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sexta-feira, 26 de novembro de 2021

Dia da Consciência Negra é todo dia!

Clementina de Jesus, 1978.
Foto Guina Araújo Ramos



por Guina Araújo Ramos 

Todo dia... Em todo dia é necessário que os brasileiros reforcem (ou adquiram) consciência da história e das condições de vida da população negra, a maior do país.

Todo dia é dia de luta contra o racismo, contra a segregação social, contra o preconceito de classe, de cor etc, e ainda contra as várias versões de escravidão de que é vítima a população negra, enfim, todas estas violências que atingem os grupos sociais subalternizados e explorados historicamente pela “elite” colonialista brasileira.

E todo dia é dia de celebrar as grandes figuras negras do Brasil. Hoje, por exemplo, uma das nossas maiores vozes: Clementina de Jesus!

É evidente que, dada a desproporção da presença das pessoas negras nos espaços de prestígio e poder da sociedade brasileira, até que não me surpreendi ao perceber que, na minha carreira de fotojornalista, fotografei muito menos negros...

E isto pode ser demonstrado em rápido balanço dos Bonecos da História que publiquei até agora: a presença de pessoas negras não chega a 25%... Pouco, não por escolha minha, mas por indicação profissional alheia, uma evidência do racismo estrutural vigente, porém todos da maior qualidade!

São eles (nas respectivas postagens): Carmen Costa, Lula, D. Ivone Lara, Marielle Franco, Beto Sem Braço e Aluísio Machado, Jorge Ben Jor, Aracy de Almeida, Júnior, Zezé Mota, Caetano Veloso (com Betânia e Gal), Luisinho do America, Jackson do Pandeiro, "Boca de Anjo", Carlinhos Pandeiro de Ouro, Tia Doca da Portela, Cartola, Apoena Meirelles (e Zé Bel), Milton Nascimento, Alcione, Conceição Evaristo, Baden Powell, Paulinho da Viola, Agnaldo Timóteo, Gilberto Gil e Monarco, se deixei de citar alguém...

E, não por acaso, são também negros os protagonistas da série "Foto Monumento": Trabalhador Desvalorizado, Trabalhador Semiescravizado e Torcedor Desanimado.

Clementina de Jesus, 1978. Foto Guina Araújo Ramos

Creio que só fotografei Clementina de Jesus uma única vez, e é uma pena, para a revista Manchete (ou Amiga?), em um show, e já não sei mais qual... E daí são apenas duas as imagens de Clementina de Jesus as que tenho para apresentar n’[Os] Bonecos da [minha] História [no Fotojornalismo]. Outras fotos, aí só mesmo se alguém conseguir descobrir o paradeiro do sumido arquivo fotográfico da Bloch Editores...

Pena que eu não tenha mais do que estas duas fotos, dois “slides” (diapositivos, transparências...), um deles, aliás, muito ruim de foco... 

Lamento, mas as fotografias, além da perda de detalhes do próprio escaneamento, pela ação do tempo (as fotos são de 1978), estão cobertas de manchas, com tendência ao lilás.Uma escassez que me obrigou a considerável esforço de recuperação digital da imagem principal, o que, infelizmente, nunca dá resultado perfeito... Para que se tenha noção, deixei a foto sem foco na condição atual.É pena, mas, no que nos traz Clementina, vale a pena!

https://bonecosepretinhas.blogspot.com.br/


domingo, 18 de abril de 2021

Fotomemória da redação - Félix, o papel do goleiro do Fluminense

por Guina Araújo Ramos (do blog Bonecos da História)

Continuando a modesta série de jogadores que fotografei durante treinos de time de futebol – que não são muitos, não me preocupei em guardar este tipo de material, que o grau de informalidade era muito grande, sem uniformes oficiais etc –, trago um registro feito no estádio do Fluminense, no bairro das Laranjeiras. 

Trata-se do goleiro Félix, apelidado de Papel (pela magreza), campeão mundial em 1970. Só que, à época, não mais atuando como goleiro profissional, mas na função de treinador de goleiros do Fluminense.

Félix no Fluminense - Rio, 1979. Foto Guina Araújo Ramos

Após longa carreira na Portuguesa de Desportos, Félix foi contratado em 1968 pelo Fluminense, e daí convocado para a seleção que disputou (e ganhou) a Copa do Mundo de 1970. Apesar de muita vezes criticado, Félix viveu, no correr da década, a melhor fase da sua carreira, como participante da “Máquina Tricolor” que ganhou cinco campeonatos cariocas e o brasileiro de 1970.

Voltando para São Paulo, Félix continuou próximo ao futebol, dirigindo alguns times e coordenando escolinhas. Faleceu em agosto de 2012, em São Paulo.

A matéria é do meu tempo de colaborador eventual da Manchete Esportiva (que fotografar esporte não era o meu forte...), acredito que de 1979, só não tenho como pesquisar.

Félix no treino, Rio,. 1979. Foto de Guina Araújo Ramos

Certamente era daquelas matérias que fazem um balanço da situação do jogador, agora uma pessoa “normal”. Mostrava que Félix se mantinha no futebol, agora deslocado para a função de treinar outros goleiros. Embora seja uma atividade que tinha tudo a ver com a sua experiência, não creio que a cumprisse com tanto prazer assim, e creio que é o que as fotos parecem demonstrar.

Importante mesmo é relembrar o goleiro Félix, grande profissional que, acima de tudo, e com fundamental atuação, fez parte da equipe mais admirada do futebol brasileiro, o do tricampeonato, na Copa de 1970, no México.

Deste grande feito fui mero telespectador... Passo então a bola ao coleguinha José Esmeraldo Gonçalves, que resumiu muito bem a trajetória de Félix em texto no “Blog que virou Manchete”, ilustrado pela “Edição Histórica da Manchete - Copa 70 - A Glória do Tri”, com fotos de Jáder Neves e Orlando Abrunhosa, e texto de Ney Bianchi.

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sábado, 18 de abril de 2020

Fotomemória da redação: Ivan Locci e os perigos que ressurgem. Por Guina Araújo Ramos

por Guina Araújo Ramos (do blog Bonecos da História

São tempos espantosos, estes, os da pandemia do novo Coronavírus, os da COVID-19. O certo é que nossa geração, em termo mundiais, simplesmente não viveu nada parecido.

