quinta-feira, 28 de julho de 2022

Carta às brasileiras e aos brasileiros em defesa do Estado Democrático de Direito!


A Faculdade de Direito da USP divulgou, no dia 26-7, a "Carta às brasileiras e aos brasileiros em defesa do Estado Democrático de Direito". O documento já recebeu mais de 250 mil assinaturas de apoio entre ministros, juristas, membros do Judiciário, docentes, banqueiros, empresários, personalidades de várias áreas e nomes da sociedade civil, incluindo jornalistas. 

"Em agosto de 1977, em meio às comemorações do sesquicentenário de fundação dos cursos jurídicos no país, o professor Goffredo da Silva Telles Junior, mestre de todos nós, no território livre do Largo de São Francisco, leu a Carta aos Brasileiros, na qual denunciava a ilegitimidade do então governo militar e o estado de exceção em que vivíamos. Conclamava também o restabelecimento do estado de direito e a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte.


A semente plantada rendeu frutos. O Brasil superou a ditadura militar. A Assembleia Nacional Constituinte resgatou a legitimidade de nossas instituições, restabelecendo o estado democrático de direito com a prevalência do respeito aos direitos fundamentais.


Temos os poderes da República, o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, todos independentes, autônomos e com o compromisso de respeitar e zelar pela observância do pacto maior, a Constituição Federal.


Sob o manto da Constituição Federal de 1988, prestes a completar seu 34º aniversário, passamos por eleições livres e periódicas, nas quais o debate político sobre os projetos para país sempre foi democrático, cabendo a decisão final à soberania popular.


A lição de Goffredo está estampada em nossa Constituição “Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de seus representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.


Nossas eleições com o processo eletrônico de apuração têm servido de exemplo no mundo. Tivemos várias alternâncias de poder com respeito aos resultados das urnas e transição republicana de governo. As urnas eletrônicas revelaram-se seguras e confiáveis, assim como a Justiça Eleitoral.


Nossa democracia cresceu e amadureceu, mas muito ainda há de ser feito. Vivemos em país de profundas desigualdades sociais, com carências em serviços públicos essenciais, como saúde, educação, habitação e segurança pública. Temos muito a caminhar no desenvolvimento das nossas potencialidades econômicas de forma sustentável. O Estado apresenta-se ineficiente diante dos seus inúmeros desafios. Pleitos por maior respeito e igualdade de condições em matéria de raça, gênero e orientação sexual ainda estão longe de ser atendidos com a devida plenitude.


Nos próximos dias, em meio a estes desafios, teremos o início da campanha eleitoral para a renovação dos mandatos dos legislativos e executivos estaduais e federais. Neste momento, deveríamos ter o ápice da democracia com a disputa entre os vários projetos políticos visando convencer o eleitorado da melhor proposta para os rumos do país nos próximos anos.


Ao invés de uma festa cívica, estamos passando por momento de imenso perigo para a normalidade democrática, risco às instituições da República e insinuações de desacato ao resultado das eleições.


Ataques infundados e desacompanhados de provas questionam a lisura do processo eleitoral e o estado democrático de direito tão duramente conquistado pela sociedade brasileira. São intoleráveis as ameaças aos demais poderes e setores da sociedade civil e a incitação à violência e à ruptura da ordem constitucional.


Assistimos recentemente a desvarios autoritários que puseram em risco a secular democracia norte-americana. Lá as tentativas de desestabilizar a democracia e a confiança do povo na lisura das eleições não tiveram êxito, aqui também não terão.


Nossa consciência cívica é muito maior do que imaginam os adversários da democracia. Sabemos deixar ao lado divergências menores em prol de algo muito maior, a defesa da ordem democrática.


Imbuídos do espírito cívico que lastreou a Carta aos Brasileiros de 1977 e reunidos no mesmo território livre do Largo de São Francisco, independentemente da preferência eleitoral ou partidária de cada um, clamamos as brasileiras e brasileiros a ficarem alertas na defesa da democracia e do respeito ao resultado das eleições.


No Brasil atual não há mais espaço para retrocessos autoritários. Ditadura e tortura pertencem ao passado. A solução dos imensos desafios da sociedade brasileira passa necessariamente pelo respeito ao resultado das eleições.


Em vigília cívica contra as tentativas de rupturas, bradamos de forma uníssona:


Estado Democrático de Direito Sempre!!!!"



* O texto entre aspas, acima, foi reproduzido do site Migalhas.com apoiado por dezenas de escritórios e departamentos jurídicos.  


VOCE PODE APOIAR O MANIFESTO ACESSANDO O LINK ABAIXO

https://www.estadodedireitosempre.com/

Mídia: na capa da Vogue, o charme nada discreto da batalha da Ucrânia. Promovida a "correspondente de guerra", Annie Leibovitz fotografou a primeira dama na trincheira do glamour

Olena Zelenska na capa da Vogue. Reprodução Instagram/Foto de Annie Leibovirtz

 

Charme e glamour da primeira-dama da Ucrânia em meio a destroços de guerra.
Reprodução Instagram/Foto Annie Leibovitz


por Ed Sá 

É possível rir de uma guerra? O cinema já mostrou que sim. Basta citar apenas dois filmes, M.A.S.H e How I won the War (Oh, que delícia de guerra, no Brasil) que ironizaram dois conflitos militares: o do Vietnã e a Segunda Guerra Mundial. 

Quem agora prova, na vida real, que guerra também pode ser piada é a primeira-dama da Ucrânia, Olena Zelenska, que posou para capa e reportagem da Vogue, deixando-se fotografar pela célebre Annie Leibovitz com destroços ao fundo, posando perto de soldados e de barricadas. 

A guerra na Ucrânia é uma tragédia em escala incompreensível que demonstra a falência moral dos líderes mundiais envolvidos. Glamurizá-la beira o absurdo. Desde que a edição norte-americana da Vogue divulgou a matéria das sua fotógrafa agora "correspondente de guerra", Olenna tem sido bombardeada nas redes sociais que classificam a sua atitude como um "desrespeito" às milhares de vítimas dos combates e dos mísseis.


Jovens de Kiev voltam à balada. Reprodução O Globo


Na mesma linha da "alegria", O Globo publica hoje matéria sobre a volta das baladas em Kiev. Os jovens caem na night movidos a Horilka, a popular vodca local. A foto também contrasta com a situação dramática vigente em várias regiões do país há 155 dias e sem conversações de paz à vista. 

Sally Kellerman, a "Hot Lips" do filme M.A.S.H.

Quando M.A.S.H estreou, em 1970, a guerra no Vietnã alcançava picos de brutalidade. Os mesmos meios de comunicação que anunciavam o lançamento do filme mostravam em fotos e vídeos a crueza das batalhas. No entanto, as plateias das salas de exibição riam com a trama em torno de uma unidade médica instalada em um acampamento e se esbaldavam até com cirurgias e amputações em série ou curtiam a nudez da gostosa enfermeira vivida por Sally Kellerman, no filme, por motivos óbvios, apelidada da "Hot Lips".


John Lennon no filme "Oh, que delícia de guerra".

Já o filme "Oh, que delícia de guerra", lançado em 1967, é uma paródia de humor negro sobre um grupo de soldados que recebe a missão de construir um campo de críquete em território inimigo, na Tunísia, durante a Segunda Guerra.. Sob a direção de Richard Lester, o elenco reúne nomes como Michael Crawford, Ronnie Kinnear e até John Lennon. Em combate, os soldados totalmente inaptos para a guerra, cometem uma sucessão de erros. Entende-se: no fim, o comandante da tropa é internado em uma manicômio. 

Por tudo isso, uma coisa é certa: as plateias das  redes sociais não veem humor na guerra.


Frase do dia: tempos de um estranho mentiroso

 “UM HOMEM NUNCA É MAIS VERDADEIRO QUANDO ADMITE SER UM MENTIROSO”

Mark Twain

terça-feira, 26 de julho de 2022

Nessa jogada nem o VAR acusa impedimento. Flamengo quer construir o Estádio Jair Messias Bolsonaro, o Bozolão

por Niko Bolontrin

Historicamente, clubes de futebol, entidades privadas, mamam no caixa público favorecidos pela demagogia política. 

