quarta-feira, 24 de fevereiro de 2021

A rivederlo, paesano • Por Roberto Muggiati

Foto Twitter City Lights Books

Se Jack Keroauc, Allen Ginsberg e William Burroughs são os Três Mosqueteiros da geração beat, Lawrence Ferlinghetti é o seu D’Artagnan. Nascido há 101 anos em Yonkers, Nova York, filho de imigrantes ítalo-portugueses, Ferlinghetti mudou-se em 1955 para São Francisco, onde morreu ontem, atraído pela atmosfera vibrante da cidade, que foi a capital cultural dos beats. Lá ele fundou com Peter D. Martin em 1953 a primeira livraria só de paperbacks, iniciando um movimento de democratização da cultura. 

Ferlinghetti  concebia a livraria como um “ponto de encontro literário”, onde escritores e leitores se congregassem para trocar ideias sobre poesia, ficção, política e arte. Dois anos depois, ele iniciou a editora City Lights Publishers, com o objetivo de provocar uma “fermentação dissidente internacional”. 

Seu lançamento inaugural foi o primeiro volume da série City Lights Pocket Poets, que abriu novos caminhos para a poesia norte-american. Em 1956, publicou o revolucionário Howl, de Allen Ginsberg, que foi confiscado pelas autoridades americanas, dando início a uma histórica campanha de resistência que acabaria derrubando a censura.  Autor de um dos livros de poesia mais vendidos de todos os tempos, A Coney Island of the Mind/Um parque de diversões da cabeça, Ferlinghetti – como outros poetas beats – criou uma forma híbrida e inovadora de arte, em que os poemas eram recitados ao acompanhamento de música de jazz, e muitas vezes improvisados, como ela.


Foto Reprodução Wikipedia

PS
• Quando eu morava em Paris no início dos anos 60, tive a felicidade de comprar quase tudo da City Lights numa pequena livraria da rive gauche, defronte à Notre Dame, Le Mistral, que correspondia à imagem de livraria concebida por Ferlinghetti. No andar de cima, George Whitman – que a fundara em 1951 – hospedava de graça viajantes, a maioria mochileiros, com uma condição: todo hóspede pagaria a estadia com a leitura de um livro. George gabava-se de que, ao longo dos anos, 40 mil pessoas teriam dormido nos treze leitos de Le Mistral, que ele chamava de "uma aventura socialista disfarçada de livraria”. Em 1964, George mudou o nome de Le Mistral  para Shakespeare and Company, em homenagem à livraria da americana Sylvia Beach, que publicou o romance Ulysses de James Joyce. Na verdade, Sylvia Beach, que fechou sua livraria quando os nazistas invadiram Paris em 1940, havia doado o nome a George Whitman. Ele morreu em 2011, aos 98 anos, mas sua filha, Sylvia Beach Whitman, segue a tradição, tocando uma das livrarias mais queridas de Paris. Onde o leitor pode ter a certeza de encontrar o catálogo completo da City Lights Books. Em tempo: Ferlinghetti conheceu a incipiente livraria de George Whitman em Paris no início dos anos 50 e foi ela que o inspirou a abrir a City Lights Books em São Francisco. 

O POETA

Lawrence Ferlinghetti

Correndo risco constante

de absurdo e morte

toda vez que atua em cima

das cabeças da audiência

o poeta sobe pela rima

como um acrobata

para a corda elevada que ele inventa

e equilibrado nos olhares acesos

sobre um mar de rostos

abre em seus passos uma via

para o outro lado do dia

fazendo além de entrechats

truques variados com os pés

e gestos teatrais da pesada

tudo sem jamais tomar uma

coisa qualquer

pelo que ela possa não ser

Pois ele é o superrealista

que tem de forçosamente notar

a verdade tensa

antes de ensaiar um passo ou postura

no seu avanço pressuposto

para o poleiro ainda mais alto

onde com gravidade a Beleza

espera para dar

seu salto mortal


E ele um pequeno

homem chapliniano

que poderá ou não pegar

aquela forma eterna e bela

projetada no ar

vazio da existência 

(Tradução: Leonardo Fróes)


terça-feira, 23 de fevereiro de 2021

Cancelamento: cada caso é um caso

por Pedro Juan Bettencourt

Cancelamento é uma atitude coletiva em voga nas redes sociais. Tem provocado polêmicas. As reações mais ruidosas contra pessoas, empresas e instituições geralmente são disparadas a partir de vídeos e áudios que comprometem os protagonistas. Quase sempre são cenas ou conteúdos indesculpáveis. Projetam racismo, humilhação, prepotência, machismo, bullying, violência, agressões domésticas, intolerância religiosa, preconceito de gênero, discriminação, assédios moral e sexual etc. 

Vale o bom senso. A turba digital também pode expor pessoas inocentes. Já aconteceu. Acusações falsas e montagens de fotos e vídeos podem ser desmascaradas, mas a onda de cancelamentos se forma em cliques rápidos e sempre faz um estrago. Então, que cada um pense antes do clique relâmpago. Que procure identificar o alvo. Os escrotos costumam ter antecedentes e o Google facilmente rastreia os elementos. Veja os vídeos, cheque, verifique comentários, não é difícil. Muitas denúncias são acompanhadas de testemunhos. A mulher racista flagrada na padaria está sendo verdadeira e sincera com as suas podres convicções. Uma rápida pesquisa mostrou outros casos de intolerância ligados à figura. O juiz folgado e filmado que humilha o servidor na praia é, naquele momento, mais verdadeiro do que provavelmente nunca o foi. Vídeo, áudio e testemunhas comprovam. Não tenha receio de cancelar essas figuras.