O perigo é, objetivamente, mortal, posto que não há cura e nem vacina. Resta-nos apenas uma defesa parcial, uma quarentena indefinida, que teria um prazo final, mas é continuamente estendida enquanto a quantidade de vítimas cresce.

Ao perigo maior, o da contaminação com o vírus, vão se acrescentando outros, que vão de uma possível obesidade, forçada pela angústia que a imobilidade provoca, até os riscos dos acidentes caseiros, incluindo, aliás, as dificuldades de convivência entre parentes que nunca conviveram tanto... Riscos de acidentes que se exacerbaram até mesmo pela falta de prática de muitos no uso dos recursos que têm em suas próprias casas. Ainda bem que uma crise tão profunda trouxe à tona um impressionante movimento de solidariedade coletiva.

Ivan Locci - Rio de Janeiro, 1984 - Foto Guina Araújo Ramos

Daí, me lembrei da criança que, vítima de um desses acidentes caseiros, recebeu, no correr dos anos 1980, um apoio fundamental para a sua recuperação (e integração na sociedade), apesar dos traumas que sofreu: o italiano Ivan Locci, que continua grato ao Brasil.

À época, este era um acidente até corriqueiro: um jato de álcool lançado ao fogo, a partir de uma garrrafa plástica, que retornava ao corpo da pessoa e fazia nele um incêndio particular. As crianças eram as vítimas mais frequentes, a ponto de o álcool líquido ter sido substituído no comércio pelo álcool em gel. Muitos adultos, nos churrascos e nas fogueiras juninas, também sofreram destes males, ou foram responsabilizados pelos sofrimentos de seus filhos (e foi, aliás, o caso do pai de Ivan Locci).
Agora, como recurso na defesa contra a pandemia, o álcool 70° está de volta às lojas, e às casas, e seus riscos também. Diante do caos da saúde pública (que já existia, mas está sendo levada ao absurdo), dificilmente quem se queimar no uso do álcool terá tratamento de qualidade. Nem, muito menos, o tratamento especialíssimo que o garoto Ivan Locci teve, o de ser operado pelo mais importante cirurgião plástico brasileiro (talvez do mundo, à época), o médico, professor e até membro da Academia Brasileira de Letras, o Dr. Ivo Pitanguy.

Ivan Locci - Rio de Janeiro, 1984 - Foto Guina Araújo Ramos

Fotografei o menino Ivan Locci, para o Jornal do Brasil, no anos de 1984, em um pequeno hotel do bairro do Flamengo, durante um dos seus vários retornos ao Rio de Janeiro, para revisão das cirurgias que vinha fazendo desde 1981, as quais recuperaram minimamente as feições do seu rosto.
Fiquei feliz de encontrar agora, revendo o assunto em pesquisa na Internet, algumas imagens recentes de Ivan Locci, de um evento do ano de 2017, em Gênova, na sua Itália natal.

Fico feliz também por recuperar a figura de Ivo Pitanguy, com quem tenho a alegria adicional de dividir a data de nascimento, 5 de Julho, a quem também fotografei, em sua famosa clínica da Rua D. Mariana, mas lamento não ter em mãos estas fotos (creio que para Fatos & Fotos, por conta de alguma celebridade que ele “retocara”, como Marisa Berenson). E nem saber mais como encontrá-las.

quinta-feira, 2 de maio de 2019

Beth Carvalho (1946-2019) - O povo na voz e na imagem - Por Guina Ramos

Beth Carvalho, 1979. Foto de Guina Ramos

Beth Carvalho, 1979. Foto de Guina Ramos

Apenas uma vez as nossas trajetórias se cruzaram, em uma entrevista realizada em sua casa (e não me lembro mais onde), principalmente porque, embora acompanhando a sua carreira pelas mídias, poucas vezes cobri (e muito pouco circulei por) rodas de samba.

Mas, agora, neste 1º de Maio, entre tantos outros motivos de sofrimento para o povo brasileiro, com a tristeza generalizada da perda de uma das figuras mais queridas da Música Popular Brasileira (ou, mais precisamente, do samba carioca), busco, emocionado, este reencontro com Beth Carvalho.

 Estas fotos (slides, 35mm) são de 1979, dos meus tempos de Bloch Editores, o que explica o estado de suas cores, o tom geral tendendo para o amarelo, e com tantas invasões de magenta e pontos pretos, embora boa parte deles eu tenha retirado com o Photoshop...

Estas fotos devem ter sido feitas, muito provavelmente, para publicação na Manchete, ainda que nada impedisse de serem repassadas à revistas Amiga ou Sétimo Céu, que também publicavam fotos coloridas. Ou que tenha acontecido algum dos possíveis vice-versas... Restaram comigo estas duas, e não tenho mais qualquer noção das condições nem dos motivos desta seção de fotos.

É curioso que sejam dois “closes” tão assemelhados, mas o estilo pode ser resultado de uma demanda da redação, pois muitas vezes os editores, especialmente em revistas, instruíam o fotógrafo sobre qual tipo de imagens pretendiam para a matéria.

Este é apenas um registro pessoal, como tantos colegas o fizeram (e em geral com mais qualidade), mas desde já com grande sentimento de saudade. As fotos relembram, para mim (e espero que para todos), não só a beleza e a simpatia da cantora, também seu intuitivo charme como modelo fotográfico.

Afinal, o que importa mesmo é a emocionante trajetória de Beth Carvalho, a sua firmeza no apoio aos artistas do povo, de quem era "madrinha", a sua defesa das causas dos mais necessitados na sociedade brasileira.

E, muito mais do que através das minhas fotos, é com esta presença que Beth Carvalho ficará na lembrança do povo brasileiro.

(por Guina Ramos, do blog Bonecos da História)

quarta-feira, 17 de abril de 2019

Fotomemória - Serão as elites comunistas? O que Luiz Carlos Prestes diria sobre isso? Por Guina Araújo Ramos

Rio, 1980: Sozinho, Prestes deixa a sede da Polícia Federal após depoimento. Ele embarca em um Fusquinha, o táxi da época. A simplicidade da imagem contrasta com o séquito, as caravanas, os jatinhos e o exibicionismo policial em torno do depoentes atuais. Foto de Guina Araújo Ramos

por Guina Araújo Ramos (do blog Bonecos da História) 

Em vídeo que viralizou na Internet, o atual Ministro da Educação, Abraham Weintraub, surpreendeu todo o Brasil com uma declaração bombástica: ”Os comunistas estão no topo do país. Eles são o topo das organizações financeiras; eles são os donos dos jornais; eles são os donos das grandes empresas; eles são os donos dos monopólios".

