sexta-feira, 26 de agosto de 2022

Fora de sintonia...

Reprodução Jornalistas & Cia

 

Do G1, hoje: Globo também não quer dar reajuste que recupere a inflação.

São muito raras as greves de jornalistas. No passado, quando tinham apois dos gráficos, algumas paralisações eram capazes de afetar os veículos. São, também, quase invisíveis. As empresas de comunicação noticiam greves de metrô, de caminhoneiros, de  Correios etc, mas historicamente não informam sobre manifestações de jornalistas. 

A nota acima é do Jornalistas & Cia. Informa que jornalistas da Globo e Globo News no Rio, São Paulo e Brasília, protestaram diante das sedes da empresa em meio a uma dura negociação salarial. Os jornalistas pedem a reposição da inflaçao (10,75%), a Globo oferece 7%. A programação dos canais segui incólume. 

Uma consequência inesperada da Guerra na Ucrânia: vai faltar papel higiênico na Alemanha.

por Ed Sá

Vai dar merda. Literalmente. A crise do fornecimento de gás para a Alemanha provocada pelas sanções à Rússia em reação à guerra na Ucrânia vai obrigar o país a reduzir dramaticamente a produção de... papel higiênico.

Cada alemão consome 134 rolos por ano, e a ordem será racionar. Usar jornal está complicado: os veículos impressos estão em extinção. As embalagens são, na maioria, de plástico. Melhor não arriscar esse substituto.

A informação é da Die Papierindustrie, a associação que reúne fabricantes de papel higiênico. "Nós dependemos do gás. Sem essa energia não podemos garantir o suprimento. Por isso estamos alertando os consumidores para economizarem a importante commoditie", diz um executivo da indústria. 

Comer menos batata, farelo de trigo, hortaliças, nozes, amêndoas, amendoim pêra e maçã com casca são conselhos valiosos. Usar mais água para a higiene poderia ser uma alternativa, mas o inverno está chegando e o gás também será racionado para aquecimento. O cidadão deverá fazer o sacrifício de usar água gelada. Além disso, são raros os bidês na Alemanha. 

Os banheiros costumam ter as waschlappen, mas, atenção, são toalhinhas para banho e não para substituir o papel higiênico. Provavelmente, bares e restaurantes não mais oferecerão o produto aos clientes, que deverão levar sua cota de casa mesmo. É possível que apareça um mercado negro de papel higiênico contrabandeado do Casaquistão, mas o produto é muito áspero. É outra coisa a que os alemães terão que se acostumar. Paciência. Ir para o matinho está descartado: leis ambientais multam quem usar esse quebra-galho. Não há informação sobre a situação em outros países europeus. Recomenda-se aos viajantes brasileiros que levem suas provisões ou passarão vexame em praça pública.

quarta-feira, 24 de agosto de 2022

Memórias da redação: Adolpho Bloch esnobou Collor e paparicou Lula • Por Roberto Muggiati


1989: à véspera do segundo turno - Adolpho Bloch, Luís Inácio Lula da Silva,
Osias Wurman, Carlos Heitor Cony, Roberto Muggiati e Jaco Bittar


Antes do segundo turno - Pedro Collor, Mauro Costa, Oscar Bloch Sigelmann,
Fernando Collor de Mello, Pedro Jack Kapeller, Arnaldo Niskier,
Daniel Tourinho e Roberto Muggiati. Fotos Acervo Pessoal


Era o segundo turno das eleições de 1989, o duelo no Sarney Curral, opondo o Caçador de Marajás e o Sapo Barbudo. Fernando Collor de Mello jantou na Bloch numa segunda-feira depois do fechamento da revista. Adolpho Bloch inventou uma desculpa e não deu as caras, Jaquito e Oscar recepcionaram o futuro presidente. A Bloch teve uma mãozinha nessa história. Collor concorreu por uma legenda menor, o Partido da Reconstrução Nacional (PRN), antes Partido da Juventude, fundado por Daniel Tourinho, que trabalhou na área de recursos humanos da Bloch Editores entre 1974 e 1985. 

Num gesto impulsivo, Adolpho Bloch convidou Lula para almoçar na sede da Manchete no Rio na véspera do segundo turno, sábado, 16 de dezembro. Lula e comitiva vieram naquela manhã de São Paulo num jatinho. Adolpho recebeu calorosamente o líder sindicalista e o levou a visitar o escritório do ex-Presidente Juscelino Kubitschek no prédio do Russell, que havia se tornado uma peça de museu depois da morte de JK em 1976. Lembro de um episódio engraçado durante o almoço. A certa altura, Adolpho desconcertou Lula com uma pergunta a queima roupa:

– E o senhor gostaria de ter um mais moço que o senhor?

O líder petista titubeou:

– Não entendi, sêo Adolpho! Ter um o quê? Mais moço?...

– Um sogro, porrraa!

Ele não se conformava de ter um sogro quatro anos mais moço: o general Abraham Ramiro Bentes, pai de sua segunda mulher, Anna Bentes.

Um trunfo que Collor usou em sua propaganda no segundo turno foi apresentar na TV uma ex-namorada de Lula, Míriam Cordeiro, com a qual ele teve uma filha, Lurian. A ex acusou Lula de “racista” e de ter exigido que ela abortasse a filha. Collor também espalhou que, se eleito, Lula confiscaria a poupança, medida que ele próprio, Collor, adotou assim que foi empossado. Houve ainda o sequestro “cenográfico” do empresário Abílio Diniz, libertado no domingo das eleições, com os sequestradores apresentados pela polícia vestindo camisetas do PT. Ainda assim, Lula não se saiu tão mal e reduziu a vantagem de Collor do primeiro turno (66,05% contra 33,95%) para o segundo (53,03% contra 46,97%).

Vamos voltar ao “adolphês”, o linguajar críptico (e típico) do empresário que só os mais próximos conseguiam captar (Cony era mestre nisso). Por ter morado em Paris e em Londres, Adolpho sempre me requisitava como interprete para seus encontros internacionais. Mas muitas vezes me levava a tiracolo mesmo quando se reunia com brasileiros. Não esqueço seu primeiro encontro em 1979 – à cabeceira da longa mesa de jantar do prédio do 804 no Russell – com Leonel Brizola, que acabara de voltar do exílio. 

Com os olhos brilhando, Brizola abriu o diálogo:

- Bloch, o socialismo é uma coisa tão bonita!

Adolpho desviou o rosto para o lado, naquele seu cacoete judaico-ucraniano de cuspir no chão. O Engenheiro não notou – ou fingiu que não notou. 

