sexta-feira, 24 de junho de 2022

O novo fake que a mídia de direita impulsiona

 


Se essa capa não te choca, você está pronto para... ganhar crachá do "gado"


 

"Para além" é o cacete! (*)

 

(*) Provavelmente é uma dublagem tosca, meio Disneyworld, do "far beyond". E onde se lê cópia, segundo o corretor imbecil, leia-se copia 

Estadão: Dalton Trevisan segundo Roberto Muggiati

 


Mídia: PVC rasga dinheiro ao vivo


O comentarista do SporTV, Paulo Vinícius Coelho, o PVC, criticou o Flamengo, ontem, por desperdiçar dinheiro ao pagar rescisão a quatro técnicos em apenas 18 meses. Para ilustrar a crítica ele rasgou uma nota de 20 reais. A cena surpreendeu os colegas de bancada.  Cédulas são classificadas como patrimônio da União e danificá-las é crime previsto no Código Penal. PVC pediu desculpas depois e mostrou a nota "restaurada" com fita adesiva ou cola. Veja o vídeo:

 https://youtube.com/shorts/ba_l4drDmlY?feature=share

quinta-feira, 23 de junho de 2022

Mídia - Vai um sigilo de 100 anos aí? Cala boca institucional agride liberdade de imprensa

Que o governo Bolsonaro tem muito a esconder, é verdade que está às claras.  

Tanto que qualquer mané da administração decreta 100 anos de sigilo por qualquer coisa. 

Virou zona . Um impõe sigilo sobre a agenda. Evita que se tornem públicos encontros suspeitos. Outro não quer que vazem suas viagens de lazer a bordo de jatinhos oficiais. Um terceiro empregou um general de muitas estrelas e alto salário e o demitiu quando soube que uma revista apurava o tamanho da boquinha. O sigilo é tamanho que nem o empregador sabe o que o general fazia no trampo em questão. 

Vendeu um carro em circunstâncias duvidosas? Sigilo nele. Saiu mais cedo da repartição  pra aliviar a dor nas costas em uma casa de massagem? A assessoria jurídica recomenda um sigilozinho de 100 anos. 

Como 2022 é ano de eleição pipocam sigilos pra todo lado.  Se a mulher de um figurão quiser saber da hora em que o marido deixou o local de trabalho terá dificuldade. Até o segurança da portaria é orientado a botar sigilo na informação. Um certo alto funcionário gosta de confraternizar com rapazes na happy hour?  Bota sigilo. Tem de 200 anos? A dona patroa do fulano recebeu um cheque e não sabe que raio de grana pousou na sua conta? Faz aí um sigilo retroativo de 50 anos, rápido.

O fato é que os repórteres que cobrem Brasília estão enfrentando dificuldade extra. E não só em Brasília. O caso do homem assassinado no Rio Grande do Norte por agentes da PRF já está sob sigilo da 100 anos. Há  exemplos de sigilo decretado pelas PMs de varios estados. A Justiça também está mais pródiga em ocultar casos até banais.

A coisa se espalha. Um amigo que voltou pra casa com 10 doses de vodca acima do resto da humanidade decretou ao porteiro do prédio sigilo de 20 anos para a hora e o estado em que adentrou o elevador.  Um esperto planeja instalar um escritório de advocacia para oferecer sigilos para pessoas em geral. 

A lei da transparência virou piada para que tem cargo público. Se precisa esconder é porque boa coisa não é. 


Manchete registrou a temporada de Danuza Leão em Paris, em 1952. Veja a capa de estréia da modelo



Com fotos produzidas do Rio, reportagem da Manchete apresentou Danuza Leão
como modelo internacional após sucesso em Paris. Fotos de Oldar Froes

Danuza Leão morreu ontem, aos 88 anos, no Rio. A ex-modelo, jornalista e escritora sofria de enfisema e estava internada na Clínica São Vicente. Danuza teve uma ligação com a mídia. Antes mesmo de se tornar colunista viveu ao lado de Samuel Weiner toda a luta épica do jornal Última Hora fundado pelo marido e a perseguição que este sofreu. Décadas depois, tornou-se colunista da Folha de São Paulo. Seu currículo inclui experiências com atriz em Terra em Transe, de Glauber Rocha e participação em novela da Globo. 

Em 1952, com menos de seis meses de existência, Manchete registrou os primeira passos de Danuza rumo à fama, aos 19 anos, como mostra o post abaixo que foi publicado neste blog em 14 de dezembro de 2009 resgatando a estreia da modelo na mídia, em grande estilo. Leia o texto qe acompanhava as fotos reproduzidas acima.

