terça-feira, 6 de fevereiro de 2018

A forma da água e a mídia desinformada



Por Roberto Muggiati

O sucesso do filme de Guillermo Del Toro retumbou na mídia do mundo inteiro, mas poucos jornalistas – se algum – se deram ao trabalho de falar sobre o título, que se tornou parte integral da obra, imprimindo a ela uma forte carga poética.


Elementar, meu caro, o tributo do diretor mexicano ao filme americano The Creature From The Black Lagoon/O Monstro da Lagoa Negra, embora muitos não tenham feito menção ao sci-fi p&b de 1954, que se passa na Amazônia.


O título, sim, é que não tem mistério. Pelo menos para mim. Del Toro o chupou descaradamente do romance noir italiano da Andrea Camilleri, La forma del’1acqua, publicado em 1994 (no Brasil, traduzido pela Record, em 1999, como A forma da água.).

O puxão de orelha na mídia se justifica ainda mais porque o romance foi o primeiro de uma série que lançou o comissário Salvo Montalbano, detetive de uma imaginária cidadezinha siciliana chamada Vigàta. (O nome Montalbano foi uma homenagem ao autor espanhol de romances policiais Manuel Vázquez Montalbán. Aliás, a literatura noir vive hoje um boom impressionante na Europa, deixando bem para trás a matriz do gênero, os Estados Unidos. Entre os destaques, o noir nórdico, com o sueco da série Millenium Stieg Larson – morto em 2004, mas virou franquia – o norueguês Jo Nesbo e islandês Arnaldur Indridason, da série Reykjavíc Murder Mystery – será que existe tanto crime assim na cidade de apenas 125 mil habitantes?)

A pior desinformação, no caso de A forma da água, é que o comissário Montalbano, a partir de 1999 virou uma série de TV com 32 episódios e alcançou sucesso no mundo inteiro, inclusive no Brasil, eu não perdia um. Foi tal a repercussão que a municipalidade de Porto Empedocle, cidade natal de Camilleri, mudou o nome para Porto Empedocle Vigàta, com vistas ao potencial turístico das histórias envolvendo o comissário Montalbano.

Andrea Camilleri

Graças a Montalbano, Camilleri deixou o trabalho escravo de roteirista de TV, está vivo e passa muito bem com seus 92 anos bem vividos. Só me pergunto o que ele estaria pensando ao ver hoje o seu título nas manchetes do mundo inteiro, A forma da água. Tecnicamente, caberia um processo por plágio? Ainda que coubesse, Camilleri não está nem aí, não é de esquentar a cabeça e vai preferir encolher-se num canto e soprar seu saxofone tenor, sonhando com o fraseado cool de Lester Young.

2 comentários:

Anônimo disse...

Como o estagiário vai saber disso?

Ademir disse...

Muita cara de pau dos produtores do filme roubarem descaradamente o título.