Eleito governador do Rio de Janeiro em 1982 – nas primeiras eleições livres e diretas para governador desde 1965 – Brizola seria uma mãe para a Bloch. Não só abriu crédito ilimitado para a empresa, como, no primeiro Carnaval do Sambódromo, em 1984 – também o primeiro Carnaval da Rede Manchete – concedeu direitos exclusivos de transmissão a Adolpho, chutando para escanteio a TV de Roberto Marinho. 

Dá para imaginar as benesses que cairiam sobre a Bloch caso Brizola fosse eleito presidente, mas ele chegou em terceiro, depois de Collor e Lula. Mas a Manchete sempre soube cativar o poder. Colocou Leopoldo Collor de Mello, irmão mais velho do Presidente, na chefia da Rede Manchete em São Paulo. Na presidência de Fernando Henrique Cardoso, o Primeiro Filho, Paulo Henrique Cardoso, ganhou um importante cargo na Rede Manchete, com direito a um luxuoso escritório privado.

Lula não chegou a pegar a Manchete – ou vice-versa – mas se a Bloch ainda sobrevivesse em 2002 com toda a certeza seria tratada a pão de ló pelo presidente petista, em reconhecimento ao apoio que recebeu de Adolpho – na contramão do poder – no segundo turno de 1989.


terça-feira, 23 de agosto de 2022

Empresários bolsogolpistas são alvos de operação da PF

Empresários formando facção para conspirar contra a democracia não é novidade no Brasil. O livro "1964- a Conquista do Estado", de René Dreyfus, expôs, com nomes, a conspiração no meio fomentada pelo Ibad e outras instituições. Durante a ditadura, um grupo de empresários também amplamente conhecidos financiou a instalação de centros de tortura e assassinatos de opositores do regime militar. 

Uma das mensagens dos bolsogolpistas


O bolsogolpísta acima lamenta que o golpe não tenha acontecido em 2019.  

Por isso, não foi surpresa a revelação do jornalista Guilherme Amado, do site Metrópoles, sobre a discussão em um grupo do WhatsApp, chamado Empresários & Política, de um golpe de Estado, caso Lula vença as eleições. Obviamente, sentem-se amparados pelo bolsogolpismo. Ontem, durante entrevista ao Jornal Nacional, Jair Bolsonaro não se comprometeu a respeitar o resultado das urnas se não for reeleito.  

Por solicitação do ministro Alexandre de Moraes, do STF e do TSE, a PF abriu investigação sobre alguns dos bolsogolpistas, que atacam o Tribunal Superior Eleitoral e o Supremo Tribunal Federal. São alvos da operação desta terça oito empresários que fazem parte da citada facção do zap: Afrânio Barreira Filho (Coco Bambu); Ivan Wrobel (W3 Engenharia);José Isaac Peres (Multiplan); José Koury (Barra World); Luciano Hang (Havan); Luiz André Tissot (Sierra); Marco Aurélio Raymundo (Mormaii); Meyer Joseph Nigri (Tecnisa).

segunda-feira, 22 de agosto de 2022

A 'motociata' do coração de Pedro I


Reprodução Folha de 22/8/2022

Reprodução O Globo - 1972

por Flávio Sépia 

Em 1972, o período mais violento e infame da ditadura, Garrastazu Médici celebrava o Sesquicentenário da Indepêndencia do Brasil. Portugal, também sob uma ditadura, era governado por Marcelo Caetano, herdeiro político do ditador Antonio Salazar. E foi assim, com um pacto entre autocratas, que os restos mortais de Pedro I foram importados pelo Brasil. 

Aqui, o governo militar organizou uma longa peregrinação da ossada pelo país. Pedro I não teve descanso: passou cinco meses entrando e saindo de aviões e, pior, ouvindo discursos ufanistas de prefeitos e governadores. 

Meio século depois, a República continua a perturbar o imperador: o governo protomilitar de Jair Bolsonaro mandou vir de Portugal o coração do imperador acomodado em formol e guardado em algo parecido com um vidro de picles de luxo. O propósito: comemorar os 200 anos da Independência. 

A história registra muitos casos parecidos, todos mórbidosExpor o coração de alguém é o auge da invasão de privacidade? Talvez não. O Museu do Erotismo, em São Petersburgo guarda um vidro com álcool ou, quem sabe,  vodca, com o suposto pênis de Rasputin dotado de 28 cm. Tal medida e não seus poderes sensoriais podem explicar o sucesso do bruxo entre todos os gêneros da corte dos Romanov.

Lênin repousa embalsamado na Praça Vermelha, em Moscou. Repousa não é bem o termo. O mausoléu é visitado diariamente por milhares de turistas. É um paradoxo, mas o único período em que Lênin descansou foi durante a Segunda Guerra Mundial quando, por precaução, diante da ameaça nazista às portas de Moscou, o corpo foi levado para a Sibéria. 

Visitar o túmulo de Napoleão Bonaparte, em Paris, na igreja da Cúpula dos Inválidos, é também um progama turístico. O que nem todos os visitantes sabem é que falta algo aos restos mortais do "pequeno corso". Quando ele morreu no exílio, em 1821, o médico que fez a autópsia teria retirado o pênis, com o qual presenteou um padre da paróquia local. Desde então, o órgão percorreu roteiro impreciso. O padre, provavelmente, gostou do presente tanto que o guardou até a morte.  Só em 1916, a partícula napoleônica chegou a um colecionador britânico e entrou em um bizarro mercado de compra e venda. Em 1977, um urologista teria adquirido a "bimba', que tem literalmente em repouso apenas 4 cm. 

Comentaristas políticos supõem que Bolsonaro usará o resquício de D. Pedro como peça da campanha eleitoral. É possível. Entre os apoiadores do sujeito estão os monarquistas. Espera-se, pelo menos, para não extrapolar a bizarrice, que Bolsonaro não leve o coração para a anunciada motociata de 7 de setembro. 

O "bonde" dos codinomes: "Tchutchucas", "gato angorá", "sapo barbudo", "queijo palmira"...

por Ed Sá

O termo tchutchuca, como todos sabem, bombou na internet. 

Não foi a primeira vez que a gíria carioca foi usada para classificar um integrante do governo. Em 2019, o deputado Zeca Dirceu (PT-PR) mandou essa em fala na Câmara: "Paulo Guedes é "tigrão" com aposentados, professores e agricultores e "tchutchuca" com a turma mais privilegiada do país e os amigos banqueiros", mas foi o youtuber de direita Wilker Leão, um apoiador de Bolsonaro momentaneamente descontente, que colou o apelido no "mito".  Wilker o chamou de "tchutchuca do centrão", em alusão à atração fatal do presidente pelo Centrão, a facção de políticos predadores de dinheiro público. 

