sábado, 7 de janeiro de 2023

Memórias da redação - Vinícius de Moraes e suas mulheres apaixonadas

 






Revista Manchete (2 de janeiro de 1980)

Depoimento a Reynivaldo Brito e Tarlis Batista

Fotos Manchete (*)

Não nasceu para negócios, mas para o amor e para a vida. No dia 19 de outubro de 1913, na Rua Lopes Quintas, 114, Gávea, o nascimento de Marcus Vinícius da Cruz de Melo Moraes trouxe alegria e preocupação. O pai tinha algum dinheiro, fizera maus negócios na ocasião, com o nascimento do garoto teve de emigrar, procurar vida mais barata. A família deixou a aristocracia da Gávea e foi para o Cocotá, na Ilha do Governador, então muito bucólica, sem ponte e sem praias poluídas.

Ali, o menino Vinícius tomou contato com a natureza, à vida desinibida e livre dos pescadores e dos pobres. Nunca perderia esse chão de infância.

Mas havia que estudar e na ilha não havia bons colégios. Vinícius é matriculado no Santo Inácio, onde reinicia, gradualmente, seu retorno à Zona Sul, mais precisamente, à Gávea, onde, aos 66 anos, morreria.

No colégio dos jesuítas, a fase espiritualista, católica, conservadora, as influências de pias leituras e, mais tarde ainda, na Faculdade de Direito, a influência de Santiago Dantas e Octavio de Faria. Vinícius não chegou nunca a ser um reacionário, mas andou perto.

Como acontecia naquele tempo, falsificava-se facilmente a idade para um menino precoce poder cursar a faculdade. Com 16 anos, já acadêmico de Direito, faz a primeira letra, Loura ou Morena, música de Haroldo Tapajós, gravada em disco Colúmbia pelos Irmãos Tapajós: Paulo e Haroldo, Ano do evento: 1932. Repetiu a dose com os mesmos parceiros, fazendo foxtrotes que tiveram algum sucesso. Mas não dava para ganhar a vida. Com 19 anos, já formado, sonda o mercado de trabalho e verifica que não dá para advogado. Preferia ficar lendo, num bar, tomando um chopinho, e, sobretudo, vendo passar na calçada às moças cheias de graça.

Anos mais tarde, eternizaria esse hábito e essas moças na figura da Garota de Ipanema. Sempre influenciado pelo catolicismo, ele publica seu primeiro poema na revista A Ordem, fundada por Jackson de Figueiredo. A Transfiguração da Montanha foi levada por Octavio de Faria a Alceu Amoroso Lima, que dirigia a revista. Todos pareceram gostar inclusive o próprio Vinícius, que no ano seguinte estréia em livro: Caminho Para a Distância. Seu amigo Octavio de Faria dedica-lhe um ensaio em que estuda a ainda escassa obra de Vinícius ao lado de outro estreante, Augusto Frederico Schmidt. Relembrando essa fase, Vinícius não teve piedade de si mesmo: “Minha poesia inicial tinha de ser esotérica e metafísica. Era muito artificial. Felizmente, minhas curtições de menino criaram em mim um nódulo natural de resistência contra os erros da minha formação, que me permitiram, quando mais adulto, optar por uma simplificação de meu instrumento de trabalho, no sentido de comunicar-me mais e melhor”.

O segundo livro se enquadra dentro desse período sombrio e tem um título óbvio: Forma e Exegese (1935). Apesar de tudo, é um poeta desempregado, até que consegue o seu primeiro emprego sério: o de censor de filmes, de 1936 a 1938, ocupação pouco brilhante e democrática da qual logo procurou se livrar. Arranjou uma bolsa-de-estudo. Aos 24 anos, o primeiro casamento, por procuração. A noiva, Tati, morava em Londres. Foi o início da outra e da mais comprida obra do poeta: o amor.

O casamento durou bastante, foi o mais longo. Vindo do exterior, o casal foi morar no Leblon, numa casinha da Rua General São Martin. Ali se reunia uma turma de amigos, mas a boca-livre era moderada pois o dono da casa continuava sem emprego. Aí apareceu a opção do Itamarati. Naquele tempo não existia o severo vestibular do Instituto Rio Branco. Mesmo assim, havia um concurso e Vinícius passou uns tempos estudando seriamente, só conseguiu passar na segunda tentativa. Deve a sua carreira diplomática à influência de sua mulher Tati e de seus amigos diplomatas Jaime Azevedo Rodrigues e Lauro Escorel. Em 1943 recebe o primeiro posto no exterior: Los Angeles. Serviria na carreira diplomática durante 25 anos, mas nunca levou a sério a função.

Mas importante do que tudo foi à viagem que fez pelo interior do Brasil em companhia do polonês Waldo Frank. A intimidade com o Brasil de verdade provocou a virada total em sua vida: na poesia, na ideologia, na maneira de viver e, até, no modo de amar. Libertou-se gradativamente das amarras e entrou de cabeça na vida. Para Viver.

Daí em diante, a vida de Vinícius se confunde com a do tempo em que viveu, nos setores da música popular, do espetáculo, da badalação e até mesmo da política.

Duas importantes vertentes se formam na obra viniciana, dividida esquematicamente em dois segmentos básicos: a poesia em termos eruditos ou em letras de canções populares; e o roteiro infinito de suas andanças amorosas, sintetizadas em nove casamentos e diluídos em diversos casos, sobretudo, na imagem do grande amante que, de uma forma ou outra, influencia homens e mulheres de duas gerações.

Como poeta, ele conseguiu ser maravilhosamente fiel às mulheres com as quais se casou e amou enquanto o amor foi amor

A série de casamentos iniciada com Tati prolongou-se, em 1952, com Regina. Seguiram-se: Lila Bôscoli, Lúcia Proença, Nelita Abreu Rocha, Cristina Gurjão, a baiana Gesse, a argentina Martinha e Gilda, a última. Mais do que um rosário de nomes, foi uma vivência de amor que ele esboçara, pela primeira vez em letra de forma, numa edição de MANCHETE, em 1955, na seção intitulada A poesia é Necessária. Ilustrado por Carlos Thiré, aparecia Receita de Mulher, com a indicação: “Poema inédito, enviado de Paris especialmente para esta página.” O poema tornou-se famoso, principalmente pelo seu citado começo: “As muitas feias que me perdoem/ mas beleza é fundamental.”

A ruptura de Vinícius com o mundo acertado e frio é total. Pouco a pouco, ele abandona uma série de convenções, a gravata, o paletó os cabelos corretamente cortados, engorda e emagrece conforme a vida vai levando, curte corajosamente suas fossas, atola-se no amor (“O que mais gosto é do agarramento”), participa de movimento bossa-nova, onde logo conquista o lugar que ninguém lhe tira: o de melhor letrista. Ao mesmo tempo que muda de mulher, muda de parceiros e ele próprio admite que há alguma analogia na parceria de uma vida e na parceria de uma canção: o mesmo ciúme, o mesmo gostar muito e, finalmente, a exaustão, o não ter mais nada a dizer.

Antônio Carlos Jobim, Carlos Lira, Baden Powell, Toquinho – ele influencia diretamente todos demais letristas e se torna o Poetinha das rodas boêmias, o adulto maldito da sociedade bem-comportada.

Em 1968, já famoso internacionalmente através de seu filme Orfeu do Carnaval e de algumas letras que percorriam o mundo, Vinícius é aposentado a força de suas funções de diplomata – que, aliás, ele próprio era o primeiro a desprezar. Dá expediente, então de boêmio, em regime full time. Deixa o Rio por uns tempos, considerando a cidade em que nascera muito cruel e agressiva. Vive uns tempos na Bahia, jura que nunca mais sairá de lá, “a Bahia está mais perto da verdade”, mas o sonho dura o que duraram suas paixões e ele volta ao mundo e ao Rio. Só conseguiu ser fiel ao grande amor, que para ele não estava numa mulher ou numa situação, mas num clima interior.

