
Jornalismo, mídia social, TV, atualidades, opinião, humor, variedades, publicidade, fotografia, cultura e memórias da imprensa. ANO XVII. E, desde junho de 2009, um espaço coletivo para opiniões diversas e expansão on line do livro "Aconteceu na Manchete, as histórias que ninguém contou", com casos e fotos dos bastidores das redações. Opiniões veiculadas e assinadas são de responsabilidade dos seus autores. Este blog não veicula material jornalístico gerado por inteligência artificial.
segunda-feira, 19 de abril de 2021
domingo, 18 de abril de 2021
Caso Henry: o Pequeno Polegar
Reprodução |
O chamado caso Henry está documentado em fotos, mensagens e vídeos.
Talvez uma dos mais comoventes entre as peças reunidas pela polícia seja um pequeno filme de celular, feito pela babá, que mostra o menino caminhando no corredor do apartamento. O vídeo foi enviado para a mãe da pequena vítima e o objetivo era atestar que ele sofrera violência por parte do padrasto. Henry mancava, impressiona ver a fragilidade da criança.
Presos, os suspeitos - o casal Jairo de Souza Santos Júnior, vulgo Dr. Jairinho, e Monique Medeiros da Costa e Silva, a mãe de Henry - posaram para a foto oficial de acusados. Nos Estados Unidos, esse tipo de pose para os arquivos policiais chama-se mugshot. Aqui, é "boneco". A mídia divulgou as fotos de Jairo e Monique diante do tradicional painel métrico. A imagem revela um dado curioso. O vereador mede 1,90 e mãe de Henry 1,80. Segundo testemunhas, Henry era vítima constante de violências. Vivia assustado. Imagina-se o grau de intimidação que sofria. O menino tinha 1,15 de altura e pesava 25 kg.
Entende-se porque ele enviou tantos e repetidamente ignorados os pedidos de socorro.
Seu pesadelo era a "terra dos gigantes".
Quem não leu Charles Perrault e seu Le Petit Poucet? No conto, um menino chamado Pequeno Polegar luta para sobreviver a ogros terríveis.
A diferença é que Perrault deu ao seu conto o final feliz que Henry não teve.
Fotomemória da redação - Félix, o papel do goleiro do Fluminense
por Guina Araújo Ramos (do blog Bonecos da História)
Continuando a modesta série de jogadores que fotografei durante treinos de time de futebol – que não são muitos, não me preocupei em guardar este tipo de material, que o grau de informalidade era muito grande, sem uniformes oficiais etc –, trago um registro feito no estádio do Fluminense, no bairro das Laranjeiras.
Trata-se do goleiro Félix, apelidado de Papel (pela magreza), campeão mundial em 1970. Só que, à época, não mais atuando como goleiro profissional, mas na função de treinador de goleiros do Fluminense.
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Félix no Fluminense - Rio, 1979. Foto Guina Araújo Ramos |
Após longa carreira na Portuguesa de Desportos, Félix foi contratado em 1968 pelo Fluminense, e daí convocado para a seleção que disputou (e ganhou) a Copa do Mundo de 1970. Apesar de muita vezes criticado, Félix viveu, no correr da década, a melhor fase da sua carreira, como participante da “Máquina Tricolor” que ganhou cinco campeonatos cariocas e o brasileiro de 1970.
Voltando para São Paulo, Félix continuou próximo ao futebol, dirigindo alguns times e coordenando escolinhas. Faleceu em agosto de 2012, em São Paulo.
A matéria é do meu tempo de colaborador eventual da Manchete Esportiva (que fotografar esporte não era o meu forte...), acredito que de 1979, só não tenho como pesquisar.
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Félix no treino, Rio,. 1979. Foto de Guina Araújo Ramos |
Certamente era daquelas matérias que fazem um balanço da situação do jogador, agora uma pessoa “normal”. Mostrava que Félix se mantinha no futebol, agora deslocado para a função de treinar outros goleiros. Embora seja uma atividade que tinha tudo a ver com a sua experiência, não creio que a cumprisse com tanto prazer assim, e creio que é o que as fotos parecem demonstrar.
Importante mesmo é relembrar o goleiro Félix, grande profissional que, acima de tudo, e com fundamental atuação, fez parte da equipe mais admirada do futebol brasileiro, o do tricampeonato, na Copa de 1970, no México.
Deste grande feito fui mero telespectador... Passo então a bola ao coleguinha José Esmeraldo Gonçalves, que resumiu muito bem a trajetória de Félix em texto no “Blog que virou Manchete”, ilustrado pela “Edição Histórica da Manchete - Copa 70 - A Glória do Tri”, com fotos de Jáder Neves e Orlando Abrunhosa, e texto de Ney Bianchi.
Visite o blog Bonecos da História, clique AQUI
Na capa da Time:
Na quarta-feira, 21 e quinta, 22, líderes mundiais se reunirão virtualmente para discutir o futuro do planeta. É a Cúpula do Clima. O Brasil vai participar. Espera-se mais um vexame. O governo Bolsonaro levará para a conferência sua política ambiental declaradamente ditadas por madeireiros, garimpeiros, latifúndios, pecuaristas e ocupantes ilegais de terras públicas e reservas. E, como último fato, o afastamento do delegado da PF que emitiu notícia-crime conta o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles.
A Time levanta um debate mundial, que vai além do desvario brasileiro. Os governos estão longe de cumprir as metas de controle das emissões de carbono e do aquecimento global. A revista defende que a pandemia deve ter como consequência mudanças de paradigmas rumo a um mundo menos hostil à natureza e mais amigável com a única "casa" que a humanidade possui: o planeta.
sábado, 17 de abril de 2021
sexta-feira, 16 de abril de 2021
Quando as linhas do tempo se cruzam • Por Roberto Muggiati
World Press Photo 2021 - Deu Brasil na cabeça - O país das tragédias inspira os fotojornalistas vencedores
Um voluntário procura focos sob uma ponte. Foto de Lalo de Almeida/Folha de São Paulo/ Panos Pictures |
A dramática luta contra o fogo. Foto de Lalo de Almeida/Folha de São Paulo/Panos Pictures |
O fotojornalista brasileiro Lalo de Almeida ganhou o primeiro lugar na categoria Série Meio Ambiente do World Press Photo 2021. Ele fotografou para a Folha de São Paulo e Panos Pictures a devastação no Pantanal. Queimadas fora de controle, o clima de impunidade estimulado pela política antiambientalista do governo Jair Bolsonaro e o período de estiagem local foram o combustível para a destruição. O quadro final: milhares de animas mortos, um dos mais importante biomas do planeta em cinzas e cerca de 160 mil quilômetros consumidos pelo fogo, um terço do Pantanal. A série de Lalo de Almeida denuncia mais essa tragédia brasileira. Com o mundo ainda chocado pelo desmatamento da Amazônia, o Brasil ofereceu ao planeta esse novo trauma. Segundo investigações da Polícia Federal, os incêndios foram provocados por empresários do agronegócio até agora impunes
O abraço resgatado ganhou prêmio principal do WPP 2021. Foto de Mads Niessen/Politiken |
Outra tragédia, essa global, foi o campo de inspiração para o vencedor do prêmio principal do World Press Photo 2021, o fotojornalista Mads Niessen. Mas o Brasil, mais uma vez, é protagonista. E, de novo, em uma calamidade que, pelas proporções dramáticas que alcançou aqui, tem as digitais criminosas de Jair Bolsonaro. Niessen fotografou a cena comovente para o jornal Politiken. Na imagem, Rosa Lunardi, 85 anos, é abraçada pela enfermeiro Adriana Souza, no lar Viva Bem, em São Paulo. Empatia, solidariedade, compreensão e compaixão. Tudo aí. O abraço, o primeiro em cinco meses que a idosa recebeu, foi possível graças a cuidados especiais. Ela envolve a enfermeira que, além da máscara, veste uma proteção de plástico que casualmente ganha forma de de asas de anjo.
