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Reprodução Twitter |
Jornalismo, mídia social, TV, atualidades, opinião, humor, variedades, publicidade, fotografia, cultura e memórias da imprensa. ANO XVII. E, desde junho de 2009, um espaço coletivo para opiniões diversas e expansão on line do livro "Aconteceu na Manchete, as histórias que ninguém contou", com casos e fotos dos bastidores das redações. Opiniões veiculadas e assinadas são de responsabilidade dos seus autores. Este blog não veicula material jornalístico gerado por inteligência artificial.
A Faculdade de Direito da USP divulgou, no dia 26-7, a "Carta às brasileiras e aos brasileiros em defesa do Estado Democrático de Direito". O documento já recebeu mais de 250 mil assinaturas de apoio entre ministros, juristas, membros do Judiciário, docentes, banqueiros, empresários, personalidades de várias áreas e nomes da sociedade civil, incluindo jornalistas.
"Em agosto de 1977, em meio às comemorações do sesquicentenário de fundação dos cursos jurídicos no país, o professor Goffredo da Silva Telles Junior, mestre de todos nós, no território livre do Largo de São Francisco, leu a Carta aos Brasileiros, na qual denunciava a ilegitimidade do então governo militar e o estado de exceção em que vivíamos. Conclamava também o restabelecimento do estado de direito e a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte.
A semente plantada rendeu frutos. O Brasil superou a ditadura militar. A Assembleia Nacional Constituinte resgatou a legitimidade de nossas instituições, restabelecendo o estado democrático de direito com a prevalência do respeito aos direitos fundamentais.
Temos os poderes da República, o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, todos independentes, autônomos e com o compromisso de respeitar e zelar pela observância do pacto maior, a Constituição Federal.
Sob o manto da Constituição Federal de 1988, prestes a completar seu 34º aniversário, passamos por eleições livres e periódicas, nas quais o debate político sobre os projetos para país sempre foi democrático, cabendo a decisão final à soberania popular.
A lição de Goffredo está estampada em nossa Constituição “Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de seus representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.
Nossas eleições com o processo eletrônico de apuração têm servido de exemplo no mundo. Tivemos várias alternâncias de poder com respeito aos resultados das urnas e transição republicana de governo. As urnas eletrônicas revelaram-se seguras e confiáveis, assim como a Justiça Eleitoral.
Nossa democracia cresceu e amadureceu, mas muito ainda há de ser feito. Vivemos em país de profundas desigualdades sociais, com carências em serviços públicos essenciais, como saúde, educação, habitação e segurança pública. Temos muito a caminhar no desenvolvimento das nossas potencialidades econômicas de forma sustentável. O Estado apresenta-se ineficiente diante dos seus inúmeros desafios. Pleitos por maior respeito e igualdade de condições em matéria de raça, gênero e orientação sexual ainda estão longe de ser atendidos com a devida plenitude.
Nos próximos dias, em meio a estes desafios, teremos o início da campanha eleitoral para a renovação dos mandatos dos legislativos e executivos estaduais e federais. Neste momento, deveríamos ter o ápice da democracia com a disputa entre os vários projetos políticos visando convencer o eleitorado da melhor proposta para os rumos do país nos próximos anos.
Ao invés de uma festa cívica, estamos passando por momento de imenso perigo para a normalidade democrática, risco às instituições da República e insinuações de desacato ao resultado das eleições.
Ataques infundados e desacompanhados de provas questionam a lisura do processo eleitoral e o estado democrático de direito tão duramente conquistado pela sociedade brasileira. São intoleráveis as ameaças aos demais poderes e setores da sociedade civil e a incitação à violência e à ruptura da ordem constitucional.
Assistimos recentemente a desvarios autoritários que puseram em risco a secular democracia norte-americana. Lá as tentativas de desestabilizar a democracia e a confiança do povo na lisura das eleições não tiveram êxito, aqui também não terão.
Nossa consciência cívica é muito maior do que imaginam os adversários da democracia. Sabemos deixar ao lado divergências menores em prol de algo muito maior, a defesa da ordem democrática.
Imbuídos do espírito cívico que lastreou a Carta aos Brasileiros de 1977 e reunidos no mesmo território livre do Largo de São Francisco, independentemente da preferência eleitoral ou partidária de cada um, clamamos as brasileiras e brasileiros a ficarem alertas na defesa da democracia e do respeito ao resultado das eleições.
No Brasil atual não há mais espaço para retrocessos autoritários. Ditadura e tortura pertencem ao passado. A solução dos imensos desafios da sociedade brasileira passa necessariamente pelo respeito ao resultado das eleições.
Em vigília cívica contra as tentativas de rupturas, bradamos de forma uníssona:
Estado Democrático de Direito Sempre!!!!"
* O texto entre aspas, acima, foi reproduzido do site Migalhas.com apoiado por dezenas de escritórios e departamentos jurídicos.
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Olena Zelenska na capa da Vogue. Reprodução Instagram/Foto de Annie Leibovirtz |
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Charme e glamour da primeira-dama da Ucrânia em meio a destroços de guerra. Reprodução Instagram/Foto Annie Leibovitz |
por Ed Sá
É possível rir de uma guerra? O cinema já mostrou que sim. Basta citar apenas dois filmes, M.A.S.H e How I won the War (Oh, que delícia de guerra, no Brasil) que ironizaram dois conflitos militares: o do Vietnã e a Segunda Guerra Mundial.
Quem agora prova, na vida real, que guerra também pode ser piada é a primeira-dama da Ucrânia, Olena Zelenska, que posou para capa e reportagem da Vogue, deixando-se fotografar pela célebre Annie Leibovitz com destroços ao fundo, posando perto de soldados e de barricadas.
A guerra na Ucrânia é uma tragédia em escala incompreensível que demonstra a falência moral dos líderes mundiais envolvidos. Glamurizá-la beira o absurdo. Desde que a edição norte-americana da Vogue divulgou a matéria das sua fotógrafa agora "correspondente de guerra", Olenna tem sido bombardeada nas redes sociais que classificam a sua atitude como um "desrespeito" às milhares de vítimas dos combates e dos mísseis.
