terça-feira, 12 de janeiro de 2016

Istambul: turistas no alvo do terrorismo religioso

Mesquita Azul, uma das atrações de Istambul mais visitada pelos turistas na região onde ocorreu o atentado.. 

Obelisco Egípcio no Hipódromo Bizantino próximo à Mesquita Azul

Turistas no Topkapi, no Serralho.

VLT na rua Yerebatan, região de Sultanahmet. 

Grande Bazar, no Beyazit. Fotos de J.E.Gonçalves
por José Esmeraldo Gonçalves
O bairro de Sultanahmet reúne algumas das mais visitadas atrações turísticas de Istambul. A Mesquita Azul, o Hipódromo de Bizâncio, a Santa Sofia, além de centros de artesanato, dos museus de Tapetes Vakiflar, de Mosaicos, de Artes Turcas e Islâmicas, os Banhos de Roxana, entre outros monumentos e instalações, se espalham no lado oriental da antiga capital dos impérios Romano, Bizantino e Otomano . Os turistas - cerca de dez mil, por dia -  costumam percorrer a pé esse extraordinário circuito. Foi essa a região escolhida pelo terrorista para acionar sua bomba.
Nos últimos anos, Istambul entrou de vez no roteiro dos brasileiros e era comum ouvir ecoar o português nas vielas de casas otomanas. A Turquia não demonstrava grandes tensões e isso ficava claro nas ruas, onde as pessoas eram em geral receptivas e prestativas. O país aproximava-se do ocidente e vivia a expectativa de entrar para a União Europeia. 
Mas algumas nuvens políticas começavam a escurecer o horizonte. 
Quando lançou as bases da república turca, no começo da década de 1920, o líder Mustafá Kemal, que passou a ser conhecido como Atatürk, o pai dos turcos, incluiu entre os fundamentos do novo Estado o laicismo. Apesar de o islamismo ser a religião dominante para cerca de 90% da população, Ataürk anteviu que um Estado secular seria o pilar que neutralizaria o autoritarismo religioso. Em quase um século, a Turquia sofreu intervenções militares (principalmente após se tornar membro da Otan, em 1952, e virar peça importante da Guerra Fria) e atravessou períodos de grave instabilidade econômica. Envolveu-se em conflitos com os curdos, foi à guerra em Chipre, mas preservou os princípios republicanos. 
Em 2002, a população insatisfeita com a situação econômica e uma inflação de 100% deu ao Partido Justiça e Desenvolvimento, de orientação religiosa, uma maioria de dois terços no Parlamento. O então primeiro-ministro Recep Erdogan promoveu uma série de reformas e em dois anos levou a inflação para um dígito. Fortalecido politicamente desde então, Erdogan, que hoje é presidente, foi, gradualmente, aumentando a influência islâmica no Estado. Surgiram leis restritivas de inspiração religiosa, censura à imprensa e oposicionistas passaram a sofrer perseguição. Os recentes atentados em Ancara, a capital do país e, agora, em Istambul, são o retrato desse novo tempo. O processo de islamização do Estado – em curso, apesar de grande reação interna – não vai facilitar um futuro com protagonistas como o Estado islâmico, o agravamento das relações com os curdos, a crise dos imigrantes e os reflexos das disputas entre sunitas e xiitas. 
Provavelmente, o turismo será a vítima mais imediata desses imbróglios cumulativos. O que será uma pena. São poucas as cidades que oferecem ao visitante tantas e tão preciosas atrações. Istambul, principalmente, uma metrópole onde o novo e o antigo convivem em cada esquina, transforma a visita em prazer, com direito a memoráveis aulas de história. Resta torcer para que a agitação mundana do Beyoglu, no setor europeu da cidade, onde ficam a praça Taksin e a cosmopolita rua Istiklal, não se torne vítima do sequestro da convivência democrática pelo fanatismo religioso. E que mezes e raki da rua Nevizade, um point boêmio de Istambul, tenham vida longa.  
Os turistas vítimas do atentado em Sultanahmet  estavam desfrutando desses momentos que, de resto, fazem parte de uma sensação que os terroristas pretendem explodir: o prazer de viver.
Por isso, Paris foi alvo. Por isso, os turistas de Istambul entraram na mira do terrorismo religioso.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

