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segunda-feira, 14 de novembro de 2022

Mídia - "Caaaaalada! - Eliane Cantanhêde quer que Janja se manifeste apenas no quarto do casal

Janja no palanque. Foto de Ricardo Stuckert


por José Esmeraldo Gonçalves 

Ontem a Rede Globo exibiu no Fantástico uma entrevista com Rosângela da Silva, a Janja, casada com o presidente Lula e com participação destacada na campanha presidencial. 

Provavelmente, a entrevista foi gravada antes dos comentários machistas e preconceituosos que Eliane Cantanhêde lançou contra a socióloga. O protagonismo de Janja incomoda a jornalista. Autêntica, simples, sem a afetação que, aliás, a Cantanhêde transmite nas suas intervenções na TV, a entrevista de Janja foi uma resposta elegante ao ataque em estilo Século 19 que recebeu na Globo News. 

No fim quem restou exposta e obsoleta - e tem recebido milhares de críticas nas redes sociais - foi a jornalista. 

Afinal, o que a Cantanhêde quer para as mulheres brasileiras? Que vivam em "prisão domiciliar" enquanto os maridos não chegam do trabalho? Que usem uma tornozeleira afetiva?  

O humorista Chico Anysio interpretava um personagem, o Nazareno, casado com a coitada da Sofia. Cada vez que ela interferia em uma conversa, o marido disparava o bordão "caaaaalada!". 

"Ela não é presidente do PT, não é líder política”, disse a Cantanhêde. Para a jornalista, a socióloga "ocupa excesso de espaço". No mesmo comentário, ela definiu os únicos metros cúbicos nos quais Janja pode se manifestar: o quarto do casal. 

A Cantanhêde imita a famosa frase que Ciro Gomes disse sobre a função de Patricia Pilar, com quem estava casado: dormir com ele. 

Ciro se deculpou. A Cantanhede ainda não. 

Durante a campanha Janja recebeu muitas ofensas e foi vítima de fake news nas redes sociais. Ela verá, ao longo do mandato de Lula, que será um alvo de parte da mídia. Não falha. Dilma foi capa de revista por ser "nervosa", foi criticada até pelo "jeito de andar". A jovem Tereza Goulart, que fugia ao figurino conservador de "primeira-dama" (título deplorável, a propósito) era caluniada pelas "senhoras de Santana". 

Já Iolanda Costa e Silva, Scyla Médici, Lucy Geisel e Dulce Figueiredo só recebiam elogios. 

Em todo caso, democracia é melhor. Na sala, no quarto, no trabalho, nas ruas, na estrada, no morro, no asfalto...            

quinta-feira, 7 de abril de 2022

A mídia só pensa naquilo

por Flávio Sépia. 

O volume de tempo e espaço que a política profissional ocupa em jornais, revistas, sites, redes sociais, rádio e TV no Brasil e espantoso. Nos países desenvolvidos, eleições mobilizam os meios de comunicação, claro, mas não são tão absolutas nem tão massivas. O debate eleitoral já é intenso na mídia há quase um ano. A partir de agora vai virar coisa de doido. Isso não quer dizer que necessariamente melhora a escolha do eleitor. São discussões seletivas às quais candidatos fora do espectro político que manda no país têm pouco ou nenhum acesso. O fenômeno ocorre há muito tempo e a qualidade do voto só piora. Lembra de 2018, quando muitos  pilantras ganharam votos em todo o país e o povo iludido só descobriu depois?

A mídia neoliberal está engajada na busca da chamada terceira via (que os jornalistas em adesão ao marketing partidário estão chamando agora pela alcunha pomposa e falsa de Centro Democrático). Sonham com um candidato que rompa a dita polarização entre Lula e Bolsonaro, os atuais líderes das pesquisas. Um candidato assim evitaria que as oligarquias da grande mídia tenham que embarcar no jet ski de Bolsonaro como aconteceu em 2018. A melhor chance de um nome alternativo a Lula e Bolsonaro pode estar na estratégia de juntar no mesmo saco União Brasil, MDB, PSDB e Cidadania para sair com um candidato único. Dizem que isso será anunciado no dia 18 de maio. 

Como o Brasil é um país onde o que parece mudança pode ser apenas mais do mesmo, o candidato que pode sair do sacolão do "Centro Democrático" não tem nada de centro e tem pouco de democrático. João Dória, Simone Tebet, Eduardo Leite e Sérgio Moro, os mais cotados, foram eleitores de Bolsonaro ou bolsonaristas praticantes. 

Pesquisa recente da Quaest aliás indica que os bolsonaristas arrependidos não são tão arrependidos assume estão voltando para o curral do gado. 

Não é difícil imaginar que tipo de democracia pode sair desse centro elitista que só vê pobre em tempo de eleição ou em quadro de Portinari ou foto de Sebastião Salgado. Isso se em matéria de arte conheceram algo mais do que Romero Britto.

quarta-feira, 23 de março de 2022

Pastor pediu ouro para liberar verba. "Especialistas" afirmam que commodities antigas podem subir de cotação no mercado do gabinete dos atravessadores. Incenso, mirra, sárdio, crisólito e açafrão estão em alta no pregão

por Ed Sá

O Estadão, ao revelar mais um escândalo do governo Bolsonaro - dessa vez em um gabinete paralelo informalíssimo formado por certos pastores que fazem política e que mandava na grana no Ministério da Educação - e a Folha, em seguida, divulgando uma estarrecedora gravação da jogada, praticaram jornalismo do bom essa semana. Reportagem e investigação. 

