segunda-feira, 8 de maio de 2017

Aterro do Flamengo: um eterno objeto de desejo e o que o "fato alternativo" tem a ver com isso...

Nos anos 1950, lobistas queriam construir prédios na faixa aterrada. A iniciativa, felizmente, não prosperou.
Foto Pedro Kirilos

A Marina da Glória, hoje privatizada, quer erguer um Centro de Convenções no local que já é um dos mais descaracterizados em relação ao projeto original do Aterro. Foto Alexandre Macieira

A mídia em geral, no mundo e no Brasil, investe em checagem de notícias com o objetivo de conter a onda de pós-verdades e de "fatos alternativos" - mentiras, na expressão correta -, que assolam as redes sociais, mas não apenas as redes sociais.

O jornalismo impresso não está, obviamente, livre do fenômeno. Omitir, falsear, deturpar o fato em nome de interesses corporativos, políticos, morais, religiosos etc, ou simplesmente errar, também gera pós-verdades e "fatos alternativos".  Ao não checar informações sob os vários ângulos, o jornalismo, impresso ou digital não só corre o risco de passar a informação errada como o de ser usado por interesses escusos. A pressa, a não localização imediata de uma fonte confiável, a pressão para fechar a página ou atualizar o site, tudo isso pode, às vezes involuntariamente, comprometer a correta apuração, mas ao ceder o jornalista assume o risco. Para o profissional, há ainda um obstáculo comum: muitas e empresas costumam mentir, diretamente ou através de assessorias, para proteger os seus interesses.

A nota original e...


...desmentido.

O Globo publicou as notas acima sobre a construção de um Centro de Convenções no Aterro do Flamengo, um parque tombado, na qual os empreendedores asseguravam ao jornal que não teriam problemas quanto à aprovação do prédio porque a paisagem não sofreria alteração.

Para a primeira nota, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional não foi ouvido.

O IPHAN tomou a iniativa de procurar o Globo, que hoje publica uma segunda nota sobre o assunto dizendo que não é bem assim e que o projeto ainda será analisado. No caso, a construção foi anunciada pela Riotur e Rio Convention Bureau. As duas instituições aparentemente entrararam na história como "bois de piranha", já que a concessão da Marina, que já foi questionada na Justiça, pertenceu a Eike Batista, hoje enrolado na Lava Jato, é atualmente da BRMarinas e, como a nota assegura, o empreendimento é "100% privado".

Há mais um risco para os jornalistas que queiram evitar os "fatos alternativos". É comum fontes não exatamente confiáveis usarem a imprensa para os chamados "balões de ensaio". Isso acontece quando interessados em ações de qualquer tipo, geralmente não plenamente legalizadas ou que podem gerar contestação, usam jornais para lançar um "teaser" como meio para saber até onde seu projeto ou iniciativa provocará reação, de onde virão as reações mais fortes, e o que precisará fazer para vencê-las. Essa é uma tática manjada, o que não impede que seja até frequente.

Voltando ao Aterro, uma das mais belas paisagens do Rio, o triste é que é preciso uma vigilância permanente. Já ameaçaram construir no local restaurantes, com o argumento de que seriam projetados pelo escritório de Niemeyer, a Comlurb chegou a instalar containers no local como um "posto avançado",  uma roda-gigante revindicou uma área para seu mafuá, já tentaram privatizar os campos de pelada, a mesma Marina da Glória já descaracterizou o Aterro com ampliações de interesse comercial, a frequente autorização para grandes shows danifica o Aterro e, apesar disso, continuam permitidos.

Esse mesmo tipo de edificação - como um prédio, como é a proposta para um Centro Convenções - foi evitado pelos arquitetos que projetaram a Marina: eles "enterraram" a construção para minimizar o impacto visual.

Talvez nenhuma outra área da cidade seja tão cobiçada por empresários sem noção.

Se o IPHAN cochilar a Rio pode acordar com espigões nos jardins de Burle Marx.

Aliás, nos anos 1950, houve pressões para que o então Distrito Federal permitisse a construção de condomínios de luxo nos terrenos aterrados. O Rio escapou por pouco de mais uma "selva de pedra".

Lota Macedo Soares, um das idealizadoras do Aterro, botou a boca no mundo e evitou o golpe que faria alguns milionários entre ilustres famílias e espertos políticos que defendiam um "projeto habitacional" chique para o Aterro.

Lota não está mais aqui, mas as ameaças, sim.

4 comentários:

J.A.Barros disse...

Já existe um restaurante no aterro do flamengo. A Marina tem sido disputada há anos e o último pretendente foi ninguém menos do que o "bilionário" Eyke Batista – como sempre envolvido em negociatas clamorosas – que depredou o antigo e tradicional Hotel Glória, monumento que guardava nos seus salões e quartos a presença de muitas celebridades internacionais que por ele passaram. Hoje, é muito triste quando passamos em sua frente e o que vemos é apenas uma carcaça do imponente prédio que durante anos foi além de ser um Hotel um ponto turístico do Rio de Janeiro. Esse foi um dos crimes cometidos pelo senhor Eyke Batista, que de repente surgiu no cenário brasileiro como um dos bilionários catalogado no mercado mundial.

J.A.Barros disse...

O Aterro dop Flamengo é um solo sagrado. E como tal intocável. Por favor, não pensem em chamar o escritório o escritório do Niemaier criarem qualquer obra no Aterro, senão teremos dezenas de IGLUS espalhados no sacrossanto espaço do Aterro.

Rick disse...

Até uma casa de espetáculos tentaram construir ali perto do Morro da viúva. Felizmente, parece que não foi permitido.
Mesmo ali no MAM, construiram aquele mostrengo que é o VIVO, uma casa de show. Dizem que fazia parte do projeto original, não importa, aquela horrenda extensão acabou com a perspectiva do MAM, ficou uma boa merda.

J.A.Barros disse...

É claro que não fazia parte do projeto original. Os idealizadores e executores desse projeto eram pessoas do bem e muita capacidade intelectual.