“Vinícius havia chegado a Paris, em 1956” – conta Cristina Gurjão – “e o Ronaldo Bôscoli me apresenta a ele. Na época Vinícius estava casado com Lila Bôscoli. Eu tinha 16 anos e fiquei deslumbrada com a possibilidade de frequentar a casa dele. Acabei me tornando amiga do casal. Mas nada havia entre nós. Depois ele se separou de Lila e se casou com Lucinha Proença. Eu só me casei com ele em 1968. Foi um casamento que durou quase três anos e nesse período tivemos uma filha, Maria, hoje com 10 anos. Vinícius foi um dos seres humanos mais perfeitos que conheci. Foi, inclusive, um bom pai. Todas as vezes que vinha ao Rio encontrava tempo de se dedicar a Maria. A influência dele está se refletindo agora em nossa filha, cujo temperamento é bastante parecido com o de Vinícius”.

Além de distribuir amor, Vinícius distribuiu talento e alegria com seus numerosos parceiros e amigos da música, do teatro e da vida

“Meu primeiro encontro com Vinícius – diz a baiana Gesse – foi durante a filmagem de Sol Sobre a Lama, dirigido por Alex Vianny e cuja trilha sonora era de Pixinguinha e dele. Foi um simples conhecimento, não um contato estreito. Em 1969, quando Vinícius colocou as mãos sobre o cinema da calçada da fama, em Ipanema, segui com Maria Bethânia e alguns outros amigos baianos para uma boate. Vinícius foi conversando com todos, de repente estávamos ele e eu sozinhos, fomos para uma boate onde Luizinho Eça tocava ao piano. Vinícius começou a cantar canções para mim. E assim tudo começou. No dia seguinte voltei para a Bahia e pouco tempo depois recebi um telegrama pedindo que eu viesse ao Rio. Arrumei as malas e vim ao seu encontro, seguindo com ele para o Uruguai. Ele iria realizar uma temporada por lá. E lá nos casamos. Foi, aliás, o nosso primeiro casamento. O segundo aconteceu em 1973, no candomblé. Nos sete anos que durou nossa ligação, ele foi muito feliz. Vinícius me cercava de muitas atenções e carinho. Sei que muitas mulheres povoaram a sua vida durante o nosso casamento. Ele viajava, em temporadas pelo interior, eu telefonava para o quarto dele, uma mulher atendia, dizia que era a camareira, a arrumadeira, mas eu sabia que era outra amada. Não me aborrecia. Afinal, o seu amor era eterno enquanto durava. O nosso, enquanto durou, foi eterno. Recebia flores de todos os cantos do mundo, fui carregada no colo e tive todas as minhas vontades realizadas pelo homem maravilhoso que um dia me amou”.

Vinícius não fazia por menos. A um repórter confessou um dia: “O que eu gostaria mesmo é de reunir a mulherada toda, desde Tati, todas as minhas namoradas, mulheres, casos, flertes, encher a casa com elas, fazer aquele porão de Fellini em Oito e Meio, a promiscuidade total, o amor total”.

Para um homem assim, para um poeta simples e consumado, a vida não podia estar dissociada de sua obra. Mais do que escrever poesia, ele vivia a própria poesia em sua vida, em sua paixão e em sua glória.

(*) Infelizmente, a edição não deu crédito para os fotógrafos. 

Mídia - a cobertura política apela para caça-cliques

por Flávio Sépia 

A mídia neoliberal dominante vende a alma para resistir ao novo estilo de comunicação que a internet impõe. Para isso, não hesita em nivelar por baixo. A cobertura política atual estimula a fofoca. 

Se não há um conflito para esquentar a pauta, que se invista na divergência latente. 

Um exemplo: comentaristas agora mais valorizados do que repórteres discutem como se fosse amanhã a corrida presidencial de 2026 e já destacam o que chamam de "briga pelo poder" que, segundo eles, envolve Simone Tebet, Fernando Haddad, Geraldo Alckmin e Tarcísio Freitas. 

Ao ouví-los a impressão que fica é que no próximo sinal de trânsito o brasileiro que acabou de eleger um novo presidente vai encontrar cabos eleitorais com bandeiras e "santinhos" dos "candidatos". Mas não, na fila do pão não tem ninguém falando nas eleições de 2026.  

Para os comentaristas o que vale é plantar conflitos para descolar cliques. Claro que, como é frequente, quando os próprios governantes e suas decisões geram conflitos, ótimo, os comentaristas não precisam dar asas à imaginação. 

O governo Lula já deve ter recebido mais críticas do que Bolsonaro em quatro anos. Explico: a mídia neoliberal jamais criticou a política econômica de Bolsonaro e Paulo Guedes. No máximo discutia os costumes, a aversão à cultura, o racismo disseminado entre os apoiadores do governo passado e funcionários da administração, os ataques ao meio ambiente, o desprezo ao estado laico e intolerância etc. A economia era praticamente intocável. 

Sabe-se agora que Bolsonaro e Paulo Guedes deixaram um rombo colossal nas contas públicas. 

A mídia neoliberal não questionou isso, o mercado não ficou nervoso. 

Ao contrário. Jornalistas da mídia tradicinal, de braços dados com Faria Lima só faltaram festejar o "Brasil voando" tão repetido pelo Paulo Guedes. Uma comentarista observou que "o bom momento' da economia poderia beneficiar Bolsonaro, sem apontar que "o bom momento" era a distribuição eleitoreira de dinheiro via auxílios, doações a taxistas, caminhoneiros, emendas de orçamento, renúncia fiscal para baixar preços dos combustíveis etc.     

Subitamente, depois que a cadelinha  "Resistência" subiu a rampa do Planalto, os mesmos comentaristas foram acometidos de um forte espírito crítico encomendado pelo baronato da midia. 

Quem lucra com a política de juros altos do Banco Central


Monica de Bolle é carioca e mora em Washington D.C. Trabalhou no FMI, foi professora da PUC-Rio. Atualmente é professora da School for Advanced International Studies da Johns Hopkins University e pesquisadora sênior do Peterson Institute for International Economics. 
Neste artigo publicado no Twitter, ela explica as razões da ofensiva do "mercado" e da mídia neoliberal contra o governo Lula deflagrada nos primeiros dias da nova gestão.  Pela clareza e pela força dos argumentos, vale a pena ler para entender a alta de juros na segunda metade do governo Bolsonaro



Relacionando o Fiscalismo à Inflação (*)

Quando a inflação sobe é preciso aumentar a taxa de juros, certo? Os livros de economia dizem isso, os fiscalistas insistem nisso, a mídia não cansa de escrever isso. Logo, só pode estar certo, não? Não.

Ou, melhor dizendo, não necessariamente. Inflação em alta não é, de cara, motivo para aumentar os juros de forma rápida e intensa. Para tanto, é preciso ter um diagnóstico. Qual diagnóstico justifica a alta expressiva dos juros?

Quando a inflação tem causas quase unicamente domésticas -- sejam gastos públicos elevados, consumo "excessivo", espirais salário-preços -- é trabalho do Banco Central conter as pressões por meio da elevação dos juros, dados seu mandato e o regime de metas de inflação.

Ainda assim, os juros não são o instrumento perfeito de contenção inflacionária, mas constituem o melhor que temos para enfraquecer os impulsos que levam aos aumentos de preços.

