terça-feira, 13 de abril de 2021

Abril é o mais cruel dos meses • Por Roberto Muggiati


Poesia numa hora destas? Sim, justo agora, o tempo dos assassinos (já proclamava Rimbaud em 1873 no poema Matinée d’Ivresse), o tempo dos genocidas, o tempo dos torturadores de criancinhas, o tempo dos queimadores de livros, o tempo dos toscos que odeiam a cultura e a beleza porque elas expõem a nu toda a sua barbárie e esterilidade.

Esterilidade é o tema do grande poema de T.S. Eliot The Waste Land/A Terra Desolada, publicado há cem anos em outubro de 1922. A genial sentença de abertura, April is the cruellest month, reflete admiravelmente o abril que estamos vivendo hoje. Abaixo, os versos iniciais do poema de Thomas Stearns Eliot (1888-1965) e sua tradução pelo poeta brasileiro Ivan Junqueira (1934-2014).


THE WASTE LAND

1. The Burial of the Dead

April is the cruellest month, breeding

Lilacs out of the dead land, mixing

Memory and desire, stirring

Dull roots with spring rain.

Winter kept us warm, covering

Earth in forgetful snow, feeding

A little life with dried tubers.


A TERRA DESOLADA

1922 (tradução: Ivan Junqueira)


1. O ENTERRO DOS MORTOS

Abril é o mais cruel dos meses, germina

Lilases da terra morta, mistura

Memória e desejo, aviva

Agônicas raízes com a chuva da primavera.

O inverno nos agasalhava, envolvendo

A terra em neve deslembrada, nutrindo

Com secos tubérculos o que ainda restava de vida.

PS • Alguns trechos de Matinée d’Ivresse/Manhã de embriaguez, de Arthur Rimbaud (1854-1891):

“Cela commença sous les rires des enfants, cela finira par eux. (...) Começou pelos risos das crianças, terminará por eles.(...)

Nous savons donner notre vie tout entière tous les jours.
Voici le temps des Assassins.(...)

Sabemos dar nossa vida inteira todos os dias.

Eis o tempo dos Assassinos.



PS –Em 1946, Henry Miller publicou The Time of the Assassins: A Study of Rimbaud. Acabo de ver na Estante Virtual uma tradução portuguesa, O tempo dos assassinos, por R$ 559,89.

 

Um comentário:

Prof. Honor disse...

Agônicas raízes com a chuva da primavera.
O inverno nos agasalhava, envolvendo
A terra em neve deslembrada, nutrindo
Com secos tubérculos o que ainda restava de vida.
O verão nos surpreendeu, caindo do Starnbergersee
Com um aguaceiro. Paramos junto aos pórticos
E ao sol caminhamos pelas aléias do Hofgarten. Genial...