesmo tempo, se balançando sobre uma pequena tábua enlouquecida sobre um rolete de madeira. Nisso, comparado a tantos outros artistas de rua, e apesar da dificuldade da arte, talvez até nem se destacasse tanto...
O que realmente atraía o público era uma mistura de muito bom humor nas falas, enquanto se mantinha no limite do equilíbrio, e a exorbitância de exageradas caretas, que fazia destacando os olhos e os dentes (ou a falta de muitos deles), o seu principal recurso cênico. É certamente em relação a este ponto, e de muita ironia (popular também), que lhe adveio o apelido...

Pois, agora, mais de 40 anos passados, me vem à mente uma preocupação (ou melhor, uma "pós-ocupação"...): como terá sido o final da vida (que suponho já tenha ocorrido) do Boca de Anjo?

Aliás, quem realmente era Boca de Anjo? De onde viera? Do que ele vivia? Apenas dos espetáculos improvisados (mas bem treinados) na rua ou de algum outro trabalho? Tinha uma profissão, digamos, “normal”? e conseguiu se aposentar? Teve uma velhice minimamente confortável? Quantos anos teria na época dessa foto, quantos anos viveu?

E não consigo deixar de extrapolar para os tempos atuais... E as tantas pessoas, cada vez mais, que vivem, que continuam vivendo, no Brasil, como artistas de rua? Como elas conseguem viver? E, afinal, qual será o futuro delas?

Tragédia no campo dos sonhos...

Ronaldo, Ronaldinho Gaúcho, Zico, Roberto Dinamite, Neymar, Paulo Cesar Caju, Marcelo, Daniel Alves, Fernandinho, Willian, Jesus e tantos outros craques que brilharam no passado ou agora se destacam na Europa ou nos principais times brasileiros devem estar com o pensamento na tragédia que ocorreu hoje no Centro de Treinamento do Flamengo.

Eles sabem exatamente o que significava para garotos vindos de todo o Brasil estar ali, no ambiente de um grande clube, vislumbrando o sonho de se tornar profissional.

Não é fácil a vida de um menino que por vocação ou incentivo dos pais se dispõe a entrar desde cedo na máquina que faz ou desfaz carreiras. Milhares de jovens brasileiros perseguem essa oportunidade, poucos a alcançam.

Os dez jogadores que morreram no incêndio do CT rubro-negro já haviam ultrapassado muitas etapas da "peneira" brutal que seleciona os mais aptos. das escolinhas onde muitos entram aos nove anos, aos incontáveis testes. O grupo que chegou ao Flamengo estava, certamente, à beira do momento em que, enfim, poderia vislumbrar alguma recompensa a tanto esforço.

Hoje é um dia triste para o futebol e para as famílias das vítimas que compartilhavam a luta e o sonho dos seus jovens boleiros.


Na tela: Roberto Civita vai virar filme-exaltação, sessão-pipoca ou mostrará sem reverências o barão da comunicação?

O Portal dos Jornalistas informa que a biografia de Roberto Civita, ex-presidente da Abril, vai virar filme. O produtor Belisario Franca, adquiriu os direitos do livro "Roberto Civita: O dono da banca – A vida e as ideias do editor da Veja e da Abril", escrito por Carlos Maranhão, que trabalhou na editora por cerca de 40 anos.

Poderia ser uma oportunidade para dissecar um dos barões da mídia brasileira. Será? Não se pode falar ainda sobre a adaptação que o cinema fará, mas um problema dessas biografias é a chapa-brancura que ameniza as controvérsias. Algo parecido aconteceu com a biografia de outro barão, Roberto Marinho, encomendada a Pedro Bial, funcionário do grupo Globo.

A proximidade dos autores com o biografado costuma desfocar a grande angular crítica e favorecer a reverência.

Roberto Civita acumulou realizações editoriais, cometeu erros na condução dos negócios e foi controverso nas relações com o poder político. Civita faleceu em 2013. O seu legado vive hoje uma grave crise plantada desde que a Abril perdeu o vlt das mudanças no jornalismo, não entendeu os sinais da internet e gastou milhões em reformulações atirando para todos os lados, dos negócios em Educação (colégios e curso de inglês, livros didáticos), operadora de TV a cabo e TV UHF a provedor de internet, empresa de eventos, de logística e distribuição, loja digital etc.