Pensemos agora em outras situações.

Especificamente, imaginemos que as causas da inflação sejam, sobretudo, externas. Por exemplo: a inflação pode ter subido porque a China, com a adoção da COVID zero para combater a pandemia, desarticulou as cadeias de produção globais. 

A inflação pode, também, ter subido por causa da alta dos preços do petróleo provenientes da guerra entre a Rússia e a Ucrânia.

Se esses forem os fatores predominantes da alta inflacionária brasileira, aumentos de juros para conter a inflação serão menos eficazes.

O que isso significa? Significa que ou o Banco Central terá de elevar os juros para um patamar mais alto para alcançar o mesmo resultado de contenção inflacionária do que se as causas fossem internas. Ou, alternativamente, significa que o Banco Central pode...

...elevar menos os juros e aguardar até que as condições externas causadoras da inflação tenham se estabilizado.

Qual o diagnóstico para as causas da aceleração inflacionária brasileira observada em 2021?

Uns acham que são sobretudo internas, embora seja difícil apontar quais são, exatamente. Afinal, todos sabem que a economia não andou nada bem e que a fome, a pobreza, o desemprego, o subemprego, aumentaram no período.

Como a inflação brasileira subiu junto com a inflação no resto do mundo, parece bem mais certeiro o diagnóstico de que suas causas sejam, sobretudo, externas.

O BC optou por combater a inflação de origem externa elevando rapidamente os juros de 2,75% em março de 2021...

...para os atuais 13,75%. Isso significa que a despesa financeira, isto é, a despesa com o pagamento dos juros da dívida, aumentou em cerca de R$ 740 bilhões ao longo de apenas 15 meses (de março de 2021 até junho de 2022). 

Os fiscalistas argumentam que as despesas estão muito elevadas, que não há espaço para financiar programas sociais na magnitude que o governo anunciou. Contudo, a base de sua argumentação é a despesa primária, aquela que exclui os pagamentos de juros da dívida.

Desse modo, ocultam o estrepitoso crescimento da despesa que realmente interessa: a despesa financeira. Por que? Porque quem recebeu os R$ 740 bilhões com a elevação dos juros para combater uma inflação de causas externas foram aqueles que detém títulos públicos.

Quem detém títulos públicos? Ora, não são os mais pobres, as pessoas em situação de fome, os desempregados, as pessoas que vivem nas favelas, enfim, não é a maioria da população brasileira. São os donos de fundos de investimento. São os fiscalistas, ou seus representantes.

Portanto, reparem na oportunidade conferida pela inflação externa aos detentores de títulos: por causa da resposta do BC (essa não é uma crítica ao BC), detentores tiveram ganhos extraordinários, com risco zero, e alta liquidez. Explico.

Risco zero: não há risco de calote da dívida pública, logo os rendimentos recebidos não refletem qualquer problema futuro de capacidade de pagamento do governo.

Alta liquidez: liquidez é dinheiro na mão. Títulos públicos podem ser vendidos nos mercados secundários em troca de moeda. Dinheiro vivo.

Portanto, entre março de 2021 e junho de 2022, receberam os detentores de títulos uma elevadíssima rentabilidade sem qualquer risco e, ainda por cima, com alta liquidez. A tríade rentabilidade alta, risco zero, e liquidez é uma distorção.

Uma distorção que distribui recursos para os que têm mais, não permitindo sobras para quem tem menos. A pobreza aumentou, a fome também. Por que? Porque os recursos públicos são limitados.

Está aí o resumo do conflito distributivo da segunda metade do governo Bolsonaro.

Os alarmes soam porque, francamente, quem quer largar rentabilidade com liquidez e risco zero? Quem quer perder seu quinhão para dar a quem precisa?

Eis a distorção brutal sobre a qual pouquíssimos falam.


(*) Texto reproduzido do Twitter

Da Rede Estação Democracia - A energia que nos impulsiona

 De LENEIDE DUARTE-PLON*, de Paris




Tarefa de reconstruir o país enche os brasileiros de entusiasmo.



O Brasil foi apontado pela pesquisa Ipsos, realizada em dezembro em 36 países e divulgada esta semana na França, como “o país mais otimista do mundo”. 85% dos brasileiros ouvidos concordaram com a afirmação: “2023 será um ano melhor que 2022”. O otimismo domina corações e mentes. A esperança escancarou portas fechadas a cadeado.

Em matéria de otimismo, seguem o Reino Unido com 53%, a França com 44% e o Japão com 36%.

Os brasileiros têm motivos para ser otimistas e esperar um novo ano melhor ? Sim. Dezenas, centenas de motivos.

Nenhum de nossos governantes teve em seus ombros carga tão pesada, tão difícil, tão épica. Mas nenhum governante brasileiro teve ativistas tão “entusiasmados”, no sentido etimológico, plenos de deus, dessa força ancestral que nos habita. Estamos plenos de todos os deuses africanos, dos deuses dos povos indígenas, do deus dos cristãos, do deus dos judeus e do deus dos muçulmanos. De todos os deuses do Olimpo. A palavra “entusiasmo” deriva-se do grego “enthousiasmos” que significa “ter um deus interior” ou “estar possuído por Deus”. Estamos possuídos dessa energia interior que nos impulsiona para a frente, nos dá forças para a tarefa hercúlea de reconstrução do país.

Reconstruir o maior país da América Latina, devolver otimismo a uma população esmagada, faminta, morando nas ruas, se abrigando sob marquises das grandes cidades. Reconstruir o Sistema Único de Saúde, a Educação, a Cultura, o Ministério do Trabalho, a Ciência, a Tecnologia, a Pesquisa. Dar um ministério aos povos originários, reconhecendo-lhes os direitos pisoteados pelas botas dos militares e pelos usurpadores de terras indígenas, pelos assassinos que agiam na impunidade.

O Brasil não tem motivos para ser o povo mais otimista do planeta ? Temos, agora, um maestro cheio de élan para reger a partitura que todos nós escreveremos. Todos nós? Sim, os democratas, os que não renunciaram à luta, à denúncia dos abusos, os que se indignaram com todos os crimes, a começar pelos crimes contra o meio ambiente que hipotecam nosso futuro.

LEIA A MATÉRIA COMPLETA NA RED  AQUI

quinta-feira, 5 de janeiro de 2023

Fotomemória da redação: por falar em Pelé...

 


Capa da Manchete, 1980. Foto de Sérgio de Souza

por José Esmeraldo Gonçalves 

Os arquivos desaparecidos da Manchete guardam milhares de fotos de Pelé. Uma rápida pesquisa mostra que o nome Pelé foi citado na revista mais de 10 mil vezes, sem contar outras publicações da Bloch, como Fatos & Fotos, Amiga, EleEle, Manchete Esportiva. 

Manchete acompanhou a carreira e a vida do jogador desde os seus primeiros dias no Santos Futebol Clube, passando pelas quatro Copas do Mundo que ele disputou e a conclusão da trajetória no Cosmos, de Nova York. 

Reprodução/Manchete Esportiva/1959.

Pelé parou com a bola, mas a Manchete não deixou de acompanhá-lo até o ano 2000, quando a Bloch Editores faliu. Em 1959, a Manchete Esportiva publicou uma edição especial com uma fotonovela sobre a vida de Pelé, estrelada pelo próprio jogador e sua família. Vai ver foi nesse momento que inventaram o reality show. A fotonovela mostrava o craque, já campeão do mundo, fotografado passo a passo com a família nos lugares de referência da sua vida real. O script era de Benedito Ruy Barbosa. Fotos de José Castro feitas em Bauru e Santos. No elenco, além do próprio Pelé, estão Dondinho, o pai, Dona Celeste, a mãe, Lula, seu treinador, entre outros..