Em alguns dos demais veículos, onde esses dois pilares do jornalismo andam escassos, o de sempre: comentaristas, âncoras e "especialistas" pegando carona nos furos dos outros e "repercutindo" o assunto junto com repórteres escalados para colher monótonos desmentidos já previstos e o twist carpado do governo para tentar contornar o incontornável: o uso de pessoas alheias à Educação como atravessadores de verbas públicas para prefeituras. Segundo um prefeito, um dos pastores pediu um quilo de ouro para facilitar o encaminhamento da bufunfa para um município. 

Esse aspecto interessante que não me escapa: o pastor recorre ao valioso ouro. Podemos esperar outras transações usando valores consagrados em tempos antigos? A mirra, por exemplo, era muito apreciada pelos efeitos terapêuticos. O incenso era bem cotado. Nos vilarejos mais imundos e onde mortos jaziam ao ar livre, essa resina aromática - acreditava-se que a fumaça subia aos céus -  chegava a valer mais do que o ouro. Entende-se. O mau cheiro devia ser um grande problema na época. Tanto que o olíbano, outra resina perfumada, também era commoditie. Era chamado de "suor dos deuses" e concorria em valor com o ouro. Podia ser usado como analgésico. Era produto de exportação e também servia para pagamento de dívidas e para limpar o nome nos "serasa" da Galiléia. A canela e o açafrão eram coisa fina. Supondo que um religioso influente da época pretendesse obter, digamos, a exclusividade de uma rota para transporte de especiarias, o "homem de bem" poderia prometer a autoridade um mimo em forma de carregamento de canela. Obteria a concessão, certamente. 

As pedras preciosas, claro, mandavam bem no mercado da corrupção. Além do valor em si, carregavam poderes místicos que lhes davam ainda maior importância. Se quisesse ter a mulher de um potentado com aliada, uma joia de jasper era tiro certo, simbolizava a paixão; sárdio, crisólito e calcedônia eram apreciados como reforço nos lobbies empreendidos por negociantes. 

Fica a ideia aos corruptos atuais. Em vez de carregar volumosas malas de dinheiro e entupir apartamentos com sacos de notas de 100 e 200 reais, poderão transportar com discrição pedras valiosos, incenso e mirra. As duas últimas também facilitariam a lavagem de dinheiro e evitariam problemas legais. Duvido que o Banco Central fiscalize o mercado de especiarias é e improvável que a justiça eleitoral exiga dos políticos candidatos declaração de bens em olíbano e açafrão.

Antes que eu me esqueça: não me venham falar em intolerância religiosa. Pastores que fazem politica são políticos e devem ser tratados como tal sempre que estiverem nessa atividade. Intolerância religiosa é outra coisa. É, por exemplo, atacar e incendiar terreiros de religiões afro-brasileiras e destruir imagens de santos católicos.


domingo, 24 de maio de 2020

Pornô-política: suruba autoritária em reunião ministerial com orquestração de palavrões



CENA 1
"DÁ LOGO UM ESPORRO"



* O clima é de reunião de alunos do ensino médio, turma do fundão. As redes sociais usam o termo "gado" para designar os fanáticos seguidores da seita bolsonariana. Pois a expressão pejorativa acaba de ganhar up grade. Bolsonaro trata os ministros - e alguns deles parecem se comportar de acordo - como se bovinos fossem. O uso de palavrões faz parte do protocolo. Bolsonaro fala e os demais se sentem à vontade para imitar. O enquadramento humilhante dos ministros por parte do "líder' é outra coisa que chama a atenção. Lembra as paródias dos filmetes do Hitler que as redes sociais adaptam a todas as situações. O coronel Jarbas Passarinho entrou para a história por sua participação na reunião que aprovou o AI-5s, em 1968. "Às favas, senhor presidente, neste momento, todos os escrúpulos de consciência”.  Se estivesse à mesa, no Planalto, no fatídico dia 22 de abril de 2020, Passarinho se sentiria à vontade  - e não apenas por estar cercado de militares- para ressignificar e resumir sua famosa frase. Bastava dizer 'foda-se a consciência" e estaria sob medida no figurino do Planalto.  




CENA 2 
"ESSES PULHAS"

* Bolsonaro abre a reunião advertindo os ministros. É proibido falar com a imprensa: os pulhas. Nenhum ministro se manifesta. Alguns permanecem de cabeça baixa. 


CENA 3

"O PRÍNCIPE AUTORIZOU"

* Lorezoni bate um papo na Árábia Saudita e acha que descolou bilhões de dólares. Acredita que o "príncipe" vai morrer nessa grana sem saber nem onde vai aplicar. "Temos dez bilhões de dólares da Arábia Saudita que precisa definir onde vai botar". Do jeito que ele fala, pode até desejar nos cofres do Centrão que o governo está abarrotando. Lorezoni é como aquele caipira que cai no conto da loteria. Ou como a "cinderela" seduzida na calada da noite. Pergunte se o "príncipe" até hoje compareceu com a grana "prometida". 