Realmente, para alguém que tenha vivido (ou se informado sobre) as últimas décadas da História do Brasil, parece difícil perceber alguma verdade nesta afirmação. Logo me lembrei de histórica personagem do movimento comunista no Brasil, que batalhou por múltiplas causas políticas no correr de praticamente todo o século XX, e fiquei tentando (mas não fui capaz de) imaginar o que Luiz Carlos Prestes diria disso...

Tentando entender o momento atual, acabo de encarar a maratona de leitura da sombria trilogia “Os Subterrâneos da Liberdade”, romance memorialista de Jorge Amado, formada pelos livros “Os ásperos tempos”, “Agonia da noite” e “A luz no túnel” (e nem este título alivia o terror que foram aqueles tempos). O autor faz um balanço da ditadura do Estado Novo e descreve a situação desesperadora dos militantes comunistas, perseguidos e torturados pelas forças policiais, ao mesmo tempo que explorados como força de trabalho pelos grandes proprietários, em indústrias e latifúndios. Ao fundo das cenas, além de Getúlio Vargas, se equilibrando entre fascistas alemães (e seus apoiadores integralistas) e imperialistas americanos (e seus sócios da burguesia local), estava todo o tempo a figura de Prestes, o mais importante preso político da época.

Com o fim do Estado Novo, Prestes foi anistiado em 1945, eleito senador pelo Rio e deputado constituinte (assim como o próprio Jorge Amado), vivendo um momento de liberdade que durou apenas até a “redemocratização” do país cassar tanto o partido quanto seus parlamentares...
Mais uma vez perseguido pela ditadura de 1964, Prestes manteve-se na clandestinidade até 1971, conseguindo então sair do país, para se exilar na antiga URSS.

Rio, 1979. Prestes volta do exílio e desembarca no Galeão. O líder comunista fala à multidão,
que reunia delegações de vários estados. Foto de Guina Araújo Ramos.

Prestes acena e agradece a recepção. Foto de Guina Araújo Ramos. 

Apenas no retorno do exílio, em 1979, tive oportunidade, é lógico, de fotografá-lo. E logo desde a chegada, ainda no aeroporto do Galeão (o hoje Tom Jobim), como parte de uma série de coberturas de retornos de exilados (incluindo Fernando Gabeira e Miguel Arraes) para as revistas da Bloch Editores, fotografando para a Manchete, sempre a cores, ou para Fatos & Fotos, em preto-e-branco.
A chegada de Prestes foi das mais concorridas, uma verdadeira multidão encheu o saguão do desembarque e se espalhou pela pista de acesso ao aeroporto, uma verdadeira aclamação.

A partir de 1980, agora pelo Jornal do Brasil, fazendo dupla com o repórter Carlos Peixoto, voltei a registrar os passos de Luiz Carlos Prestes. A princípio, acompanhando a maratona de intimações que sofreu uma delas em outubro, obrigado a comparecer à Polícia Federal, para prestar depoimentos em diversos processos, ainda dentro do quadro da ditadura de 1964. Ficou evidente que mantinha a postura altaneira, muito bem demonstrada na chegada do exílio, mas apresentou também, talvez por fidelidade às suas causas, grande simplicidade.Basta ver que, depois de horas de depoimento, e de ser acossado pelos jornalistas por longos minutos à saída, simplesmente deu alguns passos para um pouco mais distante da Polícia Federal do Rio de Janeiro, em direção à Praça Mauá, fez sinal para um táxi e lá foi ele embora em um fusquinha...

Na sequência da década de 1980, no correr dos eventos políticos em torno do governo João Figueiredo, que levaram ao fim da ditadura, Prestes volta à luta política, agora na legalidade. E resolveu apoiar, ainda que com ressalvas, a candidatura de Leonel Brizola ao cargo de governador do estado do Rio de Janeiro. Nesta campanha, fotografei Luiz Carlos Prestes em contato direto com os operários, a categoria central da classe social cujas causas, na condição de comunista declarado, sempre defendeu. Protegido por um boné em que se lia “Brizola na cabeça”, Prestes falou aos funcionários de estaleiros navais da Ponta d’Areia, bairro operário de Niterói. Apesar do apoio a Brizola na campanha de 1982, Prestes não se integrou ao seu governo, mantendo sempre postura crítica, com presença constante nas manifestações pela mudança do regime ditatorial. Foi já no governo Sarney, em 1986, que o fotografei pela última vez (em um frila para não sei mais que revista), em um evento na ABI, à frente de uma faixa que falava, muito justamente, algo como “o povo não vai pagar esta dívida”... 

Trazendo toda esta trajetória de vida política para este preocupante momento atual, quando novas formas de autoritarismo afloram e, como se percebe das falas de ministros e de outros políticos, há uma tentativa de fazer com que tanto conceitos como a própria História do Brasil sejam forçadamente reescritos, volto, um tanto espantado, à pergunta inicial: como Luiz Carlos Prestes, em outros tempos o Cavalheiro da Esperança, hoje em dia, se estivesse entre nós, ele que deixou como herança toda uma vida de luta contra as poderosas, bem como destruidoras, elites brasileiras, encararia estas inesperadas afirmações?

Afinal, as elites brasileiras (financeiras, midiáticas, empresariais, monopolísticas) são (ou serão) comunistas?

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quinta-feira, 7 de março de 2019

Fotomemória do carnaval - Fantasias recuperadas da Nikon de Guina Araújo Ramos

Evandro de Castro Lima - Hotel Glória, Rio, 1985. Foto de Guina Araújo Ramos


Mauro Rosas, Sambódromo Rio, 1984 - Foto de Guina Araújo Ramos 


Clóvis Bornay (à direita), Hotel Glória, Rio, 1985 - Foto de Guina Araújo Ramos

por Guina Ramos (do blog Bonecos da História) 

Apenas uma vez, vivi a emoção de fotografar o maior (na época) concurso de fantasias do Brasil, o do baile do Hotel Glória, no Rio de Janeiro, e isto aconteceu na Terça-feira Gorda do Carnaval de 1985, naturalmente quando ainda não haviam destruído o Hotel Glória...