A capa acima é de 1980. Pelé completava 40 anos e, durante uma reunião de pauta, Célio Lyra, diretor de Serviços Editoriais, sugeriu uma capa com Pelé, recém-divorciado de Rosemeri Cholbi, a Rose,  cercado de modelos. O repórter Tarlis Batista, amigo do jogador, fez o contato e a entrevista, a primeira com ele solteiro. Célio reuniu as modelos Xuxa, Luíza Brunet, Adeline e Márcia Brito, vistas aí no sentido horário. Sérgio de Souza fotografou. O resto da história todos sabem, Pelé a contou muitas vezes. Foi durante essa sessão de fotos que ele conheceu Xuxa. Dali nasceu o romance que durou até 1986.    

segunda-feira, 2 de janeiro de 2023

Qual era a queixa mesmo?


 

Reprodução Twitter 

No alto, Bolsonaro apresenta seu ministério. Duas mulheres, nenhum negro, nenhum indígena. Nenhuma reclamação da mídia, na época, sobre a falta de diversidade. A outra foto mostra o ministério de Lula, que uma colunista do UOL acaba de chamar de misógino, olha só. 

E a capa do New York Times como é que está hoje?

 


Mídia - A posse de cada um

por José Esmeraldo Gonçalves

Uma das características principais dos influenciadores das redes sociais é "personalizar" a informação. Para eles e elas, a regra é clara: o influencer deve ser sempre mais importante do que a notícia. 

A mídia tradicional faz todas as tentativas possíveis para enfrentar  as redes sociais. Difícil. Falo das redes sociais legítimas e não geradoras de fake news ou incubadoras de robôs. Elas produzem conteúdos o tempo todo e é inevitável que a mídia tradicional se obrigue e repercuti-las em todas as editorias: política, esporte, celebridades, polícia etc. O poder de comunicação dos influencers é geralmente institivo. Linguagem, textos, e contextos são muito particulares. Nem eles sabem porque determinada fórmula deu certo e não é facil recriá-la em "laboratório".  A mídia tradicional tenta pegar esse bêerretê.

Há muitos exemplos, fiquemos com os mais recentes: durante a entrega de prêmios de "melhores do ano" o programa do Luciano Huck contratou um humorista influenciador e o colocou na plateia para fazer intervenções irreverentes. Resultado: as polêmicas criadas repercutiram positiva e negativamente mais do que o assunto central do programa. Já o SportTV, na tentativa de "modernizar" a cobertura da Copa, apostou em Jojô Todinho para "debater" a Copa do Catar. Não funcionou nem como humor. Foi constrangedor, na verdade. O desastre só não foi total porque Marcelo Adnet carregou o quadro nas costas. A estratégia não impediu que o grande fenômeno tenha sido a cobertura de futebol canal do Casemiro no You Tube que quebrou recordes de engajamento.

Foi curioso, ontem, comparar estilos da TV na posse do Lula. A Globo News, líder em audiência entre os canais de notícias, manteve seu estilo apesar da grandiosidade do evento. Os comentaristas, em grande número, revezando-se em estúdio na Praça dos Três Poderes, dominaram a cena. Como influencers narram suas experiências, divulgam suas opiniões. O evento, qualquer evento, é o pano de fundo. Menos notícia, muita opinião. Na prática, os âncoras foram mais focalizados do que o presidente que tomava posse, assim como as cerimônias, o cortejo, as multidões etc. A Globo News tem veiculado exaustivas campanhas sobre seus âncoras transformando-os em personagens, vale dizer, seus influencers. O jornalista Octávio Guedes se sai bem no estilo "influencer": sabe usar a ironia e a irreverência ao comentar o fato. Ao jeito dos fenômenos das redes sociais, o canal tenta adicionar humor, informalidade e brincadeiras entre os apresentadores. Apesar do esforço rumo à descontração, adota o ambiente formal e clean do estúdio. Não se misturam.Tanto assim que passaram a levar o estúdio às imediações da notícia, digamos. Aconteceu também na cobertura do governo da transição, onde âncoras preferiram enfrentar mosquitos no gramado do CCBB, sob uma tenda-set.

Uma observação: a Globo News tem atualmente pouquíssimos anúncios, mas isso não significa que tenha menos intervalos comerciais. Ao contrário. Você está vendo os comentaristas do canal e o jornal é interrompido para exibir um anúncio institucional com... os comentaristas do canal. Isso em todos os intervalos. Quando não, a Globo Play pelo menos exibe por intermináveis segundos o logo Globo News, sem áudio. O assinante fica com a impressão de que o sinal caiu. Talvez isso aconteça só para quem acessa através do streaming. Vai ver na Globo News via Net sejam veiculados comerciais que não passam via Globo Play. Não sei, é apenas uma hipótese.

A CNN Brasil parece equilibrar melhor a parceria entre âncora e repórter. Está mais ligada nos fatos. É mais dinâmica. Confirmou antes os detalhes da entrega da faixa, assim como mostrou a saída do cortejo antes da concorrente e conseguiu colocar mais cedo duas repórteres, uma delas filmando com celular e outra acompanhada de  cinegrafista, no salão que reunia praticamente todo o novo governo, o que resultou em matérias exclusivas. Além disso, a âncora de ontem no horário da posse, Daniela Lima, ex-Folha de São Paulo e  TV Cultura, tem alma de repórter, opina, e é uma máquina acelerada de produzir informações, Além de aciona os repórteres com muita frequência. 

A Globo, como canal aberto, é um transatlântico bem mais difícil de mudar de rumo.  A cobertura foi ancorada pelos experientes William Bonner e Renata Lo Prete. Ambos faziam comentários breves e pontuais em cima do que acontecia. As imagens dominavam a cobertura. Bom ritmo. Para quem quis menor interferência de comentários recorrentes e ligou a TV ou o celular para ver o acontecimento como prioridade e a Globo entregou essa missão.  

O melhor é que houve opções. Quem viu, viu, onde quis.

O blog não acompanhou a Jovem Pan ou outros canais bolsonaristas/golpistas. 

Na fotografia, o destaque em sites e redes sociais foi a impressionante produção de Ricardo Stuckert, fotógrafo que trabalha com o Lula e agora foi nomeado para Secretaria do Audiovisual do Ministério da Cultura. Ele  aparentemente usava duas câmeras, celular e operava um drone. Claro que contou com o apoio de um assistente, mas estava em todos os lugares colado no Lula. Nesse quesito, só perdeu para Janja.


Posse: as melhores ausências

As ausências políticas na posse do Lula foram irrelevantes, nas bem-vindas. Ao não comparecer, Bolsonaro deu mais brilho à cerimônia. Mourão imitou o sociopata, no que fez muito bem: o cerimonial agradeceu. Os dois ministros do STF nomeados por Bolsonaro  declinaram do convite. Melhor assim. O ex-ministro da Marinha não deu as caras e assim contribuiu para dar maior dignididade ao evento. Temer, o notório golpista, não apareceu. Ótimo, atravessou a ponte para o passado.

O que essas pessoas têm em comum?

A democracia lhes causa erisipela cerebral. 

