por Niko Bolontrin
Era previsível a repercussão da entrevista do drug lord Joaquín "El Chapo" Guzman feita pelo ator Sean Penn. O impacto do material jornalístico é reconhecido, em geral, mas sobram críticas à "ética' da abordagem ao fugitivo e ao estilo do texto, com trechos considerados verborrágicos, e à qualidade de algumas perguntas. Fico com o teor jornalístico da entrevista e, especialmente, das informações contidas na longa abertura de Penn, que traça um perfil do traficante, contextualiza e descreve os encontros. O resto é besteira, um debate idiota com boa dose de corporativismo e falso moralismo. Um bom jornalista, um bom escritor, teria feito melhor? Sim. Mas o bom jornalista e o bom escritor não chegaram lá. A ABC News informou ontem que Sean Penn está sob investigação por parte das autoridades mexicanas. Outra bobagem. As mesmas autoridades divulgaram que a movimentação da equipe para a realização da entrevista possibilitou às forças policiais o "estouro" do esconderijo do traficante, agora preso. Deduz que elas não estavam inteiramente ausentes.
Sabe o que pode haver de reprovável no procedimento da Rolling Stone? A informação não confirmada de que El Chapo teria condicionado a entrevista à sua leitura do texto final, embora não tenha feito qualquer alteração. Se for verdade, esta questão de "aprovação" é um comportamento condenado pelo jornalismo, embora aconteça com alguma frequência (e quando interessa politica, comercial ou ideologicamente).
A polícia mexicana quer saber porque Sean Penn não comunicou às autoridades que ficou em contato com El Chapo por vários meses. Deve ser piada ou o delegado que diz isso é um clone do Cantinflas ou do Chaves. Os primeiros contatos foram via internet: Penn enviou perguntas e recebeu respostas em vídeo. Mais tarde, aconteceram os encontros pessoais. O ator trabalhou na condição de jornalista, tem fontes protegidas, assim como Bob Woodward e Carl Bernstein, no Caso Watergate, se negaram a revelar o nome do informante Deep Throat e foram garantidos pela lei.
Na mídia americana, Sean Penn está sob ataque, assim com a Rolling Stone. O Boston Globe diz que um não passa de um Mr. Madonna e a outra é "fanzine' e não "magazine". O New York Post chama Penn de El Jerko (de "jerk", algo como "pobre rapaz", "tolo") e destaca que ele foi parceiro de um traficante em fuga.
Credite-se à reação da mídia americana um certo viés direitista: Sean Penn é considerado lá um esquerdista radical. Para entender a coreografia: hoje, o site da Veja repete tais refrões e diz que a entrevista prova que a esquerda está ligada ao crime em todo o mundo.
Resumindo: a Rolling Stone deu uma bola dentro. O resto é choro, vela e frustração de quem gostaria de ter publicado a entrevista ou de fazer, quem sabe, um selfie íntima ao lado do El Chapo, o criminoso mais procurado do mundo. Ainda: pelo menos três jornalistas, um deles o inglês Robert Fisk, entrevistaram Bin Laden em encontros "secretos". Fizeram boas matérias e não provocaram espasmos de falsa ética como no caso chefão mexicano.
Jornalismo, mídia social, TV, streaming, opinião, humor, variedades, publicidade, fotografia, cultura e memórias da imprensa. ANO XVI. E, desde junho de 2009, um espaço coletivo para opiniões diversas e expansão on line do livro "Aconteceu na Manchete, as histórias que ninguém contou", com casos e fotos dos bastidores das redações. Opiniões veiculadas e assinadas são de responsabilidade dos seus autores. Este blog não veicula material jornalístico gerado por inteligência artificial.
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segunda-feira, 11 de janeiro de 2016
domingo, 10 de janeiro de 2016
Senn Penn faz a entrevista exclusiva que muitos jornalistas gostariam de ter feito. A Rolling Stone americana publica a matéria do ator com o 'drug lord' El Chapo
por Niko Bolontrin
Quem assistiu ao seriado "Narcos', estrelado por Wagner Moura no papel do megatraficante colombiano Pablo Escobar, constatou que a vaidade e a busca pelo poder, incluindo aí o poder político, foram as pedras soltas na base do império do chefão do chamado Cartel de Medellín. Em certo momento, Escobar aproximou-se de alguns jornalistas e, através deles, procurou divulgar sua imagem de grande benfeitor da população nas áreas miseráveis do país. Mas essa mesma relação com a mídia se tornou uma fonte de informações sobre seus passos para os agentes da DEA americana instalados na Colômbia.