CENA 4 
NINGUÉM TÁ VENDO. É HORA DE PASSAR A DESREGULAMENTAÇÃO 
POR BAIXO DA MESA


* O ministro quer brincar de esconde-esconde. Total tática 171. Sugere que o pais e a imprensa distraídos com a epidemia oferecem o momento para baixar decretos e portarias que o povo não precisa saber. Na verdade, o jogo sujo do ministro já está em execução: o desmatamento na  Amazônia cresce exponencialmente, perdão de multas e demissões no Ibama fazem a festa dos criminosos na região, enquanto os brasileiros estão preocupados com a Covid-19. 

CENA 5
BOLSONARO É O PRÓXIMO CHURCHIL, O ROOSEVELT BRASILEIRO



* Esse aí exagerou na bajulação. O saco bolsonariano deve ter saído avariado dessa reunião. Justiça seja feita: não apenas esse elemento manejou o saco presidencial. Tantas eram as mãos apalpando o "líder" que este saiu da mesa para botar um pouco de gelo no indigitado.

CENA 6
O COWBOY QUE TEM 15 ARMAS E PODE MATAR OU MORRER

* O burocrata acima está com a macaca. Baixou um Rambo no fulano. Aparentemente, o tema da reunião era um projeto de desenvolvimento que o próprio governo detonaria dias depois dessa pajelança de ministros. Mas o sujeito acima é um "revoltoso" e prefere discorrer sobre o que faria se tivesse a filha retirada da praia em tempo de isolamento social. Promete pegar 15 armas que guarda no seu arsenal família. 

CENA 7

DAMARES DIVULGANDO FAKE NEWS NA REUNIÃO





Damares "denuncia" que a "esquerda" está contaminando aldeias na Amazônia só para "colocar nas costas do presidente". Já é público a a ministra costuma ver coisas. Dessa vez, ela "flagrou" uma conspiração para disseminação do coronavírus. Ninguém riu ao ouvir o novo delírio da figura, mas Damares está pronta para ser roteirista de filmes de terrir. 


CENA 8
"ODEIO, ODEIO"



* Weintraub fala como se interpretasse o papel de um ditador de chanchada. Reclama que só ele quer tocar fogo no país e se ferra por isso. Insiste que quer lutar. É uma espécie "generalíssimo Franco" de cabaré. Erra ao não perceber que esse lugar já está ocupado em Brasília.


CENA 9
FAMÍLIA AMEAÇADA DE LEVAR FODA


CENA 10
"PERDE O MINISTÉRIO QUEM FOR ELOGIADO PELA FOLHA OU PELO GLOBO"




* Uma cena significativa. Bolsonaro assume claramente que quer formar uma milicia particular armada; diz que tem um serviço de informação privado;  e confirma que interfere na PF em palavras, na reunião, e em atos antes e depois desse encontro com ministros.

CENA 11
A LA MUSSOLINI: "FAZ GINÁSTICA, CANTA O HINO, BATE CONTINÊNCIA"



* Uma sequência importante. Nela Paulo Guedes, tido pela mídia como "ministro técnico", mostra que é mais uma das anomalias ideológicas do governo federal. Uma Damares com filtro.


sábado, 11 de janeiro de 2020

A mídia neoliberal e o jornalismo de mercado na ilha da fantasia





por Flávio Sépia

Em relação ao governo Bolsonaro, a mídia neoliberal tem, como se vê, duas linhas claras; apoia ferozmente a política econômica, o ajuste fiscal selvagem, os cortes de programas sociais e a supressão de direitos trabalhistas, previdenciários etc, e reserva algum espaço para críticas nos campos ambientais, de educação, política externa e temas de comportamento.

No fim de dezembro, essa mídia exaltou um suposta recuperação da economia, saudou previsões do mercado e passou dias soltando fogos de artifício editoriais a estatísticas, inclusive uma sobre aumento de vendas do comércio no fim de ano que se revelou inconsistente.

Foram os efeitos do espírito de Natal, dos fogos de artifício e do espumante?

O ano virou e a realidade veio à superfície. Inflação acima da meta, ao contrário do que os jornalistas e colunistas de mercado festejaram, queda brusca da produção industrial, explosão do endividamento das famílias, aumentos de produtos, serviços e alimentos, além de queda das exportações e uso das reservas estratégicas em dólar, o que significa começas a queimar o colchão que evita o caos nas contas.

Se no dia da divulgação desses números desfavoráveis a abordagem foi discreta, hoje o assunto praticamente sumiu das primeiras páginas. A exceção é a Folha que, mesmo assim, atribuiu as nuvens negras que jogaram água no chope neoliberal apenas à carne.

A ilha da fantasia começou o ano sob terremoto.

terça-feira, 26 de novembro de 2019

Fatos: o Brasil rebobinado...

por José Esmeraldo Gonçalves (*)

Dê uma olhada nessa edição da Fatos. Você provavelmente vai achar que lembra o filme Feitiço do Tempo, quando o dia da marmota se repete como farsa.

