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quinta-feira, 28 de fevereiro de 2019

Carnaval carioca em crise? Chora tamborim...

Entre os anos 1970 e a primeira metade da década de 1980, bastava ao carioca que quisesse ignorar o Carnaval manter distância do desfile das Escolas de Samba. Ou evitar a Rio Branco e a Cinelândia, onde o Bola Preta, os blocos de embalo, como Bohêmios de Irajá, Bafo da Onça, Cacique de Ramos, blocos de sujos e foliões fantasiados davam alguma vida ao Centro da cidade.

Para quem preferisse pegar um cineminha, ir a um museu ou visitar a titia, melhor não passar na Visconde de Pirajá, território da Banda de Ipanema, que sempre arrastou uma multidão, ou desviar dos pequenos blocos de bairros, como Cachorro Cansado, no Flamengo, e mais uns poucos resistentes.

No mais, carnaval era ver na TV, ir ao Sambódromo ou comprar as edições especiais de Manchete e Fatos & Fotos. Ah, sim, os bailes também persistiam, mas aconteciam em ambientes fechados. Em muitos bairros da Zona Sul, as ruas mais pareciam um feriadão comum para ser curtido na praia e nos botecos.

A partir de 1986 e com mais força nos anos 1990, as ruas foram retomadas. Surgiram dezenas de blocos - autênticos e sem bandeiras comerciais, simples iniciativas de moradores, de vizinhos e de frequentadores de botecos - e milhares de cariocas foram atrás das baterias. Blocos tradicionais, como o Bola Preta, foram revigorados. Na outra ponta da folia, o espetáculo das escolas de samba tornou-se mega, uma superprodução quase hollywoodiana.

As multidões dispostas a brincar o carnaval não foram embora, ao contrário, mas tudo isso  parece agora em crise. 

O Globo de hoje revela que volta a ser discutida uma proposta para passar para uma empresa privada o desfile das escolas de samba hoje comandado pela Liesa. Já houve uma tentativa nesse sentido. A negociação não será fácil. Não é como um empresário contratar um show e exibi-lo no Sambódromo. Embora o samba há muito já tenha se profissionalizado - carnavalescos, destaques, mestres de bateria, madrinhas e rainhas, intérpretes, compositores etc são contratados - a grande massa dos mais de 2 mil e tantos desfilantes das grandes escolas ou está ali de graça ou paga para entrar em alas. Digamos que um concessionário assuma o Sambódromo e apenas contrate as escolas para participar do desfile. Os desfilantes terão direito a um cachê do show? Ou continuarão a sambar apenas pelo amor às cores da sua escola? Independentemente do novo formato e do debate sobre quem paga o que e quem recebe o que, o fato é que o espetáculo do Sambódromo precisa de uma injeção de autenticidade, modernizar não significa artificializar. Até a criação dos sambas da maioria das escolas é industrial ou fast food, foi terceirizada, com os compositores das comunidades perdendo a vez para fornecedores de letras e músicas por encomenda.

Muita água deve rolar. É hora de agir e não esquecer que na primeira metade do século passado ninguém imaginava que Democráticos, Fenianos e Tenente do Diabo fossem acabar. As Grandes Sociedades eram as estrelas do Carnaval e foram desbancadas exatamente pelas Escolas de Samba.

Coincidentemente, o mesmo Globo noticia que um impasse entre autoridades e organizadores de blocos está levando ao cancelamento de alguns desfiles. Como consequência do sucesso, que cada vez atrai mais turistas, observa-se que carnaval de rua cresceu demais e que é preciso equilibrar a folia com o funcionamento da cidade. Acredita-se que a maioria dos blocos admite que organização, estrutura, segurança etc devem estar em harmonia com a diversão.

Ocorre que ao se recuperar por iniciativa dos cariocas, o carnaval de rua despertou a atenção de empresários que viram no extraordinário palco da cidade uma oportunidade para promover cantores, shows, bailes, celebridades, eventos e marcas. Vieram os blocos chamados comerciais, como Favorita, Preta Gil, Chora me Liga, entre outros. Alguns foram desestimulados, mas chegaram a fazer tentativas de impor ao Rio o "abadá" baiano, o avental que equivale a privatizar a rua e cobrar um arremedo de ingresso aos foliões. As autoridades criaram a Arena dos Blocos, na Barra, para receber esse tipo de show, mas nem todos os empresários aderiram. Ou, talvez por força de prestígio, conseguiram permanecer na Zona Sul e no Centro da cidade. Em 2018, foram quase 600 desfiles de blocos. Esse ano, o número caiu para pouco mais de 500.

A Prefeitura pretende tirar das ruas mais blocos ano que vem.

Que o critério de eliminação pelo menos privilegie as manifestações autênticas dos bairros e controle a ofensiva dos chamados blocos comerciais.