sábado, 7 de março de 2015

De Paris: um correspondente em estado de perplexidade com a política brasileira

Reprodução Le Monde
por Jean-Paul Lagarride
A leitura dos jornais, hoje, em Paris, me surpreendeu. Assim, liguei meu velho ordinateur Archimedes, de 1987, mas que funciona perfeitamente, em busca de mais informações na internet.Vi que são 49 políticos investigados, de vários partidos. E me parece que a lista é resultados apenas das denúncias de dois implicados. O que significa que a relação pode engordar, e muito.  A leitura que se faz na França é, infelizmente, que a Câmara e o Senado brasileiros, em função do financiamento sem limites das campanhas eleitorais por grandes grupos privados, seriam formados, em sua maioria, por bancadas de "delegados" dos seus financiadores. O povo brasileiro não seria representado nessas instituições.  Por isso, os escândalos se tornam rotina. Quando fui correspondente da Manchete, costumava conversar com amigos brasileiros e isso me dava uma visão mais precisa da conjuntura - palavra que os analistas políticos da minha época usavam até o desgaste. Simples curiosidade, já que a minha função era escrever sobre questões europeias e entrevistar personalidades do cinema, arte, economia, literatura, política internacional etc. Hoje, quase não tenho contato com jornalistas brasileiros. Muitos dos meus contemporâneos, incluindo o quase franco-brasileiro Justino Martins, já descansaram. Contudo, meu interesse nos rumos do Brasil permanece vivo.
Nos últimos dois meses, através da leitura remota dos principais veículos, tive a impressão de que dois políticos estavam em ascensão, tantos eram os comentários elogiosos na imprensa brasileira. Dois líderes que se afirmavam, tal era a exaltação em curso. Suas atitudes eram festejadas e chegaram a ser definidas como "históricas". Chamam-se, se não me engano, Cunha (Eduardo) e Renan (Calheiros). Pois não é que ambos estão na lista de investigados?
Pelo que conheço, em certos momentos, a imprensa brasileira parece apostar em nomes "furados", como se dizia no Rio. E curiosamente, os personagens escolhidos e incensados pelos conglomerados jornalísticos não parecem ter muita sorte. Foi assim com Carlos Lacerda, o conspirador que quebrou a cara; com Fernando Collor; com um tal de Demóstenes Torres, um senador ou deputado que era dito como paladino da moralidade e se envolveu em um escândalo, acho que o caso Cascade (Cachoeira); e, agora, os senhores Cunha e Renan têm suas auras supostamente ilibadas rapidamente comprometidas. Raciocinando com meus velhos neurônios, arrisco dizer que Renan, Cunha e a imprensa vão continuar juntos, agora engrossando a campanha do impeachment. Alguém quer apostar?
Não entendo mais nada. Desculpem, sou hoje um comentarista mais perplexo do que racional. Vou tentar acompanhar com mais atenção, nas próximas semanas, a velocidade e a imprevisibilidade dos fatos.
Desejo boa sorte ao Brasil.
E, por coincidência, os políticos da Espanha, onde a família real inventada pelo ditador Francisco Franco já é investigada por corrupção, também estão em ebulição. Vejam The Times, de ontem.


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