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Jovens de Kiev voltam à balada. Reprodução O Globo |
Na mesma linha da "alegria", O Globo publica hoje matéria sobre a volta das baladas em Kiev. Os jovens caem na night movidos a Horilka, a popular vodca local. A foto também contrasta com a situação dramática vigente em várias regiões do país há 155 dias e sem conversações de paz à vista.
Sally Kellerman, a "Hot Lips" do filme M.A.S.H. |
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John Lennon no filme "Oh, que delícia de guerra". |
“UM HOMEM NUNCA É MAIS VERDADEIRO QUANDO ADMITE SER UM MENTIROSO”
Mark Twain
por Niko Bolontrin
Historicamente, clubes de futebol, entidades privadas, mamam no caixa público favorecidos pela demagogia política.
O caso mais recente é o do Flamengo que tem se aproveitado de ligações com Bolsonaro para conseguir patrocínio de banco público e emplacar leis que o beneficiam. No passado, o Flamengo ganhou de Getúlio Vargas um grande imovel no Morro da Viúva, na Zona Sul do Rio.
O clube da Gávea não está sozinho nesse tipo de armação. O Botafogo acaba de confirmar a longa concessão do Engenhão a preço módico. Lembrando que o clube agora é SAF e pertence a um americano. O mais grave é o proprietário do Botafogo exigir que a prefeitura do Rio autorize a destruição da pista de atletismo do estádio que sediou um Panamericano em 2007 e a Olimpíada 2016. O empresário acha que a pista de atletismo prejudica o torcedor por deixar muito longe o campo. O prefeito Eduardo Paes estaria propenso a se render à exigência do americano, esquecendo que o poder público gastou bilhões para construir o Engenhão e a pista de atletismo é essencial para o desenvolvimento do esporte olímpico no Brasil. A privatização do Maracanã, aliás, já acarretou a destruição de uma das melhores pistas de atletismo do Brasil. O estádio do Corinthians deixou dívida imensa com a Caixa com prazo para pagamento de quase 20 anos.
O Cruzeiro, agora propriedade de Ronaldo Fenômeno também está à caça de uma doação de terreno para construir seu estádio em Minhas Gerais.
Também recentemente, o Vasco, em vias de ser vendido para uma empresa americana, ganhou um mimo do ex- prefeito Crivella: o terreno do seu CT na Zona Oeste do Rio.
A jogada atual do Flamengo é ainda mais descarada. O clube mobiliza Bolsonaro e o próprio Eduardo Paes, certamente impulsionados por interesses eleitoreiros, para levar a Caixa Econômica a doar um valorizado terreno na região do Porto para o Flamengo construir seu estádio. Por enquanto, a Caixa resiste a presentear o clube da Gávea, mas as pressões são visíveis. Curiosamente, a mídia não crítica o possível Estádio Jair Messias Bolsonaro, o Bozolão, talvez porque apoie esse tipo de negociata quando envolve clubes de futebol. Aparentemente acha normal o poder público presentear cartolas e empresários, desde que seja em nome do futebol. Nesses casos, a bola é o álibi que nem o VAR da moralidade declara impedimento.
O Globo noticia que Bolsonaro foi ao Piraquê, na Lagoa, noRio, e foi "vaiado por uns e aplaudido por outros". O jornalão prefere poupar o Bozo e omite que ali é a sede esportiva do Clube Naval, o que dá outra e importante conotação à notícia. O Piraquê tem sócios civis "convidados", mas a maioria é de militares da Marinha. A nota foi publicada na coluna Ancelmo Gois.
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O poeta d’Annunzio na “cabine” do aeroplano de Curtiss. |
De férias no norte da Itália com os irmãos Max e Otto Brod, Kafka compareceu a um show aéreo em Brescia e ficou impressionado com o efeito do espetáculo sobre uma massa de 50 mil espectadores. O texto de Kafka foi publicado em 29 de setembro de 1909 no jornal Bohemia (a propósito, o evento ocorreu no sábado 11 de setembro, algum presságio kafkiano da data sinistra das Torres Gêmeas?)
Confiram um trecho do texto de Kafka, a primeira descrição de aeroplanos na literatura germânica:
“A torre do semáforo indica prontamente que o vento se tornou mais favorável e que Curtiss voará para o grande prêmio de Brescia. Estará começando? Mal concordamos que sim e o motor de Curtiss já está roncando, quase não se pode vê-lo, e já voa ele para longe de nós, voa sobre a planície que aumenta à sua frente, em direção ao bosque à distância, que agora parece se erguer pela primeira vez. É longo o seu voo sobre o bosque, ele desaparece, e o que fitamos então é o bosque, e não ele. Por trás de algumas casas, sabe Deus aonde, lá vem ele na mesma altitude de antes, e corre em nossa direção: quando sobe, veem-se as superfícies inferiores do biplano inclinando-se na escuridão; quando mergulha, as superfícies superiores rebrilham ao sol. Ele vem para a torre do semáforo e faz a volta, indiferente ao alarido com que é saudado, e retorna diretamente para o lugar de onde veio, e logo se torna pequeno e solitário.”
Kafka e os irmãos Brod encontraram-se em Brescia com o piloto francês Louis Blériot, famoso pela travessia do Canal da Mancha. Outra celebridade presente foi o poeta italiano Gabrielle D’Annunzio, que se aventurou a dar uma voltinha na “máquina” do piloto americano Glenn Hammond Curtiss.
A primeira corrida aérea, em 1910. Foto Smithsonian Museum |
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1972: a rua em obras. Foto Divulgação |
No mesmo ano, Jaime Lerner, o idealizador da primeira rua para pedestres. Foto Divulgação |
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A XV de Novembro adotada pelos curitibanos. Foto Facebook |
Na sexta-feira, 19 de maio de 1972, começavam em Curitiba os trabalhos de construção da primeira via exclusiva para pedestres no Brasil, na artéria principal da cidade, a Rua XV de Novembro, na quadra entre as ruas Monsenhor Celso e Marechal Floriano. Foi uma verdadeira operação de guerrilha urbanística, chefiada pelo prefeito Jaime Lerner. Ele comentou na ocasião: “Na semana passada, quando perguntei ao diretor de Obras quanto tempo levaria, ele me falou em cinco meses. Eu pedi em 48 horas. Ele respondeu: ‘Você está louco!’ Após muita negociação, os engenheiros concordaram que tudo poderia ser feito em três dias.” Com seu dom de síntese, Lerner disse: “Neste caso, a pressa é a amiga da perfeição!”