Sean Penn sob ataque: entrevista do ator com El Chapo vira polêmica

por Niko Bolontrin
Era previsível a repercussão da entrevista do drug lord Joaquín "El Chapo" Guzman feita pelo ator Sean Penn. O impacto do material jornalístico é reconhecido, em geral, mas sobram críticas à "ética' da abordagem ao fugitivo e ao estilo do texto, com trechos considerados verborrágicos, e à qualidade de algumas perguntas. Fico com o teor jornalístico da entrevista e, especialmente, das informações contidas na longa abertura de Penn, que traça um perfil do traficante, contextualiza e descreve os encontros. O resto é besteira, um debate idiota com boa dose de corporativismo e falso moralismo. Um bom jornalista, um bom escritor, teria feito melhor? Sim.  Mas o bom jornalista e o bom escritor não chegaram lá. A ABC News informou ontem que Sean Penn está sob investigação por parte das autoridades mexicanas. Outra bobagem. As mesmas autoridades divulgaram que a movimentação da equipe para a realização da entrevista possibilitou às forças policiais o "estouro" do esconderijo do traficante, agora preso. Deduz que elas não estavam inteiramente ausentes.
Sabe o que pode haver de reprovável no procedimento da Rolling Stone? A informação não confirmada de que El Chapo teria condicionado a entrevista à sua leitura do texto final, embora não tenha feito qualquer alteração. Se for verdade, esta questão de "aprovação" é um comportamento condenado pelo jornalismo, embora aconteça com alguma frequência (e quando interessa politica, comercial ou ideologicamente).
A polícia mexicana quer saber porque Sean Penn não comunicou às autoridades que ficou em contato com El Chapo por vários meses. Deve ser piada ou o delegado que diz isso é um clone do Cantinflas ou do Chaves. Os primeiros contatos foram via internet: Penn enviou perguntas e recebeu respostas em vídeo. Mais tarde, aconteceram os encontros pessoais. O ator trabalhou na condição de jornalista, tem fontes protegidas, assim como Bob Woodward e Carl Bernstein, no Caso Watergate, se negaram a revelar o nome do informante Deep Throat e foram garantidos pela lei.
Na mídia americana, Sean Penn está sob ataque, assim com a Rolling Stone. O Boston Globe diz que um não passa de um Mr. Madonna e a outra é "fanzine' e não "magazine". O New York Post chama Penn de El Jerko (de "jerk", algo como "pobre rapaz", "tolo") e destaca que ele foi parceiro de um traficante em fuga.
Credite-se à reação da mídia americana um certo viés direitista: Sean Penn é considerado lá um esquerdista radical. Para entender a coreografia: hoje, o site da Veja repete tais refrões e diz que a entrevista prova que a esquerda está ligada ao crime em todo o mundo.
Resumindo: a Rolling Stone deu uma bola dentro. O resto é choro, vela e frustração de quem gostaria de ter publicado a entrevista ou de fazer, quem sabe, um selfie íntima ao lado do El Chapo, o criminoso mais procurado do mundo. Ainda: pelo menos três jornalistas, um deles o inglês Robert Fisk, entrevistaram Bin Laden em encontros "secretos". Fizeram boas matérias e não provocaram espasmos de falsa ética como no caso chefão mexicano.

domingo, 10 de janeiro de 2016

Cony, marafonas, vaga na garagem e o Gênesis...

J. A. Barros, a lenda viva da diagramação na Manchete, Fatos&Fotos, Fatos e no O Cruzeiro, enviou ao blog uma reprodução da crônica de Carlos Heitor Cony, na Folha de São Paulo. "Que beleza de crônica, no seu contexto e na sua ironia", sublinha Barros.

Memórias da redação: Mensalão de Mendigo

Jardim em frente ao prédio onde funcionou a Manchete era a "casa" do mendigo Pernambuco
por Jileno Dias (do livro Aconteceu na Manchete, as histórias que ninguém contou")
Vida de pedinte sempre foi difícil mesmo quando sobreviver nas ruas parecia menos complicado do que hoje. Um mendigo foi certamente grato à excentricidade de Adolpho Bloch. Pernambuco, como era conhecido, "morava" no jardim em frente ao prédio do Russell. Dormia em um velho colchão, encarava chuva, mas fome não passava. Por ordem de Adolpho, Pernambuco era "cliente" do almoço e do jantar da Bloch. Com acesso ao menu variado e de qualidade, o mendigo muitas vezes provava da mesma comida que fora servida a ministros e governadores em visita ao Russell. E a mordomia não ficava aí. Sempre que avistava Pernambuco, Adolpho perguntava: "Como está a vida". "Joinha", respondia Pernambuco, já com a mão estendida para angariar alguns trocados. Ao morrer, anos depois, o mendigo teve as despesas do enterro no cemitério São João Batista custeadas pela Bloch.

Taís Araújo e Lázaro Ramos na capa da Rolling Stone Brasil fotografados por Maurício Nahas


por Clara S. Britto 
Na Rolling Stone Brasil, edição deste mês, uma capa linda do casal Taís Araújo e Lázaro Ramos, fotografados por Maurício Nahas. Taís, que estreou em 1996, na novela Xica da Silva, da extinta Rede Manchete, comemora 20 anos de carreira. Ela e Lázaro, que emplacaram agora o sucesso da minissérie Mr. Brau, da Globo, são chamados pela revista de o "casal número um da TV".

Paolla Oliveira ao natural... Lady Gaga em cena íntima... Espontaneidade do Instagram pauta revistas, colunas e sites



Reprodução/Instagram
por Omelete
A generosidade das belas atrizes. como Paolla Oliveira, abala as revistas masculinas tanto quanto o Uber tira espaço dos taxistas. Nada contra. Acompanhe meu modesto raciocínio: como pode uma revista competir com a espontaneidade e a intimidade das fotos que as próprias postam nos seus Instagram? Impossível. Tais fotos são na maioria das vezes extremamente autênticas, não necessariamente perfeitas. Sites de celebridades, colunistas, revistas e jornais ficam ligados nas redes sociais das musas. É de lá que, sem aviso, elas presenteiam a audiência. Menos mal que um nova função jornalística foi criada: a de setorista de redes sociais 24 horas por dia. Duvida? Pois veja, abaixo, a capa da edição mais recente da V Magazine. Nada menos do que Lady Gaga e o noivo, Taylor Kinney em selfie privadíssima, onde o que conta não é a qualidade mas a ousadia assinada pelos próprios fotografados.