Na capa, o general Newton Cruz era apresentado como "o guru da nova direita". A ditadura acabara de ser enterrada, a viuvada não queria largar o osso e tentava influir na política. Conseguiram, de certa forma. Mas levaram exatos 34 anos. O guru não foi o Cruz de ontem e atende pelo nome do Bolsonaro de hoje. A matéria de Luiz Carlos Sarmento e Carlos Eduardo Beherensdorf vinha com um título premonitório; "Direita: por dentro do ovo da serpente". Um "manifesto" lançado por aquela ultra direita, reproduzido pela revista, poderia ser divulgado pelo Planalto hoje. Veja o trecho sobre a ameaça do "dragão do comunismo": "Liberais oportunistas, populistas embusteiros, assessores da desordem, minorias vociferantes, idealistas do ódio, vingativo vorazes e aliciadores das massam tentam encetar uma campanha de desmoralização das Forças Armadas".

Um assassinato também assombrava o governo. Apesar das tentativas de arquivar a investigação, o delegado Ivan Vasques insistia em ouvir agentes do SNI supostamente envolvidos no caso Alexandre von Baumgarten, ex-colaborador da ditadura. A suspeita era que sua morte tinha carimbo oficial: queima de arquivo.


De Brasília, vinha uma matéria sobre a desintegração dos partidos políticos. Não, o PSL de Bolsonaro ainda não existia. As siglas em crise eram PMDB, PFL, PDS.



Em entrevista às repórteres Lenira Alcure e Maria Luíza Silveira, Jair Menegueli, presidente da CUT, profetizava: "Trocamos a ditadura militar pela ditadura econômica". E o neoliberalismo nem era a palavra da moda.


A editoria de Cultura da Fatos publicava a crítica da peça "A Filha do Presidente", assinada por Marli Berg. Patricia Pillar fazia Paula, a filha, e Ari Leite encarnava o presidente Bermudez, descrito como "rico em  palavrões e grosserias estereotipadas". Não, o autor Hersch Basbaum nem sonhava com o atual clã que manda no país.

O repórter Rodolfo de Bonis visitou prisões do Rio de Janeiro. a matéria é dramática. Superlotação, falta de assistência jurídica, violência etc. E abordava um tema que os diretores dos presídios evitavam admitir: a separação de presos. Falange Vermelha de um lado Falange Jacaré de outro e celas para protestantes, gays, "faxinas" e "alienígenas", como a direção classificava os estrangeiros. Um preso também deu uma declaração premonitória ao se referir a um tipo de criminoso que, segundo ele, deveria estar na cadeia e não está: "São os bacanas das contas na Suíça".


Na editoria de Economia, o destaque era uma matéria de Rosângela Fernandes sobre as "moedas" que os abonados usavam para escapar da inflação enquanto o populacho sofria com o cruzeiro debilitado e corroendo salários. Eram "moedas" que não faziam parte do dia a dia das pessoas, mas compravam apartamentos, carros, terrenos e passagens para Miami. ORTN (Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional), UPC ( Unidade Padrão de Capital) só frequentavam bolsos de fino trato. O dólar no câmbio paralelo também era o seguro contra a inflação adotado da classe média alta pra cima e longe do alcance da geral do Maracanã. Esta tinha que se virar com o cruzeiro desvalorizado diariamente. Um dos entrevistados para a matéria foi Paulo Guedes. Ele mesmo, o atual ministro da Economia, então vice-presidente do Ibmec (Instituto Brasileiro do Mercado de Capitais). Ontem, Paulo Guedes impulsou a alta do dólar - extremamente lucrativa para os especuladores - ao sonhar com o AI-5 e declarar que não se preocupa com o câmbio que, não por acaso, está fazendo Brasil queimar reservas. Quem sabe, além do ato institucional ditadura, Guedes queira o Brasil, mais adiante, de volta ao controle do FMI.


A última página da Fatos era da seção Hip Hop, de Cláudio Paiva, que fazia uma bem-humorada crítica dos acontecimentos. O Congresso estava polarizado, então, em torno da discussão sobre a adoção ou não do segundo turno para as eleições. Entre as fotocharges, uma era sobre o clima de briga no plenário; a outra sobre a entrada a la Patton do general Newton Cruz na política. Era piada. Mas o dia das armas como argumentos estava para chegar.

Não parece que é hoje?

(*) Fui editor-executivo da Fatos e atesto que todas as referências acima foram colhidas de uma mesma edição da revista, a de número 12, que foi para as bancas em 10 de junho de 1995. 


sábado, 29 de junho de 2019

Angelina Jolie é a nova editora-contribuinte da revista Time. Na primeira reportagem, ela questiona políticos que são eleitos com promessa de reprimir refugiados




A partir da edição que está nas bancas dos Estados Unidos e no site da revista, Angelina Jolie estréia como a nova editora-contribuinte da Time. A primeira matéria é sobre famílias de refugiados do Sudão do Sul. A atriz e ativista é enviada especial do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados.