Marlene Paiva, Hotel Glória, Rio, 1985 - Foto de Guina Araújo Ramos

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Wilza Carla, Hotel Glória, Rio, 1985 - Foto de Guina Araújo Ramos
Tive esta preciosa oportunidade quando trabalhava no Jornal do Brasil. Pela primeira (e única) vez, lá estava eu, cercado pelas fantasias de campeões de muitos carnavais: o hors concours Clóvis Bornay, Mauro Rosas, Marlene Paiva, Wilza Carla etc...

Uma grande emoção, mas maior seria se eu soubesse que estava fotografando o último desfile de Evandro de Castro Lima, uma perda irreparável para esta arte, que ele morreu poucos dias depois, dia 24/02, o domingo seguinte ao Carnaval de 1985.

Cobri o Carnaval do Rio a partir de 1977, ao entrar para a Bloch, de início o Carnaval de rua, mas logo também os desfiles das Escolas de Samba. E simplesmente porque mandavam para a Avenida praticamente todos os fotógrafos, inclusive os iniciantes, ao menos uns 15: o Carnaval era o carro-chefe da Manchete, e a cobertura era total!

Em compensação, tenho esta foto dele no Sambódromo (quase certo de que é de 1984), dando entrevistas antes do desfile, ao, corajosamente (depois da queda de 1980), repetir o ato de desfilar sobre um precário carro alegórico. Mas a tarefa de fotografar desfiles de fantasia, que ocupavam incontáveis páginas duplas na Manchete (e em outras revistas do grupo), ah, este era trabalho exclusivo para um seleto grupo de fotógrafos.

Apenas os mais experientes no uso das câmeras de formato 6x6cm, das Rolley Flex às Hasselblad, ou, em suma, os que tinham tanto muita experiência no fotojornalismo quanto a autoridade, entre os carnavalescos, para, por exemplo, parar tudo e colocar aqueles sensíveis e vaidosos artistas postados lado a lado à sua, à nossa, frente. Eu, que estava ali para fazer apenas um registro quase ocasional, para um jornal diário, e realmente não tinha esta preocupação: usava a minha Nikon 35mm, que me dava mais agilidade jornalística, mas, mesmo com as luzes da televisão, não dispensava o flash... O que não significa que não tenha me aproveitado (assim como vários dos “coleguinhas” de jornal) da iniciativa deles, e isso bem que pode ser percebido em alguma dessas fotos.Entram aqui, então, algumas das que pude preservar, com muitos dos grandes concorrentes da noite. Nem todos, infelizmente, identificáveis por mim, nem ali na hora (que esta não era tarefa de quem escrevia o texto, mas só eles ou elas conseguiam saber tudo sobre os artistas) e muito menos agora.

Até porque, pelo que vejo numa rápida pesquisa, há muito pouco desses registros nas aceleradas páginas da Internet.

Vale a intenção.E fica a lembrança.

Aqui, nos Bonecos da História, o melhor registro possível daquele desfile.

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sexta-feira, 8 de fevereiro de 2019

Fotomemória: Boca de Anjo no palco do povo...

por Guina Araújo Ramos (do blog Bonecos da História

A série "Bonecos da [minha] História [no Fotojornalismo]" recupera uma figura que foi bastante conhecida, em especial dos fotógrafos, nas praças e nas feiras mais populares no Rio de Janeiro na década de 1970, um pouco menos, um pouco mais.

Foi o povão que lhe deu o nome artístico: Boca de Anjo.

Boca de Anjo - Rio, 1976 - Foto Guina Araújo Ramos

A espetaculosa figura me reapareceu há poucos dias no Facebook, numa postagem do perfil de Ricardo Beliel, colega que conheço desde os tempos em que me iniciei como fotojornalista nas revistas da Bloch Editores, em 1977, quando nos classificamos para o Curso Bloch de Fotografia, um dos caminhos mais valorizados, na época, para entrar na profissão (neste ano, por exemplo, foram mais de 800 candidatos para 30 vagas).

Na postagem, Ricardo Beliel, com uma foto de 1973 (uma entre tantas de alta qualidade que compõem o seu acervo), identifica o artista de rua como Boca de Anjo, apelido que é confirmado por outros colegas. Eu até já me esquecera disso, mas relembrei ter ouvido o nome à época. Agora, no entanto, gastei bastante tempo na Internet, mas não consegui qualquer outra referência a ele, e muito menos cheguei à sua verdadeira identidade.

Eu o fotografei em 1976, ele e os seus malabares de (quase sempre) fogo, numa roda de encantados espectadores, num domingo qualquer de sol, nas proximidades da antiga feira nordestina do Campo de São Cristóvão, junto à obra de um acesso à Linha Vermelha (as barras de aço ao fundo), em frente ao Colégio Pedro II, numa área geralmente vazia da grande praça do Campo, perto do início da Rua São Luiz Gonzaga, aquela que sai dali e bem que vai para Benfica...

Na época, fui algumas vezes à feira, como exercício fotográfico para os seguidos cursos que fiz no Senac da Rua Mal. Floriano, mas também por iniciativa própria (e com amigos), que era a grande, única do tipo, feira popular do Rio de Janeiro. A feira de São Cristóvão, a original, era montada, nos domingos de manhã, em torno do elegante pavilhão de exposições, desde a época da sua construção, no final dos anos 1950. Depois de várias ameaças de proibição, acabou oficializada nos anos 1990 e transferida, na década seguinte, devidamente “reciclada”, para o interior do pavilhão.

Não apenas nós dois fotografamos Boca de Anjo... Imediatamente, colegas da época (como Januário Garcia, Marco Antonio Cavalcanti, Rogério Marques, Custódio Coimbra) se manifestaram, pois o conheciam, tanto dali quanto do Largo da Carioca. E sempre fazendo a mesma performance, vestido com um “roupão” típico de palhaços, controlando os malabares de fogo e, ao mesmo tempo, se balançando sobre uma pequena tábua enlouquecida sobre um rolete de madeira. Nisso, comparado a tantos outros artistas de rua, e apesar da dificuldade da arte, talvez até nem se destacasse tanto...
O que realmente atraía o público era uma mistura de muito bom humor nas falas, enquanto se mantinha no limite do equilíbrio, e a exorbitância de exageradas caretas, que fazia destacando os olhos e os dentes (ou a falta de muitos deles), o seu principal recurso cênico. É certamente em relação a este ponto, e de muita ironia (popular também), que lhe adveio o apelido...