Corra que o míssil vem aí... Trapalhada faz arma de guerra americana ser despachada, por engano, em vôo para Cuba










por Niko Bolontrin
Um míssil Hellfire que foi enviado pelos Estados Unidos para a Europa acabou em Cuba. Segundo matéri do site da BBC, a arma destinava-se a treinamento militar na Alemanha, em 2014. O míssil, guiado a laser, equipa helicópteros ou drones pode ser utilizado para ataques ar-terra, especialmente contra blindados. O mais incrível da história é que o Hellfire havia sido despachado como bagagem comum em avião de passageiros e foi extraviado na volta da Europa. Em vez de ser embarcado para a Flórida, foi despachado no Charles De Gaulle em um vôo da Air France para Cuba. Desde 2014, os Estados Unidos pedem que Cuba devolva a arma. Os cubanos não se manifestaram ainda, já que consideraram "agressiva"  e "suspeita" a remessa de um míssil para o país. Segundo o governo americano, o míssil estava desarmado.
Saiba, então, que no seu vôo transcontinental em um avião civil você poderá estar sentado sobre mísseis enquanto toma um tinto servido pela tripulação.
Isso lembra uma história trágica. Em 1973, um Boeing, da Varig, que decolara do Rio, pegou fogo e caiu pouco antes de aterrissar no aeroporto de Orly, em Paris. Morreram 123 passageiros. Oficialmente, o incêndio em pleno vôo teria sido provocado por um cigarro aceso no banheiro. Desde então, as companhias aéreas instituíram a proibição de fumar a bordo. A maioria dos passageiros foi asfixiada pela fumaça. Entre os mortos estavam o canto Agostinho Neto, o presidente do Senado, Felinto Muller, a socialite Regina Lecléry e os jornalistas Julio Delamare e Antônio Carlos Scavone. Extraoficialmente, houve rumores, na época, de que o jato da Varig transportava no bagageiro alguns mísseis que eram levados para revisão na França. Essa versão, jamais confirmada, foi considerada fantasiosa. De qualquer forma, é espantoso saber, 43 anos depois, que vôos civis podem transportar armas de guerra.

Senn Penn faz a entrevista exclusiva que muitos jornalistas gostariam de ter feito. A Rolling Stone americana publica a matéria do ator com o 'drug lord' El Chapo


por Niko Bolontrin
Quem assistiu ao seriado "Narcos', estrelado por Wagner Moura no papel do megatraficante colombiano Pablo Escobar, constatou que a vaidade e a busca pelo poder, incluindo aí o poder político, foram as pedras soltas na base do império do chefão do chamado Cartel de Medellín. Em certo momento, Escobar aproximou-se de alguns jornalistas e, através deles, procurou divulgar sua imagem de grande benfeitor da população nas áreas miseráveis do país. Mas essa mesma relação com a mídia se tornou uma fonte de informações sobre seus passos para os agentes da DEA americana instalados na Colômbia.
O fim de Escobar é conhecido. O chefão da vez, agora, é o mexicano Joaquín "El Chapo" Guzmán. No ano passado, El Chapo escapou espetacularmente de Altiplano, uma prisão de segurança máxima. através de um sofisticado túnel de 1,5km que percorreu na própria motocicleta de fuga. A cena lembra o clássico "Fugindo do Inferno", o filme em que Steve McQueen se manda de uma prisão alemã também através de um túnel seguido de uma épica correria em uma moto. Daria um filme. Foi o que El Chapo imaginou.
Disposto a tornar-se um referência pop, algo cult, o traficante mais procurado do mundo - cuja cabeça estava valendo 3,5 milhões de dólares - enviou representantes a Hollywood com o objetivo de fazer contatos com produtores para a realização de um filme sobre a sua vida.
Após essas primeiras investidas, o ator Sean Penn e, depois, a atriz Kate del Castillo, que participou da entrevista, tiveram encontros secretos com El Chapo em algum lugar do México. O último, em outubro passado.
El Chapo acabou pagando pela vaidade de se consolidar como uma "celebridade". E a conta veio rápida: segundo autoridades mexicanas, esses encontros e a movimentação dos participantes atraíram as atenções da polícia e ajudaram na recaptura do chefão da droga, na última sexta-feira.
El Chapo foi levado de volta para a prisão de onde fugiu. E a Rolling Stone antecipou o fechamento para levar às bancas uma entrevista exclusivíssima assinada por Sean Penn. Não é possível prever o desdobramento do caso, se o filme virá, se El Chapo escapará mais uma vez, se sobreviverá. O mundo das drogas é, digamos, violentamente concorrido, chefões têm inimigos, claro, mas pelo figurino das suas prisões anteriores, o normal é que El Chapo mantenha seus império funcionando a partir de suas ordens emanadas da cadeia. De resto, tal como acontece com os traficantes do Rio e de São Paulo, cujas operações não são abaladas pelo simples fatos de haver grades eventualmente e quase sempre brevemente entre eles e os seus comandados. Um risco seria o rumor de os Estados Unidos, que têm El Chapo como um inimigo a ser eliminado, não confiarem que o México o deixará preso por muito tempo e implementarem uma solução final à moda americana.
Na introdução da entrevista, Sean Penn conta os bastidores da negociação que envolveu mensagens criptografadas, rastreadores de escuta etc, sempre sob as instruções dos emissários do El Chapo. "Quanto dinheiro você vai ganhar escrevendo este artigo?" El Chapo pergunta a Penn. O ator informa que ao fazer jornalismo não recebe pagamento. Senn indaga: "De todos os países e culturas com as quais você faz negócios, o que é o mais difícil?" . Resposta do chefão: "Nenhum".
Entre outras declarações, El Chapo diz que o tráfico de drogas nunca vai acabar.
*  "Somos cada vez mais pessoas. No dia em que eu deixar de existir, nada vai diminuir."
* "Se não houvesse consumo, não haveria venda. E o consumo, dia após dia, fica maior".
* "Eu trafico heroína, metanfetaminas, cocaína e maconha mais do que qualquer pessoa no mundo".
* "Tenho frotas de submarino, aviões, caminhões e botes".
* "É uma realidade que as drogas destroem. Infelizmente, onde eu cresci não havia outra maneira e ainda não há uma maneira de sobreviver, de jeito nenhum, de trabalhar na nossa economia, de ser capaz de ganhar a vida".
* "O tráfico de drogas já faz parte de uma cultura que se originou dos antepassados. E não só no México. Em todo o mundo".
* "Eu sei que um dia eu vou morrer. Espero que seja de causas naturais".