O caso mais recente é o do Flamengo que tem se aproveitado de ligações com Bolsonaro para conseguir patrocínio de banco público e emplacar leis que o beneficiam. No passado, o Flamengo ganhou de Getúlio Vargas um grande imovel no Morro da Viúva, na Zona Sul do Rio. 

O clube da Gávea não está sozinho nesse tipo de armação. O Botafogo acaba de confirmar a longa concessão do Engenhão a preço módico. Lembrando que o clube agora é SAF e pertence a um americano. O mais grave é o proprietário do Botafogo exigir que a prefeitura do Rio autorize a destruição da pista de atletismo do estádio que sediou um Panamericano em 2007 e a Olimpíada 2016. O empresário acha que a pista de atletismo prejudica o torcedor por deixar muito longe o campo. O prefeito Eduardo Paes estaria propenso a se render à exigência do americano, esquecendo que o poder público gastou bilhões para construir o Engenhão e a pista de atletismo é essencial para o desenvolvimento do esporte olímpico no Brasil. A privatização do Maracanã, aliás, já acarretou a destruição de uma das melhores pistas de atletismo do Brasil. O estádio do Corinthians deixou dívida imensa com a Caixa com prazo para pagamento de quase 20 anos.

O Cruzeiro, agora propriedade de Ronaldo Fenômeno também está à caça de uma doação de terreno para construir seu estádio em Minhas Gerais. 

Também recentemente, o Vasco, em vias de ser vendido para uma empresa americana, ganhou um mimo do ex- prefeito Crivella: o terreno do seu CT na Zona Oeste do Rio. 

A jogada atual do Flamengo é ainda mais descarada. O clube mobiliza Bolsonaro e o próprio Eduardo Paes, certamente impulsionados por interesses eleitoreiros, para levar a Caixa Econômica a doar um valorizado terreno na região do Porto para o Flamengo construir seu estádio. Por enquanto, a Caixa resiste a presentear o clube da Gávea, mas as pressões são visíveis. Curiosamente, a mídia não crítica o possível Estádio Jair Messias Bolsonaro, o Bozolão, talvez porque apoie esse tipo de negociata quando envolve clubes de futebol. Aparentemente acha normal o poder público presentear cartolas e empresários, desde que seja em nome do futebol. Nesses casos, a bola é o álibi que nem o VAR da moralidade declara impedimento.

Mídia: quando a notícia vira confete

 


O Globo noticia que Bolsonaro foi ao Piraquê, na Lagoa, noRio, e foi "vaiado por uns e aplaudido por outros". O jornalão prefere poupar o Bozo e omite que ali é a sede esportiva do Clube Naval, o que dá outra e importante conotação à notícia. O Piraquê tem sócios civis "convidados", mas a maioria é de militares da Marinha. A nota foi publicada  na coluna Ancelmo Gois.

segunda-feira, 25 de julho de 2022

Antes de virar barata, Kafka foi foca • Por Roberto Muggiati

 

O jornal Bohemia com a matéria de Kafka no rodapé da primeira página.




O poeta d’Annunzio na “cabine” do aeroplano de Curtiss.

Um dos primeiros textos publicados por Franz Kafka foi uma reportagem sobre uma competição aeronáutica na Itália, em 1909, quando ele tinha 26 anos, Os aeroplanos de Brescia. Fiquei pasmo ao saber que, apenas três anos depois do primeiro voo do mais-pesado-que-o-ar (o 14 Bis de Santos Dumont, que se ferrem os Irmãos Wrong!), já se promoviam corridas de aviões de asas duplas ao longo de um espaço retangular delimitado por quatro postes cônicos (“pylons” em inglês), modalidade esportiva aérea resgatada com sucesso em 2003 pela bebida energética Red Bull.

De férias no norte da Itália com os irmãos Max e Otto Brod, Kafka compareceu a um show aéreo em Brescia e ficou impressionado com o efeito do espetáculo sobre uma massa de 50 mil espectadores. O texto de Kafka foi publicado em 29 de setembro de 1909 no jornal Bohemia (a propósito, o evento ocorreu no sábado 11 de setembro, algum presságio kafkiano da data sinistra das Torres Gêmeas?)

Confiram um trecho do texto de Kafka, a primeira descrição de aeroplanos na literatura germânica:

“A torre do semáforo indica prontamente que o vento se tornou mais favorável e que Curtiss voará para o grande prêmio de Brescia. Estará começando? Mal concordamos que sim e o motor de Curtiss já está roncando, quase não se pode vê-lo, e já voa ele para longe de nós, voa sobre a planície que aumenta à sua frente, em direção ao bosque à distância, que agora parece se erguer pela primeira vez. É longo o seu voo sobre o bosque, ele desaparece, e o que fitamos então é o bosque, e não ele. Por trás de algumas casas, sabe Deus aonde, lá vem ele na mesma altitude de antes, e corre em nossa direção: quando sobe, veem-se as superfícies inferiores do biplano inclinando-se na escuridão; quando mergulha, as superfícies superiores rebrilham ao sol. Ele vem para a torre do semáforo e faz a volta, indiferente ao alarido com que é saudado, e retorna diretamente para o lugar de onde veio, e logo se torna pequeno e solitário.”

Kafka e os irmãos Brod encontraram-se em Brescia com o piloto francês Louis Blériot, famoso pela travessia do Canal da Mancha. Outra celebridade presente foi o poeta italiano Gabrielle D’Annunzio, que se aventurou a dar uma voltinha na “máquina”  do piloto americano Glenn Hammond Curtiss.



A primeira corrida aérea, em 1910. Foto Smithsonian Museum

As corridas aéreas inspiraram também um romance menos conhecido de William Faulkner, Pylon (1935) – não encontrei registro de tradução no Brasil – que repercutiu ao ser transformado em filme por Douglas Sirk em 1957, The Tarnished Angels/Almas Maculadas(com Rock Hudson, Robert Stack e Dorothy Malone). Faulkner o considerava a melhor adaptação cinematográfica de uma obra sua.


Primeira rua exclusiva para pedestres faz meio século • Por Roberto Muggiati

 

1972:  a rua em obras. Foto Divulgação


No mesmo ano, Jaime Lerner, o idealizador
da primeira rua para pedestres. Foto Divulgação



A XV de Novembro adotada pelos curitibanos. Foto Facebook



Na sexta-feira, 19 de maio de 1972, começavam em Curitiba os trabalhos de construção da primeira via exclusiva para pedestres no Brasil, na artéria principal da cidade, a Rua XV de Novembro, na quadra entre as ruas Monsenhor Celso e Marechal Floriano. Foi uma verdadeira operação de guerrilha urbanística, chefiada pelo prefeito Jaime Lerner. Ele comentou na ocasião: “Na semana passada, quando perguntei ao diretor de Obras quanto tempo levaria, ele me falou em cinco meses. Eu pedi em 48 horas. Ele respondeu: ‘Você está louco!’ Após muita negociação, os engenheiros concordaram que tudo poderia ser feito em três dias.” Com seu dom de síntese, Lerner disse: “Neste caso, a pressa é a amiga da perfeição!”

No livro recém-lançado A Rua e a Bruma, a Régua e o Compasso, Dante Mendonça descreve o que aconteceu: “A primeira etapa da nova Rua das Flores foi feita em 72 horas no trecho entre as ruas Marechal Floriano e Monsenhor Celso. Como se fosse uma ocupação em tempo de guerra, aproveitando o recesso do fim de semana. Na madrugada que se seguiu, operários, máquinas, caminhões e toneladas de pedras ‘petit-pavé’ passaram a cobrir a rua de brita e areia e a pavimentar todo o espaço entre a Praça Osório e a Marechal Floriano Peixoto. Passada a surpresa, o revestimento de ‘petit pavé’ da Rua das Flores [seu nome original, dos tempos pré-automóvel] encantou a cidade. Pela manhã estava instalado o primeiro centro urbano do Brasil reservado exclusivamente ao pedestre e que veio a ser um modelo para as principais cidades do país.”