O fim de Escobar é conhecido. O chefão da vez, agora, é o mexicano Joaquín "El Chapo" Guzmán. No ano passado, El Chapo escapou espetacularmente de Altiplano, uma prisão de segurança máxima. através de um sofisticado túnel de 1,5km que percorreu na própria motocicleta de fuga. A cena lembra o clássico "Fugindo do Inferno", o filme em que Steve McQueen se manda de uma prisão alemã também através de um túnel seguido de uma épica correria em uma moto. Daria um filme. Foi o que El Chapo imaginou.
Disposto a tornar-se um referência pop, algo cult, o traficante mais procurado do mundo - cuja cabeça estava valendo 3,5 milhões de dólares - enviou representantes a Hollywood com o objetivo de fazer contatos com produtores para a realização de um filme sobre a sua vida.
Após essas primeiras investidas, o ator Sean Penn e, depois, a atriz Kate del Castillo, que participou da entrevista, tiveram encontros secretos com El Chapo em algum lugar do México. O último, em outubro passado.
El Chapo acabou pagando pela vaidade de se consolidar como uma "celebridade". E a conta veio rápida: segundo autoridades mexicanas, esses encontros e a movimentação dos participantes atraíram as atenções da polícia e ajudaram na recaptura do chefão da droga, na última sexta-feira.
El Chapo foi levado de volta para a prisão de onde fugiu. E a Rolling Stone antecipou o fechamento para levar às bancas uma entrevista exclusivíssima assinada por Sean Penn. Não é possível prever o desdobramento do caso, se o filme virá, se El Chapo escapará mais uma vez, se sobreviverá. O mundo das drogas é, digamos, violentamente concorrido, chefões têm inimigos, claro, mas pelo figurino das suas prisões anteriores, o normal é que El Chapo mantenha seus império funcionando a partir de suas ordens emanadas da cadeia. De resto, tal como acontece com os traficantes do Rio e de São Paulo, cujas operações não são abaladas pelo simples fatos de haver grades eventualmente e quase sempre brevemente entre eles e os seus comandados. Um risco seria o rumor de os Estados Unidos, que têm El Chapo como um inimigo a ser eliminado, não confiarem que o México o deixará preso por muito tempo e implementarem uma solução final à moda americana.
Na introdução da entrevista, Sean Penn conta os bastidores da negociação que envolveu mensagens criptografadas, rastreadores de escuta etc, sempre sob as instruções dos emissários do El Chapo. "Quanto dinheiro você vai ganhar escrevendo este artigo?" El Chapo pergunta a Penn. O ator informa que ao fazer jornalismo não recebe pagamento. Senn indaga: "De todos os países e culturas com as quais você faz negócios, o que é o mais difícil?" . Resposta do chefão: "Nenhum".
Entre outras declarações, El Chapo diz que o tráfico de drogas nunca vai acabar.
* "Somos cada vez mais pessoas. No dia em que eu deixar de existir, nada vai diminuir."
* "Se não houvesse consumo, não haveria venda. E o consumo, dia após dia, fica maior".
* "Eu trafico heroína, metanfetaminas, cocaína e maconha mais do que qualquer pessoa no mundo".
* "Tenho frotas de submarino, aviões, caminhões e botes".
* "É uma realidade que as drogas destroem. Infelizmente, onde eu cresci não havia outra maneira e ainda não há uma maneira de sobreviver, de jeito nenhum, de trabalhar na nossa economia, de ser capaz de ganhar a vida".
* "O tráfico de drogas já faz parte de uma cultura que se originou dos antepassados. E não só no México. Em todo o mundo".
* "Eu sei que um dia eu vou morrer. Espero que seja de causas naturais".
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