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Imagem reproduzida da Revista Contigo! |
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Foto Tabach |
por José Esmeraldo Gonçalves (matéria publicada na Revista Contigo! em 2015)
A nova casa de Cid Moreira é um estado de espírito. Aos 87
anos, 70 de carreira e 14 de casamento com a jornalista Fátima Sampaio, o
apresentador encontra na Serra Fluminense o ambiente perfeito para seu momento
atual: viver em paz e levar a Bíblia ao maior número de pessoas.
A iluminação à base de spots, refletores e rebatedores se
destaca na sala principal da nova casa de Cid Moreira e de Fátima Sampaio, 51.
Mas são precisamente detalhes como esses que traduzem a linha e a essência dos
ambientes. Parecem estar ali para dizer que a casa tem dono, alma e nada de
impessoal. E não por acaso. Decidido a montar o refúgio perfeito, o próprio
casal cuidou da decoração. “Eu só dei alguns palpites”, corrige Cid. “Fátima é
a autora de 95% de tudo o que está aqui. E não terminou. A cada dia, aparece
uma coisa nova, uma planta diferente no jardim. Ela se distrai aí, bolou tudo”,
brinca. A jornalista, que se divide entre a logística da casa e administração
da carreira e da agenda de compromissos do apresentador, concorda, mas explica
que tentou imprimir em cada canto o jeito e o gosto do marido. “Pensei nesses
spots como uma referência carinhosa à trajetória dele, tão brilhante. Ao mesmo
tempo, podem ser usados em gravações de vídeos para a Internet, quando ele
quiser. O uso de muito vidro, principalmente na parte que dá para o lago, foi
decidido também depois de um comentário dele sobre a beleza da natureza na
serra. Segundo ele, ‘é um quadro vivo’, diz Fátima. De fato, a partir da sala
principal, da mesa onde o casal faz as refeições e até da cozinha, a vista é
panorâmica. Cid pontua: “Foi o William Bonner quem me indicou esse local,
sabia? É muito tranquilo”. Mesmo conhecendo as preferências do marido – além da
convivência, ela é autora da biografia do apresentador, “Boa Noite”, lançada em
2010, Fátima buscou a opinião dele sobre muitos aspectos da decoração.“A gente
discutiu junto o que fazer. O piso, as imitações de madeira, o balcão da
cozinha. Aproveitamos as viagens e reunimos móveis e objetos de várias regiões
do Brasil. É muito legal ele confiar no meu gosto. A gente brinca de casinha
enquanto Deus quiser, não é?”, diz ela, que equipou a casa com sistema de
captação de água da chuva e instalará, ainda no próximo verão, quando poderá
definir a posição dos painéis, um projeto de energia solar. “Temos uma horta,
pegamos rúcula, couve e alface no quintal”, lembra-se de acrescentar. Um
ambiente assim justifica um comentário do Cid, que admite ser difícil deixar,
quando precisa, a rotina da casa. “Fátima é um presente que Deus me deu, a
minha parceira que me completou. E, hoje, o que quero é só isso, viver em paz,
fazer meu trabalho”. Fátima, que o acompanha em todas a viagens e tenta
dosá-las para que ele não se afaste muito da tranquilidade da serra, confirma:
“A gente está sempre juntinho. Às vezes, ele está trabalhando no estúdio e eu
estou lendo na sala, aí ele aparece, quer saber se está tudo bem, traz um café.
Gosto muito dele. Tudo passa tão depressa, a diferença de idade, ninguém sabe o
prazo de validade de cada um aqui. Acho que por causa da diferença de idade, a
sensação é de aproveitar todo o tempo para amar, deixar as bobagens de lado.
Essa é uma sensação bem real pra mim”.
O casal se conheceu em 2000, durante um torneio de tênis
que ela cobria, como jornalista, em Fortaleza. “E estamos juntos há 14 anos.