Tchutchuca é um termo popularizado por um sucesso do Bonde do Tigrão, grupo do funk carioca. Originalmente era um elogio às meninas bonitas dos bailes nos subúrbios do Rio, mas logo ganhou o sentido pejorativo de "vulgar", "fácil", "biscate" "vaca" e "cachorinha". Obviamente, o sentido que Wilker quis dar foi o das variações. 

A velocidade com que o rótulo foi pregado na testa de Bolsonaro lembrou o efeito demolidor dos apelidos que Brizola, mesmo em tempos anteriores às redes sociais, dava aos seus adversários. Moreira Franco era o "gato angorá", cuja carascterística é "passar de colo em colo". Em 1989, Lula ganhou de Brizola o apelido de "sapo barbudo" em referência ao "sapo" que a elite brasileira poderia engolir: “A política é a arte de engolir sapos. Não seria fascinante fazer agora a elite brasileira engolir o Lula, este sapo barbudo?”, disse ele. Brizola chamava Garotinho, cujo nome já é um apelido, de queijo palmira", aquele vendido em formato de bola. “Garotinho é como uma bola, não tem lado e é oco por dentro“. O gaúcho também criou uma expressão que passou a ser muito usada para nomear a geração de políticos que apoiou o regime militar: "filhote da ditadura", como Paulo Maluf era chamado. 

Para quem não conhece, aí vão trechos dos versos de "Tchutchuca". 

Eu quero colo/Quero ver quem vai em dar colinho (...)

Vem, tchutchuca linda/Senta aqui com seu pretinho

Vou te pegar no colo/ E fazer muito carinho (...)

Vem, vem, tchutchuca/Vem aqui pro seu tigrão/

Vou te jogar na cama/E te dar muita pressão


Ouça AQUI

 

A cesta chique da Tchutchuca da Centrão

 

Reprodução Twitter 

sábado, 20 de agosto de 2022

Cony e a Montanha dos Sete Patamares • Por Roberto Muggiati

O lançamento do romance póstumo de Carlos Heitor Cony A Paixão segundo Mateus (Nova Fronteira) me levou a revisitar meus fantasmas religiosos da adolescência. Cony costumava dizer: “Sou ateu com nostalgia de uma fé que nunca tive”. Seminarista até os 19 anos, largou a batina antes de ser ordenado padre. Teve, portanto, uma convivência com o claustro, ao contrário de mim: abandonei a religião depois da Primeira Comunhão, traumatizado com aquela experiência atroz, na paróquia de Santa Teresinha em Curitiba. Primeiro, a confissão: você era obrigado a fornecer à entidade oculta por trás da treliça um cartel mínimo de pecados. Que noção de pecado pode ter uma criança de oito anos? Um menino mais esperto se forrou de balas Zequinha e bolas de gude “traficando” pecados para os menos imaginativos. Depois, o clima de pavor que cercava a ingestão da hóstia sagrada (“Muito cuidado para não morder o corpo do Senhorrrr!”...) Terminada a cerimônia sequer fui para o desjejum, apesar do convidativo Toddy com biscoitos. Saí atordoado para a rua, para o sol da liberdade, e passei muitos anos sem botar os pés numa igreja.


Foto Thomas Merton Center
Aos dezesseis anos, quando comecei a ler meus primeiros livros em inglês, caiu em minhas mãos The Seven Storey Mountain,  em que Thomas Merton (1915-68), um enfant du siècle, filho de neozelandês e norte-americana nascido nos Pirineus franceses, relata sua busca inquieta por um sentido da vida nos agitados anos 1930. Resume o escritor Clifton Fadiman: “De uma próspera família da classe média, Merton passou a infância na Inglaterra, França e nos Estados Unidos. Aluno da Universidade de Columbia, era popular e bem-sucedido. Interessado por literatura e arte moderna, entusiasta de sessões de jazz, viu-se de repente tomado por uma inquietante preocupação com os problemas sociais do seu tempo e com sua salvação pessoal. Isso o levaria a abandonar totalmente a excitação e confusão do mundo.”

Em dezembro de 1941, ele se tornou monge trapista na Abadia de Nossa Senhora de Gethsemani, no Kentucky, da ordem cisterciense, conhecida pelo voto do silêncio. Ao longo de três décadas, Merton escreveu mais de setenta livros, a maioria sobre espiritualidade. Poeta, ativista social e estudioso de religiões comparadas, defensor do pacifismo e do ecumenismo, é considerado o construtor da ponte unindo as doutrinas do Ocidente e do Oriente.

Foi em Bancoc, na Tailândia, durante uma conferência ecumênica, que Merton morreu, em 10 de dezembro de 1968, aos 53 anos. Sua morte foi atribuída ao curto circuito de um ventilador, encontrado sobre seu corpo. Como não houve autópsia, ficou sem explicação o ferimento na base do crânio, com forte sangramento. Ironicamente, o pacifista Merton teve seu corpo transportado para os Estados Unidos num avião militar que voltava do Vietnã. 

A década foi marcada por uma série de assassinatos políticos: o líder revolucionário do Congo Patrice Lumumba (61), John Kennedy (63) Malcolm X (65), o líder revolucionário marroquino Ben Barka (65), Carlos Marighela (69). O Secretário Geral da ONU, Dag Hammarskjöld, morreu em 1961 em Zâmbia num desastre aéreo – seu avião teria sido abatido a tiros. Em 1968, foram assassinados Robert Kennedy e Martin Luther King; o pintor Andy Warhol quase morreu depois de levar três tiros de uma feminista radical. A Teoria da Conspiração acabaria encampando a “eletrocussão acidental” de Thomas Merton entre os assassinatos políticos de 1968 no livro de Hugh Turley e David Martin O martírio de Thomas Merton: uma investigação (2018). 


Voltando ao livro que abalou meus alicerces na adolescência. A capa é notável, pintada por James Sante Avati (1912-2005), o “Rembrandt das capas de paperbacks”, que também assinou a famosa capa da edição de bolso de O apanhador no campo de centeio. Com um monge embuçado em primeiro plano, temos, num estilo realista bruto, uma visão social panorâmica da América do entreguerras, uma vintena de pessoas espalhadas por uma paisagem caótica de pedras e sombras.

O texto da quarta capa, naquela linguagem vívida e atraente dos paperbacks, me atraiu irresistivelmente à leitura:

O Coração de um Homem

Cândida, reveladora e extremamente honesta, esta é a impressionante biografia de um jovem bem preparado que levava uma vida emocionante e sofisticada até os 26 anos de idade, quando ingressou num mosteiro trapista. Sua história se desloca de Paris ao Harlem, de células comunistas a uma cela de monge, de sessões de jazz até o silêncio da Abadia de Nossa Senhora de Gethsemani no Kentucky, de James Joyce a Duke Ellington. Sua revelação sensível e exuberante de uma profunda experiência espiritual fez dele um dos livros mais vendidos do nosso tempo.