A ação rápida visava a evitar que os comerciantes da área, temerosos com a mudança, embargassem as obras mediante mandados de segurança. “A pressa é nossa e a praça também”, declarou Jaime Lerner, antevendo o pronto término das obras, com a rua de pedestres cobrindo sete quarteirões da Rua XV de Novembro, da Praça Osório até a Praça Santos Andrade. O prefeito foi estratégico também no timing da sua intervenção. Curitiba sediava, de 16 a 20 de maio, o encontro Lazer e Urbanismo, promovido pelo Grupo de Urbanismo da União Internacional de Arquitetos, preparatório ao 12º Congresso da UIA, que aconteceria em setembro em Varna, na Bulgária. Arquitetos de todo o Brasil, da França, Suíça, Bulgária, Romênia, Hungria, Turquia e Líbano assistiram maravilhados àquela transformação, que levou Jaime Lerner a afirmar que o evento provocou a aceitação do calçadão da Rua XV “de fora para dentro”.



Em seu livro, Dante Mendonça destaca também a rica figura humana que foi Jaime Lerner: “Num Brasil diferente, o Paraná é a banda polaca com um humor diferente: o humor polaco. Sem o sotaque carioca, paulista, baiano, gaúcho ou catarina, o humor da banda polaca tem acento próprio, um jeito singular de provocar o espírito e contar uma piada, sem nunca deixar de rir de si próprio. Jaime Lerner é a pista que nos leva a crer no parentesco do humor polaco com o imbatível humor judaico, como costuma acentuar na conversa com os amigos: ‘Para mim o senso de humor é fundamental. Você não pode se levar tão a sério. Você não é a pessoa mais importante do mundo.’”


sábado, 23 de julho de 2022

Escola em vez de milícia

 

Reprodução Twitter 

Na capa da Carta Capital: o cerco ao SUS

 


por José Esmeraldo Gonçalves

Enquanto o Brasil é obrigado a ouvir as imbecilidades de Bolsonaro e Paulo Guedes, o neoliberalismo selvagem destroi o sistema que salvou milhares de vidas durante a pandemia e é a única opção para a imensa maioria de milhões de brasileiros que não podem pagar planos de saúde. 

Nos últimos dias, o "vampiro" Michel Temer ressurgiu do pântano em que, como golpista, ajudou a mergulhar o Brasil. Dizem os "analistas" que ele está se oferecendo para ser candidato a presidente pelo MDB. Já teria o apoio das oligarquias da mídia que foram suas parceiras no golpe de 2016. Quando assumiu o poder Temer logo começou a pagar a fatura do golpe, principalmente a reforma trabalhista que precarizou empregos, a reforma da Previdência, que surrupiou direitos e foi concluída no desgoverno seguinte e o suspeito teto de gastos, uma reivindicação dos especuladores e do mercado que trafica dinheiro. 

Temer atendeu às pressões e criou um rigoroso teto de gastos. Suécia e Holanda já tiveram tetos de gastos menos radicais. São países com benefícios sociais e tinham gordura para queimar. O Japão instituiu teto de gastos e o abandonou em pouco tempo para enfrentar uma crise econômica e criar empregos.

Uma das grandes vítimas do teto de gastos é o SUS, como a Carta Capital demonstra na edição dessa semana.  E Temer, o traidor da Constituição que agora se insinua como "salvação", deve estar planejando concluir sua obra de desmonte social do país. O caos na educação, o desemprego e a destruição ambiental também são produtos da paralisia que o teto de gastos impõe.

A mídia  comprometida com o neoliberalismo ultrapassado está vibrando com a ressurreição de Temer. Ontem, o comentarista Gerson Camaroti, defendeu na GloboNews, com visível ardor, o teto de gastos como se estivesse no palanque de Temer e como se o Brasil fosse apenas um estúdio asséptico para viaipis endinheirados e lobistas. 

Como se sabe, não há teto de gastos para orçamentos secretos, para o viagra das gloriosas forças armadas, para as Codevasf da vida nem para a corrupção em geral nos ministérios da Saúde e Educação. Nesses casos, o teto tem pé-direito altíssimo. 


sexta-feira, 22 de julho de 2022

Fotografia - O inesgotável baú cultural da Manchete

 

por José Esmeraldo Gonçalves 
A intensa cobertura fotográfica política, ambiental e esportiva da Manchete era uma característica da revista ao longo de 48 anos de existência. Junto com Manchete, a Fatos&Fotos, Amiga, Geográfica, Desfile, entre outras, registraram a Bossa Nova, o Cinema Novo, Copas do Mundo, as revoltas estudantis, a MPB, a Moda, a Jovem Guarda, o Rock Brasil, as crises, para citar apenas alguns segmentos. 

O fabuloso acervo da Bloch Editores está, como se sabe, desaparecido desde que foi leiloado pela justiça. Felizmente, livros e documentários têm resgatado centenas de imagens importantes para a memória jornalística do país e a Biblioteca Nacional digitalizou a coleção das revista. Na prática, fez um backup necessário de textos e fotos.

Os pesquisadores ainda recorrem a buscas em sebos e coleções particulares, contatam fotógrafos que trabalharam na Manchete e mantêm seus próprios acervos ou recorrem aos herdeiros daqueles que já se foram. E também buscam o conteúdo de reportagens e crônicas. Há no mercado vários livros que compilaram textos de Nelson Rodrigues, Paulo Mendes Campo, Rubem Braga, entre outros, publicados originalmente em Manchete.



"O Canto Livre de Nara Leão", do diretor Renato Terra, é um desses projetos que, além de todos os méritos, recupera referências fotográficas. É impressionante, aliás, como a série documental levantou tão ampla iconografia sobre Nara e sua época. Não apenas da Manchete, claro. Estão lá imagens de O Cruzeiro, do Jornal do Brasil, Folha de São Paulo, Última Hora, Correio da Manhã e de arquivos públicos e particulares de São Paulo e Rio de Janeiro, como se vê no recorte dos créditos, acima. 

Roberto Muggiati, ex-diretor da revista, costuma dizer que a Manchete deve ter seu DNA na Transilvânia: é uma revista que se recusa a morrer. Apesar de tudo, inclusive do sumiço do arquivo fotográfico, ainda não lhe cravaram uma estaca no coração. Virou fonte. E isso é bom. 

"O Canto Livre de Nara Leão" está disponível no canal de streaming GloboPlay.

quarta-feira, 20 de julho de 2022

Cozinha do Absurdo, com receita • Por Roberto Muggiati

Vittore Carpaccio: São Martinho,
exposição permanente
 Arte das Igrejas
 em Zadar, Croácia.
Para ficar em sintonia com este mundo, vasto mundo, resolvi criar a Cozinha do Absurdo. A receita de estreia é uma ideia com a qual venho trabalhando há alguns anos: carpaccio de abobrinha. Carpaccio, como todos não sabem, foi um genial pintor veneziano, Vittore Carpaccio (1465-1525), homenageado com o nome de um prato criado em 1950 no Harry’s Bar de Veneza. 

Segundo Arrigo Cipriani, atual dono do bar, o carpaccio  foi servido pela primeira vez à condessa Amalia Nani Mocenigo, quando informou ao dono do bar que seu médico lhe havia recomendado o consumo de carne crua, rica em ferro, pois ela estava com anemia. O carpaccio, então, consistia em finas fatias de carne crua, temperadas com molho de mostarda, molho inglês, suco de limão, leite, sal e pimenta-do-reino branca. O prato foi nomeado carpaccio por Giuseppe Cipriani, o fundador e dono do bar, em referência ao pintor italiano, pois a cor vermelha forte do prato o fazia lembrar das pinturas de Carpaccio, que estavam na época em exposição numa grande retrospectiva na cidade.

Apliquei o conceito de um produto cru finamente fatiado não a alguma carne (depois da bovina, o carpaccio de salmão é a favorita), mas a um legume, a abobrinha, na versão italiana, chamada zucchini.


Carpaccio de abobrinha aos sabores aleatórios



Vale o gosto pessoal e a imaginação do gourmet aprendiz. Nesta primeira edição, usei uma abobrinha de 15cm de comprimento com 4cm de diâmetro cortada em rodelas infinitesimalmente finas e as temperei com:

• Alcaparras

• Teriyaki

• Chutney de abacaxi

• Mostarda amarela

• Ketchup

• Wasabi

• Algumas gotas de limão siciliano

• Salpicar moderadamente sal rosa do Himalaia

Todo cuidado é pouco com o Wasabi, a raiz forte japonesa: qualquer exagero é literalmente tiro e queda...

