sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Na rua, na chuva e sem renda

por Eli Halfoun
Quem é obrigado a circular, mesmo que seja de carro, pelas principais avenidas do centro do Rio o faz apressado e nervoso (é o medo), mas mesmo assim dá para perceber um grande número de pessoas que se acumulam debaixo de marquises, especialmente na altura da Central do Brasil: nem todos são, ao contrário do que se pensa, moradores e rua. Pelo contrário: são trabalhadores que têm onde morar (mal, é verdade), mas que não podem retornar às suas casas por falta de dinheiro para as passagens de ônibus, trem, seja lá o que for. A matemática é, ao contrário daquela praticada oficialmente, simples: se o cidadão trabalhador sai do trabalho e volta para casa não terá dinheiro para voltar ao trabalho no dia seguinte e muito menos para comprar o feijão com arroz do dia a dia da família.Esse é mais um problema social ao qual não se dá a menor bola e o resultado é o aumento de itinerantes “moradores” de rua. Vejamos: quem ganha R$ 500 ou R$ 600 mensais (nenhum trabalhador desses que realmente pegam no pesado), ganha mais do que isso não pode pagar no mínimo R$ 10 por dia de passagem até porque trabalharia somente para pagar a condução. Dirão os patrões ( e os governos) que existem os vales transporte e refeição, mas nem todas as empresas os distribuem como deveriam. Além do mais sabemos todos que esses vales são na maioria das vezes, trocados por dinheiro vivo para cobrir despesas do obrigatório sustento diário (saco vazia não fica em pé, como se diz popularmente).O elevado preço da (das) passagem tem provocado também o desemprego de muitas diaristas: nenhum patrão, que geralmente também é um mal pago assalariado, pode dispor todos os dias de R$ 10 ou R$ 15 para a passagem, além da diária que nem anda tão baratinho assim. A conseqüência é o desemprego: a classe média (a que mais utiliza esse tipo de serviço) não tem condições de arcar com mais uma despesa mensal com de diarista e passagens, o que a faz abrir mão do quase sempre necessário auxílio de uma faxineira, que, aliás, trabalham cada vez menos aumentando o número de empregados informais. Não é muito raro ver em lojas estabelecimentos assim: ”precisa-se de balconista que more perto”. Não, o patrão não está preocupado com o desgaste físico do empregado no corre-corre da locomoção diária, mas sim em não ter quer desembolsar o vale transporte ou outro vale qualquer que geralmente não vale nada. O alto preço das passagens (e essa já é outra discussão) está cerceando a liberdade do trabalhador de ir e vir. Ou ele vem e não volta (haja marquises) ou simplesmente não vem mais e acaba aumentando a estatística de um desemprego que não deixa esse país caminhar realmente (e não necessariamente a pé) pra frente. Pra frente como se a população é obrigada – e cada vez mais – a estacionar debaixo de qualquer marquise imunda.

2 comentários:

Gonça disse...

Grande Eli, bem pensado, assim como suas outras valiosas colaborações neste panicumovum, ao lado do nosso debarros, outro pilar desta tribuna, rs.
A propósito do tema: no Arpoador e, principalmente, nas areias de Copacabana, é grande o número de pessoas que se abrigam onde podem durante a semana já que não podem arcar com o dinheiro da passagem diária para a Baixada ou outras regiões mais distantes. Outro dia li que o antigo prédio da Manchete na rua Frei Caneca está invadido por dezenas de famílias mas também abriga "hóspedes" temporários. Outros prédios abandonados do Centro também servem de pousada para trabalhadores que não têm condições de dormir em casa todas as noites. Em muitos países do mundo, transporte público é subsidiado. Por aqui, os jornais defendem ajuda do governo a grandes grupos econômicos privados mas quando se fala em subsídio social vira escândalo e motiva campanhas iradas. Pela péssima qualidade dos nossos políticos, a maioria, e dos administradores públicos, também a maioria, o Brasil acha que a privatização geral é a solução para tudo. Menos poder público, menos roubo. Infelizmente não é assim, as mamatas continuam, embora privatizadas, mudou apenas o cofre do desvio do dinheiro público, que virou caixinha ou caixona privada. Nos principais países da Europa, transporte é estatal, com preços compatíveis. A maioria não é objeto de lucro exorbitante. Carro particular é privilégio cada vez mais caro. Em um futuro ideal, o proprietário de um carro, se quiser tê-lo, deverá ajudar a subsidiar o transporte público da imensa maioria da população. Será mais justo e menos poluente.

deBarrros disse...

Abordam vários temas socias na vida da sociedade brasileira no seu todo mas não abordam, talvez, o seu maior tema, que no meu entender, é o salário mínimo. Dizem os governos – a alegação tem sido a mesma não importa qual seja a linha partidáriia do governo – que um aumento substancial deste salário promoveria uma comoção nacional. Ora, o governo inclue nessa comoção nacional as Empresas Privadas. Essa é uma das maiores mentiras usadas por esses governos – presente e passado – para não dar esse aumento. Todas as Empresas Privadas sempre desejaram esse providencial aumento porque com isso o poder aquisitivo do trabalhador seria muito maior e as Empresas com uma demanda maior de seus produtos. Quer dizer, as suas vendas dariam um pulo fantástico. Mas, os governos nunca entenderam assim. Na sua opinião os maiores prejudicados com esse aumento seria o próprio governo, porque muitos governos estaduais e municipais iriam à falência por não poderem cumprir essa exigêcnia contratual por não terem arrecadação suficiente na cobrança de seus impostos.
Qual seria a média salarial no nível do salário mínimo? R$600,00, 700,00 ou mesmo 800,00? Nenhuma Empresa paga esse mínimo atual aos seus empregados nesse patamar.
A Central do Brasil despeja, por hora, na sua gare, mais de cinco mil trabalhadores, que, a pé, descem a rua Larga, hoje Marechal Floriano, em busca do seu local de trabalho, no centro do Rio. São verdadeiras ondas humanas, sem dinheiro para gastar mais com passagens de onibus, das 6h da manhã até mais ou menos 9h, em passos apressados e nervosos procuram chegar no seu ganha pão de todos os dias. E vai ser assim enquanto esses governos ignorarem o bolso do trabalhador brasileiro.
Há setores públicos que, realmente, não podem ser privados, como o transporte, a saúde e a educação. Esses setores tem que ser administrados, MESMO, pelos governos e fortemente fiscalizados pelo próprio governo com seriedade e espírito público. Já se tentou tornar público o transporte no Rio mas fracassou exatamente por falta de seriedade e descaso político. Acredito que em mais cincoenta anos, esse país livre desses velhos políticos, que ainda se encontram em plena atividade de roubar o país chegará a um estado de plena realização moderna e honesta na sua adninistração.