“É para um livro destes que os homens se voltarão daqui a cem anos a fim de saber o que se passava no coração dos homens neste século cruel.”  Clare Booth Luce, jornalista, fundadora da revista Time. 

O mundo me levou para outros caminhos e a tentação da vida monástica ficou para trás. Só recentemente fiquei sabendo que existe um mosteiro trapista no Brasil. No pós-guerra, cinco monges da Abadia de Genesee, no estado de Nova York, partiram para fundar um mosteiro em nosso país. A comunidade começou no município da Lapa, Paraná, mudando-se em 1983 definitivamente para a cidade de Campo do Tenente. Veja o site oficial, 

AQUI http://www.mosteirotrapista.org.br/

Thomas Merton teve uma relação especial com o Brasil. Sua biografia no site da Wikipedia reserva um capítulo especial, que transcrevo aqui:

 No Brasil Thomas Merton tinha vários amigos e publicou um grande número de livros. Muitas são as pessoas, leigas ou religiosas, que consideram as leituras de seus livros marcos importantes das suas vidas espirituais. Foram lançados mais de 40 livros em português, graças ao envolvimento de intelectuais – como Alceu Amoroso Lima – e de monjas e monges beneditinos – como Dom Basílio Penido, Dom Timóteo Amoroso Anastácio, Dom Estêvão Bettencourt e, principalmente, da irmã Maria Emmanuel de Souza e Silva.

A história sobre o início de uma relação de trabalho e de uma amizade é contada no livro Thomas Merton: o homem que aprendeu a ser feliz, pela Ir. Maria Emmanuel. Ao longo de 13 anos trocaram mais de uma centena de cartas, cartões postais, "santinhos" e livros. Parte das cartas de Merton enviadas à Ir. Maria Emmanuel estão registradas no livro The Hidden Ground of Love: Letters on Religious Experience and Social Concerns (Letters, I).

Merton se correspondeu com outros brasileiros como Alceu Amoroso Lima, Dom Hélder Câmara, abades beneditinos, religiosas e religiosos e simples leitores, ao longo de sua vida. Ele também se interessava por vários autores brasileiros - em especial pelos poetas Manuel Bandeira e Jorge de Lima.

O continuado interesse por Merton, sua vida e suas ideias, levou à fundação, em 10 de dezembro de 1996, da Sociedade dos Amigos Fraternos de Thomas Merton - SAFTM.

Após ter cessado por longos anos a publicação de suas obras no Brasil, existindo apenas dois títulos em 1996, foram reeditados em 1999 os livros A Montanha dos Sete Patamares, Novas Sementes de Contemplação e Ascensão para a Verdade logo seguidos pela publicação de outros títulos nos anos subsequentes. Hoje já são 16 os títulos disponíveis, tendo se estabelecido um novo interesse em dar continuidade à publicação de antigas e novas obras. Além desses existem quatro livros sobre Thomas Merton. Os quase 30 outros títulos esgotados podem ser encontrados em sebos de todo o país.

Bem mais recentemente, fiquei sabendo que outro redator de Manchete, Irineu Guimarães – um défroqué (sem batina) que levou a experiência do claustro muito mais a fundo do que Cony – também se voltou para os trapistas. Foi ele quem traduziu o livro francês Les Mystères de la Trappe, edição bilíngue em latim e português, uma obra-prima da paciência, fruto do seu conhecimento do latim, publicada no Brasil em 1997 com o título Os Cistercienses. 

Veja aqui a vida no mosteiro trapista de Campo do Tenente, no Paraná, num documentário da TV Estado.

https://www.youtube.com/watch?v=8bhFoienNss


Morte e vida Janaína • Por Roberto Muggiati

 

Janaína Araújo.
Reprodução TV
O governo brasileiro continua inovando. Criou agora o "Benefício de Prestação Descontinuada", uma espécie de Assistência Funeral muito eficiente. Destina-se a pessoas deficientes, de baixa renda (ou sem renda), incapacitadas de trabalhar. São colocadas numa fila em módulo “Esperando Godot” (Godot nunca chega...) até que morrem, desobrigando o governo do pagamento de um salário mínimo, dinheiro que será desviado sabe-se lá para onde...

Quem inaugurou o sistema no CRAS do Paranoá, DF – foi Janaína Nunes Araújo, 44 anos. Hipertensa, obesa, sofrendo de ansiedade, depressão e síndrome do pânico, ela não resistiu a oito dias sem atendimento na fila.

Janaínas não costumam morrer tão cedo, elas só passaram a existir depois que Leila Diniz deu esse nome a sua filha, nascida em 19 de novembro de 1971. A partir daí o nome que homenageia Iemanjá se tornou um favorito no Brasil.  Entre as Janaínas que se destacaram está Janaína Conceição Paschoal, nascida em São Paulo em 1974, jurista, política e uma das autoras do pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff. Mas nem todas alcançarão o sucesso como ela, que foi até convidada para vice de Bolsonaro. Muitas, provavelmente, são vítimas potenciais de feminicídio e outras podem até estar reservadas para o extermínio na fila, como a pobre da Janaína Nunes Araújo.

terça-feira, 16 de agosto de 2022

Trocadilho visual só para cinéfilos • Por Roberto Muggiati

 

Woody Allen. Foto CBS


Em Cul-de-sac/Armadilha do destino, Donald Pleasence e Françoise Dorleac. A irmã de Catherine Deneuve caiu sob a Maldição de Polanski. No ano seguinte, morreu carbonizada
ao volante de seu carro a caminho do aeroporto de Nice. Foto Divulgação

Depois de um longo e tenebroso inverno cinematográfico, voltei à alegria e ao humor cáustico dos filmes de Woody Allen. Do descolado Sweet and Lowdown/Poucas e boas, em que Sean Penn protagoniza um guitarrista de jazz muito doido; e de Scoop/O grande furo, em que a foca Scarlet Johansson, partindo de uma dica do além, incrimina como improvável assassino o filho de um lorde inglês, passei para o soturno Shadows and Fog/Neblina e sombras (1991), com uma constelação que inclui Woody Allen e sua então mulher Mia Farrow. (É o penúltimo dos treze filmes que fez com Woody nos seus doze anos de casamento.) A história, literalmente nebulosa, trata de um serial killer que sai estrangulando gente a granel numa cidadezinha anônima. 