Comprovada a veracidade do vídeo, da foto ou do áudio em questão, é compreensível a reação de tantos internautas que condenam tais crimes O fenômeno não é local, é universal. Há milhares de registros de pessoas que perderam emprego por postarem conteúdos inaceitáveis e criminosos. E daí? Assumiram o risco. Há igual número de empresas que foram expostas nas redes sociais por adotarem políticas odiosas, como trabalho escravo. Bem feito. Denunciadas e canceladas acabam tomando uma atitude após a justa exposição. 

Expor racistas, por exemplo, é autodefesa da sociedade. Expor fascistas, misóginos, geradores de fake news ou autores de crimes, como pastores radicais que atacam centros de religiões afro e imagens da igreja católica, também. Autores de ataques antissemitas ou antislâmicos  devem ser expostos. Milicianos não devem ganhar flores. Autoridades que humilham cidadãos devem ir para o pelourinho digital, sim. São tão poderosos, a justiça raramente os alcança, na maioria das vezes o único dissabor que terão é o vexame que a internet lhes proporciona.

A mídia cancela pessoas. Instituições cancelam pessoas. O esporte cancela pessoas. A arte cancela pessoas. Pessoas cancelam pessoas. Governos cancelam pessoas. Não entendo a surpresa Vizinhos cancelavam vizinho ao vivo. Por que a internet não cancelaria?  Se cancelamentos se tornam agressões físicas ou morais, aí entra o Código Penal. Se não, significa apenas que você não gosta da atitude do candidato a cancelamento e não o quer na sua timeline.

Sem biquíni não tem jogo...

por Niko Bolontrin

A dupla alemã de vôlei de praia, Karla Borger e Julia Sude, resolveu boicotar  o Circuito Mundial de Vôlei de Praia em Doha, Catar, no mês que vem. Motivo: as rígidas leis islâmicas que proíbem o biquíni e obrigam as atletas a jogarem de camisa e calça comprida. 

A Federação Alemã de Vôlei apoiou decisão das jogadoras. Em entrevista, Borger lamentou: "É realmente o único país e o único torneio em que um governo nos diz como temos que fazer nosso trabalho, e isso nós criticamos". 

Duplas brasileiras que vão participar do torneio no país islâmico ainda não se manifestaram sobre o assunto. O mais provável é que se submetam sem reclamar às regras abusivas recusadas pelas alemãs. 

Episódios como esse levantam uma questão entre os esportistas: países tão rígidos têm condições para receber eventos esportivos internacionais? O Catar sediará a Copa do Mundo de futebol de 2022. Haverá regras de vestimenta o observar, as turistas deverão usar roupas discretas (quem for viajar para lá deve se informar sobre o que o país entende por "discretas"). 

ATUALIZAÇÃO EM 26/2/2021 - O protesto da dupla alemã valeu. A Federação Internacional do Vôlei de Praia e a Associação do Vôlei do Catar liberaram ontem o uso de biquínis em etapa do Circuito Mundial. O torneio começará no dia 8 de março. Como acontece na Olimpíada, atletas poderão vestir calças e camisetas se o desejarem ou alegarem motivos religiosos. Melhor assim.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2021

Sem vergonha: Repórteres Sem Fronteira deixa Bolsonaro nu

 



Do RSF

"Enquanto a Covid-19 provoca estragos no Brasil, o presidente Jair Bolsonaro contribui para aumentar o número de mentiras em circulação e segue atacando a imprensa - numa tentativa de esconder sua incapacidade de administrar a crise sanitária. “A verdade nua”, campanha produzida pela agência BETC Paris em parceria com a Repórteres sem Fronteiras (RSF), reitera a importância crucial do jornalismo para garantir o acesso a informações confiáveis sobre a pandemia.

A nova campanha da RSF no Brasil, lançada em 22 de fevereiro de 2021, defende que se mostre “a verdade nua", a crua realidade dos fatos, para além de alegações fantasiosas ou manipuladoras. Uma fotomontagem mostra o chefe de Estado brasileiro, Jair Bolsonaro, sem roupa*, coberto apenas por uma placa que informa o número de mortes causadas pela Covid-19 e o número de casos confirmados da doença no país**. 

Uma forma simbólica de confrontar o presidente Bolsonaro com a realidade nua e crua dos fatos, enquanto ele acusa a imprensa pelo caos instalado no país para desviar a atenção de sua desastrosa gestão da crise sanitária. O Brasil é hoje o terceiro país mais afetado no planeta pela Covid-19 e a campanha reforça a importância de conhecer os fatos para compreender a pandemia e poder agir sobre ela. Fatos aos quais a população brasileira não teria acesso sem o trabalho dos jornalistas. 

"Essa campanha propositalmente chocante visa despertar as consciências a reagirem aos ataques permanentes do sistema Bolsonaro contra a imprensa, afirmou Christophe Deloire, Secretário-Geral da RSF. Os ataques não são apenas moralmente intoleráveis, mas também perigosos para a população brasileira que se vê privada de informações vitais sobre a pandemia. O trabalho dos jornalistas é fundamental para relatar os fatos e informar as pessoas sobre a realidade da crise sanitária. Mais do que nunca, o direito à informação, intimamente ligado ao direito à saúde, deve ser defendido no Brasil.”  

O trabalho da imprensa brasileira tornou-se particularmente complexo desde que Jair Bolsonaro assumiu o poder em 2018. Insultos, difamação, estigmatização e humilhação de jornalistas passaram a ser a marca registrada do presidente do país. Sempre que informações contrárias aos seus interesses ou aos de sua administração se tornam públicas, ele não hesita em atacá-los com violência. No final de janeiro, por exemplo, Jair Bolsonaro mandou os jornalistas para "a puta que o pariu" e afirmou que a lata de leite condensado era para "enfiar no rabo [...] da imprensa". Essa declaração delirante faz parte de uma estratégia bem azeitada de ataques contra a imprensa coordenados pelo presidente e seus familiares que ocupam cargos eletivos, conforme apresentado pelo relatório da RSF que lista nada menos que 580 ataques apenas em 2020. 