Ambos os fotojornalistas cumpriram a função diante dos fatos. Levá-los além da notícia, traduzir dramas em imagens e, ao mesmo tempo, lançar uma mensagem ao mundo.
O Brasil é que não se sai bem nas fotos. Assim como a destruição programada do meio ambiente, a Covid 19 é potencializada aqui pelo negacionismo do sociopata que governa o país.
NO SITE DO WORLD PRESS PHOTO, FOTOS DOD VENCEDORES EM TODAS AS CATEGORIAS AQUI
quinta-feira, 15 de abril de 2021
quarta-feira, 14 de abril de 2021
Fotografia - Como uma onda
Foto de Affonso Dalle/Divulgação |
por Niko Bolontrin
A dica é de um leitor. Veja essa foto da famosa (para os surfistas) "laje de Ipanema". É do fotógrafo especialista Affonso Dalle, capturada hoje. O surfista na "remada" é o Tiaguinho Arraes. No Instagram está postada uma sequência da série. E o site do Globo publica outras. AQUI
Já viu e ouviu a última do Lennon? Tem clipe novo na área...
por Ed Sá
Nunca antes visto. A mídia digital não fala em outra coisa hoje. Em 1969, JohnLennon e Yoko Ono ensaiam “Give Peace a Chance”, antes do lançamento oficial. O vídeo acaba de vir a público. Foi gravado pelo cinegrafista Nic Knowland e pelo técnico de som Mike Lax e mostra Lennon e Ono executando uma versão demo improvisada da música em seu quarto no Sheraton Oceanus Hotel nas Bahamas. O vídeo é a primeira gravação até agora conhecida da melodia de "Give Peace a Chance". É também uma bed in do casal no sofá. Eles estavam nas Bahamas por causa da condenação de Lennon em um processo por porte de cannabis nos EUA. É simplesmente a primeira apresentação da icônica canção. São quase três minutos de imagens, som e irreverências. Tem uns toques caseiros, Lennon improvisa. Yoko ri. Estavam casados apenas há dois meses e tudo isso aconteceu depois do famoso bed in do Hilton em Amsterdam. A gravação oficial de "Give Peace a Chance" aconteceu em Montreal, depois desse ensaio informal das Bahamas. Recém-descoberto, a demo foi restaurada em 5K
Em 2018, um engenheiro de som encontrou em uma caixa com rótulo errado outra gravação inédita da mesma música, mas apenas áudio.
Essa versão "tosca" e histórica revelada agora, supervisionada por Yoko Ono, faz parte da comemoração dos 50 anos do álbum John Lennon/Plastic Ono Band (1970) que será lançado no dia 23 de abril.
VEJA O VÍDEO INÉDITO DE "GIVE PEACE A CHANCE" AQUI
Fotografia - Deu match! O beijo antes da cúpula
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A bitoca política de Leonid Brejnev e Erich Honeker em Berlim, 1979. Foto de Régis Bossu/Leicastore/Frankfurt |
por José Esmeraldo Gonçalves
Ontem O Globo fez um seleção de fotos célebres de beijos. Não foi um desafio às normas anti-Covid, mas a comemoração do Dia do Beijo (13/4). A edição estava impecável. Faltou apenas uma bitoca histórica (bitoca que, na verdade, aparenta ser um tremendo chupão).
Em 30 de outubro de 1979, o fotógrafo francês Régis Bossu cobria a comemoração dos 30 anos da DDR (República Democrática Alemã). Em meio a festividades e desfiles, ele foi escalado para o encontro formal de cúpula entre Leonid Brejnev, da União Soviética, e Erich Honecker, da então Alemanha Oriental.
Bossu era freelancer da Sygma, agência francesa de fotografia que foi parceira da Manchete durante vinte anos. Ele usou uma Leica. A imagem original está hoje na galeria da fabricante de câmeras, em Frankfurt.
Naquele dia, após os discursos, o líder soviético deu um ligeiro puxão no colega alemão. O que inicialmente parecia um convite para uma conversa ao pé do ouvido virou uma beijoca de cinco segundos. Havia um batalhão de fotógrafos na sala, mas o melhor ângulo e a imagem precisa que se espalhou pelo mundo - viralizou, como se diz hoje - foram do francês. Muitos jornais e revistas reproduziram a foto cortando-a para um close do beijo, afinal era a razão da repercussão global da cena.
Acima, está a foto completa com os papagaios de pirata divididos entre indiferentes e voyeurs.
A tradição explica a iniciativa de Brejnev: para os russos o beijo na boca é símbolo de camaradagem e tem origem no "ósculo santo" da Igreja Ortodoxa representando a irmandade entre os religiosos. No mesmo ano, Jimmy Carter escapou de beijão de Brejnev oferecendo a outra face, como o New York Times registrou. Nascido na pequena Plains, na Geórgia, filho de fazendeiros batistas, Carter não conseguiria explicar um beijo daqueles no culto dominical; Preferiu declinar.
terça-feira, 13 de abril de 2021
O uso de drones em manifestações artísticas. É a era da tecnoperformance
por Ed Sá
O cinema costuma mostrar os drones como arma infalível para explodir terroristas. Um dos mais conhecidos é Good Kill (Morte Limpa), sobre um piloto que entra em surto ao lutar um tipo de guerra diferente. Ele trabalha na base aérea em Nevada abatendo alvos a 11 mil quilômetros de distância e, ao fim do expediente, volta para a esposa e filhos como se fosse um burocrata comum.
À medida em que a tecnologia se aperfeiçoa surgem as muitas possibilidades de uso dos drones, muito além de entregar pizza, fazer fotografias aéreas e espionar a vizinha ou combater inimigos. E está marcado para amanhã o primeiro voo do drone Ingenuity em Marte. O veículo foi levado pela sonda Perseverance e fará voos exploratórios a baixa altitude sobre a superfície do planeta.