Pois, agora, mais de 40 anos passados, me vem à mente uma preocupação (ou melhor, uma "pós-ocupação"...): como terá sido o final da vida (que suponho já tenha ocorrido) do Boca de Anjo?

Aliás, quem realmente era Boca de Anjo? De onde viera? Do que ele vivia? Apenas dos espetáculos improvisados (mas bem treinados) na rua ou de algum outro trabalho? Tinha uma profissão, digamos, “normal”? e conseguiu se aposentar? Teve uma velhice minimamente confortável? Quantos anos teria na época dessa foto, quantos anos viveu?

E não consigo deixar de extrapolar para os tempos atuais... E as tantas pessoas, cada vez mais, que vivem, que continuam vivendo, no Brasil, como artistas de rua? Como elas conseguem viver? E, afinal, qual será o futuro delas?

quarta-feira, 2 de janeiro de 2019

Fotomemória: D. Nylza, a mãe aos 100 anos. Por Guina Araújo Ramos

por Guina Araújo Ramos (do blog Bonecos da História

Queiram perdoar os possíveis leitores aqui chegados, mas gostaria de esclarecer que, na verdade, o pomposo título “Os Bonecos da História” encobre (não muito, que também está no cabeçalho do blog...) a minha intenção de publicar “os bonecos da minha história no fotojornalismo”, com a devida ressalva de que o conceito de “fotojornalismo” significa, aqui, um qualquer registro fotográfico que eu tenha feito por aí...

Daí que, ainda que pública, a postagem do momento é muito particular, é pessoal mesmo. A figura retratada e relembrada aqui é ninguém mais ninguém menos do que minha mãe, a (pelo menos no meio da parentada) famosa D. Nylza.

O motivo está antevisto no título: D. Nylza completaria hoje (ontem), 1º. de Janeiro de 2019, exatos 100 anos da vida. Não chegou lá, mas viveu até 15 dias antes dos seus 99 anos, sempre com a lucidez e o bom humor que aliviava as dificuldades da nossa vida.


D. Nylza, 1977, foto de Guina Araújo Ramos. "Foi feita por volta de 1977,
eu já profissional, trabalhando na Bloch Editores, num dia qualquer em que voltei à última casa
em que morei com ela e com meu pai. Entrando pelos fundos do apartamento térreo, em Olaria,
subúrbios da Zona da Leopoldina, Rio de Janeiro,
eis que a surpreendi no comando do fogão".

D. Nylza (e era assim que todos a chamavam, inclusive todos os filhos, às vezes meio ironicamente) nasceu na fazenda Cataguá, no vale do Rio Paraíba do Sul. Era filha de um cearense que, com três irmãos, tentou recriar os bons tempos dos grandes lucros do café e de uma orgulhosa filha das elites locais, então já não tão mais poderosas. A empreitada não deu certo e Seu Miguel e D. Hermínia mudaram-se, com os seis filhos, para Areal, na época ainda distrito do município de Três Rios. 

Oscar e Nilza nas Bodas de Ouro. Foto de Guina Araújo Ramos, 1985

Com apenas 16 anos, casou com Seu Oscar (ele, aos 27), seu companheiro de toda a vida, ela sempre a dona da casa, criando os seis filhos, ele sempre na estrada, com caminhão, lotação ou ônibus, na autonomia ou não, conforme a época.

Em 1948, a família se muda para Duque de Caxias, com meu pai trabalhando no transporte de areia para a construção do Maracanã. Daí que, em 1950, em plena Copa do Mundo, eu nasci no Rio de Janeiro, no Hospital do IAPETEC, hoje Federal de Bonsucesso.

A família morou em alguns bairros da Zona da Leopoldina, de Cordovil a Olaria, até que os dois, agora sós, voltaram a Areal, no princípio dos anos 1980. Lá, D. Nylza ficou viúva, em 1988, e de lá veio para sua temporada final, nos últimos quinze anos, com filho e netos, em Caxias.

Entre tantas fotos que fiz de D. Nylza, qual eu deveria escolher para a abertura desta postagem?...
Pensei até em capturar uma imagem no vídeo da visita de D. Nylza ao Pão de Açúcar, este evento que significou o cumprimento de uma velha dívida familiar. Afinal, descobri qual seria a foto: justamente aquela que ela própria havia escolhido!... Foi feita por volta de 1977, eu já profissional, trabalhando na Bloch Editores, num dia qualquer em que voltei à última casa em que morei com ela e com meu pai. Entrando pelos fundos do apartamento térreo, em Olaria, subúrbios da Zona da Leopoldina, Rio de Janeiro, eis que a surpreendi no comando do fogão. No susto, para ela, faço a foto! Sua expressão, mais de satisfação do que de espanto, até hoje me alegra. Desde que lhe entreguei uma cópia, há mais de 40 anos (tantos que as cores até se perderam), nunca mais deixei de ver esta foto, "o susto de D. Nylza", em uma parede sempre nobre de qualquer das casas em que morou.

D. Nylza homenageada. Foto de Guina Araújo Ramos, 2015. 
Das tantas outras, destaco esta, que transformei em cartaz.

É que nos últimos anos, a partir de algum impreciso momento, passei a considerá-la, em alguns contextos e de maneira certamente simbólica, e particularmente como forma de reconhecimento à sua luta pessoal, uma espécie (simpática, acho eu) de representante do próprio povo brasileiro.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2018

Fotomemória: O retorno do guerreiro que a História tornou Herói da Pátria

Aeroporto do Galeão, Rio, 10 de setembro de 1979: a revogação do AI-5, em dezembro de 1978,
abriu caminho para a volta dos exilados. Entre eles, Miguel Arraes, que fez seu primeiro discurso
cercado pela imprensa e apoiadores. Foto de Guina Ramos. 

Miguel Arraes. Foto de Guina Ramos

por Guina Ramos (do blog Bonecos da História)

Esta semana, mais uma vez, misturaram-se, em comemorações, os conflitantes sentidos da História do Brasil.