“A verdade nua” se alinha com as fortes e irreverentes campanhas de comunicação divulgadas pela RSF para promover a sensibilização do público em geral e da comunidade internacional com relação às violações da liberdade de informar. Produzida com o apoio da agência BETC Paris, a campanha está disponível em quatro idiomas (francês, inglês, espanhol, português).   

O Brasil ocupa a 107ª posição entre os 180 países incluídos no Ranking Mundial da Liberdade de Imprensa, publicado pela RSF."

O Teste Guilaroff de Cinefilia • Por Roberto Muggiati

Sydney Guilaroff e Marilyn Monroe

O primeiro cabelereiro a ter nome nos créditos


Guilaroff, o primeiro à esquerda, no enterro da amiga MM

Amantes do cinema se reconhecem pelo apego ao detalhe. No caso, aqueles créditos de produção que, nos anos 40 e 50 rolavam sempre no começo da “fita”. Dos atores principais ao diretor, passando por cenário, fotografia, música, orquestrações, figurinos e ... cabelos. De tanto ir ao cinema, ficávamos – os mais curiosos – com aqueles nomes gravados na memória. Foi assim que nosso diagramador João Américo Barros me surpreendeu uma tarde na redação ao perguntar a um crítico da
Manchete, à queima roupa, se ele conhecia Sydney Guilaroff. O crítico não era um crítico qualquer, mas um daqueles Moniz Vianna’s boys que galopavam com os cavalarianos de John Wayne no Monument Valley e davam relutantes duas ou três estrelas aos filmes em cartaz no famoso quadro de cotações do Correio da Manhã. Sem nenhum pudor ou culpa o crítico respondeu: “Sidinêi quem?” Vibrei com o Barros, Sydney Guilaroff foi um nome que, desde que o vi na tela pela primeira vez, eu carregaria na cabeça para o resto da vida, mesmo sem conhecer ainda sua incrível história. E saquei na hora também que o Barros tinha criado o teste definitivo de cinefilia. Se o cara ignorava Sydney Guilaroff, não merecia ser considerado cinéfilo, mesmo assinando todas as críticas do mundo. 

Joan Crawford

Filho de um casal russo, Sydney Guilaroff nasceu em Londres em 1907 e ganhou fama em Hollywood. Cabeleireiro principal da Metro Goldwyn Mayer, atuou em mais de 2000 filmes, shows de televisão e apresentações públicas. Tornou-se o primeiro cabeleireiro a ter o seu nome nos créditos de um filme. Em 1930, Guilaroff foi responsável pelo icônico penteado (“capacete”) de Louise Brooks, a maior estrela do cinema mudo. Mas foi Joan Crawford quem mudou sua vida: depois que Sydney penteou seus cabelos nunca mais quis abrir mão dos seus serviços. Durante três anos, a cada novo filme, ela atravessava a América de Hollywood a Nova York para que Sydney criasse um estilo de cabelos para cada papel. Irritado com aquilo, o chefão da MGM Louis B. Mayer resolveu o problema contratando Guilaroff para dirigir o departamento de cabelos do estúdio. Guilaroff trabalhou para a MGM de 1935 a 1970. Correu até a anedota de que, antes de filmarem o leão rugindo para o logo da MGM, Guilaroff penteou suas jubas. Veja aqui

https://www.youtube.com/watch?v=DhNMHcRSNdo

Vivien Leigh

Embora exclusivo da MGM, foi Guilaroff quem fez os penteados de Scarlett O’Hara em ...E o vento levou. Insatisfeita com os profissionais do estúdio de David O. Selznick, Vivien Leigh contratou Guilaroff para criar os penteados que ela desfila ao longo de um dos maiores filmes de todos os tempos. 

Claudette Colbert

Judy Garland

Lucille Ball

Greta Garbo em versão cacheada

E a Garbo como Ninotchka

Ingrid Bergman com o cabelo que virou moda
e foi capa da Time



Marlene Dietrich

Entre outras criações, Sydney assinou a franjinha de Claudette Colbert que ela adotaria para o resto da vida), as tranças de Judy Garland em O mágico de Oz, transformou Lucille Ball numa ruiva, fez os cabelos da turma de Cantando na chuva; modelou duas Garbos radicalmente opostas, em A dama das camélias e Ninotchka. Quando Ingrid Bergman ia estrelar em Por quem os sinos dobram – baseado no romance de Hemingway sobre a Guerra Civil da Espanha – o produtor David Selznick pediu a Guilaroff um corte despojado que o papel exigia. Os cabelos curtos e cacheados da heroína Maria viraram moda e foram adotados por mulheres no mundo inteiro. Já o estilo elaborado que Sydney criou para Marlene Dietrich em Kismet foi algo espetacular e também ousada e diferente a peruca que criou para Marlene em A marca da maldade, de Orson Welles. 

Jean Harlow

Fez ainda perucas para Jean Harlow, a Vênus Platinada, que estava ficando calva de tanto oxigenar os cabelos e morreu precocemente aos 26 anos. E como Esther Williams mantinha os cabelos em ordem sem sair das piscinas? Guilaroff encontrou uma solução simples: um toque de vaselina. 