Rápido, não e? O que aproximou a gente? Foi a simplicidade, apesar de ser muito
conhecido, Cid é muito simples, não tem frescura. Temos a profissão em comum,
Ele é um craque, eu sou uma operária comparada com ele, tive uma vida muito
mais simples, trabalhei em lugares mais simples, sou básica, não tenho
genialidade. E tenho admiração por ele e pelo o trabalho dele, que é muito bonito”,
diz Fátima, que define o marido como um romântico à moda antiga. “Ele gosta de
surpreender. Às vezes, em viagens, convida ‘vamos lá pra piscina, a gente
coloca umas velas, toma um vinho. Ele tem muita disposição”, ri. Desde que
deixou o Jornal Nacional, em 1996, e passou a fazer participações semanais no
Fantástico (atualmente, de contrato renovado até 2017, ele vai à Globo quando é convocado para
alguma tarefa especial), Cid Moreira se dedica intensamente à gravação de
textos bíblicos. Nesse período, lançou Cds e Dvds e cumpriu a tarefa quase
monumental de gravar toda a Bíblia, do Gênesis ao Apocalipse, em uma produção
que ultrapassou a simples leitura e incorporou personagens, dramaturgia e
efeitos especiais. Para ele, a atividade espiritual ultrapassou a tarefa
funcional. Não é apenas mais um trabalho. É profissão de fé. O apresentador não
se considera ligado a igrejas específicas ou denominações religiosas, mas tem a
divulgação e popularização da Bíblia como uma missão. “É um compromisso entre
mim e Deus. Ele e eu. A cada dia me envolvo mais, leio diariamente, viajo, faço
palestras, participo de eventos. Recentemente, subi em um trio elétrico em
Salvador e falei para mais de 40 mil pessoas”, diz ele, que está com vários
projetos em andamento. Um deles, gravar os chamados livros apócrifos católicos
(Tobias, Judite, I Macabeus, II Macabeus, Baruque, Sabedoria e Eclesiástico). Outro,
o desenvolvimento de um site onde os internautas poderão receber mensagens
personalizadas com o timbre da voz do “boa noite” mais famosos da história da
televisão. Um caixinha semelhante às de música, na qual se pode ouvir Cid ler
um salmo, é um dos trabalhos que ele faz, atualmente, no computador e no estúdio
que montou na nova casa. Uma nova fase, tão intensa quanto as outras, em uma
carreira de 70 anos, desde o primeiro emprego, em 1947, como locutor da Rádio
Difusora de Taubaté, onde nasceu. De lá para cá, passou por todas as mídias, da
mais analógica à mais digital. Rádio, cinema (como narrador de cinejornais, com
o famoso Canal 100), narração de
comerciais, dublagens, a estréia como locutor de noticiários no Jornal de
Vanguarda, na TV Rio, em 1963, até chegar à Globo e, em 1969 à bancada do
Jornal Nacional, onde permaneceu até 1996, quando passou a narrar reportagens
especiais do Fantástico. Há poucas semanas, Cid, em plena era multimídia, foi a
voz do Natalis, um megaespectáculo de água e luz que conta o nascimento de
Jesus, como parte da programação do Natal de Gramado, na serra gaúcha.
Quando não está viajando, Cid acorda cedo e, logo depois de
um café da manhã à base de frutas, dirige-se à miniacademia instalada ao lado
da piscina. Faz pilates, caminha na esteira ergométrica e, às vezes, joga
tênis. O hábito, de longos anos, explica a energia que tem de reserva para
atender aos compromissos em todo o Brasil. Confessa que já foi mais
“fanático" nos treinos, hoje pega mais leve, depois de um problema no
ilíaco. “Eu exagerava na velocidade da esteira”, admite. Na miniacademia,
destaca-se, ao fundo, um cartaz com a palavra “relax”, um sutil recado, apesar
de calma e tranquilidade fazerem parte do seu temperamento. Uma característica
que o leva a atender os fãs, durante as viagens, com a maior paciência. E olha
que, no caso do Cid Moreira, não basta apenas a foto selfie. Querem áudio. É de
lei pedirem ao homem do ‘boa noite” que grave recados nas secretárias
eletrônicas dos celulares.
(*) - O apresentador Cid Moreira morreu na manhã de quinta-feira (3/10/2024) aos 97 anos, no Hospital Santa Teresa, em Petrópolis, na região serrana do Rio de Janeiro. O ex e histórico âncora do Jornal Nacional sofreu falência múltipla de órgãos após quadro de pneumonia.