"Quem vem à mente quando você imagina um refugiado? Você provavelmente não imagina um europeu. Mas se você fosse filho da Segunda Guerra Mundial e perguntasse a seus pais o que era um refugiado, eles provavelmente teriam descrito alguém da Europa. Mais de 40 milhões de europeus foram deslocados pela guerra. A Agência de Refugiados da ONU foi criada para eles. Nós esquecemos disso. A atitude de alguns dos líderes que proferem a mais dura retórica contra os refugiados hoje remete ao passado de países que já passaram por experiências trágicas de refugiados e foram ajudados pela comunidade internacional". 

Ao primeiro sinal de conflito armado ou perseguição, a resposta humana natural é tentar tirar seus filhos do perigo. Ameaçadas por bombas, estupros em massa ou esquadrões de assassinato, as pessoas juntam o pouco que podem carregar e buscam segurança. Refugiados são pessoas que escolheram deixar um conflito. Eles puxam a si mesmos e suas famílias através da guerra, e freqüentemente ajudam a reconstruir seus países. Estas são qualidades a serem admiradas.
Por que então a palavra refugiado adquiriu conotações tão negativas em nossos tempos? Por que os políticos são eleitos com promessas de fechar as fronteiras e recusar os refugiados?"

Essa é abertura da reportagem de Angelina Jolie. Dá o que pensar nesses tempos de fanatismo neofascista.

O TEXTO COMPLETO ESTÁ NA TIME AQUI

segunda-feira, 7 de janeiro de 2019

Memória da redação: as eternas assombrações do Verão

por José Esmeraldo Gonçalves

Em dezembro de 1989, a revista AZ me pediu que escrevesse sobre o último Verão (89/90) de José Sarney, que entregou o cargo em 15 de março de 1990 ao recém-eleito Fernando Collor.

Aquele Verão foi praticamente todo do Sarney. Michel Temer, personagem da recente saideira, ao contrário, não curtiu a última estação integralmente - a data oficial da posse foi antecipada para 1° de janeiro - mas as entressafras presidenciais, datas à parte, mostram mais semelhanças do que diferenças na temporada mais quente do ano.

Uma dessas diferenças: Sarney mandou no país durante inacreditáveis cinco anos, que era o tempo do mandato hoje fixado em quatro. Com toda razão, o Brasil estava de saco cheio do bigodudo. Uma semelhança em relação à atual transição: Collor havia sido eleito por um partido pequeno, o que a realidade política mostra que não é problema, tanto que os jornais publicavam a cada dia a relação crescente de deputados que acabavam de aderir ao novo presidente.

Abaixo do Planalto, o país queria saber "quem matou Odete Lara", Marisa Monte pregava a ejaculação precoce ("vem depressa, dentro de mim, me beija, me faz esquecer, bem que se quis), Senna, Xuxa eram notícia. O fetiche nacional era um colarinho branco. O novo presidente anunciava o fim das barreiras à importação, a desestatização, redução da máquina administrativa e a demissão de funcionários públicos. O que não anunciou antes, mas logo chegou após e posse, foi o confisco da poupança e dos depósitos bancários superiores a Cr$ 50.000,00 (cinquenta mil cruzeiros).

Na Nova República de Sarney o figurino que se despedia era o jaquetão de seis botões. Não foram poucos os empresários pedintes que o vestiram antes de audiências no Planalto. O governo Collor ainda não tinha um nome, alguns jornais diziam que a Era Collor ia começar, outros já anteviam a República das Alagoas. Sem jaquetõesCollor iria popularizar as camisetas com frases.

Dizem que presidente que deixa o cargo sai com a sensação de que não passou de ano, que os amigos somem, que ninguém telefona, que o cafezinho vem frio, têm saudade da roupa lavada e da comida boa, das viagens pagas e dos presentes. Para fechar a matéria, recorri a uma "fake news", o "diário" em que Sarney relatava seu "drama" e se queixava dos últimos dias. O homem estava triste. Mas a política não o abandonaria nem vice-versa.

Uma cena recente deu até a impressão de que aquele Verão 1989/1990 não passou: Sarney e Collor estavam no Congresso, neste 1° de janeiro de 2019, como convidados da posse de Jair Bolsonaro.

Resistentes, eles permanecem, de um jeito ou de outro, assombrando a vida pública quase trinta anos depois. O que mostra que Verão o Brasil tem de sobra. O que nos falta é Primavera.




Reproduções Revista AZ. Clique nas imagens para ampliar. 

terça-feira, 23 de outubro de 2018

Da revista Fatos: Nova República na máquina do tempo

As urnas de 2018 fecham um ciclo político e, para alguns analistas, marcam o fim da Nova República.

O jornal Libération publicou agora, em 12 de outubro, o artigo "Brésil: la fin de la nouvelle République (1985-2018)" reforçando essa tese.

Para as novas gerações, Nova República deve ser algo tão ficcional quanto o foi na época. Ao discursar durante sua campanha para o colégio eleitoral, Tancredo Neves usou a expressão criada por seus marqueteiros para para dar uma griffe à era pós-ditadura. Tancredo se foi, Sarney pegou a cadeira e bastaram alguns meses para ficar claro que a "nova" política não era nova nem republicana.