Guilaroff com Liz Taylor

Grace Kelly no altar by Guilaroff. 
Fotos DP

Elizabeth Taylor, outra estrela que se tornou sua amiga, ameaçou abandonar a filmagem de Cleópatra na Inglaterra quando os sindicatos locais proibiram o ingresso de Guilaroff. Liz insistiu e conseguiu que Sydney fizesse seus cabelos todas as manhãs bem cedo, sem colocar os pés nos estúdios em Pinewood. Foi ele quem penteou Marilyn Monroe para o seu primeiro teste e ficou seu amigo e confidente pelo resto da vida. Foi o cabeleireiro do ultimo filme de MM, Os desajustados, e um dos amigos que carregaram o caixão da estrela. . "Sydney conhecia todo mundo e os segredos de cada um”, disse Debbie Reynolds, estrela da Cantando na chuva e sua amiga. “E era totalmente confiável.” Quando Grace Kelly casou com Rainier de Mônaco, Guilaroff atravessou o Atlântico em voo VIP a fim de preparar suas madeixas para a cerimônia nupcial. 

Guilaroff nunca se casou e em 1938 se tornou o primeiro solteiro nos Estados Unidos a adotar um filho (chamou-o Jon, em homenagem a Joan Crawford.) O estado da Califórnia tentou sustar a adoção, mas Guilaroff não só venceu a causa, como adotaria mais dois filhos. Em seu livro de memorias, Crowning Glories, ele alega que teve relações românticas com greta Garbo e Ava Gardner. Não só as estrelas o adoravam, Sydney era o cabeleireiro favorito de astros como Cary Grant, Clark Gable, Fred Astaire, James Stewart, Spencer Tracy, Tyrone Power, Robert Taylor e Frank Sinatra. 

Satisfeito? Agora você já pode passar no Teste de Cinefilia Sydney Guilaroff…


PS • Nem nossa Pequena Notável escapou de Sydney Guilaroff. Em 1948, o produtor Joe Pasternak convidou Carmen Miranda a fazer dois musicais em cores para a Metro Goldwyn Mayer, A Date with Judy/O Príncipe Encantado e Nancy Goes to Rio/Romance carioca (1950). Particularmente na primeira produção a MGM se esmerou para oferecer uma imagem diferente de Carmen, sem os turbantes típicos e revelando pela primeira vez seus cabelos, com penteados criados por Guilaroff e trocando os trajes de baiana por vestidos e chapéus elegantes desenhados por Helen Rose.



domingo, 21 de fevereiro de 2021

Na capa da Istoé: vida alegre na pátria da morte

 


Para alguns governantes, geralmente autoritários, o poder é uma festa. Idi Amin gostava da balada e desafiou a Rainha Elizabeth para se divertir em Uganda e conhecer um "homem de verdade"; Pinochet era abonado e gostava de gastar dólares ao lado de companhias masculinas nas praias da Espanha; parte do PIB das Filipinas era gasto em sapatos para Imelda Marcos; Saddam Hussein dividia os prazeres da riqueza com os filhos. Manter coleções de Ferraris, passar temporadas nos Alpes e fechar boates em Paris até champanhe escorrer nas calçadas era o que a família iraquiana entendia por viver. A Istoé usou na chamada de capa das doces férias do clã poderoso o título de um filme tipo "sessão da tarde". Mas, na ficção da tela, a diversão durava apenas um dia. Para esses tipos, a curtição é interminável e governar com tudo pago é só felicidade.

O filme O Enigma de Andrômeda, lançado há 50 anos, antecipou a tese atual de um cientista britânico: o vírus da Covid-19 é um E.T

Cena de O Enigma de Andrômeda. Sem vacina, microrganismo
 extraterreste contamina pequena cidade.

por Jean-Paul Lagarride 

Em agosto do ano passado, o jornal português Diário de Notícias publicou matéria com o cientista britânico Chandra Wickramasinghe, que defende uma teoria polêmica. Segundo ele, que trabalha no Centro de Astrobiologia de Buckingham, o vírus da Covid-19 chegou à Terra através de um meteorito que caiu na China em 2019, dois meses antes do aparecimento do SARS-CoV2. 

Em meio a tantas teorias da conspiração, Wickramasinghe foi levado a sério por alguns - afinal, ele tem cerca de 80 artigos publicados em revistas científicas e a própria tese "espacial" saiu na revista  Advances in Genetics -  e ironizado e ridicularizado por outros. 

A suposta ameaça de vírus extraterrestres não é uma questão nova e não apenas a ciência abordou o assunto. Em 1971, há 50 anos, Andromeda Strain (no Brasil, O Enigma de Andrômeda) impressionou muita gente.  No filme, baseado em um livro de Michael Crichton, dirigido por Robert Wise e estrelado por James Olson, Arthur Hill, David Wayne, Charles Dutton e Ruth Leavitt, um grupo de cientistas é convocado para investigar a causa das mortes em uma pequena cidade logo após a queda de um satélite na região.

Em meio à pandemia, O Enigma de Andrômeda tornou-se atual. Principalmente porque cientistas da OMS ainda não chegaram a uma conclusão sobre a origem do vírus da Covid-19. Em pesquisas que ainda se desenrolam na China, a equipe descartou a tese de "acidente em laboratório biológico"  e ainda não se convenceu da alegada origem do microrganismo em frutos do mar ou animais silvestres. 

Se a investigação científica não tem uma resposta e Wickramasinghe insiste na contaminação via meteorito, a ficção científica se apresenta e O Enigma de Andrômeda é buscado no You Tube e nos serviços de streaming. Pelo menos no cinema, o alienígena já esteve entre nós.

