quarta-feira, 5 de julho de 2017

TRÍVIA DA TRAVE: as redes eram assim... Ilha do Urubu faz uma viagem no tempo.

Ilha do Urubu: Flamengo revive a tradicional rede "Véu de Noiva" hoje banida dos grandes estádios. Foto Flamídia

por José Esmeraldo Gonçalves

No seu novo estádio, o Ilha do Urubu (“Urubuzão” para os íntimos), na Ilha do Governador, no Rio de Janeiro, o Flamengo resgatou a tradição da rede “Véu de Noiva” – na sua versão vintage, inclinada como um manto, muito próxima do travessão, descaindo depois num ângulo suave até o fundo do gol.

Os "velhinhos do Board", como João Saldanha apelidava o conservador International Football Association Board, conselho superior da Fifa encarregado de definir e atualizar as regras do futebol, nunca impuseram um modelo rígido, mas, durante muito tempo, o "filó" ou "barbante", no jargão de locutores esportivos, até que não mudou muito.

Na Copa de 1958, a rede com barra de ferro. Foto Manchete Esportiva


Em 1958, na Suécia, os organizadores da Copa montaram barras de ferro sustentando a rede. O modelo foi abandonado depois por questões de segurança. Além disso, a barra de ferro nada discreta no fundo do gol não raro devolvia a bola como se fosse um poste, o que confundia o torcedor no alto das arquibancadas.

Na Copa de 70, no México, as traves ganharam suportes um pouco maiores nos ângulos do travessão, que afastavam do goleiro, por quase um metro, o caimento da rede.

Na Copa de 1950, Giggia estufou a rede "Véu de Noiva" de Barbosa. O "barbante" visto aí
foi queimado anos depois junto com a lenha de um "churrasco de desabafo"
organizado por jogadores para exorcizar a derrota para o Uruguai. Funcionou. O Brasil foi campeão
do mundo antes do fim daquela década, em 1958, conquistando o primeiro título da série do Penta.
A propósito: que alguém localize imediatamente e faça um churrasco
com as duas redes azarentas do Mineirão, aquela dos 7 X 1  de 2014 de triste memória.

Na Copa de 1974, a da Alemanha, os suportes foram alongados e o gol ganhou um aspecto de "caixote". Os puristas, incluindo jogadores, criticaram o modelo  -  um "monstrengo", na visão deles. De fato, a rede esticada reduzia o impacto de uma imagem consagrada no futebol: a do gol que "balança a rede". Como o de Ghiggia, contra Barbosa, na Copa de 1950, no Maracanã.

1978: o argentino Kempes vai buscar a bola no fundo da rede esticada. Foto Fifa

Na Copa da Argentina, o suporte superior estava lá, embora ainda mantivesse a rede ligeiramente em diagonal. Uma das hipóteses para a evolução do formato estaria na tecnologia das câmeras de TV. O modelo quadrado tornou possível a instalação de microcâmeras no fundo do gol. Outro motivo seria melhorar a visão do árbitro, quando posicionado na lateral da grande área, e do bandeirinha.


Pelé, mil gols. FF
Sejam lá quais forem as razões da Fifa, o "Véu de Noiva" dava, para muitos, um toque extra às tramas e emoções do futebol. Que o digam os artilheiros, que após estufar as redes entravam no gol e se enrolavam no "filó". Como Pelé, em 1969, no Maraca, após o seu milésimo gol. Comemorar na rede é coisa que se tornou rara, a malha esticada não favorece. Hoje, os gols são festejados com "dancinhas" ou corridas em direção à câmera instalada no corner, para a alegria do patrocinador do uniforme.


Piqué: rede de lembrança
Naquele jogo, Pelé ficou com a bola, mas esqueceu a rede. Piqué, do Barcelona, não. Ao vencer a Liga dos Campeões, em 2009, arrumou uma tesoura, cortou a rede inteira do Estádio Olímpico de Roma e levou de lembrança pra casa.

Até o fim dos anos 1980, o Maracanã manteve-se fiel à tradição da "Véu de Noiva" até que, após uma reforma, a Suderj instalou uma rede retangular. Durou pouco. Houve reclamações e o modelo original foi recolocado. Pouco depois, foram montados pequenos suportes, semelhantes aos da Copa de 1970, e assim ficaram as traves até o fechamento do estádio para obras, em 2010.

Maracanã, Copa 2014.
Reprodução/Divulgação Fifa
Para a Copa de 2014, a Fifa "recomendou" uma mudança mais radical no Maracanã: a rede antes em diagonal foi esticada com uma corda presa a um mastro atrás do gol. E, em breve, deve receber definitivamente os sensores do árbitro de vídeo (o VAR, de Video Assistant Referee) que a Fifa testou na recente Copa das Confederações e que deve ser confirmado para a Copa de 2018, na Rússia.

E assim a "noiva" perdeu de vez o "véu", confiscado pelo
padrão Fifa agora recomendado para as competições que a entidade promove.

Como a regra não chega à minúcia de estabelecer um rígido figurino, nada impediu que o Flamengo restaurasse o "Véu de Noiva". Sem falar que a experiência de ver um jogo na "Ilha do Urubu" também trouxe de volta um prazer há muito negado ao torcedor: a extrema proximidade com o campo, coisa que era comum por aqui quando clubes como Olaria, Madureira, São Cristóvão e Bonsucesso mandavam jogos contra Vasco, Botafogo, Flamengo e Fluminense nos seus acanhados mas envolventes estádios de bairro. A "Ilha do Urubu" é quase isso. Para o torcedor do Flamengo que fica nas arquibancadas da linha de fundo, Guerrero estufa o "Véu de Noiva" na fila do gargarejo.    

Um comentário:

Helton disse...

Os jogadores do Corinthians retiraram as redes como trofeus depois de um titulo não me lembo qual