Hoje (ontem), em especial, é uma data de chumbo... É a “comemoração” dos 50 anos de decretação do AI-5, o mais pesado dos Atos Institucionais da ditadura civil-militar do Golpe de 1964. O governo, ao pretender calar por completo a oposição ao regime, através da ampla prisão de opositores e fechamento do Congresso Nacional, acirrou a luta pelo retorno da democracia, que atravessara o ano com manifestações de rua e atos de contestação, instigando a reação armada de grupos políticos na clandestinidade, firmemente combatidos por ações repressivas, incluindo torturas e mortes. Eis que, agora, com apoio de importantes setores da sociedade, a eleita "nova" classe política brasileira quer um retrocesso de 50 anos, o retorno àquela situação asfixiante que o país vivia...

Ontem, por outro lado, um dos grandes perseguidos daquela ditadura, preso nos primeiros momentos do golpe de 1964, o então governador do estado de Pernambuco, Miguel Arraes (que, aliás, faria 102 anos neste 15/12/2018), teve o seu nome gravado no livro de aço dos Heróis e Heroínas da Pátria, junto a mais 20 personalidades e políticos do país (inclusive, neste Bonecos da História, o ex-governador Leonel Brizola).

Fotografei o ex-governador de Pernambuco apenas uma única vez, para a revista Manchete, quando do seu retorno do exílio na Argélia, em seu desembarque no aeroporto do Galeão (hoje, Tom Jobim), em 10 de Setembro de 1979, no correr de uma sequência de retornos de políticos brasileiros ao país.

Miguel Arraes, cercado pela imprensa e por apoiadores, fez o seu primeiro discurso de retorno do exílio no próprio saguão do aeroporto do Galeão, envolvido por centenas de pessoas que se mantiveram sentadas no chão para ouvi-lo.

Restaram-me do momento apenas estas duas fotos, uma delas sofridamente escaneada...

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quinta-feira, 25 de outubro de 2018

Fotografia - Dos arquivos do fotojornalista Guina Araújo Ramos - Figueiredo, o último ditador?

Figueiredo dando pulinho. Gávea Pequena, Rio, 1983. Foto de Guina Araújo Ramos

Figueiredo ao sair do governo - Rio, 1985 - Foto Guina Araújo Ramos

por Guina Araújo Ramos (do blog Bonecos da História)

Em plena campanha presidencial de 2018, a discussão sobre os candidatos (não “entre”, que Jair Bolsonaro se recusa a participar de debates) tem mudado dos tradicionais “programas de governo” para conflitos mais radicais: Barbárie x Civilização e/ou Democracia x Ditadura.

Barbárie x Civilização, quanto ao Brasil, pode até parecer retórico, “apenas” um reflexo do terrorismo, das guerras, das ondas de refugiados, dramas que dilaceram a África, a Europa e o Oriente Médio.

Já o dilema Democracia x Ditadura, que tem raízes profundas no solo brasileiro, tornou-se tema recorrente. O motivo é mais do que sabido: o candidato Jair Bolsonaro, do PSL, os seus filhos também parlamentares, o candidato a vice-presidente, Gal. Mourão, e vários de seus correligionários, todos eles se referiram recentemente à intenção explícita de interferir no Judiciário, de desrespeitar direitos de minorias, de ameaçar os opositores de prisão ou exílio.

A defesa da tortura e a proposta de uma nova ditadura militar no Brasil, supostamente sem corrupção, aparecem em diversas falas do presidenciável. Jair Bolsonaro, sustenta seu adversário, Fernando Haddad, do PT, é uma ameaça à democracia, que também está sendo ameaçada por fake news.

Tudo isto me trouxe à mente um sisudo e autoritário Presidente da República que fotografei muito, um dito ditador, apontado até como mandante de torturas, e a pergunta: terá sido (ou será) João Figueiredo o último ditador do Brasil?...

Ao menos, sabe-se que João Figueiredo foi o último militar presidente do Brasil de uma série de presidentes militares instalados no Palácio do Planalto com o evento auto-batizado de Revolução de 1964.

O mesmo que mais tarde foi renomeado (por historiadores) para Golpe Civil-militar de 1964 (com sua consequente Ditadura, exacerbada pelo AI-5, de Dezembro de 1968) e, há pouco, “reinventado” pelo ministro Dias Toffoli, presidente do Supremo Tribunal Federal, através do singelo epíteto de Movimento de 1964.

Desde o início de seu mandato (Março de 1979), acompanhei algumas visitas de Figueiredo ao Rio, especialmente para a Fatos & Fotos, da Bloch Editores.

A partir de Junho de 1980, ao passar para o Jornal do Brasil, Figueiredo virou figurinha repetida nas minhas pautas... Como exemplo, os vários registros do seu desembarque, e comitiva, no setor militar do aeroporto do Galeão.

Numa solenidade tradicional, todo ano realizada na Praia Vermelha, na Urca, no Rio, registrei Figueiredo entre vários dos seus mais ministros, mais o governador Chagas Freitas e o cardeal Eugênio Câmara, no palanque das comemorações militares da assim chamada Intentona Comunista de 1935. 

A foto é sugestiva pelo detalhe de que peguei um gesto seu que pode ser remetido a uma das suas mais sugestivas frases: “Prefiro cheiro de cavalo do que cheiro de povo.”.
Sinceridade, aliás, não lhe faltava. Tanto é que deixou muitas outras frases marcantes, em entre elas um autoelogio, bem ao estilo ditatorial: “Me envaideço de ser grosso!”...

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terça-feira, 4 de setembro de 2018

Armando Rozário, do outro lado do mundo

Bar Garota de Ipanema, 1983. "Em 1983, quando trabalhava para o Jornal do Brasil, passando, no carro de reportagem,
pelo famoso bar Garota de Ipanema, vejo Armando Rozário sentado solitariamente em uma mesa, ao fundo. De dentro do carro, com uma zoom 80-200mm, consegui fazer, por mero divertimento, esta foto do já então famoso colega jornalista".(Foto Guina Araújo Ramos)

por Guina Ramos ( do blog Bonecos da História)

Entre tantas outras grandes perdas que o Brasil vem sofrendo, uma atinge especialmente a Fotografia brasileira (aliás, a mundial): faleceu neste domingo, 02/09, aos 86 anos, o fotógrafo Armando Rozário.

