Clóvis Rossi
Quem
deveria ficar "nervosinho"
"Há algo de profundamente errado em um
país, um certo Brasil, em que os ricos choram (e de barriga cheia), ao passo
que os pobres parecem relativamente felizes. Na ponta dos mais ricos, refiro-me
à pesquisa da consultoria Grant Thornton que "Mercado"
publica hoje e
que mostra um absurdo recorde de pessimismo entre os executivos brasileiros.
Na ponta dos pobres, valem as sucessivas
pesquisas que mostram satisfação majoritária com o governo Dilma Rousseff, a
ponto de 11 de cada 10 analistas apostarem, hoje por hoje, na reeleição da
presidente. Como ninguém vota em governo que o faz infeliz, só se pode concluir
que uma fatia majoritária dos brasileiros, especialmente os pobres, está rindo.
Que a economia brasileira tem problemas,
ricos, pobres e remediados estão cansados de saber. Problemas conjunturais (o
crescimento medíocre dos anos Dilma ou a forte queda do saldo comercial, por
exemplo). Problemas estruturais que se arrastam há tantos séculos que nem é
preciso relacioná-los aqui. Daí, no entanto, a um pessimismo recorde vai um
abismo.
Um país em que há pleno emprego e
crescimento da renda não pode ser campeão de pessimismo nem pode ficar em 32º
lugar, entre 45, no campeonato mundial de pessimismo. É grotesco.
Grotesca igualmente é uma das aparentes
razões para o surto de pessimismo que vem grassando desde meados do ano
passado. Seria a diminuição do superavit primário, ou seja, do que sobra de
dinheiro nos cofres públicos depois de descontadas as despesas e tem servido
exclusivamente para o pagamento dos juros da dívida. Foi por isso que o
ministro Guido Mantega apressou-se a divulgar os dados de 2013, para acalmar os
"nervosinhos".
Quem deveria ficar nervoso, mas muito
nervoso, não apenas "nervosinho", é exatamente quem está contente com
o governo.
Basta fazer a comparação: os portadores de
títulos da dívida pública (serão quantos? Um milhão de famílias? Cinco milhões
no máximo?) receberam do governo, no ano passado, R$ 75 bilhões. É exatamente
quatro vezes mais do que os R$ 18,5 bilhões pagos às 14 milhões de famílias (ou
50 milhões de pessoas) que recebem o Bolsa Família.
Quatro vezes mais recursos públicos para
quem tem dinheiro para investir em papéis do governo do que para quem não tem
renda. Seria um escândalo se os pobres tivessem voz. Mas quem a tem são os
rentistas que ficam reclamando da redução do que recebem, como se houvesse de
fato a mais remota hipótese de que o governo deixe de honrar sua dívida. Fazem
um baita ruído com os truques contábeis que permitiram o superavit, mas não
dizem que, com truque ou sem truque, a dívida líquida diminuiu este ano, de
35,16% do PIB em janeiro para 33,9% em novembro, última medição disponível.
Ou, posto de outra forma: o governo,
supostamente irresponsável, gasta menos do que arrecada e ainda pinga 1,3% de
tudo o que o país produz de bens e serviços na conta dos mais ricos e apenas
0,4% na dos pobres entre os pobres. E os ricos ainda choram."
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Um comentário:
A imprensa caindo na real?
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