Estados Unidos, 500 mil mortos. Na capa do New York Times, hoje, cada ponto uma vida

 




sábado, 20 de fevereiro de 2021

Brasil, um país de "temporários" e "intermitentes"

por Flávio Sépia

O Brasil perdeu a Revolução Industrial. É, até hoje, um país agrário. Vende apenas e praticamente commodities, o que equivale a trocar bens por espelhos e colares, como faziam os nativos diante do colonizador europeu. 

Todas as tentativas de Getúlio Vargas, JK, Jango, Lula e Dilma - e mesmo da ditadura militar - de transformar o país em algo mais do que exportador de grãos e minério de ferro (e, por tabela, de empregos) foram demolidas pela elite empresarial quase sempre aliada a interesses que mantêm o país em eternos subdesenvolvimento e dependência.. 

O Brasil perde agora a Revolução 5.0, a era da inovação, a que leva trabalhadores a atuar em ambientes onde podem expandir seus conhecimentos e criar soluções e não apenas a repetir processos. 

O choque do futuro preconizado por Alvin Toffler chegou e o Brasil não fez check in. 

A cada dia, a produção é gerada menos em fábricas e mais em qualquer lugar, em casa, garagens, hotéis, salas de universidades e institutos de pesquisa. As maiores corporações da atualidade não foram construídas em linhas de montagem. 

Bem no meio dessa revolução, o Brasil faz uma reforma trabalhista que cria as exóticas categorias de trabalhadores "temporários" e "intermitentes" que tendem a excluir  do processo inovador a peça mais criativa, o colaborador da empresa. O "temporário" é o trabalhador com prazo de validade curto e com o carimbo de "vencido" sempre à vista. Seu compromisso tem data para acabar. O "intermitente"  é o que diz "bom dia" ao chegar e não sabe se estará ainda no seu posto de trabalho a tempo de dar uma "boa noite" de despedida. Esse nem tempo tem para se integrar a um processo inovador de produção. 

E a tendência é que o país se transforme em "intermitente". A modalidade que mais cresce no mercado de trabalho. Tudo a ver: uma das definições para intermitente é ""com interrupções, intervalos; sem continuidade".

Permanente só a exclusão.

De ministro a ordenança

Ao nomear um general para presidir a Petrobras Bolsonaro distribui mais um boquinha. E deixa Paulo Guedes com o bibico atrás da orelha. Embora tenha estudado no Colégio Militar, em BH,
ele não é da caserna. A favor, no núcleo duro da direita radical, ele tem no currículo o fato de  trabalhado e trabalhar para os regimes de dois "líderes" sul-americanos do ramo fascista: Pìnochet e Bolsonaro. O que pode lhe ajudar a manter emprego.  

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2021

Você conhece algum ator canadense? • Por Roberto Muggiati


A morte de Christopher Plummer, o aristocrático marido da Noviça rebelde, que eu julgava um britânico da gema, me fez acordar para o fato de que não existem atores canadenses. Ou melhor, há uma legião, mas passam por americanos ou ingleses aos olhos do grande público. Plummer, considerado o melhor intérprete shakespeariano da sua geração, era um deles, nascido em Toronto. 



Outro em plena atividade aos 85 anos: Donald Sutherland fez cerca de 200 filmes, só a comédia desvairada M*A*S*H de Robert Altman bastaria para imortaliza-lo. Sem esquecer também sua atuação como o Casanova de Fellini.  (Creditem a ele ainda seu filho Kiefer Sutherland, o Jack Bauer da série 24 horas.) 





Apesar das dezenas de filmes que fizeram, Raymond Burr e Raymond Massey se celebrizaram por um papel marcante: Burr como o esquartejador da Janela indiscreta de Hitchcock (54) e Massey como o pai de James Dean em Vidas amargas (55). Burr – notório vilão de filmes noir – fez ainda sucesso na TV como Ironside, o investigador na cadeira de rodas. A filha de Massey, Anna Massey, brilhou na cena britânica: atuou em Frenzy (75), de Hitchcock, e ao lado de Anthony Hopkins em Casa de bonecas. Uma das darlings do cinema mudo, a canadense Mary Pickford fundou a United Artists com D.W. Griffith, Charlie Chaplin e seu futuro marido Douglas Fairbanks.

Lorne Greene celebrizou-se nos anos 60 no papel do rancheiro patriarca Ben Cartwright, no seriado Bonanza, que ficou 14 anos no ar e foi considerada uma das melhores séries da TV americana. William Shatner interpretou James T. Kirk, o capitão da nave estelar USS Enterprise, na série de TV Star Trek/Jornada nas estrelas. Depois de apenas três temporadas, em 1969, o seriado foi cancelado, mas as reprises fizeram de Shatner, um astro. Leslie Nielsen atuou em mais de 100 filmes e mais de 150 programas de televisão, tendo interpretado cerca de 220 personagens. Fez o capitão do navio em O destino do Poseidon e uma série de comédias malucas como Um astronauta fora de órbita, Apertem os cintos o piloto sumiu, Uma escola muito louca e Corra que a polícia vem aí.


Com 50 anos de carreira, Dan Aykroyd, de Ottawa, além de ator é roteirista, músico, vinicultor e ufólogo. Indicado para o Oscar e vencedor do Emmy, foi um dos membros originais do lendário programa de comédia Saturday Night Live, um dos criadores dos Irmãos cara de Pau  (com John Belushi) e dos Caça-fantasmas. Atuou em Conduzindo Miss Daisy, Indiana Jones e o templo da perdição, O escorpião de jade (de Woody Allen) e fez o papel de Mack Senett em Chaplin. Um dos comediantes mais brilhantes da sua geração, John Candy coestrelou com Dan Aykroyd em As grandes férias e Os Irmãos Cara-de-pau. Em 1987, fez sucesso no despretensioso  Antes Só do que Mal Acompanhado, que acabou faturando 150 milhões de dólares. Candy morreu aos 43 anos, de um ataque do coração. Seu último filme, lançado antes de sua morte,  Jamaica abaixo de zero, com bilheteria de 154 milhões de dólares, tornou-se o filme mais rentável de sua carreira.