Nascido em Hong Kong (mas, oriundo da vizinha Macau, colônia portuguesa ao sul da China), Armando Rozário veio para o Brasil na década de 1950 e se tornou figura histórica do nosso fotojornalismo. Sua trajetória profissional mostra a intensa luta por direitos e por justiça. Muito especialmente para nós, fotógrafos, seu pioneirismo na defesa de direitos autorais foi um marco para o reconhecimento de crédito de autoria nas fotos publicadas e pela garantia de direitos trabalhistas em geral.

Muito além da profissional, a sua trajetória de vida foi realmente uma grande aventura. Só ficou um pouco mais calmo nos últimos anos, já aposentado, mas ainda virtualmente ativo, a partir de sua casa na praia junto à foz do rio São João, entre Cabo Frio e Macaé.

O jornalista Luiz Peazê, no blog do lançamento de seu livro “Cronico – uma aventura diária – Nas Esquinas do Rio”, fez um sucinto, mas preciso resumo de sua vida: “Armando, para quem não sabe, é fotojornalista e nasceu em Hong Kong (1931). Trouxe da China para o Brasil, em meados da década de 1950, o método de desenvolvimento de fotojornalismo; antes disso, havia sido correspondente em Hong Kong e Macau, para a European Picture Service; Armando havia fotografado o início da revolução de Mao Tse Tung; fotografou Louis Armstrong quando este monstro do jazz decolava na carreira; fotografou a mãe do Presidente Juscelino Kubitscheck e com esta foto ganhou na justiça direitos autorais contra a Revista Manchete, criando jurisprudência na matéria; foi fundador da Banda de Ipanema; Armando tem um curriculum que não caberia aqui e, de tantas histórias interessantes a que gosto mais é a de que, em 1978, Carlos Drummond de Andrade e Otto Lara Rezende comentaram a galhardia de um jovem ecologista, fotojornalista, em crônicas no Jornal do Brasil, e o jovem era Armando Rozário.”

Pessoalmente, convivi pouco com Armando Rozário, de uma geração bem anterior à minha, mas fui colega, no Jornal do Brasil dos anos 1980, de seu filho Frederico Rozário, hoje um internacional fotógrafo especializado em surfe. E, afinal, tenho uma única foto de Armando Rozário, um tanto inusitada, talvez.

Em 1983, quando trabalhava para o Jornal do Brasil, passando, no carro de reportagem, pelo famoso bar Garota de Ipanema, vejo Armando Rozário sentado solitariamente em uma mesa, ao fundo.
De dentro do carro, com uma zoom 80-200mm, consegui fazer, por mero divertimento, esta foto do já então famoso colega fotojornalista.

Colega porque, assim como eu (mas, muito antes), Armando Rozário trabalhou na revista Manchete, de Bloch Editores, e contra ela abriu esse emblemático caso judicial (em torno do crédito da foto de D. Júlia Kubitschek, mãe de Juscelino, de 1968), base para outras reivindicações, do mesmo tipo, de fotojornalistas e para a prática, por parte das empresas, da citação de créditos autorais nas fotos.
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No início deste ano, me inspirei na história de Armando Rozário para escrever o conto "O rosário de Macau" (inédito, a ser incluído em livro), criado especialmente para participar de concurso literário na sua terra de origem familiar, Macau, ex-colônia portuguesa e, hoje e até 2049, uma Região Administrativa Especial da China.

quinta-feira, 9 de agosto de 2018

Fotomemória: Caetano, Gal, Bethânia: registros de Guina Ramos para a revista Amiga...

Caetano Veloso e Gal. Foto de Guina Ramos, 1978. 
No blog Bonecos da História, Guina Ramos documenta sua trajetória nos principais veículos de comunicação do Brasil. 
Na semana em que Caetano Veloso comemora 76 anos (dia 7/8) , o escritor e fotojornalista publica algumas imagens feitas em 1978 e estampadas na revista Amiga: Caetano e Maria Bethânia em show no Canecão (que resultou em antológico álbum gravado ao vivo); e Caetano e Gal durante ensaio para a turnê que a dupla faria na Europa. Naquele ano, Gal também preparava um disco histórico: Gal Tropical, que foi lançado em 1979.

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terça-feira, 3 de julho de 2018

Fotomemória - Chacrinha por Guina Ramos

Chacrete e Chacrinha, TV Tupi, Cassino da Urca, 1978.
Foto de Guina Araújo Ramos

por Guina Araújo Ramos  (do blog Bonecos da História)

Este domingo, 01/07/2018, marca 30 anos da morte do “comunicador” Chacrinha (Abelardo Barbosa, que, aliás, teria feito 100 anos em 2017), e eu só fico sabendo disso porque me apareceu uma rememorativa postagem no Facebook, não por acaso do jornalista Denílson Monteiro, autor de “Chacrinha, a biografia”, livro de 2014 (também disponível em e-book).

O fato é que se Chacrinha continua na memória do povo, talvez seja porque resumiu em sua tão absurda quanto surrealista arte o incompreensível espetáculo que é este país, Brasil.
E continua vivo nos palcos, assumido pelo ator Stepan Nercessian, que encarna sua irreverência num espetáculo que circula pelo Brasil e deve virar filme em 2019, intitulado, muito simplesmente, "Chacrinha, o musical".

Que ninguém estranhe ver Chacrinha, nesta série Bonecos da História, de costas para o distinto público do blog!...

Tive a subida honra (e o grande divertimento) de fotografar algumas das Discotecas do Chacrinha no final dos anos 1970, ainda TV Tupi, no Cassino da Urca, em preto-e-branco para a revista Amiga e em cor para Sétimo Céu, trabalhando para a Bloch Editores.

O próprio programa era um espetáculo!... Começava pelas longas filas de ansiosos espectadores, seguia pelos camarins congestionados de artistas, jornalistas e técnicos, e se expandia pelo auditório circular, que engolfava um palco ainda mais congestionado: grandes câmeras de TV, dois grupos de Chacretes, contrarregras e grupos musicais, jurados em seus postos etc...