LEIA A MATÉRIA COMPLETA NA ROLLING STONE. NA PÁGINA DA REVISTA HÁ UM VÍDEO. CLIQUE AQUI

sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

A melhor capa de 2015

Segundo enquete do site Poyter, a capa da Time, em maio, foi eleita a melhor do ano. 

Cante com os meteorologistas: "esse El Niño tá diferente, já não se conhece mais"...

Registros da intensidade do El Niño, com 2015 brigando pelo título. 
El Niño entrou em 2016 chutando a porta. Segundo o site Mashable, ganhou novos apelidos: Darth Niño e Godzila El Niño. País continental, como o Brasil, o fenômeno climático assola os Estados Unidos em variadas modalidades, dependendo da região: seca, inundações, onda de calor em pleno inverno, nevasca... Aqui, inundação no Sul, calor infernal no Sudeste, seca no Nordeste... Segundo os meteorologistas, estão acontecendo anomalias até mesmo dentro do padrão que se pode esperar do El Niño. Algumas zonas do oceano Pacífico deveriam estar mais quentes em função da intensidade do fenômeno, outras registram temperaturas maiores do que o previsto, a direção dos ventos não é a esperada. Resumindo, este El Niño, um dos mais fortes de todos os tempos, está "estranho", como define um perito. A avaliação é de que o contexto do aquecimento global está enlouquecendo o "menino". Em novembro, a temperatura global da superfície do mar foi a maior já registrada nesse mês. Entre janeiro e novembro de 2015, foi a mais quente da história. Em parte, culpa do El Niño, em parte, por causa do aquecimento global.
O que tudo isso quer significa, segundo os meteorologistas? Que devemos esperar o inesperado. Que ninguém tem um ideia precisa do que o El Ninõ vai trazer ainda nesse começo de ano.
As gerações passadas abusaram do planeta e entregam aos presentes esse caos climático; e as gerações atuais estão preparando cuidadosamente um desastre ainda maior para os próximos habitantes da Terra. Aquela que Yuri Gagárin viu lá de cima que era azul. Era.
Nem a Maju, do Jornal Nacional, vai conseguir aliviar esse verão.

quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

Tecnologia: um drone para transporte individual... Vem da China

eHang/Reprodução

eHang/Reprodução

eHang/Reprodução
A novidade vem da China: um drone elétrico para transporte pessoal. Trata-se do eHang 184, um quadricóptero de cabine fechada, por enquanto capaz de transportar uma pessoa por 23 minutos ou 16km. Há um longo caminho a percorrer em termos de custo, segurança e autonomia. Desde os anos 50, especialmente nos Estados Unidos, vários inventores ou fabricantes tentaram criar o carro-avião para transporte pessoal. Geralmente, tais projetos eram derivados de pequenas aeronaves com asas dobráveis, adaptadas para circular em ruas e rodovias.
Nenhum desses aparelhos revelou-se prático ou seguro. Ficou no sonho. Jamais foram comercializados para o grande público. Mais ou menos o que aconteceu com os carros-anfíbios, outra febre nos anos 50, que não concretizaram a possibilidade de um veículo sair da estrada e atravessar sem grandes complicações rios, lagos e baías.
Agora os drones - até aqui de pequeno porte e controlados remotamente - inspiram um novo caminho, não se sabe ainda se para lazer ou uso diário. Especialistas europeus em transporte urbano consideram inadiável a necessidade de um transporte aéreo individual para uso nas grandes cidades, a médio prazo. Mas são teses muito contestadas por outros pesquisadores que avaliam como inevitável o fim do transporte individual por questões ambientais e de sustentabilidade e que o investimento prioritário deverá ser em formas não poluentes de mobilidade coletiva, sem desperdícios de materiais.