Keanu Reeves, nasceu no Líbano, mas foi criado em Toronto, com nacionalidade canadense por conta do padrasto. Em 35 anos de carreira vitoriosa fez dezenas de filmes, as séries Speed e Matrix, o mocinho no Drácula de Coppola e em Ligações Perigosas de Stephen Frears e foi O pequeno Buda, de Bertolucci, Ganhou sua estrela na Calçada da Fama em Hollywood em 2005. 



Para ganhar fama e sucesso bastou a Michael J. Fox, nascido há 60 anos em Edmonton, sua irresistível interpretação de Marty McFly na trilogia De volta para o futuro, de Robert Zemeckis, um dos filmes que marcaram os anos 80. Em 40 anos de carreira, 


Jim Carrey
celebrizou-se por comédias escrachadas como Debi & Loide, O mentiroso, O pentelho, Ace Ventura, e também papeis dramáticos em filmes como O Show de Truman, Cine Majestic, O brilho eterno de uma mente sem lembranças, além de ter feito o Charada em Batman Eternamente. Outro que começou no início dos anos 80, Rick Moranis fez o seu nome Os caça-fantasmas, Querida encolhi as crianças, A pequena loja dos horrores, Os Flintstones. 


Ator, músico, produtor e diretor de cinema, Ryan Gosling, 40 anos, começou sua carreira como ator mirim no programa do canal da Disney, Clube do Mickey, e apareceu também  nas séries de terror infantil Você Tem Medo do Escuro? e Goosebumps. Depois de atuar em filmes mais sérios, Gosling foi consagrado em 2016 ao protagonizar o musical La La Land – Cantando Estações, que lhe valeu indicações para o Oscar e para o BAFTA e a premiação no Globo de Ouro. Fecha a lista o cantor, compositor e ator Justin Bieber, o darling da Geração Z.





E as meninas canadenses? Pamela Anderson ganhou o mundo como a bombshell da série sobre guarda-vidas Baywatch/SOS Malibu. Manequim de lingerie, capa da Playboy, fez ainda a série Barbwire/Bela e perigosa e hoje é ativista da causa dos direitos animais. Margot Kidder celebrizou-se no papel de Lois Lane, a namorada de Clark Kent, na série do Superman. Atuou em Irmãs diabólicas, o primeiro filme de Brian De Palma, e no drama sobrenatural The Amityville Horror. Rachel McAdams 42 anos, 20 de carreira, pontificou em filmes como Sherlock Holmes, na segunda temporada da série True Detective, que lhe valeu os elogios da crítica e vários prêmios. Por seu desempenho como a jornalista Sacha Pfeiffer em O Caso Spotlight (2015) foi indicada ao Oscar  de Melhor Atriz Coadjuvante. Segundo a revista Forbes, McAdams foi a terceira atriz mais rentável de Hollywood em 2009 (gerando às suas produtoras trinta milhões de dólares para cada milhão investido). Em 2017, foi uma das Pessoas do Ano da revista Time. Desde 2016, é uma das pessoas de maior bilheteria de todos os tempos nos Estados Unidos, com seus filmes faturando mais de 1,6 bilhão de dólares. 


Neve Campbell
ficou conhecida como a protagonista Julia Salinger, do seriado d Party of Five (no Brasil  O Quinteto), entre 1994 e 2000. Seu primeiro filme de maior lucro foi The Craft, de 1996. No mesmo ano, interpretou Sidney Prescott na quadrilogia de terror Scream, que foi um sucesso. Em 1998, foi colocada na lista das "50 Pessoas Mais Bonitas" da revista People. Voltou a brilhar em Panic (2000), ao lado do compatriota Donald Sutherland. Em 2006, estreou no teatro em Londres, em Resurrection Blues de Arthur Miller, ao lado de Matthew Modine e Maximilian Schell, dirigida por Robert Altman. A partir de 2015 entrou para a série da Netflix House of Cards. 


Rae Dawn Chong
ficou conhecida ao atuar nos filmes A Guerra do Fogo (1981), de Jean-Jacques Annaud, A Cor Púrpura (1985), A Loucura do Ritmo (1984), Comando para Matar (1985), Os Irmãos Corsos (1984) e Um Hippie nos Anos 90 (1990), em que trabalhou com seu pai, Tommy Chong, descendente de chineses, escoceses e irlandeses. Às vésperas de completar 60 anos, continua ativa no cinema e na televisão. Carrie Anne-Moss marcou seu nome na série Matrix e em Jessica Jones da Marvel. Molly Parker brilhou nas series de TV Dexter e House of Cards. 


Para terminar, a figura ambígua de Elliot Page (nascido Ellen Grace Philpotts-Page que, aos 33 anos, já protagonizou filmes como Juno e Hard Candy/Menina Má.Com, considerado pela crítica “uma das mais complexas, perturbadoras e assombrosas performances do ano”. Page recebeu ainda a chancela de qualidade Woody Allen, ao ser incluída no elenco de Para Roma com amor (2012), no qual interpreta um papel feminino e é creditado como Ellen Page.

Retomando o fio da nossa meada, quando você se interessar por algum ator/atriz que considera americano ou britânico, confira se por acaso não é canadense. Ou australiano? Ou neozelandês? Mas isso já é outra matéria...

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2021

O DIA pergunta. E a resposta é óbvia...

