sábado, 28 de setembro de 2019

O bode que deu vou te contar...

Para a Manchete, o julgamento de Charles Manson foi a sentença dos hippies. 

por José Esmeraldo Gonçalves

Na gíria atual, 'bode' é o apelido que a periferia dá às motos. Na origem, significava tristeza, depressão. Também era usado como sinônimo de bad trip, a viagem lisérgica de quinta classe sem direito a bagagem de mão nem lanche a bordo.

A mídia americana reavivou recentemente cenas e memórias de Woodstock. A revisita datada manteve o tom nostálgico da euforia do rock e dos hippies que marcou aquele festival com repercussão global.

Sharon Tate. Reprodução
O cinema e a TV americanos se ocuparam de outro acontecimento de 1969, este no sentido oposto, o do "bode", que abalou aquele agitado agosto, há 50 anos. Pelo menos duas produções, além de documentários jornalísticos exibidos pela TV, tiveram como tema o assassinato da atriz Sharon Tate, grávida de oito meses meses e então casada com o diretor Roman Polanski, pela Família Manson, uma seita liderada por Charles Manson.

Três anos antes, ao deixar a prisão onde cumprira pena por roubo e estelionato, Manson se aproximou dos hippies de São Francisco e Los Angeles. Apropriou-se de alguns estereótipos do movimento dos jovens - roupas, cabelos, inspiração budista, a postura anti-sistema  - e formou seu próprio grupo. Tornou-se um guru para muitas meninas de classe média que moravam nas ruas por opção filosófica e comportamental. Logo promovidos a seita, eles viviam de pequenos roubos, pegavam comida em abrigos e portas de restaurantes. Manson convenceu seus seguidores de que logo haveria uma grande guerra entre negros e brancos. Como parte da estratégia de antecipar o conflito planejou assassinar celebridades de Hollywood. Imaginava que negros seriam apontados como culpados, o que desencadearia repressão policial violenta. A consequente resposta dos guetos se tornaria o gatilho da guerra mansoniana.

Não é exagero dizer que centenas de outras teorias surgiram sobre a motivação da Família Manson ao assassinar Sharon Tate. Ele mesmo "viajou " até a morte (em 2017) em versões sobre os propósitos da ação.

O certo é que o impacto emocional causado pelo crime brutal tornou-se - junto com o concerto dos Rolling Stones em Altmont, Califórnia, em dezembro de 1969, quando um garoto foi assassinado a facada na plateia - um marco do começo da  estigmatização e decadência do movimento hippie. A morte da atriz não provocou a "guerra" imaginada por Manson. Quem lubrificou as armas e lustrou as botas foi a repressão do governo americano que viu ali a oportunidade para uma ofensiva política contra o pacifismo, uma das bandeiras dos jovens. A Casa Branca - então de Richard Nixon - estimulou a formação de organizações de jovens conservadores ao mesmo tempo em que o FBI atacou "células" (o nome sinistro dado às comunidades) que organizavam protestos contra a guerra do Vietnã. Foi também nessa época que surgiu a política oficial de "guerra às drogas" então com um alvo único e preferencial: os jovens hippies.

Em todo o mundo, a mídia conservadora espelhou a estratégia de Nixon. A Manchete (capa acima) é um mero exemplo da repercussão política do fato explorado pela direita. Afinal, o  Brasil em plena ditadura também estava em guerra contra os jovens "subversivos". A propósito, com o "olho rútilo" da direita, Nelson Rodrigues, colunista da revista, escreveu uma crônica sobre os hippies. Título? "A revolução dos idiotas". 

Voltando ao "bode" agora em versão cinematográfica atualizada: as produções que "viajam" de alguma forma em torno da tragédia de Sharon Tate são: "Era Uma Vez em… Hollywood", de Quentin Tarantino, em exibição nos cinemas brasileiros, e a nova temporada do seriado "Mindhunter", do Netflix.

2 comentários:

J.A.Barros disse...

Nos Estados Unidos, sempre aparecem figuras sinistras voltados para o mal que causam grande impacto, não só na sociedade americana, com repercução em todo mundo. Lembrando de alguns exemplos temos o Al Capone durante a Lei Sêca com sua impiedosa Máfia, vieram os gangsters com o terror dos Bancos,Dillinger, assassino impiedoso, sem falar nos pistoleiros do velho Oeste americano: Jesse James, Billy the Kid os irmãos Daltons; mais pra frente aparece Ted Bundy, o bandido que assaltava e estuprava jovens mulheres, que abalou terrivelmente a sociedade americana levando o medo as jovens universitárias e no mundo contemporâneo surge uma hedionda figura, Charles Manson, criador de uma seita Hippy sob o pretexto de iniciar uma revolução matando artistas e a culpa seria jogada aos negros, criando então uma guerra entre eles os negros e os brancos. Charles Manson então invadiu, com seus seguidores, uma residência matando a atriz Sharon Tate, grávida de 8 meses casada com diretor de cinema, o polonês, Roman Polansky. Mais figuras sinistras, marcaram a vida desta sociedade americana tão mesclada por imigrantes europeus. O bandido da Luz Vermelha que assaltava e estuprava casais que namoravam nos parques à noite. ficou famoso porque, condenado à morte na Câmara de Gás, inteligente, pesquisou e estudou Direito na biblioteca da prisão e com os recursos impetrados foi adiando a sua execução até o momento em que os recursos se esgotaram e ele acabou na Câmara de Gás,depois de alguns anos nessa luta. Nos dias atuais, crimes dessa natureza vem ocorrendo, com ataques isolados de alguns militantes de seitas ou não, como os dois rapazes estudantes, em Columbine, que mataram a tiros, na escola em que estudavam vários colegas e depois se mataram.
Esse tipo de crime de matança em massa vem se repetindo nos Estados Unidos, aterrorizando a população, porque acontecem de repente em qualquer lugar, causando grande número de mortes.

Flávia disse...

Hippiemismo foi um protesto romântico de apenas uma geração mas deixou sementes. O sistema e forte mas igualdade, ecologia, luta contra o racismo, a conquistas do gênero, liberdade sexual avsncaram apesar de tudo. Falta muito para a plenitude no entanto.