Santos Dumont tentou popularizar o Demoiselle, seu modelo mais avançado e...

considerado fácil de transportar e prático como um ultraleve. 
Bom lembrar que Santos Dumont investia na aviação como transporte individual. Um dos seus aviões mais bem desenvolvidos e com conceitos avançados para a época foi o Demoiselle, de 1909. Era o mais barato e menor modelo da época. praticamente um ultraleve. com o qual ele quebrou sucessivos recordes de velocidade e distância. Foi o primeiro avião construído em série - cerca de 40 aparelhos. Diz-se que o brasileiro dava de graça os planos de construção do Demoiselle: seu sonho era popularizar a aviação.
VEJA UM VÍDEO SOBRE DESENVOLVIMENTO E TESTES DO eHANG. CLIQUE AQUI

quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

Direto de uma galáxia distante, os anos 70, conheça o JA, o Jornal de Amenidades que tentou ser uma "rede social"

O número 1 do JA, de Tarso de Castro

Serviço no JA: ficha técnica do King's Motel, que foi uma espécie de point jornalistico nos anos 70/80.

O que comer no King's Motel

Muito antes dos humoristas do Casseta, o JA tornou real o Planeta Diário.
(clique na imagem para ampliar)

A capa do número 2

Enquete sobre o EM

Tarlis Batista, repórter que depois fez carreira na Manchete, foi citado no número 1 do JA. Como não era de levar desaforo para casa, respondeu em carta para a seção "Pau Nele" do número 2.

Capa do JA número 3

Matéria sobre o Jangadeiro, o lendário botequim de Ipanema.
(Clique na imagem para ampliar)

Capa do JA número 9

O "Jogo do Carro" das celebridades no JA número 9

JA interativo à moda dos anos 70: o jornal convidava o leitor a escrever para seu ídolo, que respondia em carta manuscrita.
O expediente do JA
por José Esmeraldo Gonçalves
Acredite. Houve um tempo em que não havia rede social. O que não impediu que em um passado remoto, numa galáxia distante, os anos 70, existisse algo parecido com a linguagem da rede social. Há poucos dias, descobri simulações de “posts” escritos no tempo em que nem a ficção científica falava em Facebook.  Em uma caixa de papelão ainda fechada desde uma mudança de apê encontrei quatro velhos exemplares do JA, o Jornal de Amenidades, lançado por Tarso de Castro, em 1971. Na época, eu estudava na Escola de Comunicação da UFRJ, a ECO, então instalada na Praça da República, esquina de Visconde do Rio Branco. O prédio continua lá, mas quase em ruínas como, de resto, muitas lembranças da época. Em uma manhã de junho, alguém levou para a sala de aula o número 1 do JA, com Elis Regina na capa. O jornal era impresso em formato tabloide, com as folhas dobradas ao meio, o que lhe dava um jeitão de revista sem grampo. E não vinha para explicar, nem para confundir, não parecia pretensioso, era apenas diferente. Nas semanas seguintes, comprei os números 2 e 3 em uma banca ali perto, na Gomes Carneiro, quase em frente ao Correio da Manhã, onde passava a caminho da faculdade.
Os anos eram de chumbo, pleno governo Médici, e o Pasquim, do qual fazia parte o mesmo Tarso de Castro, era a leitura menos careta nas bancas de jornal, para usar uma gíria setentista. O JA - não sei quanto tempo durou mas não resistiu muito (era semanal, custava 50 centavos e, pelo menos até o número 9, parecia não ter conseguido captar anunciante que lhe desse sobrevida) – não concorria com o jornal do Sigismundo e pegava outro atalho, o de ironizar a chamada sociedade de consumo e a cultura de massa, expressões em voga nos tempos do tal “milagre econômico”. Era pop e mais provocador do que contestador. A matéria de abertura no primeiro número era a “ficha técnica do King’s Motel, um ícone da década. “Você e a companheira se hospedam democraticamente. Sem muitas formalidades. Ninguém quer saber quem é quem. Nem a ficha, na mesa de cabeceira”.  O texto, meio ao estilo das blogueiras que dão o serviço de marcas e produtos, detalhava quartos, serviço, culinária (com pratos como Filé ao King’s ou Filé Manda Brasa), garagem, formas de pagamento e avisava aos clientes para não levar souvenir para casa. “Desista de roubar a toalha da casa (linda). Dá bolo. No tempo em que você percorre o terreno de carro até atingir a portaria pra se mandar com o souvenir, os caras vasculham o quarto e imediatamente cantam o macaco para a portaria: - ‘Senhor, com toalha é mais 20 contos’”.
Seções como "Placar Social", que fazia o ranking das pessoas citadas nas colunas de Zózimo, Ibrahim Sued, Carlos Swan, Daniel Más e Germana de Lamare, antecipavam o foco sarcástico nas celebridades, hoje material de centenas de sites na web. Havia, ainda, o "Retrato do Consumidor", onde uma personalidade revelava seus hábitos de consumo (Jorginho Guinle era a pauta do número 1), a "K.H. Regras', um tipo de perfil com figuras polêmicas, entrevistas, enquetes, críticas a programas de TV, filmes, teatro, dicas de boates e bares, além de colaboradores como Antonio Bivar, Torquato, Martha Alencar,  Sérgio Augusto, Antonio Calmon, Vera Barreto Leite, Capinam, Pinky Wainer e Joel Barcelos.
Os textos, na maioria, eram curtos, coloquiais, bem tipo rede social. O JA também incentivava a interação com os leitores: havia uma página em que qualquer um podia escrever uma carta para um ídolo – assim como se entrasse no  Facebook do “famoso” ou “famosa” – e receber uma resposta exclusiva; leitores eram entrevistados na porta do cinema para opinar sobre o filme; a seção de cartas não chegava ao tom hater da rede, hoje, mas atendia pelo nome de "Pau Nele" e publicava broncas homéricas em lojas, companhia telefônica, restaurantes e postos de gasolina que maltratassem o consumidor.
Então é isso. Quis apenas compartilhar um certo veículo jornalístico de curta temporada, agora reconectado e reacessado em uma inesperada expedição arqueológica a uma caixa de papelão esquecida. Não tive coragem de jogar fora os quatro exemplares do JA. Fiquei com a impressão de que se o fizesse estaria entregando à Comlurb o “patrimônio imaterial” de um tempo em que o jornalismo tinha essas loucuras, era capaz de apostar no inviável - porque embarcar no viável é fácil -, e ainda (com licença do Fado Tropical, de Chico Buarque) cumpria seu ideal... de pensar fora da caixa. Ou da página.  