 

segunda-feira, 18 de julho de 2022

Publimemória: o dia em que o Fiat 147 pagou promessa na Penha

 



Do Facebook "Jornais Antigos do Rio de Janeiro.

Frase do dia

 "Quem cultiva a capacidade de enxergar a beleza, não envelhece nunca.”

FRANZ KAFKA

Temporada de pinhão 2022, com receita • Por Roberto Muggiati

Curitibano, sou papa-pinhão confesso. O supermercado Princesa, que reina supremo neste buraco de Laranjeiras onde moro e que batizei de Baixo-Glicério, pode ter todos os defeitos do mundo – e os tem, sobejamente – menos um: nunca deixa, nos meses de inverno, de proporcionar fartas ofertas de pinhão (em bandejas ou a granel). Uma verdadeira proeza, considerando que, para o carioca, o precioso fruto da araucária é uma coisa muito estranha, próxima do ET.

Este ano, minhas elucubrações de entrevero de pinhão viajaram rumo a uma intersecção com meus experimentos de ratatouille tropical. Um dos resultados está na receita abaixo, sem dosagem precisa, ao bel-prazer do leitor, guiado por sua sensibilidade culinária.

Entrevero de pinhão à Ratatouille Tropical

• Um punhado generoso de pinhões cozidos.

Legumes cozidos:

• Dois ou três jilós cortados na longitudinal.

• Três ou quatro maxixes pequenos.

• Rodelas de uma abobrinha pequena.

• Iscas de um pimentão verde pequeno.

Opcional:

• Meia dúzia de quiabos em pequenas rodelas.

E, é claro, algumas taças de um vinho tinto chileno honesto a bom preço.


Documentário mostra os intestinos da familícia Trump

 


Embora não traga novidades, documentário "Sem precedentes" (Discovery+) sobre a familícia Trump tem o mérito de fazer uma ultrassonografia dos intestinos do clã. Sabe-se que desde a campanha do republicano sua estratégia golpista é copiada pela cópia pirata nacional, seu tosco similar bananeiro. Sobe esse ângulo, é curioso ver o original.


Fora do streaming é bem mais interessante acompanhar o desenrolar da comissão que investiga a conspiração dos Trumps e a invasão terrorista do Capitólio, que o Globo minimiza ao chamar de "espetáculo midiático". 

Nos Estados Unidos a comissão é vista pela maioria da opinião pública como um pilar de defesa da democracia. 

Com a queda de popularidade de Joe Biden, o risco Trump permanece como ameaça. As eleições parlamentares de novembro dirão o tamanho do perigo. Um derrota republicana pode estimular o partido a rejeitar um eventual canditadura de Trump a presidente em 2024. Se os republicanos dominarem o Congresso darão um grande passo para retomar a Casa Branca. Restará, entao, aos democratas encontrar um nome forte para suceder o desgastado Biden.

Mídia - "Sigilo" é o novo nome da censura

Logo nas primeiras semanas de governo, Bolsonaro alterou a Lei da Transparência. O sociopata ampliou o número de autoridades ou funcionários com poder de decretar sigilo sobre praticamente qualquer coisa. A inspiração é fascista, nasce nas leis implementadas por Mussolini nos anos 1920. Sigilo é a nova censura. Essa onda de vetar acesso público a documentos e procedimentos públicos é ferramenta do autoritarismo. E quando envolve gastos esconde impobridade administrativa, desvio de verbas e corrupção. O derrame de decretos de sigilo também acontece na área de segurança pública. Serve para esconder irregularidades e crimes. A mídia, principalmente,  sente os efeitos do sigilo quando proliferam decisões de juízes que impedem acesso a informações sobre investigações ou se criam barreiras para o trabalho dos repórteres.

Desde janeiro de 2019, o autoritarismo tem o poder de, quando interessa, jogar o Brasil nas trevas. 

Quem conspira contra a democracia trabalha melhor no escuro.

domingo, 17 de julho de 2022

Mídia: jornalistas podem perder emprego. A não ser que façam um curso para virar pastor

por Flávio Sépia

Bolsonaro decreta que jornalistas devem buscar emprego no paraíso celestial. Aqui na terra a barra vai pesar ainda mais. O sociopata baixou uma norma dando às TVs abertas o direito de vender 100% da programação para pastores. Até então, só podiam comercializar 25% da grade diária. 

O lobby da indústria religiosa funcionou junto ao Planalto onde circulam mais pastores do que qualquer outro gênero humano. O resultado da decisão é que muitos repórteres, editores, câmeras e produtores poderão perder seus empregos. TVs abertas são  concessões públicas, têm a obrigação  constitucional de informar, prestar serviço à população, divulgar a  cultura sem privilegiar ideologias e  credo.  Ao permitir que seitas sequestrem toda a programação, se assim desejarem as TVs, esse princípios vão para a sacolinha. 

Para algumas emissoras será um dinheiro fácil. Por que disputar audiência, montar equipes, manter departamentos publicitários e jornalísticos se o caixa vai receber um tsunami de Pix do pastoreio que, por sua vez, pede ao distinto público um dilúvio em forma de cartões de crédito, débito, transferências eletrônicas e doações de bens?

O passador de pano da República

por O.V.Pochê. 

Houve uma época, há muitas galáxias, em que os jornais e revistas acionavam D.Estevão Betencourt, monge beneditino e professor da PUC, para comentar qualquer assunto. 

Os repórteres mais antigos lembrarão.  

Os temas recorrentes eram divórcio, ainda não aprovado, pena de morte que alguns obtusos queriam instituir, drogas, feminismo, violência, amor livre etc.  Em matérias do tipo "enquete" D. Estevão era presença obrigatória. Talvez porque era atencioso, sensato, e ducado, culto e, muito importante, era acessível, recebia os repórteres ou falava ao telefone com a maior presteza. Na correria dos fechamentos, se um repórter era pressionado pelo chefe para repercutir um assunto, D.Estevão o salvava.

Sem comparar o íntegro monje com o Mourão - são semelhantes apenas na disponibilidade para falar com jornalistas -, a mídia atual tem seu "crush" para repercutir notícias. 

Mourão foi ouvido por repórteres sobre o assassinato político de Marcelo  Arruda pelo policial bolsonarista Jorge Guarani. Sempre com pompa e circunstância, empertigado como se fosse chefe da Estado de uma potência, Mourão comenta qualquer coisa. Repórter está sem pauta e precisa entrar em um link ao vivo. Tranquilo, bota um microfone na boca do falastrão. Geralmente ele expele uma opinião tosca.  Mas as bobagens que diz o mantêm na mídia. Bom pra ele que agora é político e vai disputar votos. 

A mais recente fala do Mourão chega a ser ofensiva. Ele classificou o assassinato político de Marcelo como uma coisa que acontece todo fim de semana. É um deboche. 

Em um execício tragicômico, o que o modo Mourão de analisar os fatos diria sobre casos de assassinatos políticos ou de escândalos na atualidade e na História? Sigam o fio:

Bruno e Dom - "um simples desentendimento numa pescaria.

Marielle: "uma briga de trânsito".

John Kennedy - "bala perdida, uma fatalidade. Lee Oswald apenas manuseava o rifle, acontece.

Marat - " foi morto por uma mulher, aprontou alguma coisa, foi crime passional, acontecectida hora. Na época não tinha ambulância, demorou a ser atendido, perdeu muito sangue.

Lincoln - "uma fatalidade. Não deveria ter ido ao teatro. A peça em cartaz era muito ruim. Não valia a pena".

Chico Mendes - "foi crime passional. Acontece todo dia.

Zuzu Angel - "um acidente de trânsito. Um caso para mandar um reboque, nem precisava investigar".

Atentado ao Charlie Hebdo - "provavelmente foi a reação de um assinante desgostoso por não estar recebendo o jornal".

Invasão do Capitólio - apoiadores de Trump queriam fazer apenas um passeio turístico. Era uma despedida do governo que saiu do controle, acontece.