Perdido no espaço, o Grupo entrou em decadência, abriu mão dos seus melhores quadros, não pagou tudo o que deve a milhares de funcionários demitidos, entre jornalistas, gráficos e pessoal administrativo, caiu em Recuperação Judicial e, finalmente foi vendido.

Há muito o que contar.

Se a contradita e o desfecho não estiverem na tela, a cena vai ficar datada e virar sessão-pipoca.

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2019

Memória da propaganda: remédio dos anos 1930 curava autoridades nervosas


por Ed Sá 

Terra plana, comunistas aterrorizando crentes em goiabeiras, possibilidade de guerra contra a Venezuela, pesadelos com boletos bancários, escola sem partido e sem vergonha, ameaça da China dominar o Brasil, denúncia de roubo de índia, filhos ensandecidos, o fantasma da mamadeira erótica, a conspiração LGTB, ambientalistas que atrapalham o progresso etc, a insistência em saber quem matou Marielle, a intimidade com milícias. Vamos combinar que os dirigentes têm razão para pirar.

Alguém avise a eles que esses problemas chatos são atuais, mas o remédio é antigo.

Nos anos 1930, o Neuro Fosfato Eskay já era prescrito para transtorno mentais. Havia um certo preconceito da propaganda ao dizer que era receitado para "mulheres geniosas" e de "lar infeliz".
Talvez fosse mera intolerância da época.

Hoje, o Eskay seria ideal para combater as crises de nervos e o fanatismo epidêmico no Planalto Central tanto em que veste azul quanto em quem veste rosa. Até os anos 1950, a palavra usada para definir esses doidões era "neurastênico". Rendeu até um famoso foxtrot, de autoria de Nazareno de Brito e Alberto Barros. 'Brruumm, sou neurastênico/ Brrruuuumm, preciso me tratar/senão eu vou pra Jacarepaguá"...

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2019

Sinal dos tempos: cadê as musas dos novos escândalos?

por O.V.Pochê

Como é mesmo a letra de "Como uma onda", de Lulu Santos? "Nada do que foi será do jeito que já foi um dia"...

A "nova era" já produz seus escândalos, mas ainda não surgiu em meio à repercussão midiática das novas mutretas uma só musa que mereça esse título.

A culpa deve ser da edição brasileira da Playboy impressa, que foi extinta.

Desde que Lilian Ramos foi parar na capa da revista após cena explícita no camarote do então presidente Itamar Franco, no sambódromo carioca,  em 1994, a revista emplacou várias e belas personagens de crises políticas.

Lilian foi catapultada para a mídia em um momento de descontração carnavalesca. Outras musas vieram, em seguida, no rastro de escândalos políticos, embora não estivessem envolvidas nos quesitos judiciais das investigações. O que as lincava com os episódios que ocupavam as primeiras páginas dos jornais era o relacionamento afetivo, familiar ou simplesmente por trabalhar com um dos eventuais investigados.

Mas a mídia em geral adorava tê-las como "protagonistas" e a Playboy escalá-las para capas. Se tinham dissabores com o excesso de exposição na TV e nos jornais, elas ganhavam uma compensação da Playboy, que acenava com bons cachês.

Lembra da Denise Rocha, a advogada e então assessora parlamentar no Senado? Em 2012, ela trabalhava no gabinete do senador Ciro Nogueira, que era membro da CPI do Caso Cachoeira. Enquanto a comissão investigava o escândalo político, vazou na internet um vídeo íntimo de Denise Rocha, que não tinha a ver com a história, a não ser o fato de trabalhar no Senado. Foi o bastante para a mídia apelidá-la de "Furacão da CPI" e a Playboy convidá-la para capa.

Outra "musa da CPI", no caso de uma investigação sobre o senador Renan Calheiros, em 2007, foi a jornalista Monica Veloso. Ela teve uma filha de um relacionamento com o senador, de quem recebia uma pensão supostamente paga por uma construtora, caracterizando-se propina. Renan Calheiros se defendeu afirmando que a pensão era paga com próprio dinheiro seu, Com a repercussão da investigação, Monica Veloso foi convidada e aceitou posar para a Playboy.  Além dessas três, a Playboy botou na capa, a "prima de Jânio", "a cunhada dele", "a musa do mensalão" etc.

