terça-feira, 5 de março de 2013

Comissão da Verdade faz História. Mas precisa ir mais fundo...

Reprodução
por Gonça
Para a Folha de São Paulo, foi a "ditabranda". A odiosa definição que o jornal atribui aos anos de chumbo. Talvez por isso, parte da imprensa, especialmente a paulistana, pouco se ocupe do trabalho da Comissão da Verdade. Parece temer que as investigações cheguem às viaturas que, no caso da Folha, foram cedidas aos órgãos de repressão, nos anos 70, para operações dissimuladas contra opositores do regime. É conhecida a denúncia de que aquela foi uma das suas contribuições à Oban, a violenta organização civil-militar financiada por empresários paulistas, e que torturou, assassinou e violentou centenas de brasileiros. Mas muita "gente boa" estava por trás dos massacres públicos ou privados da época. É a história que não foi escrita. 
O Globo de hoje publica matéria sobre Iara Iavelberg. Era a namorada do guerrilheiro Carlos Lamarca. Na época, e até hoje, endossava-se a versão de que Iara teria se suicidado. Hoje, surgem as provas de que foi assassinada. Em um país que tentou varrer para baixo do tapete a crueldade e a corrupção da ditadura instalada em 1964 e que até hoje homenageia generais torturadores com nomes de cidades, avenidas, pontes, a Comissão da Verdade é um fato histórico, apesar das suas limitações. Já são listadas inacreditáveis formas de tortura e morte: simulação de afogamento, de fuzilamento, afogamento real, fuzilamento real, "subversivos" lançados de aviões em alto mar, introdução de objetos e até de animais em vaginas e ânus, espancamento de crianças na frente dos pais, choques elétricos. Vai longe a imaginação sádica dos militares e civis que submeteram o Brasil à sua mais triste era.
Em parte pela censura, em parte por afinidade, a grande mídia ajudou a difundir o mito de que não houve corrupção na ditadura. "Negativo, operando", como diria um militar. São muitos os escândalos. Há numerosos sinais da roubalheira mesmo na imprensa sob censura. Geralmente, não eram aprofundados e logo sumiam da pauta. Os raríssimos casos que resultaram em investigação oficial e, estes, tiveram apuração motivada muito mais por brigas internas do que para desmonte do mega esquema. Outro dia, passou no Canal Brasil o documentário sobre a Panair. Estreou nos cinemas há alguns anos, com pouca repercussão, embora muito bem feito, e, ao atingir a TV por assinatura certamente deve ter alcançado um bom público. Lá está exposto o longo braço corrupto da ditadura. Seria um vertente necessária a uma futura etapa da Comissão da Verdade. Empresas como a Panair e a TV Excelsior foram sufocadas por interesses comerciais representados por autoridades militares. No documentários, vê-se como aviões, linhas e escritórios da Panair (que não faliu, tão somente teve suas rotas cassadas de um dia para outro) foram repassadas para a concorrente Varig, de origem gaúcha, apoiada pelos generais. Hoje a Varig é passado e a Panair é história. Mas há centenas de casos registrados em todo o país. Desde concorrências entre amigos, que obviamente afastavam empresários que tiveram alguma ligação com governos democráticos anteriores, até a tomada pura e simples de grandes e pequenas empresas e sufocamento planejado de outras. É outra história que não foi escrita ainda, essa sobre o lucrativo "serviço secreto" empresarial da ditadura, que tinha seus órgãos de repressão e, em paralelo, órgãos de expansão de riquezas e fortunas particulares.    


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