quarta-feira, 27 de setembro de 2017

Brasil tem encontro marcado com a Noite dos Cristais?

O pior legado desses dias é a intolerância institucionalizada e cada vez mais evidente nas ruas.

Com o avanço da direita e das facções religiosas fundamentalistas, do preconceito, do racismo, do individualismo acima de tudo, do "Estado mínimo" ou nenhum Estado, da apropriação dos serviços de saúde e educação e das demais estruturas públicas, desenha-se o faroeste caboclo.

Manda e usufrui da sociedade quem tem força. Milícias da direita radical e neonazista já partem das palavras para a ação e já inspiram leis no Congresso.

Políticos fazem avançar projetos que jogam o Brasil em um fosso de atraso social, traficantes ligados a evangélicos quebram locais de culto a entidades de religiões afro-brasileiras; protótipos de terroristas que enxergam o diabo até na mãe lançam bombas em centro espiritual; mães-de-santo são agredidas a pedradas; qualquer indício de diversidade é julgado, condenado e lançado na fogueira moral; frequentadores de uma exposição de arte são filmados e ameaçados; um general que certamente tem cúmplices prega o golpe em ataque à Constituição é agora elogiado por superiores e fica imune a punição; escolas são invadidas e professores ameaçados por não pregar o ideário fascista; índios e grupos de sem-terra são massacrados por policiais, ruralistas e garimpeiros; por último (veja a ilustração), um advogado negro se depara com um cartaz nada sutil colado em frente ao seu escritório há poucos dias.

Jornalismo é um dos temas preferidos desta página. Em 1920, um pequeno jornal de Munique, o  Münchener Post, publicou a seguinte nota:

“Uma espécie de partido, que ainda anda de fraldas e aparenta ter saúde bem fraca, vem aparecendo às vezes em público sob o nome de Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães. Na terça-feira à noite, um senhor chamado Hitler falou sobre o programa desse partido".

O texto ainda informava que o antissemitismo era um dos pilares do novo partido que havia sido fundado um ano antes, com 200 filiados. Ninguém pode acusar Hitler de esconder o jogo: ele já propagava então as ideias que pôs em prática pouco mais de dez anos depois dessa simples e discreta notícia publicada em um jornal que rodava menos de 10 mil exemplares e que a grande mídia da Alemanha não percebeu.

Para saber mais sobre o Münchener Post há um bom livro nas boas casas do ramo, fruto de uma minuciosa pesquisa da jornalista brasileira Silvia Bittencourt: “A Cozinha Venenosa – Um Jornal Contra Hitler”. "Cozinha venenosa" era o apelido que Hitler dava ao pequeno jornal. Dez anos depois, o partido de Hitler tornou-se uma força política, alcançou 4 milhões de adeptos.

Em 1933, Hitler passou a chanceler do Reich. O Münchener Post não resistiu e, pouco depois, foi invadido e destroçado. Bem antes disso, ao difundir o "grande medo"  - a ascensão do comunismo - os nazistas já haviam se tornado influentes em alguns veículos da grande mídia, além de manter seu próprio jornal, o Der Stürmer, que estampava títulos sobre crimes sexuais e financeiros cometidos por judeus e comunistas, denunciava a arte"degenerada", pregava a depuração racial, o controle dos valores da família e das escolas. Com a ascensão de Hitler, muitos jornais foram encampados e a Alemanha passou a ter uma única voz.

O Münchener Post, se ainda existisse, poderia ter dado a manchete que suas linotipos não chegaram a compor:  "Bem que nós avisamos".

A Noite dos Cristais tropical vai ser quando mesmo?

3 comentários:

Prof. Honor disse...

Ainda não é levada a sério a ameaça da direita radical e dos neonazistas brasileiros. Mas é assim que começa, todas as pistas estão aí.Nao vê quem não quer.

J.A.Barros disse...

Me parece que, pelo menos um partido no Brasil, tentou amordaçar a imprensa criando uma nova lei limitando e castrando o jornalismo brasileiro. Por força do senso comum e da consciência que o brasileiro tem da liberdade da imprensa no país, essa lei não foi aprovada e por fim engavetada. Mas isso não quer dizer que esse perigo foi afastado, volta e meia não só esse partido, mas outros se vendo ameaçados por ataques da imprensa a corrupção tentam desengavetar esse processo que limitava o alcance e tirava da imprensa a liberdade de trabalhar e pesquisar a ação dos corruptos neste país.

J.A.Barros disse...

A Alemanha de Hitler acabou com a imprensa livre em todo território germânico.