No livro recém-lançado A Rua e a Bruma, a Régua e o Compasso, Dante Mendonça descreve o que aconteceu: “A primeira etapa da nova Rua das Flores foi feita em 72 horas no trecho entre as ruas Marechal Floriano e Monsenhor Celso. Como se fosse uma ocupação em tempo de guerra, aproveitando o recesso do fim de semana. Na madrugada que se seguiu, operários, máquinas, caminhões e toneladas de pedras ‘petit-pavé’ passaram a cobrir a rua de brita e areia e a pavimentar todo o espaço entre a Praça Osório e a Marechal Floriano Peixoto. Passada a surpresa, o revestimento de ‘petit pavé’ da Rua das Flores [seu nome original, dos tempos pré-automóvel] encantou a cidade. Pela manhã estava instalado o primeiro centro urbano do Brasil reservado exclusivamente ao pedestre e que veio a ser um modelo para as principais cidades do país.”
A ação rápida visava a evitar que os comerciantes da área, temerosos com a mudança, embargassem as obras mediante mandados de segurança. “A pressa é nossa e a praça também”, declarou Jaime Lerner, antevendo o pronto término das obras, com a rua de pedestres cobrindo sete quarteirões da Rua XV de Novembro, da Praça Osório até a Praça Santos Andrade. O prefeito foi estratégico também no timing da sua intervenção. Curitiba sediava, de 16 a 20 de maio, o encontro Lazer e Urbanismo, promovido pelo Grupo de Urbanismo da União Internacional de Arquitetos, preparatório ao 12º Congresso da UIA, que aconteceria em setembro em Varna, na Bulgária. Arquitetos de todo o Brasil, da França, Suíça, Bulgária, Romênia, Hungria, Turquia e Líbano assistiram maravilhados àquela transformação, que levou Jaime Lerner a afirmar que o evento provocou a aceitação do calçadão da Rua XV “de fora para dentro”.
por José Esmeraldo Gonçalves
Enquanto o Brasil é obrigado a ouvir as imbecilidades de Bolsonaro e Paulo Guedes, o neoliberalismo selvagem destroi o sistema que salvou milhares de vidas durante a pandemia e é a única opção para a imensa maioria de milhões de brasileiros que não podem pagar planos de saúde.
Nos últimos dias, o "vampiro" Michel Temer ressurgiu do pântano em que, como golpista, ajudou a mergulhar o Brasil. Dizem os "analistas" que ele está se oferecendo para ser candidato a presidente pelo MDB. Já teria o apoio das oligarquias da mídia que foram suas parceiras no golpe de 2016. Quando assumiu o poder Temer logo começou a pagar a fatura do golpe, principalmente a reforma trabalhista que precarizou empregos, a reforma da Previdência, que surrupiou direitos e foi concluída no desgoverno seguinte e o suspeito teto de gastos, uma reivindicação dos especuladores e do mercado que trafica dinheiro.
Temer atendeu às pressões e criou um rigoroso teto de gastos. Suécia e Holanda já tiveram tetos de gastos menos radicais. São países com benefícios sociais e tinham gordura para queimar. O Japão instituiu teto de gastos e o abandonou em pouco tempo para enfrentar uma crise econômica e criar empregos.
Uma das grandes vítimas do teto de gastos é o SUS, como a Carta Capital demonstra na edição dessa semana. E Temer, o traidor da Constituição que agora se insinua como "salvação", deve estar planejando concluir sua obra de desmonte social do país. O caos na educação, o desemprego e a destruição ambiental também são produtos da paralisia que o teto de gastos impõe.
A mídia comprometida com o neoliberalismo ultrapassado está vibrando com a ressurreição de Temer. Ontem, o comentarista Gerson Camaroti, defendeu na GloboNews, com visível ardor, o teto de gastos como se estivesse no palanque de Temer e como se o Brasil fosse apenas um estúdio asséptico para viaipis endinheirados e lobistas.
Como se sabe, não há teto de gastos para orçamentos secretos, para o viagra das gloriosas forças armadas, para as Codevasf da vida nem para a corrupção em geral nos ministérios da Saúde e Educação. Nesses casos, o teto tem pé-direito altíssimo.
por José Esmeraldo Gonçalves
Os pesquisadores ainda recorrem a buscas em sebos e coleções particulares, contatam fotógrafos que trabalharam na Manchete e mantêm seus próprios acervos ou recorrem aos herdeiros daqueles que já se foram. E também buscam o conteúdo de reportagens e crônicas. Há no mercado vários livros que compilaram textos de Nelson Rodrigues, Paulo Mendes Campo, Rubem Braga, entre outros, publicados originalmente em Manchete.
"O Canto Livre de Nara Leão" está disponível no canal de streaming GloboPlay.
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Vittore Carpaccio: São Martinho, exposição permanente Arte das Igrejas em Zadar, Croácia. |
Segundo Arrigo Cipriani, atual dono do bar, o carpaccio foi servido pela primeira vez à condessa Amalia Nani Mocenigo, quando informou ao dono do bar que seu médico lhe havia recomendado o consumo de carne crua, rica em ferro, pois ela estava com anemia. O carpaccio, então, consistia em finas fatias de carne crua, temperadas com molho de mostarda, molho inglês, suco de limão, leite, sal e pimenta-do-reino branca. O prato foi nomeado carpaccio por Giuseppe Cipriani, o fundador e dono do bar, em referência ao pintor italiano, pois a cor vermelha forte do prato o fazia lembrar das pinturas de Carpaccio, que estavam na época em exposição numa grande retrospectiva na cidade.