Em Neblina e sombras, Donald Pleasence na mira do estrangulador;
ao fundo, parte do letreiro Cul-de-sac. Foto Divulgação



Uma das vítimas é o legista, interpretado por Donald Pleasence, encurralado pelo assassino numa viela. Woody aproveita a cena para homenagear Roman Polanski, que dirigiu em 1966
Cul-de-sac/Armadilha do destino, com Pleasence num dos papeis principais. Num close do apavorado Donald, prestes a ser estrangulado, aparece ao fundo na parede o aviso cul-de-sac, beco sem saída. Uma citação muito sutil, endereçada e a meia dúzia de cinéfilos encardidos. 

A marca registrada de Woody Allen: a fonte Windsor. Quase sempre ele escreve
e dirige seus filmes; muitas vezes, atua também.

E um brinde aos fãs de um cineasta tão detalhista que, a partir de 1977, com Annie Hall/Noivo neurótico, noiva nervosa, - o sétimo dos seus 50 filmes – passa a usar exclusivamente a fonte Windsor de Benquiat nos títulos e créditos, assim como nos cartazes e nas capas de seus DVDs.

Cena de Match Point: filme de Walter Salles em cartaz no Curzon Mayfair.
Foto Divulgação

Woody gosta de homenagear colegas de profissão. Em sua obra-prima Ponto final: Match Point ele exibe na marquise de um cinema londrino THE MOTORCYCLE DIARIES, o título do filme de Walter Salles. Outro de seus favoritos é Ingmar Bergman, e Woody não escondeu isso, clonando o estilo do mestre sueco em filmes como Interiores, Stardust Memories e Setembro

O cineasta também tem seus escritores de estima. Em Match Point é Dostoievski de “Crime e castigo”, com a diferença de que o filme poderia se chamar Crime sem castigo. O romance do russo é citado também no mais recente Homem irracional: Joaquin Phoenix, um professor de filosofia especializado nos existencialistas, comete um “assassinato moral”, eliminando um juiz cruel especializado em desgraçar a vida alheia. Namora uma aluna – a única pessoa a saber que ele é o assassino. Quando outro homem é acusado do assassinato, namorada exige que o professor se entregue, ou ela o denunciará. Phoenix tenta jogar a jovem no poço do elevador, mas quem acaba caindo é ele, ao escorregar na lanterna de pilha que ele ganhou para ela na roleta de um parque de diversões em tempos mais felizes. 

Os filmes de Allen estão cheios de discussões filosóficas e falam muito sobre o papel da sorte, ou do acaso, na vida ou na morte das pessoas. Tudo pode dar certo é outro filme que trata do tema. Cita até o Princípio da Incerteza de Heisenberg, mas Woody sabe lidar tão bem com o discurso intelectual (ou pseudointelectual) que nunca afasta o espectador, ao contrário, o atrai. Consegue se safar também quando cita a Melancolia de Ozymandias em Para Roma com amor. Esse filme, aliás, é parte de uma série de produções que fazem descaradamente a propaganda de cidades turísticas, como Meia-noite em Paris e Vicky Cristina Barcelona. Já chamaram Woody de o Midas do Celuloide: tudo em que ele toca vira ouro, sem comprometer o mérito do produto como obra de arte. 

Foram 50 filmes nos últimos 54 anos, um presente anual para sua multidão de admiradores. Nos últimos tempos, ele se viu arrastado pelo tsunami moral do #metoo e injustamente cancelado. Mas Allan Stewart Könibsberg, nascido em 1º de dezembro de 1935 no Bronx e criado no Brooklyn, em Nova York, é osso duro de roer. Vamos torcer para continuar com ele por muito tempo mais.


sábado, 13 de agosto de 2022

Democracia!

 


A camisa da seleção sequestrada pelos bolsonaristas e o dia em que Simonal acreditou que jogaria na seleção de 70



por José Esmeraldo Gonçalves 

A Copa do Mundo se aproxima e o assunto futebol ganha força fora do jornalismo especializado. As redes sociais questionam ultimamente se o torcedor deve comprar a nova camisa da seleção lançada essa semana. A discussão faz sentido e expõe opiniões distintas. Há quem ache que a camisa amarelinha deve ser resgatada do bolsonarismo que a tornou o uniforme de manifestações antidemocráticas. Outro grupo desistiu da amarelinha e considera que a extrema direita a emporcalhou de vez. 


O Globo de hoje entra na polêmica, publica matéria de uma página sobre o assunto e revela que a CBF corre para lançar uma campanha com o objetivo de "despolitizar" a camisa.

Em 1970, com a seleção na última hora invadida por militares - havia tantos milicos na comissão técnica que até parecia o atual governo - uma discussão semelhante agitava a esquerda: torcer ou não pelo Tri que seria usado pelo marketing da ditadura?  Na época, à medida que o Brasil brilhava no México, a genialidade e a garra de Pelé, Rivelino, Tostão, Carlos Alberto, Jairzinho, Gerson e Brito e companhia conquistaram os torcedores. Alguns presos políticos confessaram depois em entrevistas e livros que ficou difícil não torcer pela seleção. 

Pouco antes do Natal de 1969, embora a data da edição indique 1º de janeiro de 1970, a Fatos & Fotos publicou uma capa com Simonal fantasiado de Pelé e Pelé vestido de Simonal (curiosamente, como se vê, a revista deu mais importância à dupla de ídolos do que à morte do general Costa e Silva que teve direito apenas a uma chamada). 

O cantor vivia o auge do sucesso, era uma unanimidsde nacional. Dois anos depois dessa capa, contudo, ele preparou para si mesmo uma tremenda armadailha: convocou amigos da polícia para pressionar seu contador, Raphael Viviani, e forçá-lo a admitir que havia desviado dinheiro da empresa Wilson Simonal Produções. A polícia, sabe como é, sequestrou e torturou Viviani que denunciou o crime e acrescentou que Simonal havia presenciado tudo. O caso explodiu nos jornais e nas revistas. Ao final, em rumoroso julgamento, o artista, condenado por extorsão e sequestro, foi preso por alguns dias, mas logo ganhou o direito de cumprir a pena em prisão domiciliar. Nunca foi inocentado, como muitos pensam, e a pena talvez pior do que o veredito da lei e que praticamente acabou com a sua carreira foi o boicote e o cancelamento, como se diz hoje. Ele também foi chamado de dedo-duro por alguns artistas, mas essa acusação nunca foi provada nem virou processo. Simonal tentou, por várias vezes, retomar o sucesso, mas a marca de ligações com a ditadura foi mais forte.  