Lula: as fotos que resumiram a posse

 



Fotos de Ricardo Stuckert/PR


Flávio, artesão; Aline, catadora; Murilo, professor; Wesley, metalúrgico; Flávio; influenciador; Janja e Lula; Francisco, estudante; Cacique Raoni; Jucimar, cozinheira; Lu e Alkimin  Foto de Tomaz Silva/Agência Brasil

Entre as muitas imagens essas são, talvez, as mais simbólicas. Uma emocionante resposta ao preconceito, à discriminação, ao ódio. O Brasil que subiu a rampa do Palácio do Planalto é o país que o fascismo bolsonarista odeia. O gesto histórico é uma resposta eloquente aos assassinatos de indígenas, ao racismo, ao preconceito contra pessoas com deficiência, à fome, aos pobres. Também subiu a rampa a memória dos quase 700 mil mortos pelo deboche e desprezo do governo de Jair Bolsonaro à pandemia. Bolsonaro estava certo ao fugir do Brasil para não passar a faixa ao presidente eleito. Sua mediocridade, a raiva que carrega em si 24 horas por dia, a violência como meio e fim, o instinto destruidor e a psicopatia social como vício não cabiam mesmo nessa imagem.

As fotos de Ricardo Stuckert mostram que, enfim, a democracia voltou a subir a rampa. (José Esmeraldo Gonçalves)


sexta-feira, 30 de dezembro de 2022

Mídia saúda Pelé

 





O dia em que O Cruzeiro sequestrou a seleção campeã de 1958 e eu conversei com Pelé - Por J.A. Barros

O gol de Pelé que deu a vitória ao Brasil, por 1x0, contra País de Gales. O jogador beijou a bola no fundo das redes. Foto Jáder Neves-Manchete

. Reprodução
Pelé posou para O Cruzeiro. Reprodução

O goleiro Gilmar beija a Jules Rimet em frente à sede de O Cruzeiro

1958: Brasil vence a Copa do Mundo, na Suécia, e revela um jogador de 17 anos que viria a ser, logo depois, considerado Rei de Futebol. Edson Arantes do Nascimento, ou melhor, Pelé, fazia sua estreia no mundo. 

Naquele ano, eu trabalhava no Departamento de Arte, da revista O Cruzeiro. Consagrada a vitória, a seleção chegaria ao aeroporto do Galeão e, em cima de um carro de bombeiros, desfilaría pela cidade até o Palácio do Catete, onde o presidente Juscelino Kubitschek iria homenagear os campeões. 

Pois bem, diante desse fato, a direção da revista O Cruzeiro também resolveu celebrar os jogadores no salão de recepção da sua sede projetada por Oscar Niemeyer, na Rua do Livramento, no Centro do Rio de Janeiro. No espaço, com obras em grandes formatos de Portinari, foram montadas mesas de finos salgados, champanhe, caviar, enfim, um bufê servido pela Confeitaria Colombo. Mas o problema era como conseguir sequestrar seleção, desviando o comboio do seu trajeto e conduzindo-o para o prédio da revista. Estava previsto que o cortejo passaria na Av. Rodrigues Alves, nas proximidades da  Livramento. Rodolfo Brandt, que fazia parte do grupo de jornalistas da Cruzeiro, era da Policía Especial e pilotava uma motocicleta.  Assim que a comitiva saiu do Galeão, Rodolfo se posicionou à frente do carro dos bombeiros e passou a liderar a comitiva. O jornalista-policial entrou na Rodrigues Alves, região onde arqueólogos descobriram o porto onde os escravizados desembarcavam, e atrás dele vieram os bombeiros e os craques em caminhão aberto. Daí em  diante foi fácil. Rodolfo pegou a Sacadura Cabral e, em seguida, a Rua do Livramento. Em poucos minutos, a seleção entrava no saguão de O Cruzeiro. Em principio,a comitiva não entendeu muito o que estava acontecendo, mas resolveu relaxar e aproveitar o momento. 

Nós, do Departamento de Arte, que estávamos trabalhando, corremos para o salão, conhecemos alguns jogadores e nos detivemos em um garoto que, um pouco tímido, passou a conversar com a gente. Pelé nos disse seria o melhor jogador de futebol do Brasil. Claro, não acreditamos muito. A seguir, a  seleção retomou seu roteiro, afinal, um Presidente da República do Brasil estava aguardando os campeões do mundo havia algumas horas. 

O "sequestro" não resultou apenas em comemorações: repórteres e fotógrafos da revista fizeram matérias exclusivas com os herois do primeiro título mndial da seleção brasileira. Além disso, fomos os primeiros a ver de perto a Taça Jules Rimet. Em certo momento, o goleiro Gilmar foi para a rua e posou beijando a taça com a sede de o Creuzeiro ao fundo.

Minha filha costuma dizer que Deus gostava muito de futebol, mas não sabia jogar, então deu a Pelé toda a inteligência e toda a arte de jogar bola. 

Pelé, na minha opinião, é o eterno milagre da vida


Minhas tabelinhas com Pelé • Por Roberto Muggiati

 

 

A Fatos&Fotos foi a primeira revista a publicar a história foto de Orlando Abrunhosa

           
Em seguida, a  mesma imagem do fotógrafo brasileiro foi colorizada para
a capa da Paris Match


Um gol de gênio

 Foi pelo rádio de um carro de reportagem nos arredores de São José dos Pinhais – a caminho do local do desastre de avião que matou Nereu Ramos em 1958 – que ouvi o primeiro gol de Pelé numa Copa do Mundo. O gol que deu a vitória ao Brasil contra o País de Gales nas quartas de final. Um gol antológico que é repetido a toda hora na TV.

O primeiro gol de Pelé em Copas do mundo - 1958 - YouTube CLIQUE AQUI

               

Le Roi Pelé

Em Paris, 1961, estudando no Centre de Formation des Journalistes, certas noites, voltando para a Cité Universitaire, eu comia algo leve no bistrô La Petite Source, no Carrefour de l’Odéon, muitas vezes na companhia do colega Abdou Cissé, do Senegal, que me assediava sedento de notícias do Brasil. Quando nos conhecemos olhou para mim como se eu fosse um ser extraterreno e me perguntou, solene:

– Monsieur Muggiatí, est-ce que tu connais vraiment le Roi Pelé?

Na sua visão, Sua Majestade Edson Arantes do Nascimento reinava soberano sobre um vasto império tropical cheio de súditos felizes. Curiosamente, eu acabara de assistir em 13 de junho, no Parc des Princes, à fabulosa vitória do Santos de Pelé sobre o Racing por 5x4 no Torneio de Paris, diante de um público de 40 mil pessoas.

O gol 1000 

Como editor da revista semanal Fatos&Fotos, que fechava às quartas-feiras para ir às bancas na sexta, coube a mim botar na capa da revista o milésimo gol de Pelé, no Maracanã, de pênalti, contra o goleiro do Vasco Andrada, na noite de 19 de novembro de 1969, na vitória do Santos por 2x1.

A foto imortal

Não há cargo mais arriscado do que editor de revista ilustrada. Em meados de 1970 eu ainda dirigia a Fatos&Fotos, notória pela alta rotatividade de seus editores. O Brasil estreava na Copa do México desacreditado e com um susto, em Jalisco: já aos 11 minutos, tomava um gol da Checoslováquia, mas acabava virando o jogo e ganhando de 4x1. O jogo foi numa quarta-feira. O entusiasmo pela seleção nos fez adiar o fechamento para quinta-feira. O fuso do México nos ajudava, recebemos as fotos pelo malote que chegou ao Rio na quinta, eram rolos e rolos de filme a ser revelados, demos preferência ao preto e branco pela urgência do fechamento. O laboratório revelava, depois copiava as tiras das fotos em 35mm nas “folhas de contato”, a partir das quais o editor escolhia as melhores imagens com a ajuda de uma lupa. Reparem, cada fotinho daquelas ocupava um pequeno retângulo de 35mm, ou seja, 3,5 centímetros de comprimento. Agradeço ao meu pai por encher nossa casa de livros com as obras-primas dos grandes pintores e as melhores revistas de fotografia. Aquilo contribuiu muito para minha educação visual, característica vital para um editor de revista ilustrada. Imaginem o vexame de deixar escapar uma imagem premiada... 

