sábado, 7 de abril de 2018

Flashes de Edla • Por Roberto Muggiati

Edla van Steen. Foto: Divulgação


por Roberto Muggiati 

Conheci Edla Lucy van Steen – morta na sexta-feira, 6 de abril, em São Paulo – ao longo das últimas sete décadas. Nascida em Florianópolis – o pai era cônsul honorário da Bélgica, a mãe era de origem alemã – ainda adolescente foi estudar num colégio de freiras em Curitiba. Eu a conheci no começo dos anos 1950, nos programas de auditório do Clube Curitibano, nas manhãs de domingo. O apresentador era o futuro jornalista José Augusto Ribeiro e Edla (um ano mais velha que eu) se apresentava lendo contos seus, atividade que prenunciava sua carreira de escritora, com mais de 25 livros publicados.

Odete Lara e Edla van Steen no filme "Na Garganta do Diabo"

Tinha uma irmã mais moça, da qual não lembro nada, nem o nome; a estrela era Edla, que em 1959, aos 23 anos, estreou no cinema, ao lado de Odete Lara, no filme de Walter Hugo Khouri, Na garganta do diabo, com tomadas espetaculares nas Cataratas do Iguaçu. A esta altura, Edla já estava em seu primeiro casamento, com o pintor mineiro Loio Pérsio, que morava em Curitiba. Teve com ele seu primeiro filho, Ricardo van Steen – o nome foi homenagem ao melhor amigo do casal, o designer de móveis Ricardo Fasanello.

Os seis meses que passei no Brasil, de fevereiro a agosto de 1962 – entre dois anos de Paris e três anos de Londres – me levaram muitas vezes a São Paulo. Foi lá que reencontrei Edla, através de um amigo comum, o jornalista e escritor Nelson Coelho, um dos maiores divulgadores do zen-budismo no país. Edla já tinha separado de Loio Pérsio, uma briga de casal com uma vidraça estourada lhe valeu uma cicatriz no rosto. Estava feliz e de bem com a vida, casada com um dos arquitetos mais conceituados de São Paulo.

Edla constava do caderno de endereços que levei para Londres, onde trabalhei por três anos no Serviço Brasileiro da BBC: morava na Rua São Carlos do Pinhal, 345/1401, eu lhe mandava cartões postais das minhas viagens. Tendo renovado meu contrato, tudo indicava que eu me deixaria ficar na Velha Albion.  Acabaria me tornando um daqueles “móveis e utensílios” brasileiros da BBC (não eram poucos) e estaria vivendo hoje como um aposentado do Brexit. Foi quando casei e minha mulher disse logo a que veio, mudando toda a minha vida. Desfiz o trato para continuar na BBC e viemos para o Rio em junho de 1965. Ela decretou que eu entraria para a carreira diplomática e faria dela – ou ela mesma se faria – uma embaixatriz de sucesso. Na viagem de volta paramos em Paris, onde encontramos com o Loio Persio, que morava lá, e acertamos o aluguel do seu ateliê em Santa Tereza, onde eu estudaria para os exames do Itamaraty. Estava muito em cima da hora, passei nas primeiras quatro provas, mas fui reprovado na quinta. Uma praga de camundongos nos expulsou da Rua Aprazível e descemos correndo para o Leblon. Um dia meu amigo Narceu de Almeida, me levou para almoçar na Frei Caneca e me jogou praticamente nos braços dos Bloch. Comecei a trabalhar como repórter especial da Manchete logo depois do feriado de 15 de novembro de 1965.

Minha primeira mulher, Lina, quando era casada com um grande doleiro, costumava hospedar Loio e Edla em seu apartamento. Depois da ruptura do casal, depreendi que ela fazia parte da torcida do Loio e, na verdade, sempre mantivera com a Edla uma relação de amor-e-ódio.

Segundo casamento: vou com a nova mulher, Lena, a uma grande feijoada de sábado na casa do Cícero Sandroni, no Cosme Velho. Lá reencontro Edla van Steen e colocamos a conversa em dia sobre os dezessete anos que havíamos passado sem nos ver. A vida é feita cada vez mais de saltos e de relações fragmentadas. A última vez que vi e falei com Edla foi há cinco, seis anos, no aniversário de nosso amigo Carlos Leal, na Avenida Atlântica; estava acompanhada do último marido, o crítico teatral Sábato Magaldi.

Rever a Edla, agora, só mesmo através das belas imagens de sua juventude no filme de Walter Hugo Khouri.

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Um comentário:

Christina disse...

Como diz um dos livros de conto de Edla, "Até sempre".