Kibe explícito: vídeo capturado em lanchonete viraliza na web

por Omelete
Um vídeo feito por um cliente de uma lanchonete da rede Habib's, em São Paulo, viralizou há dois dias na internet. Mostra a TV do salão exibindo um filme pornô. Informações da assessoria de imprensa da empresa dão conta de que o incidente está sob apuração interna. Há suspeita de que alguém usou um controle remoto universal desses à venda em camelôs para mudar o canal. É possível. E com a popularização de TVs inteligentes, aquelas que têm acesso à web via wifi, esse tipo de interferência pode se tornar ainda mais comum:através de um celular pode-se acessar uma faixa da SmartTV e exibir um vídeo, fotos ou mensagens. Brincadeira que já foi moda entre adolescentes era pegar o controle remoto universal para ficar mudando o canal de TVs ligadas em vitrines de lojas de eletrodomésticos.

terça-feira, 5 de janeiro de 2016

Aqui e lá, mulheres nas capas de 2016


Para a GQ, o ano começa com Giovanna Antonelli na capa, fotografada por Yuri Sardenberg.
A cantora Adele, que emplacou recorde de venda no fim do ano

A atriz Jennifer Lawrence

A atual musa conservadora da Fox News
Jennifer Lopez na In Style

Lady Gaga na V Magazine
por Clara S Britto
Para abrir 2016, as revistas não precisaram pensar muito. Depois de uma impressionante onda internacional de capas com o elenco do filme Stars Wars, os editores, no Brasil e lá fora, cataram as estrelas da vez, sem disposição para correr riscos. Apelaram para mulheres 'empoderadas' - eita palavrinha - termo, aliás, presente na maioria dos textos que exaltam as escolhidas para abrir o ano.

O que você não lê por aqui: Europa começa a reagir contra a especulação financeira. E como a Islândia dá o exemplo e enquadra os manipuladores do mercado