Morte de Genivaldo na câmara de gás do camburão - um erro na dosagem de gás. Isso aí acontece, pode ser defeito da bomba de gás. O rapaz deveria ter ofendido a respiração.

Escândalo de propinas para pastores dentro do Ministério da Educação - " isso aí foi esclarecido, pediam o dízimo que é dito na bíblia. Nada ilegal. Bobagem, o melhor que a mídia tem a fazer em mudar de assunto.

sábado, 16 de julho de 2022

Na capa da Carta Capital: o longo braço do bolsonarismo

 


Investigação acima de qualquer suspeita...


 

Acima, reprodução do Globo, hoje, coluna de Ascânio Seleme 
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por José Esmeraldo Gonçalves

O filme Investigação Sobre Um Cidadão Acima de Qualquer Suspeita (Indagine su un cittadino al di sopra di ogni sospetto), de Elio Petri, lançado em 1970, conta a história de um comissário de policia que mata a amante e espalha nno local do crime todas as provas que o incriminam. Com esse jogo fatal, o policial quer mostrar que, apesar de todos os indícios, a lei jamais o alcançará. O filme de Petri é atualíssimo, disseca a corrupção, a arbitrariedade. a insolência de agentes da lei. 
Deveria voltar aos cinemas e ser amplamente divulgado no streaming. O  noticiário mostra que o Brasil atual reencena a cada momento, na vida real,  o filme de Elio Petri. 

quinta-feira, 14 de julho de 2022

A selfie do carnaval "secreto" hoje em Brasília. É a comemoração do Estado de Emergência

 


por O.V.Pochê

Brasília está em festa.  Foi decretado sigilo de 100 anos para o lugar onde a farra está acontecendo, mas recebemos essa selfie exclusiva. Saiu cara, custou um trator superfaturado. Uma das atrações da comemoração será um sorteio de emendas do relator que dará direito a 3 mil caixas d'água com sobrepreço amigo. Incluídas no quesito "despesas para exercício do mandato", verbas de gabinete custearam uísque em proporções bíblicas. Chope, picanha e Viagra estão no mela-cueca oficial como "doação para campanha". Charutos e as notas de 100 dólares para acendê-los foram pagos por verbas da Saúde. Tudo dentro da lei, segundo as assessorias de suas excelências. A festa não tem hora pra acabar. 

Pode até ser que o Brasil acabe antes.

Poluição demográfica: “Eu sou um de oito bilhões! ” • Por Roberto Muggiati

 

Aglomeração distópica no lazer. Reprodução Instagram 


Deu no jornal na última terça-feira que em novembro a população do planeta ultrapassará os 8 bilhões. Em novembro estarei com 85 anos de idade. Portanto, só no meu modesto tempo de vida, este pequeno geoide teve sua população aumentada quase quatro vezes! 

Há algum tempo criei um conceito que, se não repercutiu nos meios acadêmicos, deve ter sido por causa do Efeito Groucho Marx (“Eu jamais entraria para um clube que me aceitasse como sócio...”) Tenho a certeza de que é um conceito sólido que tem tudo a ver com as mazelas sócio-políticas do nosso tempo: a “poluição demográfica”. 

Considero-me até um otimista, acho um milagre que a nave Terra ainda não tenha explodido. O excesso de gente se acotovelando pelas ruas – por necessidade de sobrevivência correndo atrás do leite das crianças, ou pela busca insana do prazer nas baladas da noite – é um espetáculo atroz. 

A esta altura me vem à cabeça aquela fala esperta e urgente: “Parem o mundo, eu quero saltar fora!” Muitos já a ouviram, poucos sabem a origem. É o título de um musical de sucesso dos autores ingleses Leslie Bricusse e Anthony Newley, Stop the World – I Want to Get Off, lançado em Londres em 1961 e que depois fez sucesso na Broadway. Segundo o pianista Oscar Levant, o título foi inspirado num grafito. Ah, a sabedoria dos anônimos.

O lado bom da pesquisa da ONU que anunciou os 8 bilhões para novembro é que, pela primeira vez em meio século, graças à Covid, a expectativa de vida no mundo caiu de 72,8 anos para 71 anos. No Brasil a queda foi ainda maior, de 75,3 para 72,8 anos. Segundo esses critérios, estou com o saldo devedor, melhor ficar quietinho no meu canto...

O Tema do 007 faz 60 anos • Por Roberto Muggiati


Monty Norman: o autor do tema do 007. Foto: Divulgação


Estreou em 1962 a série de filmes do espião 007 com O satânico Dr. No. Com ele, o tema sonoro composto pelo inglês Monty Norman e arranjado por outro compositor de trilhas da série, John Barry.

O tema foi assim descrito por outro autor de música para filmes de James Bond, David Arnold: “Aquele som envolvente com suingue de bebop acoplado a uma guitarra elétrica viciosa, sombria e distorcida de puro roquenrol representava tudo o que você queria saber sobre o personagem: abusado, arrogante, confiante, dark, perigoso, insinuante, sexy, irrefreável.

E Norman comprimiu tudo isso em apenas dois minutos. ”

O tema abriu todos os 27 filmes da série, até o mais recente, Sem tempo para morrer (2021). Só há uma nota triste em tudo isso: a morte de Monty Norman, aos 94 anos, na última segunda-feira, 11 de julho, depois de uma breve doença. Mas seu tema imortal continuará eletrizando as plateias enquanto houver Bond, James Bond.

OUÇA AQUI O TEMA ORIGINAL

James Bond Theme (From Dr. No) - YouTube

Da Folha: sobre mansos, domesticados e adestrados

 

Reprodução Folha de São Paulo. Clique na imagem para ampliar

quarta-feira, 13 de julho de 2022

Mídia: sempre contra qualquer avanço social

 


Posições como essa que o título do Globo anunciou há 60 anos são comuns na história do principal jornal da direita. O Globo foi contra salário mínimo, contra o decimo-terceiro, contra os Cieps, contra universidades públicas, contra sistema de saúde pública, contra reforma agrária, contra Bolsa Família, contra Minha Casa Minha Vida, contra luz para todos, SUS etc, muitos etcs. Para fazer valer sua ideologia e o ódio contra avanços sociais, O Globo foi e vai muito além do jornalismo. Ao longo da história apoiou golpes, desde a conspiração que levou Getúlio ao suicídio, o golpe e a ditadura de 1964, apoiou Collor a ponto de manipular um debate presidencial (no caso a TV Globo), fechou com o golpe que derrubou Dilma Rousseff, apoiou a eleição de Bolsonaro e deixa claro que em um eventual segundo turno nas próximas eleições vai de Bolsonaro e Paulo Guedes. Detalhe: João Goulart assinou a lei do 13* em 1962 quando O Globo já participava da preparação do golpe de 1964. O título que enfatiza o " desastre" já fazia parte do golpismo endêmico do jornal.

Não brinquem com o Vesúvio

 

Reprodução - extra.globo.com

Silva Jardim não teve a mesma sorte. Por Roberto Muggiati

Silva Jardim
O republicano e abolicionista brasileiro Antônio da Silva Jardim, aos 30 anos de idade, visitou Pompeia, na Itália e, curioso por conhecer o vulcão Vesúvio, mesmo tendo sido avisado de que ele poderia entrar em erupção a qualquer momento, em 1º de julho de 1891 foi tragado por uma fenda que se abriu na cratera da montanha - não se sabendo se foi um acidente ou um ato voluntário.
De acordo com reportagem do jornal "A Pátria Mineira", de 30 de julho de 1891, da cidade de São João del Rei, acessível por meio do sítio do Arquivo Público Mineiro, a morte de Silva Jardim teria sido um acidente, testemunhado por um guia e seu amigo Joaquim Carneiro de Mendonça. Segundo o relato, o jornalista teria sido engolido por uma fenda junto ao Vesúvio, do que se salvou, ferindo-se, Carneiro de Mendonça, que fora auxiliado pelo guia local. O jornal menciona a fonte das informações como a "Carta Parisiense", de Xavier de Carvalho, dirigida ao "Paiz".

segunda-feira, 11 de julho de 2022

Madame P. Guedes: a tchutchuca não falha

 

Reprodução Twitter

A pergunta do dia: alô jornalista, já polarizou hoje?

