terça-feira, 12 de janeiro de 2016

Istambul: turistas no alvo do terrorismo religioso

Mesquita Azul, uma das atrações de Istambul mais visitada pelos turistas na região onde ocorreu o atentado.. 

Obelisco Egípcio no Hipódromo Bizantino próximo à Mesquita Azul

Turistas no Topkapi, no Serralho.

VLT na rua Yerebatan, região de Sultanahmet. 

Grande Bazar, no Beyazit. Fotos de J.E.Gonçalves
por José Esmeraldo Gonçalves
O bairro de Sultanahmet reúne algumas das mais visitadas atrações turísticas de Istambul. A Mesquita Azul, o Hipódromo de Bizâncio, a Santa Sofia, além de centros de artesanato, dos museus de Tapetes Vakiflar, de Mosaicos, de Artes Turcas e Islâmicas, os Banhos de Roxana, entre outros monumentos e instalações, se espalham no lado oriental da antiga capital dos impérios Romano, Bizantino e Otomano . Os turistas - cerca de dez mil, por dia -  costumam percorrer a pé esse extraordinário circuito. Foi essa a região escolhida pelo terrorista para acionar sua bomba.
Nos últimos anos, Istambul entrou de vez no roteiro dos brasileiros e era comum ouvir ecoar o português nas vielas de casas otomanas. A Turquia não demonstrava grandes tensões e isso ficava claro nas ruas, onde as pessoas eram em geral receptivas e prestativas. O país aproximava-se do ocidente e vivia a expectativa de entrar para a União Europeia. 
Mas algumas nuvens políticas começavam a escurecer o horizonte. 
Quando lançou as bases da república turca, no começo da década de 1920, o líder Mustafá Kemal, que passou a ser conhecido como Atatürk, o pai dos turcos, incluiu entre os fundamentos do novo Estado o laicismo. Apesar de o islamismo ser a religião dominante para cerca de 90% da população, Ataürk anteviu que um Estado secular seria o pilar que neutralizaria o autoritarismo religioso. Em quase um século, a Turquia sofreu intervenções militares (principalmente após se tornar membro da Otan, em 1952, e virar peça importante da Guerra Fria) e atravessou períodos de grave instabilidade econômica. Envolveu-se em conflitos com os curdos, foi à guerra em Chipre, mas preservou os princípios republicanos. 
Em 2002, a população insatisfeita com a situação econômica e uma inflação de 100% deu ao Partido Justiça e Desenvolvimento, de orientação religiosa, uma maioria de dois terços no Parlamento. O então primeiro-ministro Recep Erdogan promoveu uma série de reformas e em dois anos levou a inflação para um dígito. Fortalecido politicamente desde então, Erdogan, que hoje é presidente, foi, gradualmente, aumentando a influência islâmica no Estado. Surgiram leis restritivas de inspiração religiosa, censura à imprensa e oposicionistas passaram a sofrer perseguição. Os recentes atentados em Ancara, a capital do país e, agora, em Istambul, são o retrato desse novo tempo. O processo de islamização do Estado – em curso, apesar de grande reação interna – não vai facilitar um futuro com protagonistas como o Estado islâmico, o agravamento das relações com os curdos, a crise dos imigrantes e os reflexos das disputas entre sunitas e xiitas. 
Provavelmente, o turismo será a vítima mais imediata desses imbróglios cumulativos. O que será uma pena. São poucas as cidades que oferecem ao visitante tantas e tão preciosas atrações. Istambul, principalmente, uma metrópole onde o novo e o antigo convivem em cada esquina, transforma a visita em prazer, com direito a memoráveis aulas de história. Resta torcer para que a agitação mundana do Beyoglu, no setor europeu da cidade, onde ficam a praça Taksin e a cosmopolita rua Istiklal, não se torne vítima do sequestro da convivência democrática pelo fanatismo religioso. E que mezes e raki da rua Nevizade, um point boêmio de Istambul, tenham vida longa.  
Os turistas vítimas do atentado em Sultanahmet  estavam desfrutando desses momentos que, de resto, fazem parte de uma sensação que os terroristas pretendem explodir: o prazer de viver.
Por isso, Paris foi alvo. Por isso, os turistas de Istambul entraram na mira do terrorismo religioso.

4 comentários:

Corrêa disse...

Não há nada mais danoso e que incite à violência, guerras, intolerância e terrorismo do que a interferência de religiões na sociedade. Viram criminosas através do séculos como a história prova.

Peixoto disse...

A Turquia tem uma posição dúbia contra o Estado islâmico. Há alguma coisa aí. O país combate os curdos que são no momento as forças terrestres mais eficientes contra o EI. E tem as denúncias da Rússia de que a Turquia recebe petróleo do EI, forneceria armas etc. A islamização da Turquia não vai acabar bem. Religião controlando política sempre dá merda.

J.A.Barros disse...

Essa situação no Oriente Médio não vai acabar tão cedo. São muitos fatores que atuam como causa do surgimento desse movimento armado, e muito bem armado, que se intitula como EI, Daesh, e ISIS para outros. Tem como fundo a religião islâmica
mas, como sempre o fator econômico talvez seja o seu lado mais forte. O petróleo ainda é a grande moeda que governa o mundo. Até a Russia, que sempre se mantinha isolada, nesses movimentos armados passou a intervir fisicamente neste conflito com ataques aéreos, bombardeando tanto alvos da EI como alvos rebeldes sírios. A Russia defende o governo sírio e acredita que o apoio ao governo do Bashar al Assad é vital para acabar com o movimento armado do EI.

Salles disse...

Nessa região, a confusão só aumenta. Tem razão, não vai acabar tão cedo. Estados Unidos apoiam os rebeldes da Síria, que não combatem o Estado Islâmico e até repassariam para os terroristas parte do armamento recebido, Turquia está em cima do muro e combate os curdos, o que interessa ao Estado islâmico, Arábia Saudita não tem muito apetite para combater terroristas, Israel está distante dessa briga com o EI. França e Alemanha fazem uns bombardeios e só. A Rússia entrou acho que não apenas para apoiar o governo sírio mas por achar que o EI deve ser contido. A Rússia tem medo de islâmicos terroristas como os da Chechênia que já causaram muitas mortes no país. Uma aliança entre terroristas chechenos e do EI seria um problema grande para a Rússia. Não esqueçam que os soviéticos combateram o terrorismo dos talibãs, na época apoiados pelos americanos, temendo a ameaça islâmica das antigas repúblicas soviéticas. Retiraram-se do Afeganistão derrotados e deu no que deu: Bin Laden, Al Qaeda, atentados terroristas no Ocidente e outros bichos. Mas nem a Rússia nem a França ou Alemanha e Estados Unidos vão enviar tropas terrestres. Entrar nas cidades dominadas por EI e derrotar os terroristas cara a cara só tropas do Iraque, tropas do governo sírio e a guerrilha curda. Como vai acabar isso, sei lá, nem eles sabem