Eleições 2018, o primeiro debate. Foto Kelly Fuzaro/Band |
Guilherme Boulos, candidato do PSOL, foi o autor de duas frases que definem bem o debate de ontem na Band. Quando disse que os colegas de bancada expressavam os "50 tons de Temer". E, durante o encerramento, quando falou após Ciro Gomes, do PDT, e demarcou o terreno: "Daqui pra frente, todos os que vão falar apoiaram o golpe", referindo-se a Marina Silva (Rede), Alckmin (PSDB), Jair Bolsonaro (PSL), Álvaro Dias (Podemos), Cabo Dalciolo (Patriota) e Henrique Meireles (MDB).
Ampliando o rótulo de Boulos, o debate foi todo, na verdade, cinza. Muito por culpa das regras amarradas (em vários momento até o mediador Ricardo Boechat se enrolava) e, principalmente, pelo desequilíbrio e por forçar desigualdade de oportunidades: Meireles, Alckmin, Álvaro e, em seguida, Bolsonaro e Dalciolo, foram os mais solicitados. Marina, Ciro e Boulos foram menos escolhidos para respostas por parte dos colegas de debate. No bloco em que jornalistas da Band questionaram os presidenciáveis houve distribuição mais justa, Ciro e Boulos apareceram um pouco mais e, não por acaso, o debate ganhou alguma temperatura. Assessores dos candidatos prejudicados criticaram as regras da Band - que todos aprovaram - e que acabaram privilegiando certos debatedores.
Confira os tópicos:
* O debate mostrou que a bancada estava dividida em três meios de campo: Cabo Dalciolo, Marina e Bolsonaro formavam a esquadra evangélica, com Marina mais contida na pregação moral. Dalciolo, mais explícito adotava o estilo de "pastor". Era o apocalíptico do grupo, "O novo vem aí", "é o vento do espírito santo", trovejava. Não por acaso, os três, que disputam as mesmas ovelhas, evitaram maiores questionamentos entre si quando trocavam perguntas ou comentários; Alckmin, Meireles e Álvaro, com este dando mais ênfase à corrupção, costeavam os tons cinza de Temer. Faziam algumas críticas genéricas mas, em geral, preservavam ou omitiam o ilegítimo que o golpe colocou no Planalto. Os três fugiram do "troféu" de "candidato do Temer" como o diabo faria diante da cruz daquele bancada. E, quase sempre, escolhiam uns aos outros quanto o debate lhe dava direito de optar por fazer perguntas a um dos candidatos. As regras do debate, nos primeiro bloco, permitiam que um mesmo candidato fosse escolhido por três vezes, o que se configurou um excesso. no segundo bloco, duas vezes, melhorou um pouco. Alckmin estourou a cota de privilégio por parte de Álvaro Dias e Meireles. Sinal de que poderão estar juntos no segundo turno, caso um deses avance?
* Com exceção de Boulos cutucando Bolsonaro e de um rápido atrito entre Ciro e Bolsonaro, quando este achou que a palavra "droga" usada por Ciro em um comentário em relação ao capitão de pijama poderia confundir seus eleitores (Ciro havia falado apenas em drogas farmacêuticas), os candidatos evitaram temas mais "delicados". Alckmin não foi questionado sobre as denúncias de corrupção no seu governo, nem sobre auxiliares indiciados; ninguém perguntou a Marina sobre o entusiasmo com Aécio Neves nas eleições passadas, nem sobre seu apoio ao golpe e à ascensão de um governo que, entre outras ofensivas contra direitos sociais, neutralizou a defesa do meio ambiente e a repressão ao trabalho escravo ao atender demandas da bancada ruralista; Boulos ainda perguntou a Bolsonaro sobre uma funcionária fantasma, enriquecimento e imóveis. Os demais praticamente evitaram golpes diretos.
* Qualquer entrevistador sabe que ao fazer perguntas com três ou quatro enunciados, o entrevistado, no caso, o debatedor, geralmente opta por responder aquele que mais lhe convém e na qual poderá se sair melhor. No mínimo, gasta mais tempo com a questão "confortável". Bolsonaro, que é incapaz de falar sobre plano de governo ou detalhar o "como fazer" do seu obscuro programa, se aproveitou disso e não saiu do seu conhecido repertório. É um especialista em escapar do que interessa. Fez falta o direito de réplica aos jornalistas, principalmente, que assim poderiam exigir respostas mais claras dos candidatos e tentar impedir a fuga da fuga desabalada da essência dos questionamentos.