 


Vale a pergunta: se vivessem na Alemanha nos anos 1930 certos comentaristas da mídia brasileira interpretariam o cenário político como "polarizado" e fantasiariam a teoria dos "dois lados iguais"?

domingo, 10 de julho de 2022

A falsa e hipócrita simetria de André Trigueiro

 


O comentário do jornalista André Trigueiro repercutiu negativamente nas redes sociais. A chamada "simetria", assim chamada a "linha editorial" dos comentaristas da Globo News que busca equivaler Bolsonaro a Lula e botar na mesma prateleira os democratas e quem ataca a democracia é conhecida, mas usá-la ao analisar um caso de terrorismo político que resultou no assassinato de um líder do PT excede os limites do bom jornalismo. 

O perfil típico do terrorista bolsonarista que assassinou líder do PT

 

Reprodução Twitter

 

Quando o insano Bolsonaro faz apelos às suas gangues armadas, está nandando um claro recado de violência. Recentemente, em Minas Gerais um terrorista aparentemente ligado ao agronegócio comandou um drone que lançou veneno sobre o público de um evento político de opositores do b deolsonarismo. No Rio, durante evento na Cinelândia, que reuniu uma multidão de apoiadores de Lula, Marcelo Freixo, André Cecíliano e Alexandre Molon,  em outro ato de terror político um bolsonarista lançou uma bomba de fabricação caseira com fezes em área delimitada para o público do encontro partidário promovido por PT, PSB e PSOL. O incentivo oficial à campanha agressiva provoca nos anormais uma leitura de guerra. É preciso que a justiça puba exemplarmente essa escalada do terror, que procura atingir em última análise a democracia. A tragédia de Foz do Iguaçu é um alerta.  O assassino anunciou a intenção de "matar todo mundo". Só não o fez porque apesar de atingido por tiros o líder petista ainda da conseguiu disparar sua arma (ele era guarda municipal) e, pouco antes de morrer, já caído no chão, feriu o terrorista bolsonarista e o impediu de consumar uma grande chacina.

Escalada do terrorismo eleitoral

PRIMEIRO ASSASSINATO POLÍTICO

URGENTE: Bolsonarista assassina líder do PT em Foz do Iguaçu durante festa de aniversário

Marcelo Arruda era tesoureiro do PT na cidade. Crime político aconteceu depois do policial bolsonarista gritar “é Bolsonaro, seus filhos da puta”. Veja o vídeo da festa antes do assassinato e a foto do assassino num post de apoio a Bolsonaro


VEJA  na Fórum


Gorilas preparam a ditadura.2


 

sábado, 9 de julho de 2022

Mídia: não tá fácil pra jornalista

 



Durante entradas ao vivo nas ruas, os repórteres da Globo enfrentam com frequência pentelhos de verde e amarelo interferindo na imagem. Esse bolsonarista aí ficou plantado na Praça 15, no Rio, durante mais de uma entrevista para o RJ antes das sete da manhã. Mãos no bolso, um tanto petulante, em silêncio, ele provocava a equipe. No caso, não houve agressão, como já aconteceu em outras externas da Globo. Um clima que certamente vai se acirrar  na campanha eleitoral. Não deixa de ser um tipo de bullying.

Câncer para todos. Folha de São Paulo entra no lobby para legalização do cigarro eletrônico condenado pela ciência



Se a Folha recebeu um bom Pix para defender o cigarro eletrônico não se sabe. Mas é fato inusitado o jornal eleger o assunto para um editorial. Um dos mais fortes lobbies empresariais hoje em Brasília é o desse dispositivo cancerígeno. A Anvisa resiste bravamente com a ajuda da Associação Médica Brasileira e outras instituições.  O argumento que o jornal dos Frias usa é um mote muito adotado pela ala mais radical do Partido Republicano dos Estados Unidos. Prega que cada um é dono do seu corpo e deve ter liberdade para fazer o que quiser. Deduz-se que o jornalão conservador defende agora a liberação da maconha, da cocaína, das anfetaminas, da roleta russa, do suicídio coletivo e da tatuagem de suástica. Pra tudo isso vale o argumento "cada um dono do seu corpo".  


Cadê a inflação que estava aqui? Foi maquiada.

por Flávio Sépia

Inflação é talvez a palavra mais frequente no noticiário. É uma realidade. O que é irreal são os índices oficiais da inflação. 

Delfim Neto, o czar da economia no período mais violento da ditadura. Foi signatário do AI-5 e avalizou o governo do ditador Garrastazu Médici. Era um dos seus mais importantes auxiliares. Em última instância, o dinheiro para a imensa máquina sangrenta da repressão, do pau-de-arara à cadeira-do-dragão, da remuneração de torturadores à gasolina para as viaturas que sequestravam brasileiros, do envio de agentes para cursos de tortura ministrados pelos Estados Unidos à caríssima estrutura dos órgãos de segurança, também saía do orçamento gestado por Delfim. 

A mídia neoliberal ama Delfim. Chega ao limite mentiroso de desvincular o ministro mais próximo de Médici de tudo o que acontecia nos porões da ditadura. Um colunista volta e meia o elogia como um frasista genial e considera que só a verborragia de Paulo Guedes chega perto dessa "genialidade".

Delfim foi acusado de manipular a inflação no começo dos anos 1970. Segundo o falecido Walter Barelli revelou anos depois, já que a censura impedia na época notícias contrárias ao regime, foram encontradas planilhas fraudadas para cálculo de preços e de índices para correção de salários. 

Naquela época, a falsificação dos níveis da inflação era feita à base da canelada e da canetada. O governo não devia satisfação a ninguém.  

Hoje, um Paulo Guedes nem precisa mexer nos números da inflação ou falsificar planilhas. Há anos as normas tornam a "manipulação" legal embora ainda imoral. A estatística é apurada segundo os aumentos registrados em uma cesta básica de produtos. O problema é que a cesta é mutante. Aumentos sanzonais determinados pelo clima, falta ou excesso de chuva ou outros fatores são minimizados através de complicadas fórmulas matemáticas. Se o feijão dispara, some da cesta ou é relativizado; se o tomate sobe é limado do cálculo; se o chuchu alça voo é abatido na soma. Por isso, a inflação atual em pouco mais de 10% não reflete os 50%, 80,%,100% que você contabiliza no supermercado mais próximo e no seu orçamento familiar.  

Se tivesse esses instrumentos criativos na mão Delfim Neto não teria sido acusado de fora da lei ao maquiar a inflação no governo Médici.

quinta-feira, 7 de julho de 2022

Memórias da redação: A segunda morte do Formigão e a história secreta da queda do Boeing da Varig, em Paris, em 1973 • Por Roberto Muggiati

                    

Ciro Monteiro, o Formigão. Foto Divulgaçao

Dez horas da noite de sexta-feira 13 de julho de 1973, redação da Manchete, fechamento de uma edição extra. Um redator chega aos berros: “O rabecão da Santa Casa deu uma freada brusca, o caixão escapuliu pela porta de trás e o Formigão saiu rolando pelo asfalto dento do esquife!” 

O insólito episódio me veio à lembrança quando fazia para o Panis o alentado levantamento de celebridades mortas em desastres de automóvel. (Automorte: a megapandemia, 9/8/2021). Com um detalhe sinistro: a vítima, no caso, já vinha morta da cama de um hospital e estava a caminho do velório no São João Batista. Era o cantor de sambas Cyro Monteiro, estrela da Era do Rádio, conhecido pelos amigos como “Formigão”. Seu grande sucesso foi “Se acaso você chegasse”, composição de Lupicínio Rodrigues. 

Pouca gente lembra, mas Cyro participou em 1956 como ator da peça Orfeu da Conceição, de Vinícius de Moraes, que o considerava "o maior cantor popular brasileiro de todos os tempos", rivalizando apenas com João Gilberto. 

Em 1965, Vinícius o brindou com um álbum inteiro, De Baden e Vinícius para Ciro Monteiro. Fiel ao seu estilo de vida, Formigão morreu aos 60 anos de cirrose do fígado.