Alguns países começam a reagir contra o trem desgovernado que são os mercados financeiros. Desgovernado não é bem o termo. São claros os propósitos da manipulação. A revista italiana Panorama publicou recentemente uma série de matérias sobre a ação predatória internacional de grandes bancos e agências de risco. Uma investigação concluída há três semanas comprovou que algumas instituições manipularam taxas.
Em meio a essas denúncias, são divulgados os números da “ajuda” ao mercado financeiro. São impressionantes os dados da caixa-preta que se abre. Apenas entre 2008 e 2012, a Inglaterra transferiu para os bancos quase 1 bilhão de euros; a Alemanha de Angela Merkel despejou 650 milhões de euros de dinheiro público para sustentar especuladores. Em geral, a Europa repassou 5 bilhões de euros dos contribuintes para banqueiros em dificuldades. Autoridades financeiras de importantes centros impuseram a alguns bancos, após investigações, multas equivalentes a 306 bilhões de euros. Outro sinal de que os estragos que a especulação causa nas economias dos países chegou ao limite é que a própria União Europeia, sobre pressão da opinião pública, põe em prática a partir desse mês uma medida inédita que impede que os estados resgatem dívidas com dinheiro público e façam “salvamentos” bancários, como foi feito até aqui com bancos alemães, holandeses, espanhóis e gregos.
Agências de risco, - essas que a mídia brasileira trata como deuses no templo – também entram no foco da sociedade. Na Itália, uma dessas agências sofreu o que a Panorama chama de “humilhação”: o principal grupo de seguros do país exigiu não ser monitorado pela instituição, que tem a credibilidade contestada desde a crise mundial de 2008. A seguradora aponta falta de transparência dos critérios utilizados nas suas análises e projeções.
Um país que está sob observação internacional exatamente por seguir na direção oposta é a Islândia. Há poucos dias, tribunais condenaram cinco banqueiros como culpados, no país, pela crise financeira de 2008. Além desses últimos, há 19 outros já sentenciados. Todos respondem por manipulação do mercado, peculato e crimes fiduciários. A Islândia se recusou a fazer ajustes fiscais e a acabar com direitos sociais assim como a cobrar a conta dos trabalhadores. O alvo justo foi evidentemente quem mais ganhou com a crise: os especuladores e traficantes de dinheiro.
A mídia conservadora brasileira, obviamente, ignora esse assunto que ocupa a imprensa europeia, no momento. No Brasil, apenas a revista Caros Amigos fez uma série de reportagens reveladoras sobre o tema, mostrando como o país é refém de banqueiros que provocam crises, submetem governos, escapam ilesos e revelam enormes lucros.
Enquanto os brasileiros se distraem com a crise política, o mercado procura agir nas sombras. Após denúncias de que bancos brasileiros manipularam a taxa de câmbio, está sobre a mesa da presidente Dilma Rousseff uma Medida Provisória que atribui ao Banco Central a exclusividade de abrir processos administrativos contra agentes do sistema financeiro, inclusive em casos de formação de cartel. A medida foi gestada nas entranhas do próprio Banco Central e pode comprometer até a atuação do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), que perderia a prerrogativa de vigiar bancos. Frise-se que o Cade investiga precisamente o suposto golpe cartel do câmbio, já admitido por pelo menos uma instituição. Por enquanto, Dilma teve o bom senso de não assinar tal proposta. Espera-se que jogue a MP no lixo. E no lixo não reciclável para que não volte a assombrar o país e beneficiar poderosos à custa da sociedade.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

Máquina de escrever: um novo símbolo de rebeldia... Um livro revela que Olivettis e Remingtons estão saindo do armário

por Marina Francis
Começou como um hobby. Alguns escritores retomaram o hábito de criar seus textos em máquinas de escrever. Quando estourou o escândalo de espionagem mundial de emails e arquivos de computadores promovida pelos aparelhos de segurança americanos, alguns países, como a Rússia, reabilitaram a máquina de escrever para o registro de certos documentos oficiais. A medida também foi adotada por corporações em casos onde o sigilo era a alma do negócio. Uma tentativa, pelo menos, de escapar dos complexos americanos de espionagem política, militar e industrial. 
Agora, em plena era digital, o retorno à máquina de escrever começa a virar, também, uma espécie de movimento de rebeldia, atraindo jovens, escritores, músicos e ativistas que estão dando uma segunda chance à escrita mecânica.
Datilografar tornou-se cult. O livro "The Typewriter Revolution" documenta essa tendência. Nos Estados Unidos já há até associações nacionais de colecionadores e usuários de máquinas de escrever. Por enquanto, os adeptos da datilografia à moda antiga têm que recorrer ao mercado de usados.Em 2011, a última fábrica fechou as portas, em Bombaim. Mas há quem diga que assim como os LPs de vinil voltaram a ser fabricados, nada impede que "visionários do passado" reativem linhas de montagem das "pretinhas" como as redações de antigamente as chamavam. Olivettis e Remingtons estão sacudindo a poeira. Quem sabe, em breve, alguns livros virão com um aviso: "esta obra foi escrita em uma Smith Corona...  

Colômbia: a nova explosão da 'commoditie' cocaína...

por Flávio Sépia
Uma extensa matéria do Daily Beast mostra uma nova explosão da cocaína na Colômbia. Nos últimos anos, os Estados Unidos injetaram mais de 10 bilhões de dólares no país. Aparentemente, o dinheiro do contribuinte americano virou pó literalmente. O chamado Plano Colômbia da DEA americana fracassou. No últimos dois anos, a Colômbia voltou a ser o maio exportador de cocaína do mundo. O posto havia sido ocupado pelo Peru. Só em 2014, segundo o DB, a produção cresceu em cerca de 32%. Os número de 2015 estão sendo apurados mas é certo que não ficarão longe disso. Grupos paramilitares de direita, guerrilheiros de esquerda, facções militares corruptas e até milícias indígenas e pequenos agricultores dominam a produção e a logística da droga. Mais de 300 líderes camponeses foram mortos em 2015, a maioria vítima de disputas de terras relacionadas com a droga. Parte do problema é que a demando por cocaína continua estável nos Estados Unidos, o maior mercado do mundo, e cresce na Europa. Se há quem compre, não vai faltar quem venda. Há tribos que antes plantavam cocaína por motivos religiosos, hoje o fazem por razões econômicas. Plantar mandiocas e bananas não sustenta as comunidades. Daí, a cocaína é a commoditie valorizada. A Colômbia tem hoje cerca de 6 milhões de "refugiados internos". Pessoas que foram expulsas de suas terras por conflitos entre milícias, exército e guerrilha e que perderam suas estruturas de sobrevivência, retomaram a vida plantando coca. Os mais céticos já não acreditam que as negociações de paz com as FARC minimizem o problema já que há dezenas de grupos autônomos envolvidos na produção e tráfico de cocaína. Com o Plano Colômbia atolado em impasse e comprovando-se que a solução militar, uma espécie de "Tempestade nos Andes" imposta desde 2000, não deu certo, a alternativa no horizonte seira a legalização e controle do comércio de drogas: a vez do "Plano Uruguai".