Em dezembro de 1985, nove meses depois de instalado, o governo paria a censura. Assim como o governo militar havia proibido a exibição do filme "O Último Tango em Paris", de Bernardo Bertolucci, aquela república que se pretendia nova fechou o ano vetando "Je Vous Salue, Marie", de Jean-Luc Goddard.  O slogan de Tancredo era "Muda Brasil". Não vingou. A proibição ditada por Sarney ficou como uma espécie de símbolo do que não mudou. Outro foi a política de "esquecimento" efetivada com a destruição de documentos dos órgãos de segurança da ditadura. A economia também reeditava figurinos anteriores, adulterava a inflação, falsificava os índices de remuneração da caderneta de poupança e fantasiava a economia (como mostrava o artigo abaixo, o ministro Dilson Funaro alterou, na época, o sistema de indexação da economia, evitando que a correção monetária fosse calculada pela média ponderada dos três meses anteriores, passando a refletir a inflação, sempre mais baixa, "prevista" para o mês seguinte). Tal qual o regime anterior, praticava-se a manipulação de índices.

A Nova República não morre agora. A Nova República não existiu.

O que está de vela na mão e rabecão na porta, de novo, é a Democracia.

Clique na imagem para ampliar

quinta-feira, 21 de junho de 2018

Capa da Time: a besta encara sua pequena presa

Matéria da Time lança uma pergunta sobre os Estados Unidos: "que tipo de país nós somos?
Para compor a montagem da capa, a Time usou o detalhe de uma foto dramática de autoria
do fotojornalista John Moore, da Getty Images. O fotógrafo flagrou o instante em que uma menina chorava desesperadamente ao ser separada da mãe na fronteira do Texas com o México. A foto foi reproduzida
em centenas de países e se tornou o símbolo da crueldade da política imigratória de Donald Trump. 

quarta-feira, 18 de outubro de 2017

Fotografia: a persiana da vergonha...







O fotógrafo Luís Nova, da D.Press-Brasil, fez uma foto especial para o Correio Braziliense e emplacou espaços nas capas de quatro jornais, hoje. 

A imagem de Aécio Neves, em casa, em Brasília, ontem à noite, após sua esmagadora vitória no Senado, é a mais representativa da derrota da ética em um jogo de cartas mais do que marcadas desde que o STF abriu a porteira para a impunidade dos políticos. 

É o retrato simbólico de um sujeito privilegiado que sabe que foi posto acima da sociedade e dos demais cidadãos e, mesmo assim, não tem coragem de encará-los. 

É a tradução mais perfeita do político que vê o Brasil apenas pela fresta dos seus interesses pessoais. 

Além do Correio Braziliense, o jornal O Povo, de Fortaleza, e O Globo destacaram a foto. O Estadão também a usou, em segundo plano.

A foto de Luís Nova é uma dessas que resume para a história um instante significativo da deformação de um sistema que produz castas privilegiadas. 

Seus favorecidos estão tão à vontade nas suas torres de luxo que dispensam a sociedade. O máximo de satisfação que dão dos seus atos é uma persiana entreaberta por alguns segundos.  

ATUALIZAÇÃO EM 19/10/2017 - 

  
A foto que ganhou primeira página de vários jornais, ontem, distribuída como sendo de Aécio Neves, após a votação que devolveu ao mineiro investigado por corrupção o cargo de senador, não seria do politico do PSDB. O staff de Aécio informa que o homem da fresta é um dos seus assessores. O Globo de hoje publica a correção. Não foi revelado até o momento o nome do assessor. 

domingo, 9 de julho de 2017

Futebol: facções, e não torcidas, tocam o terror nos estádios

O Vasco vai comemorar em 2018, 120 anos.

O mínimo que o torcedor pode esperar é que o clube festeje a data na primeira divisão do futebol brasileiro.

Em um século de existência, talvez os anos mais difíceis do Vasco sejam esses últimos 20. Embora nesse período tenha sido campeão brasileiro e do Mercosul, em 2000, da Copa do Brasil de 2011 e Carioca de 2015 e 2016, além da Série B de 2009, o clube e o time nunca foram tão instáveis.

O maior adversário do Vasco na luta pela permanência na elite do futebol brasileiro não está no campo, mas nos corredores, nas salas e nas arquibancadas de São Januário. Com o fim da era do presidentes realmente beneméritos como Manuel Joaquim Lopes, João Silva, Agathyrno da Silva Gomes e Antônio Soares Calçada, a política interna do clube tornou-se predatória.

As eleições vascaínas acontecerão em novembro desse ano, mas a campanha já incendeia São Januário. Ontem, o briga de torcidas, que pode custar ao Vasco a interdição do estádio, com enorme prejuízo para a equipe que luta em campo, tem por trás essa disputa eleitoral. Um fato que se evidencia nos últimos conflitos. E é difícil encontrar puros nessa guerra suja. Situação e oposição vão lutar corpo a corpo até jogar o Vasco de volta à Série B.

A consequência será acelerar a corrida do Vasco rumo ao triste destino de outro querido clube carioca, o America?  Possivelmente. Nos últimos anos, sucessivas diretorias e a ação da oposição estão arrastando o Gigante da Colina ladeira abaixo, tal qual aconteceu com o tijucano America.