Quando os “contatos” pousaram na mesa de edição, foi como um golpe de mágica, meu olho logo caiu sobre a foto de Orlando Abrunhosa que mostra Pelé socando o ar no vértice de um triângulo formado por ele, Tostão e Jairzinho. Um detalhe importante: era uma foto horizontal, mas privilegiamos o corte vertical para maior efeito estético. Publiquei na capa, num preto-e-branco azulado com as chamadas e o logotipo em cor. Na manhã do sábado a revista esgotava em poucas horas  nas bancas do Rio e de São Paulo. Na semana seguinte, Paris-Match publicou a foto na capa, numa versão colorizada. A foto – que nós apelidamos “os três mosqueteiros” – ganhou o mundo nas décadas seguintes, foi até um selo comemorativo dos correios brasileiros. É uma das fotos que, em meus 28 anos de editor de revista ilustrada – mais me orgulho de ter publicado. Fazendo tabelinha com o inesquecível Rei Pelé...

PS • As imagens que revimos à exaustão na TV do futebol do Pelé são um hino à ousadia ofensiva, as investidas na diagonal e na vertical rumo ao gol. Os dribles, as fintas, um verdadeiro balé, calcado na pureza do futebol de várzea. O oposto do futebol de resultados mesquinho e chato de um Messi, futebol de salão maculando a grama sagrada¸ jogo de xadrez apostando no erro do adversário; e da monotonia da posse de bola dos espanhóis, com nojo da penetração. Em Pelé tivemos a velocidade física e do pensamento, a improvisação, a criação de jogadas nunca tentadas antes no futebol. A força comandada pela inteligência.


quinta-feira, 29 de dezembro de 2022

Há 30 anos: Itamar Franco, nosso melhor Presidente • Por Roberto Muggiati

Em 1994,  Itamar Franco, ao lado do seu ministro da Fazendar Rubens Ricúpero, que assumiu o cargo após o titular Fernando Henrique se afastar para se candidatar à Presidência, exibe o Real, a nova moeda brasileira, como resultado do plano de estabilização econômica idealizado, a pedido de Itamar, pelos  economistas Persio Arida, André Lara Resende, Gustavo Franco, Pedro Malan, Edmar Bacha, Clóvis Carvalho e Winston Fritsch. Foto PR.

Itamar Franco e o presidente Fernando Henrique Cardoso, que o sucedeu favorecido
pelo sucesso do Plano Real. Foto PR


Logotipo do governo de Itamar Franco, em 1992: Brasil Unido já era um apelo.

É uma verdade tão óbvia, mas jamais foi proclamada publicamente como o faço aqui e agora: durante dois anos, 1993 e 1994, o Brasil teve seu melhor presidente de todos os tempos, Itamar Augusto Cautiero Franco. 

Com a renúncia de Fernando Collor de Mello após o impeachment, Itamar assumiu definitivamente a presidência em 29 de dezembro de 1992. 

Político mineiro da boa e velha escola, Itamar armou uma administração sólida e honesta, cercando-se de uma equipe eficiente, principalmente na área econômica, que acabaria criando e implantado o Plano Real, com a adoção da nova moeda em 1º de julho de 1994. Escolhendo Fernando Henrique Cardoso como Ministro da Fazenda, Itamar premiou o sociólogo que nada entendia de finanças com a eleição à Presidência, passando-lhe a faixa em 1º de janeiro de 1985. Esse período mágico da vida política nacional foi batizado como República do Pão de Queijo. Um detalhe curioso: Itamar Franco foi o único presidente que não nasceu no solo brasileiro, mas num navio de cabotagem na rota Salvador-Rio de Janeiro, um daqueles famosos “itas”, daí o seu nome de batismo.

PS •  Nada disso teria acontecido  se Márcia Kubitschek tivesse aceitado o convite para ser a candidata a vice de Fernando Collor. Apesar da insistência dele, a filha de JK não topou a parada. O Brasil teve de esperar dezoito anos para ter a sua primeira Presidenta, Dilma Rousseff. R.M. 

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A GENITÁLIA POLITIZADA E O HOMEM QUE CARNAVALIZOU A PRESIDÊNCIA

por José Esmeraldo Gonçalves




A mídia não registrou a efeméride. Roberto Muggiati, ex-diretor da Manchete, dotado de memória que dispensa o Google, relembrou a data no texto acima que faz justiça a Itamar Franco. 

Há exatos 30 anos, o mineiro assumia a Presidência após o desastre administrativo e o escândalo protagonizado por  Fernando Collor de Mello.  

Pois Itamar foi capaz de mudar a percepção que o brasileiro tinha dos escândalos.  A ditadura obrou  suas roubalheiras, a democracia reinstalada em 1985, também. Itamar, mineiro honesto, inovou. Seu escândalo foi no melhor estilo da épica Saturnália Romana, uma celebração do prazer. Nada de roubos, a não ser o da intimidade de uma bela modelo. 

Em 1994, eu era um dos editores da Manchete, onde a cobertura do carnaval era grande evento jornalístico e de marketing que alavancava a venda da revista.  Uma equipe numerosa de fotógrafos e repórteres experientes garantia tradicionalmente, como o fez durante décadas, a qualidade da cobertura dos desfiles das escolas de samba, na Marquês de Sapucaí. Naquela noite, peguei um colete de acesso e fui para a pista. Adolpho Bloch iria a um dos camarotes do Sambódromo para o qual Itamar Franco e amigos do staff do governo também estavam convidadom. Pauta recomendada e fotógrafos atentos. O nosso problema, de repórteres e fotógrafos, era vigiar o camarote para não deixar de fazer a foto de Adolpho e Itamar, juntos. Tanto um quanto o outro não tinham hora marcada para chegar ao sambódromo. Sabíamos que Itamar estava hospedado no Hotel Glória e, lá, a festa já rolava  animada. O primeiro sinal de que Itamar estava na área foi dado mais tarde pela arquibancada em frente, com vista para o interior do camarote em questão e já em ebulição. 

Acompanhado de políticos e empresários, Itamar era visto em meio a garçons portando bandejas com garrafas de uísque e pratos de salgadinhos. Logo fotógrafos de vários veículos se aglomeraram diante do camarote. 

A modelo Lilian Ramos desfilou na Viradouro em um carro alegórico (alégoricas eram suas curvas) e chamou a atenção das autoridades que, àquela altura, flutuavam duas doses acima do resto da humanidade. Lilian vinha de topless, como Princesa da Pérsia. Seus seios de 96 cm podiam ser vistos até do espaço sideral. Itamar não podia deixar de notar. Presidente não pode se impressionar com nada sem que um puxa saco corra para serví-lo. E foi o que aconteceu. Lília Ramos foi convidada a visitar o camarote. Ela só teve tempo de tirar a fantasia e colocar uma t-shirt larga. Festejada e abraçada, a ela logo foi cedido um lugar ao lado do Itamar. E aí começou o problema. A cearense Lilia Ramos com seus 1.75 cm de altura ficava bem acima da mureta do espaço vip e a pista e o corredor, em plano inferior, permitiam ampla visão do que a camiseta escondia.  

Os fotógrafos se entreolharam. 

- Ela está de meia-calça?, um deles indagou. 