Mas o que os drones estão popularizando são as tecnoperformances, geralmente exibições coreografadas feitas por centenas ou milhares de aparelhos.
Na Itália, em Torino, grafiteiros usaram drones para pintar paredes no alto de prédios. Talvez uma das mais marcantes exibições tenha sido uma tecnoperfomances realizada em Tianjin, na China, há algumas semanas. Durante cerca de 30 minutos 600 drones homenagearam Vincent van Gogh. Entre outras obras do pintor, as luzes dos drones desenharam “A Noite Estrelada”. “Campo de trigo com ciprestes”, "A amoreira no outono", “Autorretrato com Chapéu de Palha” e a série "Girassóis”.
VEJA AQUI
Abril é o mais cruel dos meses • Por Roberto Muggiati
Poesia numa hora destas? Sim, justo agora, o tempo dos assassinos (já proclamava Rimbaud em 1873 no poema Matinée d’Ivresse), o tempo dos genocidas, o tempo dos torturadores de criancinhas, o tempo dos queimadores de livros, o tempo dos toscos que odeiam a cultura e a beleza porque elas expõem a nu toda a sua barbárie e esterilidade.
Esterilidade é o tema do grande poema de T.S. Eliot The Waste Land/A Terra Desolada, publicado há cem anos em outubro de 1922. A genial sentença de abertura, April is the cruellest month, reflete admiravelmente o abril que estamos vivendo hoje. Abaixo, os versos iniciais do poema de Thomas Stearns Eliot (1888-1965) e sua tradução pelo poeta brasileiro Ivan Junqueira (1934-2014).
THE WASTE LAND
1. The Burial of the Dead
April is the cruellest month, breeding
Lilacs out of the dead land, mixing
Memory and desire, stirring
Dull roots with spring rain.
Winter kept us warm, covering
Earth in forgetful snow, feeding
A little life with dried tubers.
A TERRA DESOLADA
1922 (tradução: Ivan Junqueira)
1. O ENTERRO DOS MORTOS
Abril é o mais cruel dos meses, germina
Lilases da terra morta, mistura
Memória e desejo, aviva
Agônicas raízes com a chuva da primavera.
O inverno nos agasalhava, envolvendo
A terra em neve deslembrada, nutrindo
Com secos tubérculos o que ainda restava de vida.
PS • Alguns trechos de Matinée d’Ivresse/Manhã de embriaguez, de Arthur Rimbaud (1854-1891):
“Cela commença sous les rires des enfants, cela finira par eux. (...) Começou pelos risos das crianças, terminará por eles.(...)
Nous savons donner notre vie tout entière tous les jours.
Voici le temps des Assassins.(...)
Sabemos dar nossa vida inteira todos os dias.
Eis o tempo dos Assassinos.
PS –Em 1946, Henry Miller publicou The Time of the Assassins: A Study of Rimbaud. Acabo de ver na Estante Virtual uma tradução portuguesa, O tempo dos assassinos, por R$ 559,89.
segunda-feira, 12 de abril de 2021
De cabeça para baixo: governo do Estado do Rio de Janeiro vira piada
Se até para fazer um cartaz o governo do Estado do Rio de Janeiro mostra incompetência, imaginem como administra o combate à Covid-19. Uma campanha para conscientizar a população sobre a vacinação mostra um "médico" usando uma máscara de maneira errada, com o clipe nasal no queixo quando deveria estar, obviamente, no nariz. A campanha teria custado ao contribuinte 13 milhões de reais. O governo do bolsonarista Cláudio Castro pediu desculpas. Não informou se vai cobrar da agência a devolução da verba. A agência Propeg, por sua vez, divulga que o sujeito que aparece na foto é um médico. Ou seja: quer culpar o "modelo"? Virou piada até no exterior. Mas pode ser uma piada sem qualquer graça. No seu blog, o jornalista Ruben Berta revela que a campanha "Rio abraça a vacina" custou R$ 13 milhões e foi contratada na correria. O governo estadual deu um prazo de dois dias úteis para que empresas interessadas apresentassem suas propostas. A Propeg foi a única agência que concordou topou trabalhar em velocidade The Flash. em realizar o serviço. Leia Ruben Berta AQUI
domingo, 11 de abril de 2021
Os piromaníacos
No ano passado, bolsonaristas promoveram uma queima de livros de Paulo Coelho. Não estavam dando descontos, era fogo mesmo. Talvez por inibição, Bolsonaro e Paulo Guedes evitam a piromania mas atacam igualmente os livros.
Sob o argumento de que quem compra livro são os ricos, a dupla insidiosa ameaça acabar com a isenção de impostos sobre livros. Isso enquanto trabalham para eliminar todas as taxas sobre a venda de armas e perdoam as dívidas da indústria religiosa fundamentalista.
O governo que classifica a Cultura de supérflua pretende impor uma alíquota de 12% sobre as obras. Na prática é como incendiar o setor editorial.
Ao longo da história, os livros e a Cultura em geral são alvos dos regimes autoritários.
"Quando ouço falar em cultura puxo meu revólver". A famosa frase foi atribuída e Goebbels e Goering. Pode ser de qualquer um dos dois. Foi registrada, de fato, pela peça "Schlageter", sobre um sabotador alemão executado na França, escrita pelo nazista Hans Johst.
Tudo a ver.
Exclusivo: Saturday Night Live entrevista o Iceberg que afundou o Titanic
Entrevistado no programa Saturday Night Live, o Iceberg dá sua versão do naufrágio do Titanic. |
por O.V. Pochê
O Titanic colidiu com um iceberg na noite de 14 de abril de 1912 e afundou na madrugada do dia seguinte. O navio saiu do estaleiro em maio de 1911, há 110 anos. Nos meses seguintes teve seu interior de palácio montado e decorado com as mais ricas peças da época.
Quase tudo já foi contado e filmado sobre o Titanic. Menos o que o Saturday Night Live fez nessa semana comemorativa. O programa entrevistou o único personagem que restava: o Iceberg em pessoa. O indigitado foi recebido, bem a propósito, pelos âncoras Colin Jost e Michael Che. Coube ao ator Bowen Yang interpretar o responsável pela tragédia. "Essa é sempre uma época do ano muito estranha para mim", disse o Iceberg logo após ser apresentado para a plateia. "Você sabe, isso foi há muito tempo atrás, eu tenho refletido muito para tentar superar", completou.
Preocupado com sua imagem, o Iceberg parecia instruído por um marqueteiro. Ele reclamou quando o âncora fez uma pergunta mais comprometedora. Reagiu como uma celebridade incomodada.