São vários os problemas que afetam os clubes, hoje. Dos financeiros aos morais e éticos. Sem administradores competentes, que deixem de lado interesses e vaidades pessoais, fica difícil. E, digamos, o mundo corporativo do futebol atual não ajuda.

Quando se fragilizam, os times ficam ainda mais expostos às pressões e interesses do empresários. Muitos jogadores já nem pertencem aos clubes, estão ali na vitrine enquanto aguardam uma "janela" para pular fora, com intermediários e atravessadores pegando carona nos valores.

E há questões ainda mais críticas. Tradicionalmente, entre os grandes clubes, dirigentes, de oposição e situação, não importa, apoiam e são apoiadas por algumas torcidas organizadas. Facilidades como ingressos, passagens etc entram no pacote de bondades. Acontece que, atualmente, o quadro de violência e de criminalidade urbanas se reflete em certas facções (a maioria nem merece mais o nome de torcidas). Grupos oriundos de comunidades dominadas pelo tráfico brigam não pelo futebol mas pela rivalidade entre as quadrilhas organizadas, veem no "inimigo" uniformizado o "alemão" vinculado a um sigla criminosa adversária. Caso ainda fossem controladas, em tese, pelos dirigentes que as apadrinham, até mesmo essa mínima porção "ordem" foi pro brejo. As facções estão desembestadas. O torcedor autêntico, aquele que leva o filho ao estádio, cada vez mais, e com razão, foge das arquibancadas transformadas em arenas de conflitos. Em dia de jogos, até vestir a camisa para ir ao botequim da esquina, mesmo longe dos estádios, é ato de coragem, e se "uz alemão" passarem em um ônibus lotado e descerem pro pau? Já aconteceram vários casos assim, recentes, envolvendo torcedores dos grandes clubes do Rio, de São Paulo, de Coritiba, de Porto Alegre etc. Por  isso, facções de um mesmo clube brigam entre si.

O poder publico geralmente se omite e atua apenas em momentos críticos. Investigar, identificar, prevenir e punir os integrantes das facções que aterrorizam estádios e ruas seria pedir demais?

O conflito de ontem, que começou nas arquibancadas de São Januário entre supostos vascaínos e continuou nas ruas próximas, fez mais uma vítima fatal.

Para encerrar esse post deprê, um pequeno detalhe histórico: ironicamente, as torcidas organizadas surgiram nos anos 1950, sob a inspiração do jornalista Mário Filho, como um instrumento de paz nos estádios. Com instalações maiores construídas, ampliadas ou reformadas para a Copa do Mundo de 1950, como Maracanã, Pacaembu, Durival de Brito, em Curitiba, Ilha do Retiro, em Recife, o Eucaliptos, em Porto Alegre, o Independência, em Belo Horizonte, este, como o Maracanã, erguido especialmente para o Mundial, imaginou-se que torcidas organizadas, com líderes carismáticos, ajudariam a conter os excessos dos demais torcedores, além de ilustrar a festa com charangas e bandeiras. Afinal, estádios como o Maracanã e o Pacaembu, podiam receber, respectivamente, 200 mil e 50 mil espectadores. Eram torcidas únicas, só nos anos 70 começaram a se desmembrar e surgiram as organizadas de bairros, cidades etc.

Dulce Rosalinda, a torcedora-símbolo do Vasco

Jaime de Carvalho, o chefe da Charanga do Flamengo
No Rio, havia uma exigência para um torcedor liderar uma torcida: ter ficha limpa na chefia de polícia do então Distrito Federal.

Dois dos mais famosos foram Jaime de Carvalho, da organizada do Flamengo, e  Dulce Rosalinda, do Vasco.

Pode ser lenda urbana, mas contavam antigos cronistas que foram as organizadas, especialmente as do Vasco e do Flamengo, que evitaram um quebra-quebra no Maracanã e contiveram torcedores revoltados em um certo e trágico domingo, 16 de julho de 1950.

Aquele mesmo, o dia em que o Brasil perdeu a Copa para o Uruguai.

quinta-feira, 9 de março de 2017

O arraiá do beija-mão... #éironiaentendeu?

Parece que foi ontem: fila do beija-mão na corte de D. João  VI.  Reprodução
Na foto histórica, Otávio Mangabeira dá uma lambidinha "irônica" na mão de Eisenhower.
A imagem virou logotipo de submissão. Foto de Ibrahim Sued.


No filme "O Poderoso Chefão", cenas de beija-mão se repetem.
No caso, respeito e esperteza, que ninguém era bobo da corte.
Quem teria coragem para dizer a Don Corleone que o beijo era "ironia"?

por O.V.Pochê

Palavras e expressões e gestos são forças vivas e se reinventam ao longo dos tempos e eventos. Por exemplo, acabo de perceber que ironia não tem mais a acepção antes conhecida; festa de aniversário também não; e beijo na mão virou "questionamento".

Na política, ironia, agora, mais lembra um comentário que Leonel Brizola dirigia a correligionários que demonstravam incontido desejo de aderir ao adversário. "Fulano está costeando o alambrado". A intuição do gaúcho era tão aguda que, muitas vezes, nem mesmo o político que olhava para o alambrado com olho rútilo de cobiça, como diria Nelson Rodrigues, sabia que estava prestes a pular o muro rumo a novas conexões. As previsões de Brizola sobre a instabilidade existencial de certos companheiros geralmente se confirmavam.