Apliquei o conceito de um produto cru finamente fatiado não a alguma carne (depois da bovina, o carpaccio de salmão é a favorita), mas a um legume, a abobrinha, na versão italiana, chamada zucchini.
Carpaccio de abobrinha aos sabores aleatórios
• Alcaparras
• Teriyaki
• Chutney de abacaxi
• Mostarda amarela
• Ketchup
• Wasabi
• Algumas gotas de limão siciliano
• Salpicar moderadamente sal rosa do Himalaia
Todo cuidado é pouco com o Wasabi, a raiz forte japonesa: qualquer exagero é literalmente tiro e queda...
Curitibano, sou papa-pinhão confesso. O supermercado Princesa, que reina supremo neste buraco de Laranjeiras onde moro e que batizei de Baixo-Glicério, pode ter todos os defeitos do mundo – e os tem, sobejamente – menos um: nunca deixa, nos meses de inverno, de proporcionar fartas ofertas de pinhão (em bandejas ou a granel). Uma verdadeira proeza, considerando que, para o carioca, o precioso fruto da araucária é uma coisa muito estranha, próxima do ET.
Este ano, minhas elucubrações de entrevero de pinhão viajaram rumo a uma intersecção com meus experimentos de ratatouille tropical. Um dos resultados está na receita abaixo, sem dosagem precisa, ao bel-prazer do leitor, guiado por sua sensibilidade culinária.
Entrevero de pinhão à Ratatouille Tropical
• Um punhado generoso de pinhões cozidos.
Legumes cozidos:
• Dois ou três jilós cortados na longitudinal.
• Três ou quatro maxixes pequenos.
• Rodelas de uma abobrinha pequena.
• Iscas de um pimentão verde pequeno.
Opcional:
• Meia dúzia de quiabos em pequenas rodelas.
E, é claro, algumas taças de um vinho tinto chileno honesto a bom preço.
Embora não traga novidades, documentário "Sem precedentes" (Discovery+) sobre a familícia Trump tem o mérito de fazer uma ultrassonografia dos intestinos do clã. Sabe-se que desde a campanha do republicano sua estratégia golpista é copiada pela cópia pirata nacional, seu tosco similar bananeiro. Sobe esse ângulo, é curioso ver o original.
Fora do streaming é bem mais interessante acompanhar o desenrolar da comissão que investiga a conspiração dos Trumps e a invasão terrorista do Capitólio, que o Globo minimiza ao chamar de "espetáculo midiático".
Nos Estados Unidos a comissão é vista pela maioria da opinião pública como um pilar de defesa da democracia.
Com a queda de popularidade de Joe Biden, o risco Trump permanece como ameaça. As eleições parlamentares de novembro dirão o tamanho do perigo. Um derrota republicana pode estimular o partido a rejeitar um eventual canditadura de Trump a presidente em 2024. Se os republicanos dominarem o Congresso darão um grande passo para retomar a Casa Branca. Restará, entao, aos democratas encontrar um nome forte para suceder o desgastado Biden.
Logo nas primeiras semanas de governo, Bolsonaro alterou a Lei da Transparência. O sociopata ampliou o número de autoridades ou funcionários com poder de decretar sigilo sobre praticamente qualquer coisa. A inspiração é fascista, nasce nas leis implementadas por Mussolini nos anos 1920. Sigilo é a nova censura. Essa onda de vetar acesso público a documentos e procedimentos públicos é ferramenta do autoritarismo. E quando envolve gastos esconde impobridade administrativa, desvio de verbas e corrupção. O derrame de decretos de sigilo também acontece na área de segurança pública. Serve para esconder irregularidades e crimes. A mídia, principalmente, sente os efeitos do sigilo quando proliferam decisões de juízes que impedem acesso a informações sobre investigações ou se criam barreiras para o trabalho dos repórteres.
Desde janeiro de 2019, o autoritarismo tem o poder de, quando interessa, jogar o Brasil nas trevas.
Quem conspira contra a democracia trabalha melhor no escuro.
por Flávio Sépia
Bolsonaro decreta que jornalistas devem buscar emprego no paraíso celestial. Aqui na terra a barra vai pesar ainda mais. O sociopata baixou uma norma dando às TVs abertas o direito de vender 100% da programação para pastores. Até então, só podiam comercializar 25% da grade diária.
O lobby da indústria religiosa funcionou junto ao Planalto onde circulam mais pastores do que qualquer outro gênero humano. O resultado da decisão é que muitos repórteres, editores, câmeras e produtores poderão perder seus empregos. TVs abertas são concessões públicas, têm a obrigação constitucional de informar, prestar serviço à população, divulgar a cultura sem privilegiar ideologias e credo. Ao permitir que seitas sequestrem toda a programação, se assim desejarem as TVs, esse princípios vão para a sacolinha.
Para algumas emissoras será um dinheiro fácil. Por que disputar audiência, montar equipes, manter departamentos publicitários e jornalísticos se o caixa vai receber um tsunami de Pix do pastoreio que, por sua vez, pede ao distinto público um dilúvio em forma de cartões de crédito, débito, transferências eletrônicas e doações de bens?
por O.V.Pochê.
Houve uma época, há muitas galáxias, em que os jornais e revistas acionavam D.Estevão Betencourt, monge beneditino e professor da PUC, para comentar qualquer assunto.
Os repórteres mais antigos lembrarão.
Os temas recorrentes eram divórcio, ainda não aprovado, pena de morte que alguns obtusos queriam instituir, drogas, feminismo, violência, amor livre etc. Em matérias do tipo "enquete" D. Estevão era presença obrigatória. Talvez porque era atencioso, sensato, e ducado, culto e, muito importante, era acessível, recebia os repórteres ou falava ao telefone com a maior presteza. Na correria dos fechamentos, se um repórter era pressionado pelo chefe para repercutir um assunto, D.Estevão o salvava.
Sem comparar o íntegro monje com o Mourão - são semelhantes apenas na disponibilidade para falar com jornalistas -, a mídia atual tem seu "crush" para repercutir notícias.