Não. A forte iluminação do sambódromo provava que entre a "genitália desnuda" (esse era o nome que a mídia dava às vaginas que eventualmente eram vistas na Sapucaí) e o planeta não havia qualquer barreira visual. 

Uma última observação; aquela visão nem era inédita. Seis anos antes, as revistas Playboy e EleEla já haviam revelado ao Brasil a "genitália desnuda' da bela Lilian Ramos. As críticas exageradas significavam só o patrulhamento hipócrita da moral crristã mesmo. 

E foi aquele o único escândalo do governo Itamar.  

Bons tempos. 

   

Memórias da tradução: Os 80 anos da Record • Por Roberto Muggiati

 


Alfredo Machado gostava de levar seus autores para almoçar no restaurante panorâmico do Russell. Em 1987, a convidada foi Doris Lessing, que ganharia o Nobel de Literatura exatos 20 anos depois. Ladeada por Roberto Muggiati, Adolpho Bloch, Eduardo Francisco Alves e o grande Alfredo. Foto Arquivo Pessoal


Comecei a traduzir livros em 1966 para complementar o magro salário de repórter da revista Manchete. Fiz duas ou três coisas para a Seleções do Reader’s Digest e também para as Edições Bloch, contos do Ian Fleming, que bombava com o seu 007. Meu grande hit foi Sexus, o romance do Henry Miller que é uma das traduções mais vendidas no país nas últimas sete décadas. As edições Bloch compraram os direitos da trilogia A Crucificação Encarnada: Hélio Pólvora traduziu Plexus e Nexus, coube a mim o mais chamativo Sexus. Mas – acreditem se quiserem – Adolpho Bloch abriu mão desse tesouro. Como emprenhava pelo ouvido, aconselhado por um pseudointelectual de plantão, começou a berrar na redação: “Não vou publicar essa porra cheia de palavrão, que merda! ” Para os judeus, palavrão boca afora é perdoável, mas palavrão impresso preto no branco é um pecado inadmissível.

A Bloch repassou a trilogia para o oportunista Hermenegildo de Sá Cavalcante, que ficou milionário. Autointitulado Presidente da Sociedade dos Amigos de Proust no Brasil, viajou com a família inteira – as duas filhinhas com aias exclusivas – para percorrer os roteiros de Em busca do tempo perdido. Era dinheiro a rodo, principalmente porque Hermenegildo se recusava solenemente a pagar direitos autorais. Um único autor os arrancou a forceps, Jean Genet, aquela Madame Satã literária da França. Quando veio ao Brasil, acampou dentro de uma sleeping bag no suntuoso hall do edifício de Hermenegildo e foi pago imediatamente, cash.

Em 1978 iniciei uma relação promissora com a Record traduzindo o romance Holocausto, de Gerald Green, que se tornou uma série de TV de repercussão mundial (foi até capa da Manchete). Mas o trabalho como editor da revista me ocupava demais, só quando senti que o Titanic Bloch ancorado na Rua do Russell seguia inexoravelmente para o naufrágio voltei a traduzir. Comecei com um ensaio da crítica A.S. Byatt sobre seis escritoras, Imaginando personagens. Foi para o selo Civilização Brasileira, que a Record tinha incorporado ao seu plantel. Com a falência final da Bloch Editores em 2000, passei a me dedicar quase integralmente à tradução de livros. Muito requisitado, pude me dar ao luxo de traduzir preferencialmente ficção, dos melhores autores em língua inglesa. Veteranos como Hemingway e Fitzgerald; contemporâneos como Doctorow, Vonnegut, Pat Conroy; e revelações como Michael Chabon, de quem traduzi o fabuloso As incríveis aventuras de Kavalier & Clay. 


E coloquei em bom português ainda quatro livros de um de meus autores favoritos, o reinventor do romance de espionagem, John LeCarré, com destaque para O jardineiro fiel, que foi filmado pelo brasileiro Fernando Meireles.


Nos 35 anos em que trabalhei na Manchete, também conheci vários escritores. Almocei com E.L. Doctorow no restaurante do 3º andar em 1975, quando lançou Nos tempos do ragtime, que seria transformado em filme por Milos Forman. Mal podia imaginar que, trinta anos depois, eu traduziria três de seus romances. O primeiro, City of God, de extrema complexidade, deu um trabalho incrível na escolha do título. O óbvio seria Cidade de Deus, alusão à obra de Santo Agostinho. Mas acabara de ser lançado o filme Cidade de Deus, sobre a notória favela carioca, baseado no romance de Paulo Lins. A diretora editorial da Record, Luciana Villas-Boas, negociou, pessoal e penosamente, o título com Doctorow – Deus, um fracasso amoroso, confesso que não me agradou. De Doctorow traduzi ainda os romances A Marcha (ambientado na Guerra Civil) e Homer & Langley – calcado na história verídica de dois irmãos que moram sozinhos num casarão da velha Nova York juntando todo tipo de tralhas, até serem encontrados mortos no meio da sujeira, um deles comido pelos ratos. Identifiquei-me com esse cenário horrendo porque morava numa casa de vila em Botafogo que abrigava todo tipo de trastes deixados por acumuladores como eu: a ex-mulher e o filho e a filha, que foram morar na Europa. 


Vivi também nessa casa uma situação do tipo “a vida imita a arte” durante o ano de 2004, ao fazer para a Record a terceira tradução brasileira de A Leste do Éden, de John Steinbeck, um catatau de quase 700 páginas. Envolvi-me com uma paciente da psicanalista da casa vizinha, uma mitômana patológica que se dizia grávida de gêmeos e atribuía a paternidade a mim.  A vilã da história de Steinbeck, Cathy, trai o marido, Adam, com o irmão dele, dá à luz os gêmeos Aron e Caleb (não fica claro se são filhos biológicos de Adam ou do irmão) e, sentindo sua liberdade cerceada por Adam lhe dá um tiro no ombro e foge de casa, abandonando-o com os meninos. (O livro inspirou o filme de estreia de James Dean, Vidas amargas). Sabendo que eu traduzia A leste do Éden, a mitômana Kátia vai monitorando nosso relacionamento segundo o enredo do livro. O problema é que, oito meses depois – sua barriga um tanquinho perfeito – não dá mais para sustentar a farsa. Sufocado, rompo radicalmente a relação. Kátia não se conforma e começa a assediar minha casa. Um dia chamo a PM – o 2º Batalhão ficava a uma quadra de distância – e ligo para sua mãe, que se limita a explicar: “É por isso que a colocamos em psicanálise cinco dias por semana. A Kátia é muito convincente, basta ela dar uma ordem que vai a torcida do Flamengo toda atrás...”




De 1999 até 2019 – quando a crise editorial provocada pelo calote das grandes livrarias – veio travar o meu ganha-pão, devo ter traduzido cerca de cem livros, ou mais. A grande maioria para a Record, mas também para a Ediouro, a Zahar e a Intrínseca, além das biografias do Chet Baker e do John Lennon para a Companhia das Letras. Na gestão da Maria Amélia Mello na José Olympio traduzi Pergunte ao pó e outros seis ou sete títulos de John Fante. Para o selo da cerejinha traduzi o ensaio de Henry David Thoreau Caminhando, acrescido de um perfil do autor e de um texto meu A Arte de Andar. Vendeu bem.