Aquela “segunda morte” de Cyro Monteiro foi um prelúdio adequado àquela noitada macabra. 

Justino Martins examinava – na parte iluminada da mesa em L que chamávamos “churrasqueira” – os cromos do malote de Paris que acabavam de subir do laboratório, com imagens chocantes do desastre do avião da Varig a poucos metros da cabeceira do aeroporto de Orly. 

Regina Lecléry

Uma coincidência dolorosa: apenas três dias antes, duas das vítimas fatais do acidente tinham se despedido ali mesmo do Justino (e de mim, seu “segundo”), junto à mesa de edição: Regina Maria Rosemburgo Lecléry (uma das mulheres mais bonitas da época) e o ator Jean-Dominique Ruhle, seu acompanhante na viagem (os dois tinham trabalhado juntos meses antes no filme de Nélson Pereira dos Santos "Quem é Beta?") Regina tinha vindo ao Rio resolver questões pessoais e voava ao encontro do marido, Gérard Léclery, que a aguardava em Paris para um cruzeiro com Henry Kissinger no seu iate. Eu a conhecera de leve em duas ocasiões: num almoço no Lagoinha Country Club para as candidatas a Miss Elegante Bangu em 1958 (minha irmã representava o Clube Curitibano e Regina era a Miss Lagoinha daquele ano); e em 1961 em Paris, quando ela e Florinda Bolkan eram as aeromoças mais cintilantes da Panair. Logo depois ela casava com o dono da companhia aérea, Wallinho Simonsen. Em novembro de 1963, Regina e o marido passaram com John e Jackie Kennedy o último fim de semana do Presidente Kennedy na sua casa de praia em Palm Beach: na sexta-feira seguinte ele seria assassinado em Dallas.

O Titanic da ditadura

A capa da Manchete com a cobertura da tragédia de Orly. Reprodução



O RG-820 era um voo de celebridades. O cantor Agostinho Santos, 41 anos, tinha como destino final Atenas, onde defenderia, na Olimpíada Internacional da Canção, “Paz sem cor”, composição feita em parceria com a filha Nancy. Viajava acompanhado do maestro e trompetista argentino Juan Carlos Iglesias (nome artístico Carlos Piper), que trabalhara com Elis Regina no programa O fino da bossa – e fizera o arranjo de “Paz sem cor”.  Agostinho ganhara o mundo ao participar da trilha sonora do premiado Orfeu Negro e ao integrar a caravana brasileira no lendário concerto da bossa nova no Carnegie Hall de Nova York em 1962.
A página dupla da abertura da reportagem da Manchete


O Boeing 707 jaz no campo pouco antes da cabeceira da pista de Orly

O dramático resgate. Optamos por não reproduzir aqui as cenas mais chocantes
do interior da aeronave incendiada publicadas na Manchete..

Os jornalistas esportivos da TV Globo Júlio Delamare e Antônio Carlos Scavone iriam respectivamente transmitir e comentar o Grande Prêmio da Inglaterra de Fórmula-1 em Silverstone.  O automobilismo havia se tornado a nova paixão do telespectador brasileiro depois que Emerson Fittipaldi se tornara campeão mundial na temporada de 1972. Outra figura ligada ao esporte era o iatista Joerg Bruder, 35 anos, casado, dois filhos. Formado em geologia, largara tudo por sua paixão náutica. Tricampeão mundial da classe Finn, fabricava e exportava mastros de alumínio de prestígio internacional. Naquela sexta-feira competiria em Brest, na França, em mais uma etapa da Finn Gold Cup. Outra passageira importante era Reeta Prithi, de 19 anos, filha do embaixador da Índia, que viajava para Londres. 

O senador Filinto Müller – homem forte da censura de Getúlio Vargas durante o Estado Novo – comemoraria seus 73 anos no dia seguinte em Paris, acompanhado da mulher, Consuelo (um sólido casamento de 47 anos) e do neto Antônio Pedro. Outro senador que tinha passagem marcada para aquele voo com a mulher era José Sarney, que desistiu à ultima hora da viagem. (Se embarcasse, a história do Brasil teria sido drasticamente reescrita). Sua vaga na primeira classe foi ocupada por Plínio Carvalho e sua filha de nove anos. Iria encontrar-se com a mulher e o outro filho do casal em Londres. Plininho, como era conhecido, fornecia equipamento de exploração petrolífera para a Petrobrás, pertencia ao café soçaite e jogava polo no Itanhangá Golf Club, onde um de seus parceiros era Wallinho Simonsen, ex-marido de Regina Lecléry, além dos colunáveis Ronaldo Xavier de Lima, os irmãos Klabin, Joaquim Monteiro de Carvalho e Didu de Souza Campos.

Também na primeira classe viajava o engenheiro Clayton Quinderé, que ia cuidar de negócios de sua firma de mineração na Europa. Dono de várias empresas no Nordeste, o cearense de 45 anos se dava ao luxo de morar num dos melhores endereços do Rio de Janeiro, o Edifício Chopin, ao lado do Copacabana Palace. 

No livro Caixa-Preta/O relato de três desastres aéreos brasileiros, Ivan Sant’anna relata um episódio suprarreal:

“Enquanto o avião se afastava do clarão da cidade, no restaurante Antonio’s a foto emoldurada de Regina Lecléry despencou da parede, sem que ninguém a tocasse, num presságio do que iria acontecer naquela quarta-feira. ”

O voo transcorreu na atmosfera etérea das travessias transatlânticas, com o  serviço de bordo da Varig – um dos melhores do mundo, ainda mantendo a qualidade impecável do seu criador, o austríaco Barão Max von Stuckart. Depois do conhaque e do cafezinho, foi exibido o filme “O dia do chacal”, lançado em maio no circuito anglo-americano e ainda indisponível nos cinemas brasileiros. Baseado no thriller de espionagem de Frederick Forsyth, filmado magistralmente por Fred Zinnemann, o “Chacal” culmina na tentativa de assassinato do Presidente francês Charles De Gaulle na cerimônia comemorativa do Dia da Libertação de Paris no Arco do Triunfo. Por uma coincidência curiosa, no dia seguinte ao da chegada do voo RG-820 a Paris, o sucessor de De Gaulle, Georges Pompidou, estaria no Arco do Triunfo para a comemoração do 14 Juillet.

O que poderia ter sido um voo inesquecível para os 117 passageiros, transformou-se em tragédia nos últimos minutos antes da aterrissagem em Orly. Um incêndio aparentemente causado por um toco de cigarro acesso jogado na lixeira de um dos banheiros dos fundos provocou uma nuvem de fumaça que rapidamente se espalhou pelo avião, já nos procedimentos de pouso, a poucos quilômetros da cabeceira da pista do aeroporto de Orly. A fumaça tomou conta também da cabine e impedia os pilotos de enxergarem; além disso, tinham perdido o contato com a torre de controle. O pouso de emergência foi feito a um quilômetro da pista de Orly, num campo de cebolas. Foi uma manobra miraculosa dos comandantes Gilberto e Fuzimoto que garantiu a integridade da aeronave. Mas, assim que avião estacou no campo de cebolas e saltaram ao solo os dez tripulantes e o único passageiro sobrevivente (Ricardo Trajano, 21 anos, que se recusou a ficar preso ao cinto de segurança e correu para a porta da cabine de comando), um forte incêndio se alastrou por toda a extensão do Boeing, carbonizando os corpos dos 116 passageiros mortos por asfixia (morreram ainda sete tripulantes) e derretendo parte do teto da aeronave.

Várias lendas e histórias ligadas à Teoria da Conspiração começaram a surgir no Day After do acidente. O histórico do 707 foi considerado “azarado”: construído em 1968, antes de ser comprado pela Varig trabalhou para a empresa de voos charters Seaboard no transporte de tropas norte-americanas para o Vietnã. A redecoração “bonitinha, mas ordinária” feita pela Varig não levou em conta a natureza inflamável do material usado. Houve também uma espécie de “vingança divina” por ter a Varig ajudado a ditadura a dar o golpe de morte na Panair – empresa sólida, mas cuja independência política incomodava os generais. Na tarde de 10 de fevereiro de 1965, numa canetada, o Presidente Castello Branco suspendia as concessões das linhas aéreas nacionais e internacionais da Panair e as outorgava à Varig, amiga do regime militar. Num conchavo combinado com antecedência, tripulações inteiras da Varig já estavam a postos nos aeroportos para assumir os voos da Panair daquela noite. (A Varig, por sua vez, cumpriria seu ciclo de desventuras e sairia totalmente do ar em 2006, depois de 79 anos de atividade.)