Mourão foi ouvido por repórteres sobre o assassinato político de Marcelo Arruda pelo policial bolsonarista Jorge Guarani. Sempre com pompa e circunstância, empertigado como se fosse chefe da Estado de uma potência, Mourão comenta qualquer coisa. Repórter está sem pauta e precisa entrar em um link ao vivo. Tranquilo, bota um microfone na boca do falastrão. Geralmente ele expele uma opinião tosca. Mas as bobagens que diz o mantêm na mídia. Bom pra ele que agora é político e vai disputar votos.
A mais recente fala do Mourão chega a ser ofensiva. Ele classificou o assassinato político de Marcelo como uma coisa que acontece todo fim de semana. É um deboche.
Em um execício tragicômico, o que o modo Mourão de analisar os fatos diria sobre casos de assassinatos políticos ou de escândalos na atualidade e na História? Sigam o fio:
Bruno e Dom - "um simples desentendimento numa pescaria.
Marielle: "uma briga de trânsito".
John Kennedy - "bala perdida, uma fatalidade. Lee Oswald apenas manuseava o rifle, acontece.
Marat - " foi morto por uma mulher, aprontou alguma coisa, foi crime passional, acontecectida hora. Na época não tinha ambulância, demorou a ser atendido, perdeu muito sangue.
Lincoln - "uma fatalidade. Não deveria ter ido ao teatro. A peça em cartaz era muito ruim. Não valia a pena".
Chico Mendes - "foi crime passional. Acontece todo dia.
Zuzu Angel - "um acidente de trânsito. Um caso para mandar um reboque, nem precisava investigar".
Atentado ao Charlie Hebdo - "provavelmente foi a reação de um assinante desgostoso por não estar recebendo o jornal".
Invasão do Capitólio - apoiadores de Trump queriam fazer apenas um passeio turístico. Era uma despedida do governo que saiu do controle, acontece.
Morte de Genivaldo na câmara de gás do camburão - um erro na dosagem de gás. Isso aí acontece, pode ser defeito da bomba de gás. O rapaz deveria ter ofendido a respiração.
Escândalo de propinas para pastores dentro do Ministério da Educação - " isso aí foi esclarecido, pediam o dízimo que é dito na bíblia. Nada ilegal. Bobagem, o melhor que a mídia tem a fazer em mudar de assunto.
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Acima, reprodução do Globo, hoje, coluna de Ascânio Seleme |
por O.V.Pochê
Brasília está em festa. Foi decretado sigilo de 100 anos para o lugar onde a farra está acontecendo, mas recebemos essa selfie exclusiva. Saiu cara, custou um trator superfaturado. Uma das atrações da comemoração será um sorteio de emendas do relator que dará direito a 3 mil caixas d'água com sobrepreço amigo. Incluídas no quesito "despesas para exercício do mandato", verbas de gabinete custearam uísque em proporções bíblicas. Chope, picanha e Viagra estão no mela-cueca oficial como "doação para campanha". Charutos e as notas de 100 dólares para acendê-los foram pagos por verbas da Saúde. Tudo dentro da lei, segundo as assessorias de suas excelências. A festa não tem hora pra acabar.
Pode até ser que o Brasil acabe antes.
Deu no jornal na última terça-feira que em novembro a população do planeta ultrapassará os 8 bilhões. Em novembro estarei com 85 anos de idade. Portanto, só no meu modesto tempo de vida, este pequeno geoide teve sua população aumentada quase quatro vezes!
Há algum tempo criei um conceito que, se não repercutiu nos meios acadêmicos, deve ter sido por causa do Efeito Groucho Marx (“Eu jamais entraria para um clube que me aceitasse como sócio...”) Tenho a certeza de que é um conceito sólido que tem tudo a ver com as mazelas sócio-políticas do nosso tempo: a “poluição demográfica”.
Considero-me até um otimista, acho um milagre que a nave Terra ainda não tenha explodido. O excesso de gente se acotovelando pelas ruas – por necessidade de sobrevivência correndo atrás do leite das crianças, ou pela busca insana do prazer nas baladas da noite – é um espetáculo atroz.
A esta altura me vem à
cabeça aquela fala esperta e urgente: “Parem o mundo, eu quero saltar fora!”
Muitos já a ouviram, poucos sabem a origem. É o título de um musical de sucesso
dos autores ingleses Leslie Bricusse e Anthony Newley, Stop the World – I Want to Get Off, lançado em Londres em 1961 e
que depois fez sucesso na Broadway. Segundo o pianista Oscar Levant, o título
foi inspirado num grafito. Ah, a sabedoria dos anônimos.
O lado bom da pesquisa
da ONU que anunciou os 8 bilhões para novembro é que, pela primeira vez em meio
século, graças à Covid, a expectativa de vida no mundo caiu de 72,8 anos para
71 anos. No Brasil a queda foi ainda maior, de 75,3 para 72,8 anos. Segundo
esses critérios, estou com o saldo devedor, melhor ficar quietinho no meu
canto...
Monty Norman: o autor do tema do 007. Foto: Divulgação |
Posições como essa que o título do Globo anunciou há 60 anos são comuns na história do principal jornal da direita. O Globo foi contra salário mínimo, contra o decimo-terceiro, contra os Cieps, contra universidades públicas, contra sistema de saúde pública, contra reforma agrária, contra Bolsa Família, contra Minha Casa Minha Vida, contra luz para todos, SUS etc, muitos etcs. Para fazer valer sua ideologia e o ódio contra avanços sociais, O Globo foi e vai muito além do jornalismo. Ao longo da história apoiou golpes, desde a conspiração que levou Getúlio ao suicídio, o golpe e a ditadura de 1964, apoiou Collor a ponto de manipular um debate presidencial (no caso a TV Globo), fechou com o golpe que derrubou Dilma Rousseff, apoiou a eleição de Bolsonaro e deixa claro que em um eventual segundo turno nas próximas eleições vai de Bolsonaro e Paulo Guedes. Detalhe: João Goulart assinou a lei do 13* em 1962 quando O Globo já participava da preparação do golpe de 1964. O título que enfatiza o " desastre" já fazia parte do golpismo endêmico do jornal.