Em 2002 e 2003, tentei uma jogada diferente. Organizei as antologias A selva do dinheiro/Histórias clássicas do inferno econômico e A selva do amor/Contos clássicos da guerra dos sexos, com autores da minha predileção: Poe, Jack London, Conrad, Stevenson, Lawrence, Virginia Woolf, Joyce, Kafka, Proust, Henry James, Fitzgerald, Tchecov, Dostoievski, Tólstoi, entre outros. Propus abrir mão do pagamento pela tradução e me tornar o detentor dos direitos autorais, já que todos eram autores em domínio público. Não foi o best-seller que eu esperava, mas me orgulho muito destas duas “selvas”. Outro trabalho que me gratificou foi a tradução de O grande Gatsby, a partir da edição restaurada dos 75 anos. Explico: Fitzgerald escreveu o romance em meio a uma crise conjugal com Zelda e fez a revisão das provas tipográficas em meio a férias etílicas na Riviera francesa. As provas iam e vinham de navio, em meio a duras críticas do editor do livro, o exigente Maxwell Perkins. Resultado: o romance foi publicado em 1925 cheio de erros e inconsistências. Tempos depois, numa fase de rara sobriedade, o próprio Fitzgerald rabiscou correções a mão num exemplar do livro. Isso, somado ao trabalho de décadas de renomados scholars fitzgeraldianos, resultaria na edição restaurada que eu traduzi para a Record em 2003.


Um tradutor não é uma máquina. Pessoalmente, sempre me senti, nessa função, como uma espécie de estivador das palavras, carregando arduamente frase após frase e revivendo as emoções – as alegrias e os sofrimentos – do enredo e dos personagens.  Foi assim, de modo marcante, com os dois últimos trabalhos. Uma Vida Pequena, de Hanya Yanagihara, conta a história de quatro amigos, centrada na figura atormentada e trágica de Jude, bebê abandonado na porta de um convento, adotado pelos padres e abusado sexualmente por eles, que se pune pelos pecados que não cometeu através da automutilação. 



Já O bom pastor, de C.S. Forester – levado ao cinema por Tom Hanks no filme Greyhound: Na mira do inimigo – narra a travessia de um comboio de suprimentos da América do Norte até Liverpool durante a 2ª Guerra num Atlântico Norte infestado de submarinos alemães.  O comandante do comboio de 37 navios – quatro apenas dotados de bombas de profundidade para se defender dos temíveis U-boats – é assolado sem trégua ao longo da travessia pelos submarinos inimigos, mal lhe sobra tempo para fazer as necessidades ou comer um sanduíche e beber uma xícara de café. Mestre da literatura marítima, Forester me fez sentir na pele cada momento de perigo da sua narrativa.

A alma da Record foi a figura telúrica de Alfredo Machado. Iniciou com Décio de Abreu a editora em 1942, como uma distribuidora de tiras de jornal e outros serviços de imprensa, a primeira syndicate brasileira de quadrinhos. A partir dos anos 60 começou a publicar livros, traduções de ficção estrangeira.  O catálogo atual do grupo é de mais de 6 mil títulos, e reúne mais de 4000 autores, entre eles 22 ganhadores do Prêmio Nobel, como Gabriel García Márquez, Herman Hesse, Albert Camus, Pablo Neruda, Ernest Hemingway, John Steinbeck, Camilo José Cela, William Faulkner, Rudyard Kipling, Nagib Mahfuz, Eugenio Montale e Günther Grass, além de gigantes brasileiros como Graciliano Ramos (Vidas secas é o campeão de vendas), Carlos Drummond de Andrade, Rubem Braga, Fernando Sabino e Dalton Trevisan.

Alfredo orgulhava-se da sede própria, um prédio sólido plantado no meio de um grande terreno próximo à barreira do Vasco, em São Cristóvão. E do Sistema Poligráfico Cameron, um moderno equipamento de impressão capaz de produzir até 100 livros de 200 páginas por minuto. Astuto relações-públicas, Alfredo descobriu o lugar ideal para entreter seus grandes autores internacionais: o restaurante da Manchete, defronte ao cartão-postal da entrada da baía de Guanabara e do Pão de Açúcar. Adolpho Bloch dizia: “Somos um grande restaurante que, por acaso, também imprime revistas. ” Participei de alguns destes almoços, notadamente com o best seller Sidney Sheldon e a prestigiada Doris Lessing, que ganharia o Nobel de Literatura em 2007. 

Corria na Manchete uma anedota típica do humor carioca de Alfredo. Numa viagem com um amigo a Roma, foram pegar as malas no hotel antes do meio-dia para não pagar outra diária. O quarto fora ocupado por duas freiras de uma cidadezinha do Wisconsin que saíram correndo para conhecer a Praça de São Pedro no Vaticano. Entre seus pertences estava uma máquina fotográfica destinada a registrar flagrantes de sua santa peregrinação. “Peraí, falou Alfredo para o amigo, ou vice-versa, vamos bater umas chapas sacanas, e arreou as calças para ter sua genitália fotografada.” E os dois ficaram a imaginar o que aconteceria quando as freirinhas fossem buscar suas fotos reveladas na lojinha da esquina do Wisconsin.

Alfredo morreu em 1991 e foi sucedido pelo filho Sérgio Machado, que fora devidamente preparado para o cargo, mas morreu prematuramente em 2016, aos 68 anos. Quem preside atualmente o grupo é sua irmã Sônia Machado Jardim, 66 anos. Ela relutou por muito tempo em entrar para o negócio da família. Formou-se em engenharia civil e seguiu seu próprio caminho. Só com a morte do pai, ouviu do irmão que não fazia sentido ela não trabalhar na Record, onde só chegaria em tempo integral a partir de 1995, depois de fazer mestrado em Administração. Com Sérgio no departamento editorial, Sônia passou a cuidar do financeiro. Além das perdas do pai e do irmão, Sônia sofreu um sequestro de 27 dias em 1997, que deixou suas marcas, mas também a fortaleceu.  Ao assumir abruptamente a presidência do grupo em 2016, aos 60 anos, entregou-se totalmente ao trabalho e amadureceu na luta. Com ferramentas técnicas para a grandiosidade da tarefa, mas se permitindo também um toque de humanidade: “Um fenômeno vai além dos influencers e da redes sociais, ele só se sustenta se for sincero. É preciso que o livro tenha qualidade para o seu leitor.”


quarta-feira, 28 de dezembro de 2022

Mídia: as voooooogais iiiiinsisteeentes

 






Reprodução 

Poooolícia, Boooolsonaro, a deeeeeciisão de proiiiiiiiiiibir armas... A comentarista Eliane Cantanhede tem esse estilo de alongar vogais, mas hoje estava com o vocal  especialmente elástico. Só uma observação. (Ed Sá)

segunda-feira, 26 de dezembro de 2022

Passando pano para o ato "análogo ao terrorismo"

 A reação inicial de governo Bolsonaro à tentativa de atentado terrorista cometida por um bolsonarista,m em Brasília, foi silêncio, em seguida vieram as declarações que tentam minimizar o episódio. Tem sido assim sempre que os bolsonarista escalam a violência, que já levou  a agressões, espancamentos e até assassinatos, e permanecem impunes. 

Novidade foi a declaração do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, que definiu o ato terrorista de Brasília como "análogo ao terrorismo".

O Brasil parece caminhar para não ter mais crimes: tudo será "análogo". 

Já existem "análogo a homicídio", "análogo a roubo", "análogo a estupro" , "análogo a sequestro" e outras modalidades adotadas quando o criminoso for menor de idade. 

Fazendeiros flagrados usando mão de obra escrava não respondem por trabalho escravo, mas por algo denominado "análogo ao trabalho escravo". 

Brevemente talvez tenhamos o Código Análogo ao Penal, que descreverá "quase cries" como "análogo a corrupção", "análogo a prevaricação", "análogo a apropriação indébita", "análogo a contrabando" etc. 

Assim os criminosos não se sentirão ofendidos.