- O que você tem a dizer às famílias de todas as pessoas que perderam suas vidas na tragédia? - indagou o apresentador.
- “Ok, não. Essas não são as questões que discutimos ", rebate o Iceberg, dizendo-se disposto a falar sobre qualquer coisa que não fosse o "escândalo" de 1912. "Acho que minha assessoria foi muito clara, não estou aqui para falar sobre o naufrágio. Estou aqui para falar sobre o álbum que estou lançando", diz.
No fim, acaba concordando em falar do naufrágio sob a sua perspectiva.
- Em primeiro lugar, o Titanic foi quem veio onde eu moro e me bateu. Era meia-noite. De repente, metade do meu rabo sumiu. Fui ferido e tudo o que as pessoas falam é que tipo 40 ou 50 pessoas morreram ou algo assim. ”
- “Eram 1.500 pessoas”, ressalta o âncora.
O Iceberg aponta que não foi responsável pela morte de ninguém.
- “Todo mundo está falando sobre mim, ninguém está falando sobre a água. O que disse a autópsia? Eles congelaram? Não, eles se afogaram, porra. Não fui eu, foi a água. Ninguém está cancelando o oceano. Ei, White Star Line, você construiu um barco ruim. Não deu certo. Isso é por sua conta, querida.
Em tempo de pandemia, com assuntos rareando e a mídia falando apenas em Covid e política, pode ser uma boa saída para pauteiros da TV. Em setembro próximo, por exemplo, a queda das Torres Gêmeas completará 20 anos. O ground zero pode ser o entrevistado ou, melhor ainda, os fragmentos dos aviões ou as colunas de aço retorcidas que estão no memorial construído no local.
No Brasil há temas fascinantes a escolher. Entrevistar a barragem de Brumadinho, por exemplo. Ou o viaduto da Av. Paulo de Frontin, no Rio, que desabou em 1971. Ou entrevistar o Bateau Mouche. O barco foi resgatado do fundo do mar, será preciso localizar. Diz-se que está em um cemitério de navios do outro lado da baia da Guanabara. Entrevistar os contêineres do Ninho do Urubu, do Flamengo. Ou, ainda, ouvir Bolsonaro, o responsável pela maior tragédia da história do Brasil.
Caso Henry: e a ajuda não veio
Clara S. Britto
Os educadores mostram como é importante para a criança um contato externo. Alguém a quem ela possa recorrer, buscar conforto e até pedir socorro se for o caso. As estatísticas mostram que os casos de violência e pedofilia têm como agentes, na maioria, parentes da criança, às vezes os próprios pais ou pessoas com acesso à casa, supostamente "de confiança".
O terrível caso do menino Henry, que domina o noticiário, é um exemplo dramático. Ele sinalizou o que estava sofrendo e buscou apoio em uma pessoa próxima em quem confiou: a babá.
Não foi ouvido. A ajuda não chegou a tempo para o menino Henry.
Fica o exemplo no momento em que facções conservadoras e religiosas se unem para impor o homeschooling, o conceito que prega a educação doméstica ou no lar. Há um projeto no Congresso impulsionado principalmente pela bancada fundamentalista. Se aprovado e implantado vai dar aos pais o controvertido direito de retirar as crianças de ambientes coletivos, a escola, especificamente, zerando a socialização dos futuros cidadãos. O sistema vai limitar o convívio. Criar "laboratórios" para gestação de seres individualistas, pouco abertos à diversidade e, em casos específicos, pequenos doutrinados ou pequenas vítimas. Muitos casos de pedofilia, por exemplo, são percebidos por professores que notam mudanças de comportamento nas pequenas vítimas e alertam os pais e até as autoridades, se preciso for. Afastar as crianças da sociedade vai deixá-las mais expostas e vai calar ainda mais seus eventuais pedidos de socorro. Mesmo que os maus pais sejam a exceção, vale a pena protegê-las do risco.
sábado, 10 de abril de 2021
Philip, o racismo na corte...
por José Bálsamo
Os editores tiveram trabalho extra ao noticiar a morte de Philip, o marido de Elizabeth: procurar eufemismos. O sujeito em questão exalava racismo. Impossível negar. Tanto que O Globo, a Folha e o Estadão reuniram várias das suas declarações vulgares que "elegantemente" chamam de "gafes" e classificam de "inoportunas" e "politicamente incorretas". Um esforço para evitar a palavra que não ousaram grafar: racismo. Já o Valor teclou a palavrinha. A CNN Internacional destacou o "humor britânico". O Business Insider pontuou "a longa e degradante história de racismo" do falecido. O site Red Flag o chamou de "idiota elitista'".
A maquiagem semântica no racismo de Philip tem origem na própria comunicação palaciana. Sem poder ocultar as declarações preconceituosas do marido da rainha, até porque quase todas aconteceram em público, os assessores, com a ajuda da BBC, adicionavam um tom cômico às grosserias e o consorte virava "espirituoso", "incorrigivel". A esquerda britânica rebatia que incorrigível era o racismo do duque de Edimburgo. Era sempre lembrado que a família de Philip teve ligações muito próximas com nazistas.
Em 1937, nazistas comparecem a enterro da irmã de Philip. |
Não há registro de comentários de Philip sobre Meghan Markle, talvez porque já estivesse debilitado nos últimos anos. Os comentários racistas sobre a mulher de Harry, conforme ela revelou em entrevista a Oprah Winfrey, teriam partido de Anne, filha de Elizabeth. E, como ficou claro através de Meghan Markle, há algo de podre no reino dos Windsor. Chama-se racismo.
Confira algumas das "philipetas" racistas
* A um grupo de dançarinos negros: "Vocês são todos da mesma família?"'
* Ao desdenhar de uma exposição na Etiópia: "Isso parece o tipo de coisa que minha filha traria da aula de arte na escola".
* Ao ofender aborígenes: "Vocês ainda atiram flechas uns nos outros?"'
* A um estudante que percorreu trilhas na Nova Guiné referiu-se a canibais: "Conseguiu que não te comessem"?
* A um convidado negro de uma festa em Londres: "De qual exótico lugar do mundo você procede? "Sou de Birmingham", respondeu o inglês.
sexta-feira, 9 de abril de 2021
Libération: Brasil é a ameaça... Os voos da contaminação
O Libération teme a Covid voadora. Enquanto o vírus e uma de suas variantes mais perturbadoras circula ativamente no Brasil, inúmeros voos do Rio de Janeiro e de São Paulo continuam pousando na França. A variante brasileira é motivo de grande preocupação para as autoridades. É o "presente" que o negacionismo assassino de Bolsonaro oferece ao mundo,
Deu no Washington Post: variante brasileira do vírus da Covid-19 chega aos Estados Unidos
Bolsonaro já ameaçou atacar os Estados Unidos com pólvora. Não precisou. No rastro do deboche com que o psicopata trata a pandemia, o Brasil se tornou um grande produtor mundial de variantes do vírus.