Centralizando toda esta loucura, o inabalável Chacrinha, sempre brilhante em suas espantosas vestimentas repletas de lantejoulas e de penduricalhos, nesta época ainda nem tanto, mais tarde incluindo a buzina, o disco telefônico, a cartola de cano alto, os óculos de aros grossos, sempre com os gestos largos com que provocava os fãs da plateia, quando não jogava um bacalhau ao léu...

Não me restaram mais do que estas duas fotografias, de todas estas coberturas da Discoteca do Chacrinha que fiz (e que dependiam das atrações da semana), de uma das quais retiro este boneco de costas. Mas, talvez evidenciando o motivo por que guardei apenas estas fotos, entre tantas que foram parar (e sumir) no desaparecido arquivo da Manchete, publico as duas fotos que me restaram...

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terça-feira, 5 de junho de 2018

Fernando Gabeira e a contradição no tempo. Por Guina Araújo Ramos

1986 - Gabeira, então do PV, em frente ao prédio da Manchete, depois de participar de debate promovido pela TV Manchete no Teatro Adolpho Bloch. Naquelas eleições para governador do Rio de Janeiro, o jornalista dividiu votos com o brizolista Darcy Ribeiro, o que deu a vitória a Moreira Franco. Gabeira nem deve ter percebido que o passado estava logo ali, como uma curiosidade subjetiva que a foto carregava. Em 1969, um dos bilhetes dos sequestradores do embaixador americano Charles Elbirck, do qual ele participou, foi deixado a pouco metros da cena acima, em uma escultura de Bruno Giorgi instalada no pequeno jardim diante da sede da Bloch Editores. Foto de Guina Araújo Ramos

1979 - Gabeira foi fotografado na praça 4 de julho, em frente à Embaixada dos Estados Unidos, no Centro do Rio. Ele voltava do exílio e não quis posar na calçada da representação americana. Como havia participado do sequestro do embaixador Charles Elbrick, o jornalista temia ser "sequestrado". Foto de Guina Araújo Ramos Ramos
 por Guina Araújo Ramos 

Têm me reaparecido amigos e conhecidos com que convivi nos subúrbios cariocas nos anos 1960 e 70, tempos da ditadura do Golpe de 1964, pessoas (a maioria deles brancos, todos da classe média) que, então, agiram como “revolucionárias”, correram risco de serem presas, algumas até o foram... Curioso é que, hoje, se transformaram em ou se apresentam como... bem, talvez o termo mais próprio seja mesmo “reacionários”.

Têm muita dificuldade de entender as necessidades da sociedade brasileira (simplesmente defendem seus relativos privilégios), continuam presos à ideologia da Guerra Fria (têm alta subserviência ideológica aos EUA) e destilam preconceitos de classe e de cor (colocam-se sempre, moralmente, acima do “povão”). Alguns chegam à absoluta contradição de pedirem “intervenção militar”, parece até que apagaram da memória seus próprios sofrimentos na ditadura...

Sentiam basicamente, na época, a necessidade de defender sua liberdade de expressão (muitas vezes, artística) e foram estimuladas por Maio de 1968 na França e as passeatas no Brasil, até sofrerem a repressão da ditadura, que lhes atingiu após o AI-5, final de 1968.

Não mudaram, de lá para cá, num ponto fundamental: apesar de criadas num país marcado pela memória do escravismo, parece que nunca tiveram a pretensão, talvez nem mesmo a ideia, de questionar as injustas estruturas econômicas ou de lutar por igualdade nas relações de classe.

Entre os Bonecos da História, talvez um exemplo muito simbólico, se não prático, seja Fernando Gabeira. Durante o ano de 1979, após a aprovação da anistia, acompanhei a chegada de vários exilados políticos da ditadura do Golpe de 1964, entre eles Fernando Gabeira.

Copio trecho do meu livro “A outra face das fotos”:

Em uma grande matéria para a Manchete, fotografei Fernando Gabeira em entrevista no apartamento de sua prima Leda Nagle, conhecida apresentadora de programas de TV, na Gávea, e circulamos com ele pela cidade, revendo todo o roteiro de sua atuação política clandestina. Tinha, naturalmente, um deslumbramento, pelo Rio e pelas pessoas, mas também era evidente nele uma nostalgia mal digerida.  E alguma preocupação... Tivemos um momento tenso na matéria. Propusemos fazer umas fotos diante do consulado americano, na avenida Pres. Wilson, e, com grande desprendimento, Gabeira aceitou posar sentado junto ao pequeno obelisco da Praça 4 de Julho, em frente ao consulado. No entanto, quando sugeri, recusou-se terminantemente a pisar na calçada à frente do prédio do governo dos EUA: muito justamente, ele, que participara do sequestro do embaixador americano Charles Elbrick, em 1969, sentia agora um repentino (e compreensível) medo de ser sequestrado...”

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sexta-feira, 1 de junho de 2018

Dos arquivos de Guina Ramos - Erasmo Carlos nas esquinas de Ipanema em 1978...


Erasmo Carlos, Ipanema, 1978. Foto de Guina Araújo Ramos.

Reprodução da matéria da Fatos & Fotos. Erasmo lançava a música "Pelas esquinas de Ipanema". 

O blog Bonecos da História, editado pelo fotojornalista e escritor Guina Araújo Ramos, publica hoje antigas fotos de Erasmo Carlos. Em uma delas, o cantor posa na Visconde de Pirajá, em Ipanema.

Seguindo os passos da canção "Pelas Esquinas de Ipanema", com trechos que relatam uma caminhada pelo bairro (Caminhar… caminhar… caminhar/Pelas esquinas/Caminhar… caminhar… caminhar/Pipi-dogs, lanchonetes/Jet-sets e ressacas/ Best sellers, discothéques/Bus-stop e pivetes/Copertone e blue jeans/ Big shots e Jobins etc) Guina retratou o Tremendão para uma matéria da Fatos & Fotos, em 1978, ano de lançamento daquele LP.

Bonecos da História revisitou seus arquivos motivado pela presença de Erasmo Carlos na mídia, hoje, 40 anos depois. O cantor, que comemora 77 anos no dia 6 de junho, está lançando um novo álbum - "Amor é isso". E também está nos cinemas: estreou ontem o filme "Paraíso Perdido", dirigido por Monique Gardenberg, com Marjorie Estiano, Seu Jorge, Humberto Carrão, Hermila Guedes e Júlio Andrade, onde Erasmo faz o papel do dono da boate Paraíso Perdido.

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