 


FENAJ: Pesquisa mostra que 93 jornalistas perderam a vida após contrair Covid-19. Quatro deles eram colegas da Manchete




Pesquisa realizada pelo Departamento de Saúde da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) revela que desde o início da pandemia de Covid 19 no Brasil até o final de janeiro de 2021, pelo menos 93 profissionais de imprensa (da ativa e aposentados) perderam a vida após contrair a doença. Os autores do relatório advertem que "esses dados podem não refletir a crua realidade das mortes na categoria, pois não existe um mecanismo oficial de registro dos casos", o que pode significar que os números são maiores. 

O dossiê mostra que pelo menos três colegas jornalistas que passaram pela Manchete perderam a vida por Covid-19:  Luiz Edgar de Andrade, Sérgio Jorge e Jesus Chediak. Não consta da relação o fotojornalista Zeka Araújo, que também trabalhou na Manchete e faleceu após a conclusão do levantamento. 

A Fenaj fez a pesquisa como uma forma de homenagem aos jornalistas. A maioria contraiu a doença trabalhando para levar informação crucial aos brasileiros. Não são números, são vidas e ajudaram a salvar outras vidas, considerando que o país governado por criminosos negacionistas não fez sequer campanhas oficiais de esclarecimentos à população. Para isso, o Brasil contou e conta apenas com os meios de comunicação. 

A todos o nosso pesar e eterno reconhecimento. 

Você pode acessar o relatório da Fenaj  AQUI

Vacina: vai pra Cuba!


Segundo reportagem do New York Times, Cuba está na reta fina para uma conquista científica extraordinária: a produção em massa de uma vacina contra o coronavírus inventada na ilha. "Uma das quatro vacinas desenvolvidas por cientistas cubanos entrará na fase final de testes no próximo mês, um passo crucial para a aprovação regulatória que, se bem-sucedida, poderá colocar a ilha no caminho para inocular toda a sua população e começar a exportar até o final do ano". A vacina se chama Soberania 2. Apesar das limitações econômicas causadas pelo longo e desumano bloqueio americano, cientistas cubanos afirmam que o governo provavelmente enviará doses aos países pobres, em conformidade com sua longa prática de fortalecer as relações internacionais por meio da doação de medicamentos e envio de médicos para tratar de crises de saúde pública no exterior.

terça-feira, 16 de fevereiro de 2021

Fotografia: O Homem da Meia-Noite sem carnaval...

 

Reprodução Twitter

Faltam vacinas e sobram crimes contra a população

 

Reprodução Twitter

O comentário acima foi postado no twitter e logo ganhou mais de 3 mil retuítes. Alerta para a estratégia mentirosa da comunicação do Planalto sempre que se vê acossado por fatos. 

O regime bolsonarista tem vasto prontuário de crimes em relação à Covid-19. Negacionismo, propaganda e até imposição de medicamentos que cientistas de vários países classificam de inúteis, além de perigosos, incentivo explícito às aglomerações, deboche sobre medidas recomendadas, como o uso de máscara e quarentena, essa foi a política de saúde do governo federal. 

A falta de vacinas, que era anunciada e agora se tornou real, é apenas mais um desses crimes contra a população. O governo Bolsonaro recusou compra de vacina da Pfizer em negociações que foram abertas em julho do ano passado e logo depois suspensas. Recentemente, não quis comprar 2 milhões de doses também da Pfizer por considerar, segundo admitiu, muita pouca quantidade. O sociopata no poder declarou no ano passado que não compraria vacinas da China. Toda essa incompetência misturada com ideologia doentia que deixou o Brasil sem cobertura de imunizante cobra o custo em vidas. Suspender a vacinação por falta de doses é mais um crime na extensa relação.

Como o tuíte afirma, os próximos dias serão de factóides oficiais para desviar a atenção dos brasileiros.


Brasil não desenvolveu um imunizante mas já tem a versão canalha: a "vacina de vento"

Reprodução

por Flávio Sépia

O Brasil não conseguiu desenvolver uma vacina contra a Covid-19, mas criou uma versão canalha; a "vacina de vento". Já são vários casos, alguns registrados em vídeo, em que o profissional de saúde - no caso, falso profissional - apenas finge que aplica o imunizante. Geralmente as vítimas são idosos. O MP está investigando esses casos. É bom que o faça e encontre uma explicação, já que a vacinação se estenderá por meses. 

Não se sabe se por corporativismo ou ingenuidade, circula a hipótese de que pode ser apenas um erro da pessoa que aplica a vacina. É bom duvidar disso. Pelo menos um vídeo mostra que no momento da aplicação o êmbolo da seringa vazia não é acionado. Ou seja, não é crível que um verdadeiro  profissional de saúde faça a picada no braço do cidadão e "esqueça' de empurrar o êmbolo. 

Funcionários flagrados já foram afastados, segundo as autoridades, e a investigação deverá responder sobre o objetivo do funcionário flagrado envolvido no ato. Iria guardar a vacina para um amigo? Teria um parente esperando pelo imunizante? Quanto valeria no mercado negro a dose surrupiada? 

A fraude já está assustando idosos que agora já não têm certeza de que se vacinaram realmente ou se foram enganados. Alguns pensam em fazer testes para saber se desenvolveram anticorpos ou apenas gases após injetados pela "vacina de vento".

Recado forte na capa do Estado de Minas

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2021

Filmes insólitos • Por Roberto Muggiati





Com minha coleção de filmes num guarda-móveis por conta da brusca mudança de Botafogo para Laranjeiras, ando correndo atrás de DVDs para aliviar meu fim de noite, depois de um dia de trabalho. Muitos dos filmes que encontrei – Doutor Jivago, Lolita, O desprezo, O poeta e o carteiro – protegidos contra pirataria, não tocam no computador, só no DVD-player, que está enfiado numa mala de roupas. 