Em 1975, a redação da Fatos & Fotos, que funcionava no sétimo andar do prédio do Russell, foi surpreendida pela chegada de Simonal, o próprio. O cantor estava acompanhado de uma figura da Bloch, da publicidade, com notórias ligações com o meio policial do regime militar. Os dois conversaram com o diretor da revista sobre o desejo de Simonal de dar uma entrevista para a FF falando sobre a carreira, os novos rumos e passos, mas pediam a "garantia" de que a matéria não voltasse a falar do caso policial que havia sido objeto de várias matérias na Fatos & Fotos e na Manchete. A entrevista, pelo menos naquela ocasião, não foi feita, apesar de Simonal conhecer o repórter escalado, Luiz Carlos de Assis, da Amiga. 

O Simonal dos tempos de sucesso tinha intimidade com a Bloch. As três revistas semanais da editora fizeram centenas de reportagens e entrevistas com ele, que atendia a todas, inclusive posar produzido para capas em horas de estúdio. 

Na última quinta-feira, a propósito, a página Grandes Esquadrões e Grandes Jogadores, do Facebook, reproduziu a capa da Fatos & Fotos e recordou a polêmica acima,  mas o principal tema do post era uma história sensacional. Simonal tinha passe-livre nos treinos e na concentração da seleção de 70 e se imaginava bom em tudo. Os jogadores bolaram uma pegadinha para o cantor convencendo-o que, com a dispensa inesperada do jogador Rogério, ele poderia ser convocado para preencher a vaga. Já estava no México, dizia que era bom de bola, argumentaram, mas Zagalo, que entrou na brincadeira, queria que ele particiasse de um treino. Simonal teria acreditado na gozação e o "treino" foi um desastre.   

Leia a historinha completa no link abaixo

 https://m.facebook.com/story.php?story_fbid=pfbid02p4he4WBQu11LG5VSZHPz5bTkMFLiefHKXNfGmHwNWgPMYjzQmX47jL1CJZXu4obql&id=1334354346655017&sfnsn=wiwspmo#_=_


  

Le Figaro destaca a baixaria de Paulo Guedes

 



Ao dizer que a França é insignificante e que vai "ligar o foda-se" contra os franceses, Paulo Guedes, o estafeta de Bolsonaro, ignora que empresas francesas são as maiores empregadoras estrangeiras no Brasil em áreas diversas como  supermercados, cosméticos, helicópteros e automoveis, além de o terceiro país estrangeiro que mais investe aqui.

Mas quando fala isso, o Guedes quer mesmo é agradar Bolsonaro. Imediatamente depois das asneiras que diz deve telefonar babando para o chefe: 

"Viu o que falei, presidente, viu, viu? Mandei bem, enquadrei os caras. Aprendi com o senhor. Conte comigo, estou aqui. Dona Michelle vai bem? Minhas lembranças para ela. Admiro sua senhora. E o senhor está com saúde? Graças a Deus. Tô gostando de ver. Vai ter 'live' hoje? Não vou perder. Um beijo no coração".  

Veja o vídeo publicado no Figaro 

https://video.lefigaro.fr/figaro/video/bresil-le-ministre-de-leconomie-juge-la-france-insignifiante/

Libération: Democracia em jogo no Brasil

 

Para o mundo, Bolsonaro, classificado como de extrema direita, é uma ameaça à democracia brasileira. A propósito, os jornalões Globo, Folha e Estadão não usam essa definição - extrema direita - para o o extrema direita Bolsonaro. Pudores de quem o apoiou em 2018 e se prepara para apoia-lo nas próximas eleições. Os sinais de que isso vai acontecer já estão à vista   

sexta-feira, 12 de agosto de 2022

Em 2012, a família Boghici posou para a Contigo em tempos felizes. Dez anos depois, o colecionador Jean Boghici, que morreu em 2015, é poupado de um drama cruel. Segundo a polícia, sua viúva foi vítima de roubo milionário planejado pela própria filha.

Uma das fotos da matéria da Contigo: Geneviève, Jean Boghici e Sabine Boghici.
 A foto é de Márcio Nunes, reproduzida da edição  de 20 de setembro de 2012.


por José Esmeraldo Gonçalves 

No começo dos anos 2000, a Contigo passou por uma reforma editorial que qualificou a revista como uma publicação que, além da cobertura de TV, seu campo de ação original, abria espaço para celebridades de todas as áreas: escritores, atletas, compositores, músicos, figuras da sociedade etc. Por volta de 2009, foi criada na revista uma rubrica chamada Gente & História destinada a entrevistas com personalidades selecionadas, era um espécie de espaço premium da Contigo. Como entrevistadores, a revista convidava, geralmente, escritores conhecidos.


A abertura da entrevista de Jean Boghici a Roberto Muggiati 
reproduzida da Contigo.
.

Nesse trecho, a matéria cita Sabine Boghici


Em 2012, como editor de redação na sucursal do Rio de Janeiro, chamei o jornalista e escritor Roberto Muggiati para colaborar na seção Gente & História. Uma das várias entrevistas que ele fez foi com o Jean Boghici, que foi fotografado por Márcio Nunes. 

Colecionador e marchand, um dos maiores do Brasil, ele estava em evidência por um motivo acidental. No dia 13 de agosto, seu apartamento, uma cobertura na Rua Barata Ribeiro, em Copacabana, sofrera um incêndio que consumiu parte do imóvel. Ninguém se feriu, mas algumas obras de arte se perderam, entre as mais importantes, as telas Samba, de Di Cavalcanti, e Floresta Tropical, de Guignard. O colecionador ficou desolado. Mas a dor maior, como ele confessou à Contigo, foi a morte da Pretinha, sua gata de estimação. 

Um dos quadros recuperados: O Sol Poente, de Tarsila do Amaral. 

Dez anos depois daquele incêndio, o sobrenome Boghici volta ao noticiário em um rumorosa caso policial. A Operação Sol Poeta da Delegacia Especial de Atendimento à Pessoa da Terceira Idade investiga um golpe milionário que teria sido comandado pela filha de Boghici, Sabine Boghici, e executado por ela e  comparsas contra a viúva do colecionador, Geneviève Boghici, de 82 anos. Estima-se que o roubo somou mais de R$ 700 milhões. 

O golpe começou em 2020. A viúva era mantida no apartamento, em cárcere privado, enquanto era ameaçada e extorquida pela quadrilha, que vendia as valiosas obras de arte e a obrigava a transferências milionárias. Foram roubados 16 quadros, joias e R$ 9 milhões em dinheiro. A polícia prendeu Sabine Borghici e os cumplíces Rosa Stanesco, a “Mãe Valéria de Oxóssi”, Gabriel Nicolau Traslaviña Hafliger, filho de Rosa, Jacqueline Stanesco, prima de Rosa e Diana; permaneciam foragidos Slavko Vuletic, pai de Diana e padrasto da Rosa, e Diana Rosa Stanesco Vuletic, meia-irmã de Rosa. 

