terça-feira, 21 de abril de 2015

A história pelo retrovisor... Há 30 anos, a morte de Tancredo Neves

por Flávio Sépia
Um pouco de contramão no fluxo de opiniões e matérias que celebram Tancredo Neves, hoje. Afinal, o que seria da história sem o contraditório. Diz-se que os vencedores escrevem e reescrevem os fatos ao sabor das circunstâncias. No Brasil, alguns acontecimentos, sob a ótica política, descambam tanto que adernam para a ficção. O que você não vai ler na mídia comercial: foi reveladora a participação de Tancredo Neves no trágico folhetim que começou em 31 de março de 1964. O mineiro era aliado de João Goulart mas amigo de militares. O jornalista Jorge Antonio Barros conta hoje, no Globo, que JK não queria promover Castelo Branco.
Festa? Era a "transição"

A "transição" capítulo 2.
O então presidente tinha informações de que Castelo era "golpista" e "mau caráter". Se não fosse promovido, Castelo receberia o glorioso pijama da reserva. Tancredo convenceu JK, Castelo ganhou mais uma estrela e se tornaria o primeiro ditador da longa sequência que lançaria o Brasil nos anos de chumbo. Em 1965, Tancredo, que foi poupado da
cassação embora tivesse participado do governo Jango, ingressou no MDB, partido criado pelos militares para encenar um "oposição democrática" em contraponto à Arena, sigla "governista". Foi eleito deputado, sucessivamente, até 1979. No período mais sangrento da ditadura, Tancredo submergiu politicamente. É difícil para um pesquisador encontrar suas digitais em algum acontecimento ou protesto nas ocasiões em que o regime era denunciado e combatido pelos meios possíveis na violenta década de 1970.
O golpe do destino
Mesmo a Wikipedia, uma enciclopédia virtual e informal, que não é infalível, ao contrário, mas é corrigida e reabastecida permanentemente, consegue resumir em uma linha a trajetória de Tancredo na citada década. Com a volta do pluripartidarismo, o mineiro, que era da "ala moderada" do MDB (nos tempos em que até Ulysses Guimarães, que não era propriamente um "subversivo", assumia o enfrentamento e era atacado ruas por cachorros da Polícia Militar da Bahia, capitania de ACM e do então governador Roberto Santos, então da Arena), deixou o partido para fundar o PP ao lado de "dissidentes" da Arena (um deles, precisamente Roberto Santos, o homem que soltou os cachorros em Ulysses). Tancredo mudou-se para o PMDB para se candidatar ao governo de Minas, já em 1982, quando percebeu que o PP não o levaria tão longe. "Ala moderada" do MDB" e "dissidente" da Arena é qualquer coisa insondável, chega a ser uma qualificação partidária risível para não dizer ridícula. Mas procede, no caso. Nos anos seguintes, as Diretas-Já tomariam as ruas. Tancredo subiu no palanque.
Sem futuro: o passado se abraça
Tipicamente, em um discurso em São Paulo, não chamou a ditadura de ditadura mas apenas de uma "confusão" que se instalou no país. E, em entrevistas, não se sabe se por ato falho, costumava chamar o golpe de "revolução". Com a derrubada da Emenda Dante de Oliveira no Congresso, os defensores de uma candidatura via Colégio Eleitoral da ditadura consideraram concorrer com uma chapa de "oposição". No começo das negociações havia quem defendesse que José Sarney fosse cabeça de chapa e Tancredo, vice. O adversário era Paulo Maluf. Parecia fácil ganhar no Colégio Eleitoral dos militares: nem ACM apoiava Maluf. Em meio às negociações, a chapa foi invertida. Tancredo era palatável pela ditadura e o Brasil foi poupado de a pantomima do Colégio Eleitoral ser ainda pior: a primeiro civil na Presidência após o golpe seria escolhido entre Maluf e Sarney. Já pensou? Pelo menos naquela votação indireta, pode-se dizer que, ao aceitar concorrer, Tancredo livrou o país de um vexame diluviano. Ponto para ele. Mas o Brasil não seria poupado de Sarney, após a morte do mineiro que, como a viúva Porcina, foi presidente sem nunca ter sido.
O povo que sonhou com as Diretas
ganha um "presente" torto.
Tancredo morreu antes de tomar posse. Tecnicamente, não chegou a ser presidente e nem sequer havia sido eleito pelo povo. Só em 1985, um ano depois da sua morte, foi promulgada uma lei especial tornando obrigatória a inclusão do seu nome em todas as galerias de presidentes do Brasil. Foi o último biônico. O capítulo seguinte, o Brasil as gerações dos anos 80 não esqueceram. O representante mais afinado com a ditadura, Sarney, virou o presidente da "transição". Vieram o Plano Cruzado - o povo gostou do congelamento de preços e assumiu um papel messiânico de "fiscal do Sarney" - e foi alvejado com o Plano Cruzado 2, que levou o país a uma hiper inflação de 80% ao mês, sublinhando a enganação da qual o país foi vítima. Mais adiante, viria a Constituinte, que não foi exclusiva como muitos pediam e acabou influenciada pelos políticos profissionais e pela ação do Centrão (bancada conservadora) apoiado pelo governo. Foi aprovado o mandato de cinco anos. Plantava-se metodicamente a base do atraso social e da consolidação de uma cruel concentração de renda. O Brasil era aquele jogador que o torcedor apelida de 'enceradeira": o falso craque que dribla dando voltas em torno de si mesmo sem sair do lugar.

4 comentários:

Ebert disse...

Fazia o jogo da politica pessoal profissional. Sem importancia como administrador para o povo.

Silvana disse...

Um martir pelo Brasil, vc está desvalorizando

Corrêa disse...

Quando a barra pesou e muita gente foi morta e torturada, Tancredo ficou trancado em casa. Só saiu na hora da armação pra se dar bem.

Silvana disse...

O Brasil não respeita os grandes homens