De tão dissimuladas, as novas ironias deveriam vir com bula elucidativa. Ou com um aviso em hashtag: #éironiaentendeu?

A definição de ironia enquadra a frase ou expressão por meio da qual se diz o contrário do que se quer dar a entender. Ou seja, se você der um respeitoso beijo na mão em um elemento que tem ideias opostas às suas, na verdade você pode estar querendo passar ao público ou à mídia não um sinal de submissão mas um monte de ironia. O gesto não mostrará mas você quis destemidamente aproveitar uma reunião sócio-marqueteira para fazer graves cobranças e questionamentos através do tal beijaço. Só não entende isso quem tira o beija-mão do contexto, como se diz, ironicamente.

Beija-mão já rendeu foto histórica. Em 1946, Dwight Eisenhower visitou o Brasil. Atento, o então fotógrafo Ibrahim Sued registrou a reverência profundamente submissa do deputado baiano Otávio Mangabeira à mão do general que a Segunda Guerra Mundial tornou famoso e que governaria os Estados Unidos de 1953 a 1961. O vexame foi ainda maior porque Eisenhower ia apenas cumprimentar Mangabeira mas este, sôfrego, abocanhou a mão do visitante. Anos depois, entrevistado pelo jornalista Murilo Melo Filho, um dos diretores da extinta Manchete, Mangabeira confessou: "Me deixei trair pela emoção. Quando vi aquele homem estendendo a mão para mim, pensei que ele não queria apertar a minha mão, queria que eu beijasse…

Já as festas de aniversário dos ricos, famosos e poderosos há muito não são apenas para cantar inocentes "parabéns", são eventos de pessoas jurídicas ou ação de marketing para lustrar imagens e proporcionar selfies da realidade nacional. Ninguém está ali a passeio. Quando o mailing list de tais eventos é político, na atual fase, aí o bicho pega. São tantos os citados em delações reunidos em uma mesma sala que não demora muito os convites para tais festas serão tornozeleiras eletrônicas customizadas. E isso não é ironia.

quarta-feira, 19 de outubro de 2016

A fé não costuma "faiá"... Repórter Fernando Molica tira o Apocalipse do armário

Coube ao repórter Fernando Molica, que nos anos 1980 foi free lancer da Fatos & Fotos e da Manchete, revelar o que parecia óbvio mas até aqui não despertava o interesse da mídia em geral: as pérolas do pensamento fundamentalista do candidato a prefeito do Rio, Marcelo Crivella, registradas em livros que a campanha do sobrinho do Macedo e do aliado do Garotinho preferiria que permanecessem empoeirados no fundo do baú.

A onda conservadora tem favorecido políticos que acenam com a perigosa mistura, como o mundo mostra, entre política e religião. O que é lamentável e não vai acabar bem.

O caso do Rio é exemplar. Um candidato acusado de agredir a mulher foi justamente rejeitado pelo voto feminino. Como em um jogo sem saída, um não-tem-tu-vai-tu-mesmo, o Rio poderá ser governado por um religioso que, segundo revelações do Molica, expressou nos livros que escreveu ou organizou o "dogma" de que a mulher deve ser submissa ao homem.

Antes, definiu religiões que não a sua como "diabólicas", usou um termo racista, "mundo amarelo", para dizer que no Oriente "os espíritos imundos vêm disfarçados de forças e energias da natureza".

Demônios são responsabilizados por vícios, homossexualidade e doenças, o que sugere que uma "política" de saúde "eficiente" seria espalhar pela cidade clínicas ambulatoriais para expulsão do diabo dos corpos e mentes.

Hoje, o site Conexão Jornalismo tira do armário mais um dado revelador.



É a música "Chute na Heresia" onde o atual candidato comenta o famoso chute em uma imagem de N.S Aparecida perpetrado por um colega pastor, Sergio von Helde.

A canção faz parte de um CD de Crivella e a letra não poderia ser mais explícita: "Na minha vida dei um chute na heresia / Houve tanta gritaria de quem ama a idolatria / Eu lhe respeito meu irmão, não quero briga / Se ela é Deus, ela mesmo me castiga" (...) "Aparecida, Guadalupe ou Maria / Tudo isso é idolatria de quem vive a se enganar / Mas não se ofenda meu irmão, não me persiga / Se ela é Deus, ela mesmo me castiga".

Além de ironizar o ponta-pé em um símbolo religioso caro a milhões de brasileiros católicos, a letra tem notas ameaçadoras e meio "bélicas": "Eu vou cortar o poste de baal? Atropelar a jezabel com meu cavalo/Lançar a pedra na cabeça do golias/E lutar a cada dia contra essa idolatria/Eu quero ver a babilônia despencar/E a fornalha não queimar/Aquele que só serve a Deus/O mar aberto, nosso povo a passar/Faraó a se afogar no meio do mar vermelho".

Crivella tem acusado o opositor, Marcelo Freixo, de supostamente apoiar a tática black bloc.

Mas esse versinho aí, meu amigo, é puro black bloc do fundamentalismo.

Barra pesada. Eu, hein?

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