O golpe planejado por Sabine, segundo as investigações, começou quando, em ação combinada, a mãe dela foi abordada por uma mulher (que seria, segundo a polícia, Diana Stanesco), que se apresentou como vidente e lhe disse que Sabine estaria doente e não demoraria a morrer. Só escaparia caso fosse realizado um urgente "tratamento espiritual". Sabine convenceu a mãe a pagar pelo tratamento e, em apenas 13 dias, Geneviève tranferiu aos criminosos mais de 5 milhões de reais. Quando desconficou do golpe, a mãe de Sabine foi isolada - a quarentena determinada em função da pandemia de Covid ajudou a disfarçar o crime - e os funcionários da casa foram dispensados. Abriu-se, então, a oportunidade de roubo progressivo do patrimônio da idosa. 

Do total de 16 quadros roubados, até agora apenas três foram recuperados, em São Paulo, e outros dois localizados em Buenos Aires. 

Segundo a polícia, Rosa Stanesco Nicolau, a “Mãe Valéria de Oxóssi”, chegou a  mandar Sabine Boghici, que seria sua namorada, a matar a mãe. Ainda de acordo com as investigações, os golpistas levavam os quadro sob a alegação de que precisavam ser "rezados". 

Jean Boghici, que morreu em 2015, aos 87 anos, foi poupado do terrível e cruel drama familiar.

 

quinta-feira, 11 de agosto de 2022

O fascínio do “Danúbio Azul” pelo cinema: uma amostra perdida • Por Roberto Muggiati


Há algum tempo venho inventariando neste blog a atração irresistível que a valsa de Johann Strauss II exerce sobre o cinema. Em 1953, o francês Henri-Georges Clouzot a usou com um efeito dramático genial na última cena de O salário do medo. Em 1968, Stanley Kubrick bota o “Danúbio Azul” a rodar em 2001: Uma odisseia no espaço, na cena em que uma nave espacial se prepara para se acoplar a uma estação orbital. 

O casamento de imagem e música foi tão perfeito que nunca mais ouviríamos a velha valsa de Strauss sem a associarmos ao filme de Kubrick. Em 2016, no filme franco-germânico-austríaco Stefan Zweig: Adeus, Europa, um prefeito do interior da Bahia brinda o escritor com um “Danúbio” desafinado tocado por uma bandinha de coreto.



https://youtu.be/w5isL1wJHr4

                      The Italian Job Deleted Scene "Blue Danube" Sequence 1969 - YouTube

O que Mourão tem a ver com Michael Jackson

 Em 2018, o então candidato a vice-presidente, general Mourão, declarou ao TSE que era indígena. Para a eleições desse ano, Mourão, agora candidato a senador pelo Rio Grande do Sul, diz que é branco. 

Em menos de quatro anos, o general tomou um banho virtual de alvaiade e virou o  Al Jolson brasileiro encenando "refilmagem" eleitoral de O Cantor de Jazz. Michael Jackson gastou milhões de dólares para embranquecer. Fez plásticas, evitou raios de sol e apelou para medicamentos. Mourão precisou apenas da caneta e de um formulário eleitoral. 

Suspeita-se que os marqueteiros do agora nórdico Mourãosson temiam que os eleitores bolsonaristas do Rio Grande do Sul rejeitassem o indígena. (José Eesmeraldo. Gonçalves)

segunda-feira, 8 de agosto de 2022

domingo, 7 de agosto de 2022

Xuxa vai a leilão na prateleira virtual

Uma página no Facebook, administrada por Joeliton Boia Relíquias, lista objetos atualmente "cults" para venda em leilões. Uma rápida visita resume através de alguns itens a TV que ficou no passado. Hoje, em tempo de streaming, já são várias as gerações que desconhecem programas e estrelas que fizeram sucesso, além de equipamentos ligados à jurássica era. Para quem viu a série da Netflix Stranger Things, a página de Joeliton, de Arapiraca (AL), funciona como se fosse um portal para outro universo. Quem garimpou essa página foi Nilton Muniz, ex-Manchete, colaborador deste blog. 

Várias edições da revista Manchete, com Xuxa na capa, estão entre as "raridades" anunciadas. A Manchete se foi, Xuxa faz raras aparições na TV, os programas infantis no formato que ela e Angélica comandavam, ambas lançados pela Rede Manchete, não mais existem. As revistas com capas da Xuxa estão em leilão, lance mínimo de apenas R$1,00.


Câmera JVC


Videocassete Sharp


Antena externa de TV


MinTV
i

Teletrim

Além das peças próprias, Joeliton também divulga itens de outros "leiloeiros" ou vendedores, são coisas que remetem à idade da pedra da TV. Há um videocassete Sharp, uma antena daquelas que se colocava no telhado ou sobre o televisor, de preferência com um rolo de bombril enrolado nas hastes para melhorar o sinal, câmera de vídeo e miniTV.  Além dos mais variados objetos - até um carro Gordini 63 - está à venda, no campo audiovisual, um teletrim, o ancestral do celular em comunicação. Para quem não sabe, o dispositivo avisava que tinha alguém querendo falar com você e exibia o número de telefone no visor. Só isso. Caso estivesse na rua, cabia-lhe comprar uma ficha para acionar um "orelhão" (o apelido popular do telefone público) e torcer para encontrar um que funcionasse e "desse linha".      

sábado, 6 de agosto de 2022

Brasil de Fato - Sobre Jô Soares, o que faltou contar...


O site Brasil de Fato relembra uma previsão de Jô Soares que, infelizmente, se confirmou. No auge do golpe contra Dilma Rouseff, o apresentador conduzia um quadro com jornalistas de política - que ele chamava de "as minhas meninas" - que discutia acontecimentos nacionais. 

Jô dizia que o processo que levou ao impeachment de Dilma "tinha cheiro de golpe". As "meninas" subiram nas tamancas. "É por isso que eu digo, com todo respeito à minha amiga Lúcia (Hipólito), tem cheiro de golpe. Você querer usar isso para depor"...  

Jô não conseguiu completar a frase. A jornalista Ana Maria Tahan interrompeu bruscamente o apresentador. "Você é ingênuo!", imaginem, foi o que ela disse.

- "Quem é ingênuo"?, Jô se surprenedeu com a intervenção, mas continuou:

- "Se acontecer [o impeachment], não vai ser possível dar um jeitinho. E é por isso que o Brasil não acaba. Com tudo isso, vai se ajeitando, quebrando um galho aqui e outro. Agora, o que estou falando, não é que não é necessário, mas pode chegar a uma consequência que seria muito mais prejudicial ao Brasil do que a Lei da Responsabilidade Fiscal", afirmou.

E essa foi a previsão. 