sábado, 2 de janeiro de 2016

2016: Meu Réveillon com Norma Desmond

Por ROBERTO MUGGIATI

Depois dos convencionais fins de ano com a família – em casa ou na mitológica festa a rigor no Graciosa Country Club de Curitiba – tive a partir de 1960 uns réveillons insólitos e glaciais: sozinho em Frankfurt; com amigos brasileiros numa cervejaria de Munique, com direito a uma visita, antes, ao campo de extermínio de Dachau; em Londres, com a rapaziada se jogando na fonte de Trafalgar Square; em Paris bêbado diante da Nôtre Dame sob os flocos de neve que começaram a cair à meia-noite.
Veio depois uma sucessão mais sábia e desapegada de réveillons sozinho comigo mesmo no meu esconderijo de Botafogo – não à toa o Alberto da Manchete me chamava de O Eremita.

Gloria Swanson e William Holden. Reprodução
Nesta última passagem de ano, fiquei em casa, disposto a manter minha distância deste “insensato mundo” a que alude nosso caro Thomas Hardy. De uma pilha de DVDs me olhava com insistência Sunset Boulevard/Crepúsculo dos Deuses. Lembrei que o filme de 1950 tem uma cena de réveillon marcante e resolvi rever o clássico de Billy Wilder. A ação começa com um flashback narrado por um cadáver furado por três tiros numa piscina. O corpo é mostrado com um movimento de câmera magnífico, um contra-plongé literal que sobe do fundo da piscina. Contrariando toda a lógica, Joe Gillis (William Holden) conta como foi parar naquela posição crítica. Pressionado por dívidas atrozes, sem futuro como roteirista, deixa-se enredar pelo dinheiro de uma estrela do cinema mudo, Norma Desmond (Gloria Swanson), que mora com um mordomo sinistro numa mansão decadente da Hollywood dos anos 20.
A cena da piscina. Reprodução
(Não por acaso o filme ganhou o Oscar de direção de arte e cenário.) Joe – a pretexto de roteirizar uma ideia da atriz para um filme com Cecil B. de Mille – se deixa gigolotear pela dona, detentora de uma sólida fortuna de Glorias passadas.
Aqui entra de novo em cena a Manchete – aquele vampiro que nem balas de prata, nem estacas de madeira-de-lei no peito conseguem desencarnar. Na condição de diretor da revista, recebi em 1978 a visita de Gloria Swanson à redação, acompanhada do marido. Ele, William Dufty, jornalista, lançava aqui seu livro Sugar Blues, uma cruzada ambulante contra os males do açúcar. Eu não era tiete só de Gloria, mas também de William. Imaginem, amigo íntimo de Billie Holiday, ele copidescou a autobiografia da cantora, Lady Sings the Blues. Vejam a primeira frase primorosa que lavrou: “Papai e mamãe eram apenas duas crianças quando casaram. Ele tinha só dezoito anos, ela dezesseis e eu três.”
Gloria Swanson/Reprodução
Confesso que pouca atenção prestei para Dufty, fascinado que estava por Gloria Swanson/Norma Desmon. Tinha ela 51 anos quando fez Sunset Blvd; estava com 79 ali, diante de mim, ainda inteira. Ícones como Gloria/Norma  estão acima do bem e do mal. E, segundo um axioma da turma dos Capuccinos que se reúne todo sábado high noon na Travessa de Ipanema, “os xibius são eternos”.
A gigantesca mesa do editor da Manchete em forma de L nos separava. Gloria estendeu a mão, eu apertei sua mão. Infelizmente, não houve nenhum toque de pele, ela usava uma luva branca, comme il faut. Suplício de Tântalo, Norma Desmond ficou para sempre inatingível para mim. Mas uma memória eterna.
Meu amigo cinéfilo Paulo Martins também viu de perto Gloria Swanson naquela incursão carioca – imaginem, tomando um cafezinho com o marido num pé sujo da Galeria Alaska!... Outro mito de Hollywood extraviado (com duplo sentido) em Copacabana foi Norman Bates, o ator Anthony Perkins, quando veio lançar aqui Psicose de Hitchcock. Teve até um caso com Maurício Bebiano, que conheci na época no salon cinématographique parisiense de Paulo Berredo Carneiro, nosso embaixador na Unesco. Não me deixam mentir as irmãs Maria Lúcia Dahl e Marília Carneiro. (E os já finados Joaquim Pedro, Paulo César Saraceni e Gustavo Dahl.)
Gloria Swanson morreu cinco anos depois da visita à Manchete, aos 84. Mas, como Norma Desmond em Sunset Boulevard – que se tornou um musical de sucesso – viverá para sempre.