O primeiro porre a gente não esquece: o meu
foi num Carnaval dos anos 1950, com Catuabom.
Por Roberto Muggiati
O rótulo assumidamente kitsch da Catuaba Selvagem desenhado por Benício, ilustrador que teve trabalhos publicados na extinta revista Ela Ela. |
Reprodução O Globo |
A Catuaba Selvagem foi a grande sensação do Carnaval de 2017 – no Rio de Janeiro e em outras praças. As vendas foram tão marcantes que seu fabricante – a Arbor Brasil – já pediu autorização para entrar no mercado norte-americano, começando por Miami. Os motivos da preferência são o teor alcoólico (14%), o preço razoável e suas alardeadas qualidades afrodisíacas, além de exercer efeito menos diurético do que a cerveja.
A planta Anemopaegma glaucum fotografada na serra dos Pirineus |
Meu primeiro porre, aos treze anos, gravado a ferro e fogo na memória, foi no Carnaval de 1951, com Catuabom, uma gororoba que surpreendentemente ainda continua no mercado. Marinheiros de primeira viagem – eu e dois amigos – enjoamos e depois vomitamos a alma e perdemos a garrafa, que não tinha acabado, nas areias da praia de Guaratuba, no litoral paranaense. Gastamos umas boas duas horas embriagadas à procura do precioso Catuabom. Não tenho a menor ideia de como voltei para casa.
Eu passava as férias na casa de praia de meu tio e padrinho – advogado e jornalista – José Muggiati Sobrinho. Era uma bela residência de madeira – na época Guaratuba quase não tinha prédios de alvenaria – plantada na avenida principal, a meio caminho entre a baía e a praia aberta. Tio José era uma espécie de Rei de Guaratuba: comodoro do Iate Clube, com uma lancha possante, tinha o único lotação da cidade, uma Kombi, que fazia o trajeto da baía até a praia, com um quilômetro de distância. Era dono também do único cinema local. Explicando melhor: com o equipamento básico de um projetor, algumas latas com rolos de filmes e uma tela, ou um simples lençol branco, ele promovia sessões de cinema num galpão de madeira que pertencia à associação dos pescadores. Ao fim da sessão, as cadeiras eram encostadas às paredes e o galpão se transformava em pista de forró para os caiçaras.
Foi lá que vi um dramalhão mexicano inesquecível: Maria Candelária, de Emílio Fernández, que escreveu o enredo em treze guardanapos de papel num restaurante, enquanto esperava a atriz Dolores del Río, ansioso porque não pudera comprar um presente de aniversário para ela. Estrelado por Dolores e Pedro Armendáriz, filmado na Cidade do México com fotografia do mestre Gabriel Figueroa, Maria Candelária, conquistou o Grand Prix da primeira edição do Festival de Cannes, em 1946. Um detalhe que nunca esqueci: a heroína morre apedrejada por uma turba.
A foto do fato narrado abaixo: escondendo a ressaca no Clóvis; no bloquinho de carnaval com as primas Marli (4ª) e Ieda (6ª); e a mesa de pingue-pongue em destaque à direita. Foto: Acervo Pessoal |
Como disse Sartre – ou, se não disse, pensou – a náusea é mil vezes pior que a dor, um convite ao suicídio.
O orgulho da família – e o meu, pessoal – estava em jogo. O oponente era agressivo e atacou forte no começo, mas estava aí a sua principal fraqueza: a truculência. Com sutileza e jogo de cintura ganhei a partida. E então fui encarar o almoço dominical ainda com o gosto amargo da catuaba na minha boca. Um gosto que sinto até hoje...
3 comentários:
Muggiati, pra quem viu você durante anos naquela mesa solene da Manchete, vê-lo como um Clóvis porrista é sensacional, rs, rs
Em Portugal tem uma bebida muito popular chama Pau de Cabinda, feita segundo me disseram de casca de uma árvore de Angola. É um poderoso afrodisíaco capaz de acordar pra vida até um monge tibetano de 100 anos
Roberto Mugiatti, mandou via email a seguinte mensagem: "Esmeraldo, por trás do Eremita (apelidado pelo Alberto) e do Muggi das Crises, que carregava a Cruz da Mesa em L,
existia outro Muggiati, amante da vida e das suas pequenas transgressões. Mas a condição de editor-chefe de uma revista como a Manchete me obrigava a adotar um tom de seriedade condizente com o cargo.Um abraço, Muggiati"
P.S - "Gostei da foto de 1982" (N.R. - Em referência ao post Fotomemória da redação:"Manchete, rua do Russel, 8° andar, março de 1982" publicado wm 4/3/2917)
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