Esse obscuro 2019, contudo, começa com escândalos e polêmicas várias mas sem musas à vista. Mesmo se a Playboy existisse, Damares, Ricardo Velez Rodrigues, Flávio Bolsonaro, Queiroz, Marcelo Alvaro Antonio e Onix e Alcolumbre não emplacariam capas.

Como diria Lulu Santos, "tudo passa, tudo passará".

Passou.

terça-feira, 5 de fevereiro de 2019

80 anos depois do começo da Segunda Guerra, Rússia lança o filme "T-34". O tanque que foi o pesadelo dos nazistas é o protagonista...

Cena do filme "T-34", nova superprodução russa sobre a Segunda guerra Mundial. Foto Mars Media/Divulgação

A Segunda Guerra Mundial é chamada na Rússia de Grande Guerra Patriótica. A União Soviética perdeu então 27 milhões de cidadãos, quase 15% da sua população. Para demonstrar a grandeza desse número, a Alemanha perdeu menos de 9% da sua população, Estados Unidos 0,32%, Reino Unido 0,94%, França 1,44% e Japão menos de 6%.

A devastação material e humana que o país sofreu permanece uma ferida aberta 80 anos após o início da Segunda Guerra (no caso da Rússia, 78 anos desde a invasão das tropas alemãs em 1941).  Hitler se desesperou quando os soviéticos empurrarem de volta para casa o que restou de suas tropas porque viu ali o prenúncio da derrota final.

O tanque soviético T-34, o pesadelo de Hitler, entra em Berlim
em abril de 1945 e decreta a derrota final da Alemanha. 
O mensageiro dessa etapa decisiva na aniquilação dos nazistas foi uma extraordinária máquina de guerra: o tanque T-34. Depois de virar lenda ao vencer as poderosas Divisões Panzer alemãs, o T-34 vira filme e atrai multidões aos cinemas da Rússia.

A superprodução da Mars Media, que estreou há poucas semanas, já foi vista, desde por mais de 10 milhões de pessoas.

O lançamento coincide com o aumento das tensões com o Ocidente e com a Rússia alertando sobre a nova corrida armamentista empreendida por Donald Trump. Pesquisas recentes de um instituto local, o Levada, indicam que mais de 50% dos russos acreditam que o país enfrenta nova ameaça militar.

Geopolítica à parte, o "T-34" é apenas um filme que conta a história de um grupo de soldados soviéticos que escapam de um campo de concentração nazista utilizando um tanque T-34 que os alemães haviam apreendido.

O tema Segunda Guerra é ainda sensível aos russos. Para alguns críticos, o filme "T-34" peca por "romantizar" um episódio baseado em fato real. O diretor Alexei Sidorov explicou porque não optou por uma narrativa sombria. "Sim, é guerra. Sim, é a morte. Toda família perdeu alguém. Mas vencemos essa guerra e isso é importante", disse ele.

Ainda não há previsão para a exibição do "T-34" no Brasil.

ATUALIZAÇÃO EM 9/2/2019 -

Janeiro de 2019 - T-34 voltam para a Rússia. Desmobilizados pelo Exército do Laos,
tanques ainda em boas condições são embarcados de volta para Moscou..
Serão usados em paradas militares, museus, monumentos e filmes..

Há poucos dias, a Federação Russa repatriou 30 tanques T-34, que foram desmobilizados pelo Exército da República do Laos. Os blindados estão em boas condições condições e são da série T-34/85, o mesmo modelo que participou da Batalha de Kursk. A Rússia pretende usar os tanques em paradas militares, museus e monumentos, além de disponibilizar os blindados para filmes históricos. O T-34 ainda foi usado durante a Guerra Fria por forças da Europa Oriental, onde ainda existem raros modelos. Museus da Coréia do Norte têm o blindado, que foi usado durante a guerra, em 1950. No Vietnã, o Museu da História Militar, em Hanói, exibe o veículo que também integrou divisões do Vietnã do Norte. No atual conflito do Iémen, há tanques T-34 ainda em combate.