O Washington Post, hoje, noticia que uma das cepas brasileiras já contaminou 434 pessoas em Massachusetts, Illinois e na Flórida.
Não se pode dizer que o governo Bolsonaro não está diversificando a pauta de exportação
A "novinha" do Picasso
“Mulher sentada perto de uma janela” segundo Picasso: o quadro que nasceu de uma "cantada" |
por José Esmeraldo Gonçalves
Em 1927, Pablo Picasso abordou na rua, em frente à Galeria Lafayette, a adolescente Marie-Théràse Walter, 17 anos. Uma "lolita" que, provavelmente, estava a caminho da escola. Era o que, hoje, as redes sociais chamam do "novinha". Picasso tinha 45 anos e era casado com a ucraniana Olga Khokhlova. Sedutor, ele falou para a menina que gostaria de pintar um retrato seu. Equivalia hoje, muito mal comparando, a propor à jovem uma capa de revista. Houve um segundo encontro na Gare Saint-Lazare. A conversa do espanhol funcionou.
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Thérese, a "novinha" de Pablo Picasso. |
Thérése foi morar em um apartamento próximo ao do pintor e nos anos seguintes posou para dezenas de obras, incluindo esculturas e desenhos. Picasso nunca a assumiu, como se diz.
Uma dessas obras, o quadro “Femme assise près d’une fenêtre” (“Mulher sentada perto de uma janela”) será leiloada no próximo dia 11 de maio, em Nova York. O cubismo ganhou formas sensuais no traço apaixonado do pintor e, embora nem desconfiasse disso na época, incorporou na paleta o verde das notas de dólar. O quadro poderá ser arrematada por US$ 55 milhões, segundo a Christie’s.
Muito mais do que o sorvete que Picasso ofereceu à menina há 94 anos.
quinta-feira, 8 de abril de 2021
A mídia precisa mesmo adotar apelidos "carinhosos" de bandidos e acusados de crimes? "Dr. Jairinho", "Fernandinho", "Leozinho",
por Flávio Sépia
Quando mídia passou a adotar os apelidos "carinhosos" dos bandidos, dos acusados ou suspeitos de crimes?
Fernandinho Beira-Mar. Não é fofo?
Já faz tempo que a regra para marginais era grafar Fernando Luiz da Costa, vulgo "Fernandinho Beira-Mar". José Rosa Miranda vulgo "Mineirinho", o apelido era a grife do bandido famoso na década de 1960, mas imprensa sempre pedia passagem para dar o nome da certidão. Sem intimidades.
Agora tem aí o tal do "Dr. Jairinho". O elemento é suspeito de um crime hediondo. O correto é Jairo de Souza Santo, vulgo "Dr. Jairinho". Havia um traficante com ligações na Colômbia e Paraguai, era peixe graúdo, está foragido. Ganhou as manchete como "Leozinho". Ouvido assim no rádio e TV até parece que o jornalista está falando de um amigo tão do peito que até convidaria para um churrasco na laje. Em outro campo de atuação, Garotinho, Rosinha e uma raríssima exceção, "Pezão". Marcinho VP foi um bandido carioca famosos. Foi tema de best seller e de documentário. Chamava-se Márcio Amado de Oliveira e atuava em Botafogo. Foi ele quem garantiu a segurança de Michael Jackson e de Spike Lee na favela Dona Marta para gravar o clipe. Correu tudo bem, o clipe circulou no mundo, os astros saíram ilesos assim como a imagem do Rio, pelo menos em relação à integridade dos visitantes.
O Rio já teve o grupo dos "inho". Era policiais condenados por lavagem de dinheiro e ocultação de bens que atendiam pela alcunha de "Helinho", "Jorginho". Tantos eram os diminutivos da quadrilha que a mídia até apelou para o coletivo "grupo dos inhos".
A famosa planilha de jabaculês da Odebrecht tinha um deputado conhecido como "Fodinha". Mas esse os coleguinhas abdicaram do uso público.
quarta-feira, 7 de abril de 2021
Só dói quando o Brasil ri
por Flávio Sépia
Na Itália, o humorista Beppe Grilo, fundador e líder do Movimento 5 Estrelas, antissistema, ganhou enorme influência política, conquistou prefeituras, elegeu grandes bancadas de deputados, senadores e até eurodeputados. O comediante Volodymyr Zelenskiy é o atual presidente da Ucrânia. Na Bulgária, o cantor e apresentador Slavi Trifonov, que faz quadro cômicos ao lado de uma marionete, foi a surpresa em recentes eleições parlamentares, não desalojou do poder o partido majoritário mas vai ter influência na formação do novo governo.
O Brasil pode entrar nessa onda. Danilo Gentili, apresentador e humorista, é cogitado pelo MBL para disputar as eleições presidenciais ano que vem. A ideia que nasceu de uma piada pode evoluir para o palanque. Como as pesquisas dão Lula e Bolsonaro na ponta e o resto dos atuais presidenciáveis, tipo Ciro, Dória, Moro, Huck etc, patinando lá atrás, nada impede que outros partidos também recorram a comediantes. Por que não?
Tiririca - Já tem experiência política, é deputado federal. Foi o autor do slogan "vote Tiririca, pior do que tá não fica".
Dani Calabresa - Pode ser a chance de outra mulher voltar à presidência. Terá como bandeira a luta feminista contra assédio.
Didi Mocó - O Brasil finalmente assumiria ter um "trapalhão" no governo. E Joe Biden está aí para mostrar que idade não é problema.
Carlos Alberto Nobrega - Pode perfeitamente governar do banco da Praça é Nossa, que já funciona como uma espécie de ouvidoria pública.
Mamãe Falei, como é conhecido o deputado estadual de São Paulo Arthur do Val, é um liberal identificado com a direita, já levou uma tapa de Ciro Gomes, isso deve valer uns votos. Tem a opção de ser vice de Danilo Gentili.
Emilio Surita - do Pânico, ligado à facção mais à direita da rádio Jovem Pan ultradireitista.
Marcelo Tas - conduziu o humorístico CQC. O CQC acabou mas ele ainda é considerado "engraçado".
Tom Cavalcanti - A vantagem é que, se eleito, pode governar como vários dos seus personagens de acordo com a ocasião. Ana Maria Bela, Capitão Sentimento, Michel Tomer, Pedro Bilau e, principalmente, João Canabrava.
Paulo Guedes - Reparem nas declarações debochadas do comediantes da Economia. É uma veia de humor politicamente incorreto. Faz piada de tragédia e rindo sacaneia o povo. Tem chances como concorrente ao stand up do Planalto.
Humoristas que não saíram do armário. É muito cedo ainda e analistas acreditam que vão surgir outros candidatos. Não faltam comediantes não assumidos que podem tentar subir a rampa do Planalto. Damares, general Heleno, Mourão, Osmar Terra, Janaína Paschoal... 2022 promete.
