sexta-feira, 16 de agosto de 2019

Jornalismo: o coro dos contentes

Quando empresários fazem lobby para desburocratizar atividades quase sempre direitos são suprimidos e não apenas a papelada.

A chamada Lei da Liberdade Econômica é um desses comboios que em nome de uma "boa causa" - a eliminação de entraves funcionais - resulta em compressão das liberdades individuais, especificamente aquelas que dizem respeito aos trabalhadores.

Os analistas e colunistas de economia da mídia conservadora vivem um dilema que de tão exposto até beira o ridículo. A maioria ajudou a criar as condições políticas que elegeram Bolsonaro. E, desde janeiro, cumpre a dolorosa missão patronal de exaltar as medidas econômicas de mercado e timidamente ou com alguma ênfase criticar, no máximo, as políticas ambientais, educacionais, de saúde, a pauta fundamentalista dos costumes. Acontece que o governo é indivisível e se há alguém com um projeto definido no Brasil atualmente, para todos os setores e com a marca da ultra direita, chama-se Bolsonaro. Aliás, o teclado dos funcionários da mídia conservadora parece não conseguir compor essa palavra,  "ultra direita", que é a definição exata que a imprensa internacional usa como griffe do atual governo do Brasil. A economia não é um mundo à parte da política da ultra direita. É como se um cruel assassino serial tivesse sua culpa esquecida apenas porque gosta de plantar camélias, adora animais e posta fotos nas redes sociais orando e se batizando no Jordão e isso o eximisse de pena.   

Veja-se o caso da MP da Liberdade Econômica, que recebe aplausos dos colunistas. Junto com a papelada somem coisas como um empresário falido não precisar ter mais o patrimônio pessoal à disposição da Justiça para pagamento de dívidas trabalhistas. "Somente o patrimônio social da empresa pode responder pelas dívidas", diz a lei. Se com patrimônio pessoal incluído nas garantias as falência geralmente punem ex-empregados, imagine o que acontecerá a partir da aprovação da nova lei.

Olha só esse artigo: "fica permitido o uso de registro de ponto do trabalhador por exceção, ou seja, quando for diferente da jornada regular". E aí vem o risco embutido: "isso poderá ser definido por acordo individual escrito, convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho". Um trabalhador que procura emprego há meses, com a família em dificuldade, vai deixar de assinar qualquer papel que o empregador oferecer como condicionante ao posto?

Ao analisar a MP da Liberdade Econômica, os principais colunistas revelam uma ingenuidade lapidar. Um mero exemplo: Míriam Leitão escreveu no Globo: "Mesmo sendo necessário tornar o processo de licença ambiental mais ágil, transparente e previsível, o que o governo tem feito na área é inibir os órgãos de controle e desmontar a máquina". Apesar de admitir isso, o artigo se agarra esperançoso em uma dúvida: "como há um item que determina que, se uma licença não for dada num prazo específico, ela estará dada automaticamente, há risco de que isso seja usado para eliminar na prática exigências que de fato precisam ser cumpridas por razões ambientais e de segurança". "Risco" cara pálida? O artigo está aí exatamente para que as empresas possam usufruir desse prazo e... jogo jogado. Ainda mais se a máquina está sendo desmontada, com demissões e transferências de cientistas e fiscais que teimam em atuar, é claro que a análise ambiental de projetos tende a demorar mais ou, pior, passar a ser feita nas coxas por ordens de cima ou por funcionários amedrontados.

O governo diz se preocupar com a família, mas isso parece significar apenas a submissão a questões morais e religiosas. Um artigo da MP reduz o tempo de lazer e convivência dos pais com os seus filhos. "Fica liberado o trabalho aos domingos e feriados", que será pago em dobro e compensado com folgas sendo que apenas uma delas em um domingo a cada quatro trabalhados, as demais cairão em dia útil, vale dizer em data escolar. Com pai e mãe submetidos a esse regime, reduz-se o tempo de convivência da família.