E a causa do incêndio? Uma tragédia daquele porte não podia ter sido causada por uma banal guimba de cigarro jogada no cesto de papéis do banheiro. A causa real teria sido a combustão espontânea de cargas de bancos ejetáveis de caça Mirage que o Boeing transportava no porão para serem trocados por apresentarem defeito de fabricação. (Entre 1972 e 1973 a Força Aérea Brasileira fez uma grande encomenda à França de caças Mirage III-E novos em folha.) Ivan Sant’Anna conta no seu livro: “Eu mesmo escutei essa história da boca de um veterano comandante da Transbrasil, que começou na empresa nesta época e teve a oportunidade de comentar o assunto comigo mais de uma vez. ”

A Manchete também saiu chamuscada

Aquela edição da revista fechou de madrugada na redação, rodou na gráfica de Parada de Lucas no sábado e foi às bancas na manhã seguinte, tirando o apetite da maioria dos comensais do farto almoço de domingo. As fotos eram chocantes, mostrando os corpos carbonizados dos passageiros. Alguns eram até identificados nas legendas, como o senador Filinto Müller e sua mulher.

Com seu prestígio abalado pelo acidente, a Varig achou que a Manchete havia exagerado na cobertura e rompeu relações com a editora Bloch. Não mais passagens de cortesia, nem transporte de malotes.  O salvador da pátria foi um judeu romeno de baixa estatura, Joseph Halfin, diretor da Air France no Brasil (Oscar Bloch Sigelmann imediatamente deixou de chama-lo de “Petit Napoléon, como jocosamente fazia.)

O apanhador no campo de cebolas

Comandante Gilberto
Estranho destino teve o comandante do voo RG-820 Gilberto Araújo da Silva. Por sua perícia profissional ao impedir que o Boeing 707 em chamas caísse sobre os subúrbios de Paris, fazendo-o pousar num campo de cebolas ao lado do vilarejo de Saulx-les-Chartreux, a alguns quilômetros da cabeceira da pista do aeroporto, o comandante Gilberto foi condecorado pelo Ministério dos Transportes da República da França – e considerado herói nacional francês, apesar de brasileiro – e pelo governo brasileiro com a Ordem do Mérito Aeronáutico, no grau de Cavaleiro. 

Recuperado das lesões sofridas no acidente de Orly, ele voltou a voar, até se envolver em 1979 num dos acidentes aéreos mais nebulosos da história. Cito do Wikipédia, que fez um relato preciso dos fatos:

“O avião cargueiro Boeing 707-323C (Voo Varig 967) decolou do Aeroporto Internacional de Narita, em Tóquio, às 20h23 do dia 30 de janeiro de 1979. O destino final era o Aeroporto Internacional do Rio de Janeiro-Galeão, com uma escala nos Estados Unidos.

Vinte e dois minutos depois de decolar, o comandante Gilberto Araújo da Silva fez o primeiro contato com o controle de tráfego aéreo. Não havia qualquer problema a bordo. O segundo contato, previsto para as 21h23min, não chegou a ser feito.

O avião desapareceu sobre o Oceano Pacífico cerca de trinta minutos após sua decolagem em Tóquio. Nenhum sinal da queda, como destroços ou corpos, jamais foi encontrado. O voo de carga transportava, entre outros itens, 53 quadros do pintor Manabu Mabe, que voltavam de uma exposição no Japão. As pinturas foram avaliadas na época em mais de US$ 1,24 milhão. É conhecido por ser um dos maiores mistérios da história da aviação e um dos raríssimos voos civis comerciais que desapareceram sem deixar vestígios. Esse caso nunca teve uma causa específica, pois nunca foi encontrado nenhum sinal do PP-VLU (aeronave envolvida). Até hoje nunca foi encontrado nenhum sinal de vestígios plásticos, peças e/ou corpo dos seis tripulantes.

Teorias conspiratórias

O desaparecimento foi notado pelos controladores de voo após a falta de comunicação na passagem do Varig 967 sobre um dos pontos imaginários fixos sobre o oceano, usados na navegação e monitoramento de progresso de voo. Após uma hora de tentativas frustradas de se estabelecer alguma comunicação, o alarme foi dado e as equipes de busca e salvamento foram acionadas. Com a escuridão reinante, as buscas foram suspensas e só foram retornadas mais de doze horas depois da decolagem, na manhã do dia seguinte. Apesar de mais de oito dias de busca intensa no mar, nenhum sinal de destroços, manchas de óleo ou dos corpos dos tripulantes jamais foi encontrado. 

A investigação interna da Varig não conseguiu resolver o enigma. No relatório final sobre o acidente, consta o seguinte: "Não foi possível encontrar nenhum indício que lançasse qualquer luz sobre as causas do desaparecimento da aeronave". Muitas hipóteses e teorias foram formadas a partir de então para tentar entender o que ocorreu com o Boeing 707 da Varig. As teorias da conspiração lançaram no ar algumas delas:

Teria ocorrido um sequestro promovido por colecionadores de arte, já que no porão estavam as obras do pintor Manabu Mabe. No entanto, essas pinturas jamais foram achadas em lugar nenhum;

O Boeing teria sido abatido por soviéticos, interessados em esconder segredos do caça Mikoyan-Gurevich MiG-25 do desertor Viktor Belenko, que supostamente estaria desmontado e sendo levado aos Estados Unidos no porão de cargas do avião;

O ex-rádio-operador e ex-copiloto da Força Aérea Brasileira (FAB) Oswaldo Profeta chegou a escrever um romance chamado O Mistério do 707 para dizer que o que houve não foi um acidente. Ele acredita que a tripulação do Boeing pode ter cometido algum erro de navegação e penetrado no espaço aéreo soviético, uma área supervigiada. Segundo Profeta, é possível que o avião tenha sido abatido; 

Uma teoria conta que o Boeing 707 teria sido forçado a um pouso na costa da Rússia, onde os tripulantes teriam sido mortos;

A hipótese mais plausível, no entanto, considera que, logo após a decolagem, com a aeronave já tendo atingido um nível de cruzeiro elevado, houve uma despressurização lenta na cabine, o que não causou a explosão da aeronave – ou seja, não foi uma descompressão explosiva – mas lentamente sufocou os pilotos. O avião, então, segundo a linha de raciocínio, voou com ajuda do piloto automático por muitos quilômetros mais, até que, acabou o combustível, caiu sobre o mar em algum ponto extremamente distante dos locais por onde passaram as buscas. Portanto, nenhum destroço foi encontrado, sendo provável – como largamente aceito – que estejam ou no fundo do vasto Oceano Pacífico, ou sobre alguma área inabitada do estado americano do Alasca.” 

Também chamou a atenção o fato de que, num dos raríssimos casos da aviação comercial mundial, o comandante Gilberto protagonizou dois desastres aéreos com vítimas fatais – ele próprio incluído no segundo, vítima do que se poderia justificadamente chamar de A Maldição de Orly.

PS • O drama de Manabu Mabe

Manabu Mabe; Divulgação-Guia das Artes
Cada tela desaparecida no acidente estava segurada em US$ 10 mil, valor considerado abaixo do mercado pelo artista. Mabe tinha feito uma grande exposição retrospectiva no Museu de Arte Kumamoto em Osaka. A maioria das 53 telas eram de sua propriedade, mas 20 pertenciam a coleções de museus e a particulares. Passado o impacto, Mabe entrou em contato com os proprietários das obras perdidas. Todos – com exceção de um – se mostraram solidários: não reivindicaram dinheiro, aceitariam outra tela como reposição. O valente Manabu prometeu a si mesmo que viveria mais trinta anos e pintaria tudo o que havia perdido. Ele morreu dezoito anos depois, em 1997, aos 73 de idade, tendo cumprido quase integralmente sua promessa.