Reprodução - extra.globo.com |
Silva Jardim não teve a mesma sorte. Por Roberto Muggiati
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Silva Jardim |
Vale a pergunta: se vivessem na Alemanha nos anos 1930 certos comentaristas da mídia brasileira interpretariam o cenário político como "polarizado" e fantasiariam a teoria dos "dois lados iguais"?
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Reprodução Twitter |
Quando o insano Bolsonaro faz apelos às suas gangues armadas, está nandando um claro recado de violência. Recentemente, em Minas Gerais um terrorista aparentemente ligado ao agronegócio comandou um drone que lançou veneno sobre o público de um evento político de opositores do b deolsonarismo. No Rio, durante evento na Cinelândia, que reuniu uma multidão de apoiadores de Lula, Marcelo Freixo, André Cecíliano e Alexandre Molon, em outro ato de terror político um bolsonarista lançou uma bomba de fabricação caseira com fezes em área delimitada para o público do encontro partidário promovido por PT, PSB e PSOL. O incentivo oficial à campanha agressiva provoca nos anormais uma leitura de guerra. É preciso que a justiça puba exemplarmente essa escalada do terror, que procura atingir em última análise a democracia. A tragédia de Foz do Iguaçu é um alerta. O assassino anunciou a intenção de "matar todo mundo". Só não o fez porque apesar de atingido por tiros o líder petista ainda da conseguiu disparar sua arma (ele era guarda municipal) e, pouco antes de morrer, já caído no chão, feriu o terrorista bolsonarista e o impediu de consumar uma grande chacina.
PRIMEIRO ASSASSINATO POLÍTICO
Se a Folha recebeu um bom Pix para defender o cigarro eletrônico não se sabe. Mas é fato inusitado o jornal eleger o assunto para um editorial. Um dos mais fortes lobbies empresariais hoje em Brasília é o desse dispositivo cancerígeno. A Anvisa resiste bravamente com a ajuda da Associação Médica Brasileira e outras instituições. O argumento que o jornal dos Frias usa é um mote muito adotado pela ala mais radical do Partido Republicano dos Estados Unidos. Prega que cada um é dono do seu corpo e deve ter liberdade para fazer o que quiser. Deduz-se que o jornalão conservador defende agora a liberação da maconha, da cocaína, das anfetaminas, da roleta russa, do suicídio coletivo e da tatuagem de suástica. Pra tudo isso vale o argumento "cada um dono do seu corpo".
por Flávio Sépia
Inflação é talvez a palavra mais frequente no noticiário. É uma realidade. O que é irreal são os índices oficiais da inflação.
Delfim Neto, o czar da economia no período mais violento da ditadura. Foi signatário do AI-5 e avalizou o governo do ditador Garrastazu Médici. Era um dos seus mais importantes auxiliares. Em última instância, o dinheiro para a imensa máquina sangrenta da repressão, do pau-de-arara à cadeira-do-dragão, da remuneração de torturadores à gasolina para as viaturas que sequestravam brasileiros, do envio de agentes para cursos de tortura ministrados pelos Estados Unidos à caríssima estrutura dos órgãos de segurança, também saía do orçamento gestado por Delfim.
A mídia neoliberal ama Delfim. Chega ao limite mentiroso de desvincular o ministro mais próximo de Médici de tudo o que acontecia nos porões da ditadura. Um colunista volta e meia o elogia como um frasista genial e considera que só a verborragia de Paulo Guedes chega perto dessa "genialidade".
Delfim foi acusado de manipular a inflação no começo dos anos 1970. Segundo o falecido Walter Barelli revelou anos depois, já que a censura impedia na época notícias contrárias ao regime, foram encontradas planilhas fraudadas para cálculo de preços e de índices para correção de salários.
Naquela época, a falsificação dos níveis da inflação era feita à base da canelada e da canetada. O governo não devia satisfação a ninguém.
Hoje, um Paulo Guedes nem precisa mexer nos números da inflação ou falsificar planilhas. Há anos as normas tornam a "manipulação" legal embora ainda imoral. A estatística é apurada segundo os aumentos registrados em uma cesta básica de produtos. O problema é que a cesta é mutante. Aumentos sanzonais determinados pelo clima, falta ou excesso de chuva ou outros fatores são minimizados através de complicadas fórmulas matemáticas. Se o feijão dispara, some da cesta ou é relativizado; se o tomate sobe é limado do cálculo; se o chuchu alça voo é abatido na soma. Por isso, a inflação atual em pouco mais de 10% não reflete os 50%, 80,%,100% que você contabiliza no supermercado mais próximo e no seu orçamento familiar.
Se tivesse esses instrumentos criativos na mão Delfim Neto não teria sido acusado de fora da lei ao maquiar a inflação no governo Médici.
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Ciro Monteiro, o Formigão. Foto Divulgaçao |
O insólito episódio me veio à lembrança quando fazia para o Panis o alentado levantamento de celebridades mortas em desastres de automóvel. (Automorte: a megapandemia, 9/8/2021). Com um detalhe sinistro: a vítima, no caso, já vinha morta da cama de um hospital e estava a caminho do velório no São João Batista. Era o cantor de sambas Cyro Monteiro, estrela da Era do Rádio, conhecido pelos amigos como “Formigão”. Seu grande sucesso foi “Se acaso você chegasse”, composição de Lupicínio Rodrigues.
Pouca gente lembra, mas Cyro participou em 1956 como ator da peça Orfeu da Conceição, de Vinícius de Moraes, que o considerava "o maior cantor popular brasileiro de todos os tempos", rivalizando apenas com João Gilberto.Em 1965, Vinícius o brindou com um álbum inteiro, De Baden e Vinícius para Ciro Monteiro. Fiel ao seu estilo de vida, Formigão morreu aos 60 anos de cirrose do fígado.
Aquela “segunda morte” de Cyro Monteiro foi um prelúdio adequado àquela noitada macabra.