* Álvaro apontou o juiz Moro como seu futuro Ministro da Justiça. Ciro aproveitou para criticar o aumento de salários e auxílios que o STF se concedeu e, por cascata, a todo o Judiciário (vai custar bilhões em um país que corta verba de saúde, educação, meio ambiente, pesquisa etc) e citou o auxílio moradia do qual Moro e mulher se beneficiam embora tenham apartamento próprio. Depois, pediu desculpas e se corrigiu: Moro recebe auxílio moradia, mas sua mulher, não. Confundiu, disse, com o juiz Bretas e cônjuge, que recebem duplo auxílio sob o mesmo teto, o que é proibido por resolução do Conselho Nacional de Justiça.
* O áudio mostrou que Bolsonaro, aparentemente, era o único que tinha claques entre os convidados da Band. Atuaram livremente. Só perto do encerramento, Boechat pediu que a plateia deixasse para o fim os aplausos: "quem sabe eu ganharei algumas palmas", disse.
* Marina teme que o Brasil vá para "um poço sem fundo". A candidata parece otimista. Vá? Já não está?" E não teria ela dando uma ajudazinha a esse buraco desde que apoiou Aécio e o golpe?
* Boulos falou: "O Bolsonaro acha que mete medo nas pessoas, mas sabe aquele cachorrinho Chihuahua, que grita, fica na sua panela, mas quando você bate o pé sai correndo?"
* Bolsonaro mostrou que seu discurso contestador "ao que está aí" é mais incisivo no combate à violência, com ênfase na defesa do acesso às armas como direito dos cidadãos, e nos códigos morais, sua sharia particular. No plano econômico e social, ele demonstra fechar, pelo pouco que verbaliza, com o mercado, com a elite empresarial, o neoliberalismo ainda mais radical, se é que isso é possível, e os velhos grupos de pressão empresarial e oligárquicas que, afinal, mandam no país.
* Meireles se apresentou como o "cara". Ignorando a paralisação do Brasil, a crueldade do arrocho social, ele diz que organizou as contas. E vai fazer de novo. Não deixou muito claro como isso melhorará a vida das pessoas no país real e não apenas a maré mansa do poderoso mercado financeiro. Minimizou sua atuação na cúpula da JBS, empresa que parece ter produzido mais propina do que frango e picanha.
* Momento surreal. Daciolo perguntou a Ciro sobre sua participação em um cinematográfico plano Ursal (União das Repúblicas Socialistas da América Latina). Ciro riu: "não sei o que é isso". E ironizou sobre o devaneio do oponente: "Democracia é uma delícia, uma beleza, e eu dei a vida inteira e continuarei dando, mas ela tem certos custos". Ciro, a propósito, foi quem detalhou mais suas propostas, apesar do tempo exíguo. Respondeu melhor, sem dúvida
* Daciolo prometeu que, no seu governo, o Brasil será a primeira potência mundial.
* Criticado por admitir não entender de economia e outros temas, Bolsonaro já ironizou: qualquer dúvida ao tomar decisões consultará o Posto Ipiranga, referindo-se às conhecidas campanhas da marca. Curiosamente, o Posto Ipiranga foi um dos anunciantes do debate.
* A Justiça rejeitou recurso do PT reivindicando a participação de Lula no debate. O candidato a vice, Fernando Haddad, também foi vetado. Ele e Manuela d'Ávila participaram de debate televisionado na internet no mesmo horário do encontro da Band.
* Em parceria com a Band, o Google monitorou as reações da internet, on line, em uma Sala Digital. Mas a Band optou por mostrar a sala em plano geral, sem exibir ou comentar a movimentação do painel. O site oficial da emissora (Band.com.br) publica hoje alguns dados. Apertem os cintos e vejam dois exemplos dos alguns resultados finais computados pela emissora.
Entre os temas de maior interesse, emprego, impostos, saúde e educação desbancaram segurança entre as principais preocupações dos internautas. Reprodução Band.com.br |
4 comentários:
Ciro foi quem respondeu com mais detalhes não só do que quer fazer mas como fazer. Lógico que em um debate com pouco tempo não dá para mostrar todo seu programa de governo. Os demais falaram trivialidades genéricas, papo de enrolação, bizarrices
Bolsonaro é cria do golpe e da agressiva participação da midia no desmonte das instituições. Por isso me espanto com comentaristas de jornais e Tv e colunistas que participaram do golpe ativamente se espantando com a situação que levaram o Brasil politicamente, judicialmente, economicamente e de desastre social. Corre o risco de vir outra ditadura e esses golpistas vão ser responsáveis.
Cabo Ravioli é cá maior comédia. Salvou o debate que foi um marasmo
Parabéns mídia golpista vc destruiu a democracia no Brasil, aumentou os privilégios dos ricos, e abriu espaço para o autoritarismo e o preconceito e racismo. Parabéns colunistas e comentaristas golpistas, abracem Bolsonaro, o líder nas pesquisas
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