Outro absurdo: "as empresas não precisarão mais de autorização do governo para testar produtos e serviços, se houver consentimento de quem for testá-los, a menos que haja risco à segurança pública ou nacional". Isso quer dizer que risco às pessoas são admissíveis?

E essa outra? "Fica permitido às empresas e empreendedores arquivar qualquer documento em microfilme ou por meio digital e ele estará equiparado ao documento físico para todos os efeitos legais". O meio digital não pode ser ignorado, claro, mas a MP não regulariza esse arquivamento. Vai ser na nuvem? Haverá backup obrigatório? Ou o empregador e o empreendedor poderá guardá-lo na memória do celular junto com fotos de viagem? Não é preciso ser visionário para prever que muitos arquivos poderão desaparecer "por engano", por "queda dos sistema" ou por culpa dos HDs "lamentavelmente corrompidos". A reforma trabalhista de Temer já passou a dificultar ou até impedir ações judiciais por parte dos empregados. A nova lei pode inviabilizar reivindicações pelo simples fato do trabalhador não conseguir provar sua demanda com documento legal que se evaporou na nuvem.

Não faz muito tempo, o Brasil alcançou quase o pleno emprego e a valorização real das médias salariais sem precisar detonar a proteção social e a segurança do trabalhador. O objetivo dessas leis neoliberais que reduzem direitos é claro: aproveitar a crise e o desespero de milhões de desempregados para empurrar regras trabalhistas cruéis sob o argumento  - e aqui usa-se a linguagem fecal que Bolsonaro adora - de que quem está na merda não vai reclamar de receber mais um pouquinho de cocô na cabeça. 

7 comentários:

J.A.Barros disse...

Pelo texto postado entendo que não existe nenhuma lei que venha contentar a "gregos e troianos". De fato cada nova lei que é aprovada mil indagações surgem na sua contestação. Talvez a mais nova lei de 2005,que passou a regular a falência empresarial, veio – no meu entender – acabar com a garantia do ressarcimento das dívidas trabalhistas no processo das massas falidas. Na falência da Bloch Editores, onde era empregado, só vim a receber esse meu crédito trabalhista 19 anos após a data da falência desta Empresa. Ora, se na lei das falências que precedia a atual, os empregados tinham o privilégio de serem os primeiros da fila de credores a receberem as suas indenizações devidas e levavam pelo menos 19 anos, imagina pela nova lei de 2005 assinada e aprovada pelo ex–presidente que se encontra preso numa cadeia em Curitiba, os primeiros da fila a receberem o que lhes é devido será o Estado: a Receita Federal, a Previdência, Bancos do Brasil, Caixa Econômica em seguida virão as Empresas credoras e por fim os trabalhadores. Se na lei antiga que beneficiava os trabalhadores no recebimento de seus créditos trabalhistas pelos menos 19 anos se passava, hoje pela nova lei o trabalhador nunca receberá a sua indenização em vida. O trabalhador agradece comovido ao ex–presidente pela nova lei de falência por ele aprovada

Cleiton A. C. Varela disse...

Amigo, sou advogando e sei que essa prioridade continua valendo, peça informação antes de escrever besteiras.

Altair disse...

A lei pretendia dar uma força à recuperação das empresas, mas não sei se isso funcionou. Mas o pagamento aos trabalhadores continuou prioritários com limites, mas muitos juíze decidem legalmente atender aos mais necessitados antes dos grandes grupos financeiros.

J.A.Barros disse...

Não, não tá valendo, até porque quiseram depois da nova lei promulgada, implantar o sistema com a Bloch Editores, com a revista Manchete, Pais&Filhos e Ele&Êla, mas não deu certo. A prioridade existe porque está escrita na lei e se ela não é cumprida é outro problema, o senhor, como advogado, é que deveria ter mais cautela em afirmar contradições, senão besteiras, partidas de um advogado, o que é de se estranhar. O senhor é advogado de causas trabalhistas?