Vibrei ao encontrar Quanto mais quente melhor e conseguir abri-lo. Tenho uma relação especial com esse filme. É um daqueles que vi em condições especiais – e muitas vezes insólitas. Como Stalag 19, projetado pelos milicos no quartel do CPOR em Curitiba. Ainda no quartel, graças a uma duvidosa unha encravada, fui dispensado de uma marcha noturna carregando 36 quilos de equipamento: ao sair para ir ver Casablanca pela primeira vez quase fui atropelado por meus companheiros, minha casa ficava na rota da marcha. A sensação do interdito deu a Casablanca um sabor especial. Fugindo de uma nevasca em Munique abriguei-me num cinema que passava Paris Blues... dublado em alemão. Ilhado em Florianópolis por causa de um temporal, vi lá A embriaguez do sucesso, um noir sobre os bastidores do jornalismo em Nova York, é um filme que revejo sempre. Maria Candelaria, o melodrama mexicano que foi o primeiro vencedor da Palma de Cannes, eu vi projetado num lençol num galpão de arrasta-pé de caiçaras em Guaratuba. E houve muitos outros, vistos em situações esdruxulas, como The Seven-per-cent Solution, num voo noturno entre Nova York e Londres, e um filme estrelado por Vittorio de Sicca num voo da Sicília para o Rio.

Vi Quanto mais quente melhor de madrugada duas ou três vezes seguidas num cinema de Nice enquanto fazia hora para pegar o voo das cinco da manhã para Londres. Nunca mais o revi. Só agora, com o distanciamento de 62 anos (o filme é de 1959), consigo apreciá-lo devidamente. Na Chicago de 1929, dois músicos (Tony Curtis e Jack Lemmon) testemunham por acaso o massacre de uma gangue de mafiosos por outra. Os bandidos se dão conta de que foram vistos e correm para elimina-los. Vestidos de mulher, os músicos escapam se integrando a uma banda feminina que viaja de trem para uma temporada na Flórida. Curtis e Lemmon se apaixonam por Marilyn Monroe, a cantora e tocadora de ukelele da banda. A situação se presta a comentários sobre transgênero e feminismo nos diálogos espertos do diretor Billy Wilder e do roteirista I.A.L. Diamond. Num happy end honesto, Tony Curtis conta a verdade para Marylin – que o acreditava um milionário – e a moça se conforma com sua sina de se apaixonar por saxofonistas tenores pobres. A frase final do filme é considerada uma das melhores na história do cinema. O milionário Osgood Fielding III (Joe E. Brown, o Boca Larga), apaixonadíssimo por “Daphne” (Jack Lemmon) só quer saber de dançar La Cumparsita com uma rosa entre os dentes e casar com a parceira. Quando Lemmon enumera a impossibilidade final (“Mas eu sou um homem!”), Osgood releva: “Ninguém é perfeito...”

PS: A morte misteriosa de MM • As condições confusas em que foi encontrado o corpo e a celebridade da atriz não tardaram a acionar a Teoria da Conspiração. No livro polêmico de 1973, Marilyn: A Biography, Norman Mailer afirma que Marilyn foi assassinada por agentes do FBI e da CIA, que julgavam o caso amoroso entre RFK e MM prejudicial aos interesses do país. Uma quantidade de escritores e jornalistas endossou a tese de Mailer. MM continuou sendo matéria fértil para escritores: a feminista Gloria Steinem publicou em 1988 Marilyn: Norma Jean e Joyce Carol Oates teve uma tradução da biografia romanceada Blonde relançada agora no Brasil, enchendo as páginas dos cadernos culturais com as fotos icônicas da loura que, pelo jeito, não vai nos abandonar tão cedo. Marilyn e Robert Kennedy foram autopsiados pelo Dr. Thomas Noguchi, o Legista-Chefe do condado de Los Angeles, que também fez a autópsia de Sharon Tate, Natalie Wood, William Holden, Janis Joplin e John Belushi, entre muitos outros. (Nas matérias da Manchete, eu o chamava de “o satânico Dr. No[guchi]”.)


Quando Marylin foi encontrada morta em sua casa de Los Angeles por seu psiquiatra, às três da manhã de domingo, 5 de agosto de 1962, eu sobrevoava o Atlântico num avião da BOAC com destino a Londres, onde iniciaria meu período de três anos no Serviço Brasileiro da BBC. Instalado num hotel próximo a Trafalgar Square, acordei cedo na segunda-feira. Era feriado, um Bank Holiday, o centro de Londres estava vazio, mal botei o pé na rua na manhã cinzenta e chuvosa vi os stands de jornais cobertos de cartazes MM DEAD, MM DIES, o Daily Mail dava na primeira página: MARILYN MONROE: ‘IT LOOKS LIKE SUICIDE’. Minha chegada a Londres ficou marcada por aquela triste notícia. Eu – como toda a minha geração – amava aquela garota.

PPS: Em abril de 1962 Marilyn tinha começado a filmar Something's Got to Give para a 20th Century-Fox, com Dean Martin e Cyd Charisse, sob a direção de George Cukor. Mas o estúdio a demitiu no começo de junho, culpando-a por todo o atraso da produção, e cancelou a filmagem, arquivando durante décadas os 37 minutos que restaram. Mais recentemente, o filme inacabado foi disponibilizado pelo YouTube. Vejam aqui os preciosos últimos minutos de MM nas telas

https://www.youtube.com/watch?v=zVfKpx-aSRk&t=439s