Se liga mídia: Ciência não tem dois lados...
A mídia brasileira se apega à desgastada prática de "ouvir os dois lados". Nessa linha que muitos veículos sérios já abandonaram no mundo, dá espaço até para notórios produtores de fake news e figuras que propagam a desinformação. Márcio S. Bittencourt é cardiologista e mestre em Sáúde Pública pela Universidade de Harvard e tem experiência em epidemiologia clínica. .
Os "párias" endinheirados...
Milhões de brasileiros estão desempregados e a pobreza cresce (como já vinha crescendo bem antes da pandemia) em um país que é dirigido apenas pela especulação financeira e ignora os problemas sociais. O Brasil amplia a cada ano a desigualdade de renda que já é uma das mais cruéis do mundo. Os bozorocas já podem ir para a rua vestidos com a camisa da CBF para cantar "a grana do mundo é nossa, com brasileiro não há quem possa"... Claro que a maior parte desse dinheiro está no exterior. Sempre bem lavado. Na lista há alguns devedores do fisco com dívida a pagar a perder de vista. Basta raciocinar: se o Brasil perde empregos a cada dia, pode-se concluir que a riqueza dos bilionários que viceja na pandemia não cria postos de trabalho. Aqui, grande fortunas estão a salvo de impostos, multiplicam-se apenas nas bolsas de apostas de Wall Street, nas contas suíças, e faturam no quanto pior, melhor.
Lockdown para a Anvisa
sábado, 3 de abril de 2021
Minhas manhãs de Páscoa • Por Roberto Muggiati
Foto:Instagram |
Na minha infância, o Natal era tudo, cercado de ritual. Já a Páscoa era apenas um ovo de chocolate protocolar para mim e as duas irmãs – se bem que em Curitiba fosse um da ICAB, a Kopenhagen local. Só vim a viver todo um ritual de Páscoa depois dos cinquenta anos, voltando à infância através de meus filhos Roberto e Natasha. Inventei uma caça aos ovos na manhã de domingo – no molde daquelas caças ao tesouro em voga nos anos 50. Lá pelas dez da manhã – que ninguém é de ferro – eu acordava a galera tocando a todo volume a Grande Páscoa Russa de Rimsky Korsakov:
https://www.youtube.com/watch?v=56mXEqg6FdA
Depois de um desjejum apressado – as crianças estavam ansiosas para começar a busca – eu distribuía para cada uma a papeleta número 1: “Procurem com aquele menininho muito mentiroso pendurado no escritório.” Era um boneco antigo do Pinóquio, que Roberto e Natasha adoravam, o brechó espanhol da Rua da Matriz relutou muito em vender, alegou razões afetivas, era brinquedo de um menino da família que morreu muito cedo. Numa das dobras do boneco articulado estava a papeleta número 2: “Abram a porta da rua e procurem no amigo que leva vocês para a escola.” Era o automóvel estacionado em frente de casa na vila, a papeleta enfiada em alguma de suas fendas, ou num local mais óbvio, como debaixo do limpador de para-brisas. (Como ensinou Poe em A carta roubada, o esconderijo óbvio é às vezes o mais dissimulado e difícil de achar.) Minha mulher, Lena, acompanhava Natasha, que tinha cinco, seis anos; Roberto, esperto, seis anos mais velho, dispensava consultoria. A caça às papeletas prosseguia pela casa de vila de Botafogo, com dois andares e terraço. Uma de minhas pistas mais criativas foi esconder a papeleta na barriga de um cágado, colada com fita adesiva. (“Aquele que se arrasta junto das plantas na área dos fundos.”)
Um ano, a caça ao ovo aconteceu em Itaipava, onde tínhamos um chalé. Numa das pistas, mandei as crianças procurarem “na piscina ou em volta dela”. Era uma pequena piscina de PVC, ninguém ousaria entrar nela na fria manhã de outono. Logo ao amanhecer, coloquei as papeletas dentro de uma garrafa incolor de PVC, amarrei-a a uma pedra e mergulhei na piscina. Um barbante meio azulado, da cor da água, prendia a garrafa à borda da piscina. Depois de uns cinco ou dez minutos, as crianças pediram arrego, tive de revelar o truque.
Roberto – que fez 40 anos em dezembro – mora há treze anos na Europa, atualmente é chef confeiteiro num restaurante de Edimburgo. Natasha – que faz 35 em maio – ao chegar o momento da escolha profissional, falou para nós: “Pai jornalista, fudido; mãe fotógrafa e jornalista, fudida; irmão jornalista, fudido; vou fazer uma coisa que dê dinheiro, pelo menos.” Formou-se em Análise de Sistemas e Administração de Empresas. Por conta da TI, está há quatro anos fora do Brasil: dois na Austrália e os últimos dois em Stuttgart, Alemanha. Na impossibilidade de mandar os ovos de Páscoa, vou mandar o link do Rimsky-Korsakov para eles – duvido muito que ouçam.
Nesta época de aplicativos e redes sociais, ignoro o tipo de domingo de Páscoa que vivem as crianças. Duvido muito que tenha algo a ver com aqueles dos meus filhos. Que, na verdade, foram os meus domingos de Páscoa, inesquecíveis.
sexta-feira, 2 de abril de 2021
A Geração Anos de Chumbo põe as cartas na mesa • Por Roberto Muggiati
Era uma vez sete amigos, estudantes na cidade do Crato, no Ceará. Em 1968, na idade do vestibular, todos migrariam para tentar o ingresso na faculdade de uma importante capital do Brasil, como Fortaleza, Recife, Natal, Rio de Janeiro, São Paulo, Brasília e Belo Horizonte. Se o Crato foi o ponto de partida, os novos destinos dos amigos se diversificaram e a vida os separou.
Assis Lima em foto de 1976. |
Transcrevo aqui algumas destas cartas, todas endereçadas a Assis Lima, o interlocutor e editor – uma espécie de regente desta sinfonia literária sobre o Brasil no período de 1968 e 1977. Diz ele: “Como toda escrita é sempre uma construção também ficcional, poderíamos dizer que estas cartas são baseadas em fatos reais, de modo que qualquer semelhança com a realidade não será mera coincidência.”
Eugênio Gomez nasceu em Joinville, SC, em 1950, aos oito anos mudou-se para Belo Horizonte, passou pelo Crato e depois se formou em medicina pela UFMG, especializando-se em pediatria – daí sua afinidade com Assis Lima, igualmente médico, além dos interesses dos dois por literatura e cinema.