Justino Martins examinava – na parte iluminada da mesa em L que chamávamos “churrasqueira” – os cromos do malote de Paris que acabavam de subir do laboratório, com imagens chocantes do desastre do avião da Varig a poucos metros da cabeceira do aeroporto de Orly.
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Regina Lecléry |
O Titanic da ditadura
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A capa da Manchete com a cobertura da tragédia de Orly. Reprodução |
A página dupla da abertura da reportagem da Manchete |
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O Boeing 707 jaz no campo pouco antes da cabeceira da pista de Orly |
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O dramático resgate. Optamos por não reproduzir aqui as cenas mais chocantes do interior da aeronave incendiada publicadas na Manchete.. |
O senador Filinto Müller – homem forte da censura de Getúlio Vargas durante o Estado Novo – comemoraria seus 73 anos no dia seguinte em Paris, acompanhado da mulher, Consuelo (um sólido casamento de 47 anos) e do neto Antônio Pedro. Outro senador que tinha passagem marcada para aquele voo com a mulher era José Sarney, que desistiu à ultima hora da viagem. (Se embarcasse, a história do Brasil teria sido drasticamente reescrita). Sua vaga na primeira classe foi ocupada por Plínio Carvalho e sua filha de nove anos. Iria encontrar-se com a mulher e o outro filho do casal em Londres. Plininho, como era conhecido, fornecia equipamento de exploração petrolífera para a Petrobrás, pertencia ao café soçaite e jogava polo no Itanhangá Golf Club, onde um de seus parceiros era Wallinho Simonsen, ex-marido de Regina Lecléry, além dos colunáveis Ronaldo Xavier de Lima, os irmãos Klabin, Joaquim Monteiro de Carvalho e Didu de Souza Campos.
Também na primeira classe viajava o engenheiro Clayton Quinderé, que ia cuidar de negócios de sua firma de mineração na Europa. Dono de várias empresas no Nordeste, o cearense de 45 anos se dava ao luxo de morar num dos melhores endereços do Rio de Janeiro, o Edifício Chopin, ao lado do Copacabana Palace.
No livro Caixa-Preta/O relato de três desastres aéreos brasileiros, Ivan Sant’anna relata um episódio suprarreal:
“Enquanto o avião se afastava do clarão da cidade, no restaurante Antonio’s a foto emoldurada de Regina Lecléry despencou da parede, sem que ninguém a tocasse, num presságio do que iria acontecer naquela quarta-feira. ”
O voo transcorreu na atmosfera etérea das travessias transatlânticas, com o serviço de bordo da Varig – um dos melhores do mundo, ainda mantendo a qualidade impecável do seu criador, o austríaco Barão Max von Stuckart. Depois do conhaque e do cafezinho, foi exibido o filme “O dia do chacal”, lançado em maio no circuito anglo-americano e ainda indisponível nos cinemas brasileiros. Baseado no thriller de espionagem de Frederick Forsyth, filmado magistralmente por Fred Zinnemann, o “Chacal” culmina na tentativa de assassinato do Presidente francês Charles De Gaulle na cerimônia comemorativa do Dia da Libertação de Paris no Arco do Triunfo. Por uma coincidência curiosa, no dia seguinte ao da chegada do voo RG-820 a Paris, o sucessor de De Gaulle, Georges Pompidou, estaria no Arco do Triunfo para a comemoração do 14 Juillet.
O que poderia ter sido um voo inesquecível para os 117 passageiros, transformou-se em tragédia nos últimos minutos antes da aterrissagem em Orly. Um incêndio aparentemente causado por um toco de cigarro acesso jogado na lixeira de um dos banheiros dos fundos provocou uma nuvem de fumaça que rapidamente se espalhou pelo avião, já nos procedimentos de pouso, a poucos quilômetros da cabeceira da pista do aeroporto de Orly. A fumaça tomou conta também da cabine e impedia os pilotos de enxergarem; além disso, tinham perdido o contato com a torre de controle. O pouso de emergência foi feito a um quilômetro da pista de Orly, num campo de cebolas. Foi uma manobra miraculosa dos comandantes Gilberto e Fuzimoto que garantiu a integridade da aeronave. Mas, assim que avião estacou no campo de cebolas e saltaram ao solo os dez tripulantes e o único passageiro sobrevivente (Ricardo Trajano, 21 anos, que se recusou a ficar preso ao cinto de segurança e correu para a porta da cabine de comando), um forte incêndio se alastrou por toda a extensão do Boeing, carbonizando os corpos dos 116 passageiros mortos por asfixia (morreram ainda sete tripulantes) e derretendo parte do teto da aeronave.
Várias lendas e histórias ligadas à Teoria da Conspiração começaram a surgir no Day After do acidente. O histórico do 707 foi considerado “azarado”: construído em 1968, antes de ser comprado pela Varig trabalhou para a empresa de voos charters Seaboard no transporte de tropas norte-americanas para o Vietnã. A redecoração “bonitinha, mas ordinária” feita pela Varig não levou em conta a natureza inflamável do material usado. Houve também uma espécie de “vingança divina” por ter a Varig ajudado a ditadura a dar o golpe de morte na Panair – empresa sólida, mas cuja independência política incomodava os generais. Na tarde de 10 de fevereiro de 1965, numa canetada, o Presidente Castello Branco suspendia as concessões das linhas aéreas nacionais e internacionais da Panair e as outorgava à Varig, amiga do regime militar. Num conchavo combinado com antecedência, tripulações inteiras da Varig já estavam a postos nos aeroportos para assumir os voos da Panair daquela noite. (A Varig, por sua vez, cumpriria seu ciclo de desventuras e sairia totalmente do ar em 2006, depois de 79 anos de atividade.)