Jô foi foi um dos poucos jornalistas a entrevistar Dilma às vésperas do processo que levou ao golpe parlamentar. A entrevista aconteceu na madrugada de sábado, dia 13 de junho de 2015, e Jô foi massacrado por apoiadores do golpe na internet. Entre os detratores, estava o guru bolsonarista Olavo de Carvalho e o apresentador Danilo Gentili, relata Brasil de Fato.

Você pode ler a matéria completa do Brasil de Fato AQUI

Jô Soares (1938-2022): tango na redação da Manchete e aniversário da Fatos & Fotos


Jô (Dr. Sardinha) apresenta a Delfim Netto uma cesta de frutas e legumes,
com destaque para o abacaxi. Dizia-se, na ocasião, que Delfim, nomeado ministro da
Agricultura, não distinguia jaca de uva.
   

 

por José Esmeraldo Gonçalves

O celular deveria existir para registrar em vídeo um hábito nunca explicado de Jô Soares ao adentrar a redação da Manchete. O Gordo, sem dizer palavra, enlaçava Adolpho Bloch e saía dançando um tango com ele. A cena era rápida e a chegada do Jô - que tinha muitos amigos na Bloch e de vez em quando ia ao Russell - era inesperada. Se fosse um encontro marcado, algum fotógrafo da casa teria registrado a dança que era silenciosa para a pequena plateia de jornalistas, mas, talvez, sonora na cabeça dos dois: quem sabe, tocava um "Los Mareados", de Hugo Baralis durante a inusitada performance.  

Jô na capa comemorativa da Fatos & Fotos Nº 1000

Jô fez muitas capas para a Manchete. Não há registro de negativa ao pedido de um repórter desesperado para marcar um matéria com o humorista, apresentador e escritor. Na Fatos & Fotos isso aconteceu pelos menos duas vezes. Em 1980, a apenas quatro dias do fechamento, alguém descobriu que chegaria às bancas a edição número 1000 da revista. Nessas ocasiões, a Manchete, o carro-chefe da Bloch, fazia grande números especiais com grande investimento: Manchete 30 anos, 40, 45, Manchete Nº 2000 etc. Para a F&F, que vivia em crise, essas comemorações passavam geralmente em branco. Foi feito um caderno especial de 32 páginas com uma retrospectiva de matérias publicadas pela revista. E a capa? Quem toparia posar em jogo rápido antes do fechamento que se aproximava? Jô. 

O Gordo estava em cartaz com espetáculo em um teatro em São Paulo. A sucursal correu para montar a foto das mil semanas, que aí aparece, com bolo e tudo, feita por Mituo Shiguihara, com produção de Denise Orensztejn. 

Em outra ocasião, Jô posou como cartomante, sem produção, para a F&F. A bola de cristal era um globo de luminária que a reporter Heloísa Marra levou de casa. O turbante, ela comprou em Copacabana. O improviso era para uma matéria sobre previsões para 1981.

Em 1979, a ditadura nomeou o economista Delfim Netto para o ministério da Agricultura. O czar da Economia durante o governo de Garrastazu Médici virou piada. Dizia-se que se fosse a uma feira livre poderia confundir jaca com uva tal era seu conhecimento sobre o setor agrícola. Foi o que bastou para o "Planeta dos Homens" criar o "Doutor Sardinha" para ironizar Delfim. Claro que a Manchete se mobilizou para fazer uma capa com os dois Gordos nacionais. Jô topou na hora, Delfim pode até ter hesitado, mas não perdeu a chance de aparecer ao lado de uma figura tão popular. 

* Jô Soares morreu na madrugada de sexta-feira, 5/8, em São Paulos, aos 84 anos. 


sexta-feira, 5 de agosto de 2022

Não é só o voto: Governo define o que pode e o que não pode ser impresso

por O.V.Pochê 

Bolsonaro e o Ministério da Defesa exigem o voto impresso. Aparentemente isso é só o começo. Em "reunião secreta" realizada em um sauna de Brasília e sem registro impresso em ata, foi decidido que o Núcleo Mole do Planalto e o Baixo Comando vão interpelar o STF para definir o que deve ser obrigatoriamente impresso e o que jamais necessitará de impressão. Veja a ordem do dia listando o que eles querem impresso e o que deve passar longe de qualquer impressora: 

SEMPRE IMPRESSO

*  O seguinte salmo deverá ser distribuído em impresso pelo Ministério do Trabalho nas empresas:   "Êxodo 21:20-21 - Com a aprovação divina, um escravo pode ser surrado até a morte sem punição para o seu dono, desde que o escravo não morra imediatamente".

* Toda mensagem em Whatsapp deverá ser impressa em formulários oficiais de telegrama.

* Instituir boleto impresso para PIX.

* Ao fim do dia o usuário deverá imprimir suas mensagens no twitter, caso a PF precise conferir.

* A volta do formulário físico do Imposto de Renda.

* A volta da carteirinha do CPF.

*  A volta da edição impressa da Playman para clipping do Planalto..

* Caixa eletrônico deverá imprimir recibo com foto de quem retirou o respectivo numerário. 

* Medidores de temperatura corporal terão que emitir resultado impresso.

* Mulher que fizer denuncia de assédio sexual tem que trazer ressonância magnética do local acessado e digitais impressas do apalpador.

* Denúncias de racismo só serão aceitas se a vítima trouxe cópia da carteirinha da Ku Klux Klan do agressor

* Vítima de bala perdida só será atendida em hospital publico se trouxer compravante do fato em três vias. 

* Se houver golpe, o Planalto informará por carta e telegrama a todos os brasileiros


NÃO IMPRIMIR NUNCA 

* Recibo de compra de Viagra para os quartéis.

* Cheques em nome de Michelle.

* Comprovantes de transferência de rachadinhas.

* Não imprimir contas do orçamento secreto do Congresso, não gravar em HD ou pen drive e sempre destruir o computador que emite as ordens de pagamento.

* Não imprimir carteirinhas de caçadores, atiradores e colecionadores de armas. Basta a palavra do homem de bem.

* Não imprimir editais de concorrências públicas. Basta um aperto de mão entre o vencedor e a autoridade para fechar as compras do governo. 

* Não imprimir nada sobre privatizações. Tais operações estão sob sigilo de 250 anos. Não imprimir isso também.

* Não imprimir o montante da sacolinha das igrejas neopentecostais É informação sob sigilo até o dia do Juízo Final.

* Nunca imprimir a frase "quem mandou matar Marielle". 

* Não imprima este post

Atenção: por ordem direta da Presidência, o Ministério da Justiça institui o "porte de impressora". Todas as máquinas devem ser cadastradas. Quem imprimir documento indevidamente ou deixar de imprimir documento obrigatório será conduzido ao DOI (Departamento de Ordem Impressa).