• “Pois romancista, meu caro, é Dostoiévski! Jamais houve e dificilmente haverá quem se lhe iguale. Aliás, meus monstros sagrados são Machado de Assis, Manuel Bandeira, Dostoiévski, Pelé, John Ford, Chico Buarque e outros poucos.” [1971]
Comentário em 2020: “Confesso que li Crime e Castigo aos 15, por sugestão de meu pai, que sabia de cor os 14 tomos encapados de vermelho-escuro em nossa nem tão pequena biblioteca e reli aos 21 anos, na azáfama do terceiro ano de Medicina: como tive saco, o que me impeliu? Não me lembro. Seria a delicada figura de Sônia, por quem estive amorosamente atraído nas duas leituras? Pergunto ao vento, sem respostas.”
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Crato, 1967: Tiago Araripe, José Esmeraldo. |
• “Fiquei muito chocado com a notícia do suicídio de A. Disseram que ele ligou o gravador, explicou por que se despedia da vida e – PUM – um tiro no ouvido. A princípio não acreditei. Mas sempre o achei muito estranho. Ele dizia, no São João Bosco, que ia suicidar-se, mas que antes mataria um bocado de pessoas com uma corrente, de pancada. Sempre levei na brincadeira, ou como impressão dele pelos filmes de James Dean e Paul Newman, ou por Hitler, a quem dizia que admirava. Não sei o que ele disse no gravador, pois as notícias que me chegaram foram incertas, confusas.
Comentário em 2020: "Alfredo Tavares, no cursinho, teve um choque enorme quando lhe contei o sucedido. Ele me disse que era um amigo de A. e que este sempre lhe falava que não passaria de 1968. Estou sentido com o que aconteceu. Apesar de não me dar com ele, representava algo na minha vida, na vida do Crato. A. sempre se julgou incompreendido e isso é o mais triste da história – era um desajustado ao meio onde vivia, não sei se você está compreendendo o que sinto, pois no fundo ele me influenciou um pouco e...” [1968]
Pedro de Lima nasceu em 1947 em Caxias, Maranhão, estudou no Crato, em Brasília, trabalhou na Universidad del Valle, em Cali, e é mestre em Antropologia Social (UFRN) e doutor em Arquitetura e Urbanismo (USP).
• “Que coisa triste a pátria acorrentada. Triste ver a pátria sendo apunhalada, traiçoeiramente. Tristeza, como o exílio na própria pátria. Calar não posso; gritar é perigoso. Não há ódio, não há vingança: o que sinto agora é nojo. Realmente, agora, lágrimas me vêm nos olhos. Já não queria tanto que elas irrigassem as rosas que cultivo. Queria minhas lágrimas lavando a vergonha, o sangue dos brasileiros que se derrama em minha Pátria! Inútil! Nem se todo mundo chorasse lavaria as manchas que enegrecem o solo brasileiro. ‘Ah! Triste tempo presente em que falar de amor e flor é esquecer que tanta gente está sofrendo tanta dor.’” [1968]
José Esmeraldo Gonçalves nasceu no Crato em 1948, mudou-se para o Rio de Janeiro – onde vive até hoje – em 1968. Foi repórter, chefe de reportagem e editor das revistas Fatos &Fotos e Manchete, subeditor do Segundo Caderno do Globo e editor das revistas Caras e Contigo. Como autor e pesquisador participou das coletâneas Esporte e Poder e Aconteceu na Manchete, as histórias que ninguém contou. Desde 2009 edita o blog Panis cum ovum, no qual os jornalistas que trabalharam em Manchete e nas outras revistas da Bloch continuam ativos – e criativos.
• “Na hora em que fui preso havia um clima de guerra, gente correndo, sozinho, tiros, bombas, sangue, pedras, falta de ar e luta. Fui metido num carro fechado. Estava um pouco machucado. Não sei bem o que pensei, talvez tenha pensado em Deus. Depois de rodar algum tempo pelas ruas, entramos num quartel (eu não tinha a menor ideia de onde estava). Fui revistado, checaram minha pasta. E passei pelo primeiro interrogatório. Fui levado até um imenso galpão, onde foram colocados mais de cem outros presos. Conversamos, discutimos e, quase 24 horas depois, deram-nos uma sopa. Após esse almoço, fomos transferidos em grupos de dez para o Dops. Novo interrogatório, mais rigoroso. Verificação de antecedentes. Mais perguntas. Até ser solto por ter sido a minha primeira entrada no Dops. Mas, fui advertido. Na segunda vez, posso ser enquadrado na Lei de Segurança Nacional (!). “Eles” acertaram o meu eu material, físico. “Eu” espírito, pensamento, saí enriquecido da experiência. Incólume!” [1968]
Emerson Monteiro nasceu em 1949 em Lavras da Mangabeira, no Ceará. É advogado, cronista, fotógrafo e artista visual. Ex-assessor de comunicação da Universidade Regional do Cariri, é o atual diretor administrativo da FM Universitária Urca. Autor e editor de livros, é membro da Academia Lavrense de Letras e do Instituto Cultural do Cariri (Crato).
• “Aqui [na Bahia], tenho participado das movimentações urbanas. Teatro. Cinema. Música. O MDB ganhando as eleições no Brasil todo. Eu com os olhos bem abertos – me emocionando. O povo – realmente existiria? A sede política me queima a garganta. O social.
Tenho lido pouco – andei cansado – tendo que manter o equilíbrio. Mas me livro do semestre da escola e virá dezembro – gordo e aberto. Virão também as festas da Bahia. A alegria desce e aliena a todos. As cores na cidade.” [1974]
Flamínio Araripe nasceu no Crato em 1952. É jornalista e assessor parlamentar na Câmara Federal. Foi correspondente do Jornal do Brasil e do Jornal da Ciência, do SBPC, no Nordeste. Em São Paulo trabalhou no Estado de São Paulo e Folha de S. Paulo. Foi editor de Cidade no O Povo, de Economia no Diário do Nordeste.
• “Flamínio Figueiredo de Alencar Araripe em 1971. O cabelo cortado e a cabeça crescendo claustrofóbica ante a relva verde. Careta e não gosta das modas do nada e do não – ou seja, o Crato e suas modas, juventude que contesta inerte aos pés do Establishment – isto está uma merda.