E a causa do incêndio? Uma tragédia daquele porte não podia ter sido causada por uma banal guimba de cigarro jogada no cesto de papéis do banheiro. A causa real teria sido a combustão espontânea de cargas de bancos ejetáveis de caça Mirage que o Boeing transportava no porão para serem trocados por apresentarem defeito de fabricação. (Entre 1972 e 1973 a Força Aérea Brasileira fez uma grande encomenda à França de caças Mirage III-E novos em folha.) Ivan Sant’Anna conta no seu livro: “Eu mesmo escutei essa história da boca de um veterano comandante da Transbrasil, que começou na empresa nesta época e teve a oportunidade de comentar o assunto comigo mais de uma vez. ”
A Manchete também saiu chamuscada
Aquela edição da revista fechou de madrugada na redação, rodou na gráfica de Parada de Lucas no sábado e foi às bancas na manhã seguinte, tirando o apetite da maioria dos comensais do farto almoço de domingo. As fotos eram chocantes, mostrando os corpos carbonizados dos passageiros. Alguns eram até identificados nas legendas, como o senador Filinto Müller e sua mulher.
Com seu prestígio abalado pelo acidente, a Varig achou que a Manchete havia exagerado na cobertura e rompeu relações com a editora Bloch. Não mais passagens de cortesia, nem transporte de malotes. O salvador da pátria foi um judeu romeno de baixa estatura, Joseph Halfin, diretor da Air France no Brasil (Oscar Bloch Sigelmann imediatamente deixou de chama-lo de “Petit Napoléon, como jocosamente fazia.)
O apanhador no campo de cebolas
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Comandante Gilberto |
Recuperado das lesões sofridas no acidente de Orly, ele voltou a voar, até se envolver em 1979 num dos acidentes aéreos mais nebulosos da história. Cito do Wikipédia, que fez um relato preciso dos fatos:
“O avião cargueiro Boeing 707-323C (Voo Varig 967) decolou do Aeroporto Internacional de Narita, em Tóquio, às 20h23 do dia 30 de janeiro de 1979. O destino final era o Aeroporto Internacional do Rio de Janeiro-Galeão, com uma escala nos Estados Unidos.
Vinte e dois minutos depois de decolar, o comandante Gilberto Araújo da Silva fez o primeiro contato com o controle de tráfego aéreo. Não havia qualquer problema a bordo. O segundo contato, previsto para as 21h23min, não chegou a ser feito.
O avião desapareceu sobre o Oceano Pacífico cerca de trinta minutos após sua decolagem em Tóquio. Nenhum sinal da queda, como destroços ou corpos, jamais foi encontrado. O voo de carga transportava, entre outros itens, 53 quadros do pintor Manabu Mabe, que voltavam de uma exposição no Japão. As pinturas foram avaliadas na época em mais de US$ 1,24 milhão. É conhecido por ser um dos maiores mistérios da história da aviação e um dos raríssimos voos civis comerciais que desapareceram sem deixar vestígios. Esse caso nunca teve uma causa específica, pois nunca foi encontrado nenhum sinal do PP-VLU (aeronave envolvida). Até hoje nunca foi encontrado nenhum sinal de vestígios plásticos, peças e/ou corpo dos seis tripulantes.
Teorias conspiratórias
O desaparecimento foi notado pelos controladores de voo após a falta de comunicação na passagem do Varig 967 sobre um dos pontos imaginários fixos sobre o oceano, usados na navegação e monitoramento de progresso de voo. Após uma hora de tentativas frustradas de se estabelecer alguma comunicação, o alarme foi dado e as equipes de busca e salvamento foram acionadas. Com a escuridão reinante, as buscas foram suspensas e só foram retornadas mais de doze horas depois da decolagem, na manhã do dia seguinte. Apesar de mais de oito dias de busca intensa no mar, nenhum sinal de destroços, manchas de óleo ou dos corpos dos tripulantes jamais foi encontrado.
A investigação interna da Varig não conseguiu resolver o enigma. No relatório final sobre o acidente, consta o seguinte: "Não foi possível encontrar nenhum indício que lançasse qualquer luz sobre as causas do desaparecimento da aeronave". Muitas hipóteses e teorias foram formadas a partir de então para tentar entender o que ocorreu com o Boeing 707 da Varig. As teorias da conspiração lançaram no ar algumas delas:
• Teria ocorrido um sequestro promovido por colecionadores de arte, já que no porão estavam as obras do pintor Manabu Mabe. No entanto, essas pinturas jamais foram achadas em lugar nenhum;
• O Boeing teria sido abatido por soviéticos, interessados em esconder segredos do caça Mikoyan-Gurevich MiG-25 do desertor Viktor Belenko, que supostamente estaria desmontado e sendo levado aos Estados Unidos no porão de cargas do avião;
• O ex-rádio-operador e ex-copiloto da Força Aérea Brasileira (FAB) Oswaldo Profeta chegou a escrever um romance chamado O Mistério do 707 para dizer que o que houve não foi um acidente. Ele acredita que a tripulação do Boeing pode ter cometido algum erro de navegação e penetrado no espaço aéreo soviético, uma área supervigiada. Segundo Profeta, é possível que o avião tenha sido abatido;
• Uma teoria conta que o Boeing 707 teria sido forçado a um pouso na costa da Rússia, onde os tripulantes teriam sido mortos;
• A hipótese mais plausível, no entanto, considera que, logo após a decolagem, com a aeronave já tendo atingido um nível de cruzeiro elevado, houve uma despressurização lenta na cabine, o que não causou a explosão da aeronave – ou seja, não foi uma descompressão explosiva – mas lentamente sufocou os pilotos. O avião, então, segundo a linha de raciocínio, voou com ajuda do piloto automático por muitos quilômetros mais, até que, acabou o combustível, caiu sobre o mar em algum ponto extremamente distante dos locais por onde passaram as buscas. Portanto, nenhum destroço foi encontrado, sendo provável – como largamente aceito – que estejam ou no fundo do vasto Oceano Pacífico, ou sobre alguma área inabitada do estado americano do Alasca.”
Também chamou a atenção o fato de que, num dos raríssimos casos da aviação comercial mundial, o comandante Gilberto protagonizou dois desastres aéreos com vítimas fatais – ele próprio incluído no segundo, vítima do que se poderia justificadamente chamar de A Maldição de Orly.
PS • O drama de Manabu Mabe
Manabu Mabe; Divulgação-Guia das Artes |