quarta-feira, 20 de setembro de 2017

Terremoto no México na capa da Fatos em 1985. O mundo era outro? Nem tanto, mestre, nem tanto...




Em setembro de 1985, a capa e a matéria principal da revista Fatos traziam uma catástrofe. O México sofrera no dia 19 o pior terremoto da sua história. Oficialmente, 10 mil pessoas perderam a vida. Mas as equipes de resgate estimaram o número de mortes em cerca de 40 mil. Milhares de corpos jamais foram encontrados.

Na Cidade do México, que tinha então 18 milhões de habitantes, ruíram 420 edifícios de oito a 18 andares, outros 3 mil e 200 foram parcialmente destruídos.

Exatos trinta e dois anos depois, os mexicanos enfrentam mais um terremoto. Não tão devastador - até agora, o número de mortos está em torno de 200 - mas igualmente trágico.

Ao folhear aquela edição da Fatos, fica a impressão de que o Brasil e o mundo se repetem e dão razão a Nietzsche. O filósofo prussiano ensinou que o eterno retorno é uma das afirmações da vida que, em ciclos, sempre liga o fim ao começo.



Na janela de capa da Fatos, está Sarney, então presidente e tão inexpressivo quanto o atual. Como Temer, ontem, Sarney estava na abertura da Assembleia Geral das Nações Unidas, que tal qual hoje dividia com o México as primeiras páginas dos jornais. Como o atual e ilegítimo, Sarney não foi levado a sério, falou algo sobre a dívida externa, tema em evidência, e garantiu que faria um ajuste fiscal e um superávit para pagar 50 bilhões de dólares de juros nos anos seguintes. No mais, abriu o discurso citando um poeta do Maranhão, Bandeira Tribuzzi - na plateia os delegados devem ter feito "hã?", "who" - e mandou goela abaixo um discurso genérico, pleno de literatices, com pérolas como essa: ""O Brasil acaba de sair de uma longa noite. Não tem olhos vermelhos de pesadelo. Traz nos lábios um gesto aberto de confiança e de um canto de amor à liberdade". Puro "marimbondos de fogo".


Kim Jong-un tinha pouco mais de dois anos de idade, a Coreia do Norte nem sonhava com a bomba e Donald Trump nem imaginava que um dia faria um discurso ameaçador na ONU, mas a Assembleia Geral também mostrava preocupação com ameaças à paz. A Fatos narrava o encontro entre o ministro do Exterior soviético Eduard Chervardnadze e o secretário de Estado americano George Schultz para discutir uma tema que preocupava o mundo: o programa militar "Guerra nas Estrelas" com o qual o presidente republicano da vez, Ronald Reagan, ameaçava militarizar o espaço e acelerar a corrida armamentista.

Artur da Távola, um dos colunistas da Fatos, escrevia sobre o Brasil "dividido", outro tema recorrente. "Vai-se fazer necessária um hábil costura política para remover resistências de ambos os lados".  E defendia um "pacto social": "Pacto, porém, que não seja feito à custa de quem mais tem pago, tanto os preços do desenvolvimento quanto os resultados desastrosos da incompetência e da corrupção".







Corrupção? Para quem pensa que o ataque de políticos e empresários aos cofres públicos é novidade, a Fatos dedicava ao assunto três matérias. Uma sobre um esquema de fraude nas compras da Cobal. Além de superfaturamento em aquisições de feijão, os acusados estavam com dificuldade de explicar a compra de 100 mil calcinhas que, teoricamente, não eram produtos revendidos pela Companhia Brasileira de Alimentos. Outra reportagem abordava o caso de um tal réchaud de prata que virou polêmica e por causa disso o Congresso discutia um projeto que previa punição para autoridade que recebesse presentes caros. Outra notícia era a prisão de um banqueiro libanês que tinha muito a delatar sobre um caso de venda de vistos e passaportes brasileiros que envolvia o ex-ministro da Justiça ainda no governo do general João Figueredo, Ibrahim Abi-Ackel.


Uma notícia da semana era o terrorismo. Não se falava em Estado Islâmico nem em "lobo solitário' mas, segundo a Fatos, o terrorismo internacional tinha uma nova sigla: ORMS (Organização Revolucionária dos Muçulmanos Socialistas. Naquela semana, o alvo mais uma vez  foi Roma, que já sofrera cinco atentados em poucos meses. Um solitário palestino de apenas 16 anos, ainda sem a alcunha de "lobo", entrou em uma agência da British Airways acionou uma granada e saiu (terroristas suicidas ainda não estavam em moda). A bomba feriu 15 pessoas.

No mais, a Fatos falava de um arremedo de reforma política que não vingou, tema que o nosso Congresso discute hoje. A proposta de uma Constituinte ganhava força. O Banco Central colocava em circulação a nota de maior valor na época - Cr$100 mil - com a efígie Juscelino Kubitschek. Geddel seria grato ao BC se uma nota desse valor existisse hoje em reais:  ele ia precisar de menos malas para guardar seus 51 milhões. E a guerra em cartaz era a do Irã-Iraque, que fazia aniversário de seis anos. Exatamente, a duração da guerra atual: a da Síria.

Como os dias e as estações, os fatos parecem se repetir. Às vezes como jornalismo, às vezes como farsa.

2 comentários:

Corrêa disse...

Arthur da Távola comentava, como diz aí, o pacto social, em 1985. Hoje, no Brasil mais dividido do que nunca, tão falando em pacto. Isso é impossível, as classes dirigentes, a maioria dos políticos, a maioria dos empresários e o mercado não querem pacto nenhum, isso desde 1500, não querem abrir mão de nada, odeiam distribuição de renda e justiça social. Invejam os países mais desenvolvidos e mas esquecem que eles tem mais justiça e melhor distribuição de riquezas. Não tem pacto com esse filhos da puta. .

J.A.Barros disse...

Concordo com você Corrêa, é isso aí desde 1500. Eles não querem mudar nada, muito menos os políticos no Congresso.