segunda-feira, 14 de março de 2022

Vamos voltar aos tempos do gasogênio? • Por Roberto Muggiati

Carro movido a gasogênio. Fot reproduzida ddo livro
 Der Käfer II, de Hans-Rüdiger Etzold

Bem-vindas à guerra, gerações pós-1945! A Segunda Guerra Mundial começou em 1º de setembro de 1939; em 6 de outubro eu completei dois anos. Apesar da tenra idade, senti na pele – como milhões de brasileiros – os efeitos do conflito global. A começar por meu nome. Como não pôde me batizar de Benito, em homenagem a Mussolini (minha mãe vetou), meu pai me chamou de Roberto, outro nome favorito de Il Duce. As três sílabas correspondiam às primeiras sílabas das capitais do Eixo:
ROma, BERlim, quio. O Eixo era a Itália de Mussolini, a Alemanha de Adolfo Hitler e o Japão do Imperador Hirohito contra o resto do mundo, os Aliados.

Um amigo de infância, descendente de alemães, começou a ser hostilizado pela vizinhança e sumiu para sempre da minha vida. Aos seis anos, em 1943, fugindo de uma epidemia de coqueluche, as crianças desceram de Curitiba para o nível do mar. Eu, minha irmã e um monte de primos ficamos hospedados com as respectivas famílias num hotel na Ilha do Mel, na Baía de Paranaguá. À noite, pesadas cortinas pretas eram cerradas para obedecer ao blecaute. Semprei julguei aquilo um mero ritual sem sentido, até atingir a idade da razão, quando aprendi um pouco mais sobre a guerra. As águas do Atlântico Sul viviam infestadas por submarinos alemães, os temidos U-Boots. Já em dezembro de 1939, o estuário do Rio da Prata foi o palco da primeira grande batalha entre as marinhas inglesa e alemã.

A escassez de gasolina levou o Brasil à adoção do gasogênio, os carros eram equipados de uma espécie de fornalha externa que queimava matérias sólidas ou líquidas para a produção de gás que alimentasse os motores de combustão. Esse “gás de síntese” podia usar como matéria-prima madeira, carvão e combustíveis líquidos também. Lembro que meu tio Rubens Bittencourt, um sujeito elegante casado com tia Lygia, irmã de minha mãe, tinha uma baratinha Ford conversível equipada com gasogênio. Foram muitos passeios e piqueniques pelos arredores de Curitiba, de fazer inveja à patuleia pedestre.

Eu tinha sete anos e sete meses quando a guerra acabou na frente europeia. Na capa interna do meu precioso álbum de fotografias escrevi convicto na minha caligrafia titubeante:


8-5-1.945 a ultima guerra. Dia da Vitória

Santa ingenuidade! Três meses depois, o Japão era vencido ao custo do massacre de duas bombas atômicas, em Hiroxima e Nagasaki. E o mundo entrava direto na Guerra Fria, vivendo durante décadas o pesadelo do apocalipse nuclear. Coreia. Indochina. Bloqueio de Suez. Baía dos Porcos. Os mísseis de Cuba. Vietnã. Os genocídios tribais na África. Afeganistão. Guerra do Golfo. Guerra do Iraque. Terrorismo global. Torres Gêmeas. Devo ter esquecido algumas, muitas, os terrorismos locais, o IRA, o movimento basco, as FARC colombianas. E, mais recentemente, os delírios expansionistas de Putin, a anexação da Crimeia e agora a invasão da Ucrânia.

Retiro o que eu escrevi, Roberto Fernando Muggiati, na ignorância dos meus sete anos. A última guerra será sempre a penúltima...

2 comentários:

J.A.Barros disse...

s Ninguém, hoje, se lembra dos ônibus, taxis e carros particulares movidos à gasogênio, durante a Segunda Guerra Mundial. O brasil foi atingido severamente por essa guerra que envolveu todos os países do mundo. Na baia da Guanabara, o governo proibiu que as avenidas que contornavam a baia, à noite, as luzes dos quartos das janelas se mantivessem apagadas. Na época, era o blackout que mantinham todas orlas das praias às escuras, porque submarinos poderiam furtivamente invadir a baia e bombardear a cidade. Com a guerra, a importação de gasolina caiu fortemente e o transporte, na sua expressão total ameaçava parar. Surgiu então o gasogênio, que no meu entender era uma caldeira amarrada na traseira dos carros, mantida acesa, com lenha ou carvão, produzindo o vapor que iria mover os carros. No Rio de Janeiro, todos os ônibus adotaram o gasogênio e ficávamos parados apreciando aquele monstrengo de veículo, se movimentando e transportando passageiros. Viajei muito naquelas aberrações. Era quente e a fumaça gerada pela caldeira invadia os interior dos ônibus, com seu cheiro de queimado, incomodando até as nossas vistas. Mas, era a guerra. Me lembro da campanha criada para recolher qualquer objeto que compunha ferro ou aço. Nos bairros surgiram os depósitos de panelas, aros de bicicletas, colheres e garfos - o pinico ainda era muito usado naquela época e milhares de pinicos foram parar nos entulhos, contribuindo para o esforço de guerra - enfim tudo aquilo que representava ferro foram jogados fora. E surgiram, as pirâmides. gigantesco montes de entulho eram criados que no fim tomavam o aspecto de Pirâmides. A intenção dessas pirâmides eram que recolhidos os objetos, nelas depositados seriam derretidos nas fornalhas das Metalúrgicas, que criariam novas chapas de aço, que iriam alimentar as fábricas de armas militares. O brasil, seu povo sofreu as agruras da guerra e participou militarmente, com soldados na Itália, lutando contra os exércitos nazistas. E o gasogênio, como contou Roberto Muggiati, foi o grande componente que marcou a presença do brasil nessa guerra, que sacudiu o mundo.





J.A.Barros disse...

... onde se lê; Na época, era o blackout que mantinham... se leia, que mantinha...