Papel rasgou e daí? Menos letras no espaço limitado por mais que se berre, a barra a ser forçada inexiste, os ares estão (in)formados para a forra – o trilho desperta o sono no som e engole o trem bocejando, sem esforço. A falta de sentido mostra claro sombrio o tema – a trama desdobra a rebordosa sob a exata porcaria o exato momento a falta de sentido mostra, delineando, o tema – na mata poeira levantando as partículas do pensamento e justamente etcetera. O mal do novo é preguiça ou cansaço. A maior burrice é a ignorância. Faltou o leite das cachorras do onde. A traça corrói muito sutil as bases definidas, defendidas, defasadas – a ilusão adiada de cada dia a dia. Minha bisavó é uma pessoa sensata e faria, na calma da velhice, uma dúzia de revoluções muito tranquila. [1971]
O editor
Assis Lima nasceu no Crato em 1949. Médico pela Universidade Federal de Pernambuco, especializou-se em Psiquiatria em São Paulo. Mestre em Psicologia Social (USO). Autor do livro Conto popular e comunidade narrativa (1985), com Prêmio Sílvio Romero – Funarte). Organizou a coletânea Contos populares brasileiros – Ceará (2003). Coautor dos infanto-juvenis Baile do menino Deus (1995), Bandeira de São João (2012), Arlequim de Carnaval (2011) e O pavão misterioso (2004). Autor de Poemas arcanos (2008), Marco misterioso (2011) e Chão e sonho (2011, poesia), tendo publicado pela Confraria do Vento os livros Terras de aluvião (2016), Poemas de riso e sizo (2017) e O código íntimo das coisas (2019).
As ditaduras sempre abominaram e perseguiram a cultura, pela "ameaça democrática" que ela representa. “Quando ouço alguém falar em cultura, saco logo o meu revólver." A frase, de uma peça antinazista encenada em 1933, ano em que Hitler assumiu o poder – erroneamente atribuída a Goebbels ou a Goering, asseclas do Führer – simboliza radicalmente a postura dos regimes totalitários em relação à cultura.
´Foi uma bela ideia da edição de Cartas da Juventude disponibilizar, numa playlist do Spotify, 60 canções citadas no livro, uma autêntica trilha sonora da época. Entre elas Caminhando (Pra Não dizer que não falei de flores), de Geraldo Vandré. Foi essa música, o hino das passeatas de 68, a gota d’água que levou a linha dura militar a decretar o AI-5 na sexta-feira 13 de dezembro de 1968. (Sim, artistas e intelectuais, homens e mulheres, não hesitaram em ir às ruas declarar o seu repúdio à ditadura, como na Passeata dos Cem Mil, no Rio de Janeiro.)
Vejam só que coincidência (ou confluência) feliz: no dia 15 de janeiro de 1985, depois que Tancredo Neves foi eleito Presidente da República pelo Colégio Eleitoral – pondo fim a quase 21 anos de ditadura militar – Cazuza arrebatava uma multidão de 250 mil pessoas no primeiro Rock in Rio cantando Pro Dia Nascer feliz.
https://www.youtube.com/watch?v=2khOoaB5gUo
Essa história daria um tratado, vou me limitar a breves pinceladas nas demais áreas. No Grupo Opinião, formado no Rio de Janeiro, depois do golpe militar, para afrontar a ditadura, Maria Bethânia surgia para a imortalidade na pegada do Carcará em 1965 no espetáculo Opinião. Em São Paulo, no Teatro de Arena, Vianninha e Guarnieri transplantam para os trópicos as ideias e táticas do “teatro engajado” de Bertold Brecht. No Teatro Oficina, Zé Celso faz montagens revolucionárias. Em meados de 1968, quando encenava um espetáculo inspirado na canção Roda Viva de Chico Buarque, a sala foi invadida e depredada, pelo Comando de Caça aos Comunistas, uma milícia paramilitar de neonazistas que adotou a sigla CCC em homenagem ao KKK americano.
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Terra em transe, de Glauber Rocha, lançado em 1967. |
Foi na fase light que o Cinema Novo deslanchou, muitas vezes com apoio oficial. Havia até uma Comissão de Assistência à Indústria Cinematográfica, a CAIC. Muitos diretores tiveram seus filmes de estreia lançados de pois do golpe: Joaquim Pedro de Andrade (O padre e a moça), Gustavo Dahl (O bravo guerreiro), Neville de Almeida (O bem-aventurado), Walter de Lima Jr (Menino de engenho), Maurício Gomes Leite (A vida provisória), Luís Sérgio Persson (São Paulo Sociedade Anônima), Maurice Capovilla (Bebel, garota propaganda), Sylvio Back (Lance maior), Rogério Sganzerla (O Bandido da Luz Vermelha), Julio Bressane (Matou a família e foi ao cinema).
Três protagonistas dos Oito do Glória, presos em 1965 numa manifestação contra o Presidente Castello Branco, fizeram importantes obras sobre o dilema do intelectual brasileiro da época: aderir ou não à luta armada. Carlos Heitor Cony e Antonio Callado escreveram os romances Pessach, a travessia e Quarup. Glauber Rocha fez um de seus filmes mais carismáticos, Terra em transe.
Depois do AI-5, o Brasil partiu para outras artes, ou malasartes: a filosofia de vida da Pilantragem, na música, e a pornochanchada no cinema. As artes plásticas sofreram o duplo impacto da pop art (que apagou as fronteiras de arte culta e arte popular) e da arte conceitual, que saiu das telas para os happenings, as instalações e tudo o mais que se quiser.
Como contestador-mor, destacou-se o carioca Hélio Oiticica, lançador das capas chamadas parangolés (um híbrido de arte plástica e dança) e do provocador lema “Seja marginal, seja herói”, numa serigrafia sobre a guerra entre bandidos honestos e policiais desonestos.
quinta-feira, 1 de abril de 2021
1962: o ano bom do cinema brasileiro
por Ed Sá
A propósito do post abaixo sobre a estreia de Os Cafajestes, em 1962, é justo complementar: naquele ano foram lançados dois outros filmes que também fazem parte da história do cinema brasileiro. Um deles foi Assalto ao Trem Pagador, de Roberto Farias. O outro, O Pagador de Promessas, dirigido por Anselmo Duarte.
O Assalto ao Trem Pagador levou para as telas um roubo espetacular que aconteceu no Rio de Janeiro, em 1960. A ação dos seis integrantes da quadrilha foi recriada com o mesmo trem e no mesmo ramal ferroviário do fato policial, mas o filme dramatiza principalmente a vida de cada um dos assaltantes após o roubo, com o bando tensionado pelas investigações e deslumbrado pela montanha de dinheiro (27 milhões de cruzeiros, com um salário mínimo valendo na época 13.440 cruzeiros) arrecadados.O Pagador de Promessas foi o primeiro filme brasileiro a conquistar a Palma de Ouro, em Cannes, e também a primeira produção nacional a ser indicada para concorrer ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro. Foi escrito e dirigido por Anselmo Duarte. Conta a história de Zé do Burro e aborda a intolerância religiosa, um tema bem atual.
Ele tanta cumprir uma promessa que fez em um terreiro de candomblé para salvar um burro doente. Zé carrega um cruz para levar à igreja de Santa Bárbara, mas o pároco se enfurece com a associação à religião afro e impede a entrada do penitente.
O elenco tinha, como destaques, Leonardo Villar, Glória Menezes, Dionísio Azevedo e Geraldo Del Rey, Anselmo filmou O Pagador em Salvador e Monte Santo, na Bahia.