J.A.Barros disse...

Consultei alguns advogados e colegas sobre esse detalhe da nova lei da Falência, e eles me confirmaram de que quem tem a prioridade no recebimento das dívidas da falida é a União, logo os trabalhadores perderam sua antiga prioridade. É simples assim. Se no decorrer do processo mudaram as prioridades, é outro problema.

J.A.Barros disse...

Essa nova Lei da Falência veio como novidade, copiada de países europeus, que é a Recuperação Judicial. Quer dizer que a Empresa falida depois de obedecer uma série de requisitos e obrigações, nomeado um interventor judicial, continua seus trabalhos na tentativa de se reestruturar e ganhar novamente o mercado. A idéia é muito boa, e foi tentada na Bloch Editores com uma nova redação editando as revistas Manchete, Pais&Filhos, Ele&Ela e não sei com certeza se a revista Desfile estava dentro desse projeto. O seu editor genial, Roberto Barreira, se encontrava muito doente e não pode dar sua assistência necessária para continuidade da revista.Tudo bem no começo, mas depois de algum tempo, a tentativa se frustrou porque acabou o dinheiro e sem ele nada poderia mais acontecer. Mas, consultando, pesquisas e amigos advogados entendemos que houve mudanças substanciais nessa nova lei e uma delas foi a volta do privilégio dos créditos trabalhistas voltarem a serem prestigiados. Mas, no principio, na nova lei o privilégio do recebimento dos créditos cabia a União, que vinha em primeiro, seguido dos Estados e Municípios e então os créditos trabalhistas viriam em seguida. A verdade é que, a fome de receber esses créditos é muito grande. No caso da falência da Bloch Editores, depois de alguns anos e muitos ex–empregados terem conseguido receber o seu credito o representante dos empregados da Bloch Editores junto com o Síndico da Massa Falida, conseguiu que a Massa pagasse a Correção Monetária dos que estavam quitados. Isso aconteceu em três anos seguidos e foi quando a Receita Federal entrou na Justiça requerendo o pagamento de 25 milhões de reais devidos pela Bloch Editores à Receita. Esse processo no seu decorrer chegou, depois dos recursos, à Câmara Alta, que para tristeza dos trabalhadores, os senhores desembargadores deram ganha de causa à Receita e que a Massa interrompesse os pagamentos das Correções Monetárias e reservasse 25 milhões de reais, para o pagamento devido à Receita Federal. Imagina, os Juízes Desembargadores, deram ganho de causa à Receita Federal, se baseando na nova lei de Falências, que em princípio, privilegiava a União no recebimento das dívidas, se esquecendo ou ignorando o Juiz Relator, de que a Falência da Bloch Editores estava regida pela antiga Lei de Falências. Quer dizer, os ex–empregados da Bloch Editores, em um momento ficaram regidos pela antiga Lei de Falência e ao mesmo tempo pela nova Lei de Falência que é a RecuperaçãoJudicial e no fim e ao cabo, muitos ex–empregados ainda não receberam os seus créditos trabalhistas e os que receberam pararam de receber a sua devida Correção Monetária. Mas, entendemos tudo isso porque estamos e vivemos neste país chamado brasil.

J.A.Barros disse...

Agora, esse desrespeito de comunicação entre pessoas que não se conhecem, não sabem o nível de cultura de seu interlocutor, e vão logo o rotulando de ignorante e de falar besteira, é muito do carácter do brasileiro. Não é assim que se devem comportar duas pessoas, que através de um programa de computador cria uma janela de comunicação. Deve, na verdade, procurar criar uma nova amizade na troca de idéias através desse processo fantástico de pessoas em Estados ou em Países longínquos se comunicarem e se conheceram fraternalmente e não se hostilizarem como se fossem inimigos mortais. Somos pessoas civilizadas e educadas e vamos tentar agirmos assim da próxima vez. OK?