4 de outubro de 1952. A revista Manchete, recém-lançada, chegava às bancas com uma modelo brasileira na capa. Sobre a moça deitada na praia, sob céu azul, a chamada "Danuza conquista Paris". Nada menos. Entre os assuntos daquela semana, quando o Rio já experimentava o calor de verão que se anunciava em plena primavera, a revista destacava a morte do cantor Francisco Alves (seria a capa da edição seguinte), a luta pela sucessão (que não aconteceria) entre Getúlio e Adhemar, e uma reportagem do jornalista Hélio Fernandes sobre a agitada vida noturna de Copacabana - eram os tempos do Vogue, Balalaika, Maxim's - mas era Danuza Leão a estrela da edição número 24 da revista que Adolpho Bloch lançava para concorrer com a poderosa O Cruzeiro. A reportagem de Carlos Moreira, com fotos de Oldar Froes começava com a frase "Danuza Leão é um dessas criaturinhas que sempre exigem um adjetivo".

AManchete contou que Danuza estava em uma festa de Jacques Fath, em um castelo em Coberville, a convite dos Diários Associados, quando o famoso costureiro encantou-se pela brasileira e ofereceu-lhe um contrato de 100 mil francos mensais. "E foi assim que a capital da moda ganhou o primeiro manequim brasileiro - Danuza - que, com 19 anos, será provavelmente o mais jovem modelo de modas do mundo", concluiu o repórter.


Por que Maria Lúcia Dahl não contracenou com Marlon Brando no Último Tango? • Por Roberto Muggiati

 

Maria Lúcia Dahl faria o papel de Rosa, a mulher de Marlon Brando

Morando em Paris em 1972, Maria Lúcia Dahl foi convidada para atuar em O Último Tango em Paris. Bernardo Bertolucci foi colega de Gustavo Dahl no Centro Sperimentale de Cinematografia em Roma e ficou amigo dela também. Prometeu-lhe o segundo papel feminino mais importante do filme, o de Rosa, a mulher de Marlon Brando, que se suicida com a navalha do amante num mar de sangue na banheira do hotelzinho mambembe, propriedade de sua mãe. O Último Tango não é só sobre Sexo, é também sobre a Morte. Antes do funeral, Rosa é velada no quarto do hotel, toda de branco cercada de rosas. Uma das cenas mais notáveis do filme é o monólogo de Marlon Brando diante da defunta, uma DR unilateral desesperada em que tenta exorcizar toda a dor da perda.

Quando Maria Lúcia me contou essa história, lembrei a ela que Kevin Costner teve seu primeiro destaque no cinema no papel de um cadáver que reúne um grupo de amigos em The Big Chill/O reencontro. Ela depois contaria em sua coluna do Jornal do Brasil em novembro de 2008 como foi duplamente passada para trás e perdeu o papel. “Respondi [a Bertolucci] que para ficar ao lado de Marlon Brando toparia ser uma morta muito viva, que o espreitaria sutilmente com o rabo do olho.”

Entra em cena a vilã da história, a figurinista do filme, que a princípio Maria Lúcia elogia: “Metka vestia a Maria Schneider com chapéus de aba larga, vestidos compridos e botas, num novo estilo hippie chique.” 

Decepção. “Mas acabaram contratando outra atriz, Veronica Lazar, para fazer a tal morta. Disseram-me que ela fez carreira na Itália e casou com o Adolfo Celi. Eu, hein, Rosa...” 

E a explicação: “De repente, no meio da conversa sobre um passado remoto lembrei-me de uma cena que tinha sepultado no meu inconsciente. Foi exatamente na época do filme que, recém-separada do meu marido exilado, fui deixar, como combinado, minha filha pequena para passar o fim de semana na casa dele. Como ninguém respondesse à campainha, vi que a porta da casa e a do quarto estavam abertas e fui entrando. Encontrei meu ex-marido dormindo nos braços da Metka. Ela abriu um olho e, assim que me viu, fechou-o novamente, como eu havia planejado fazer com a entrada em cena do Marlon Brando – e fingiu-se de morta. Reprimi tanto esse fato que a ficha deve ter ficado entalada em algum lugar do meu coração ou do cérebro, até concluir que ela, a revolucionária do figurino, deve ter feito a cabeça do Bertolucci contra mim.” 

Fotomemória de O Cruzeiro - Veja o time de diagramadores e auxiliares da revista dos Diários Associados nos anos 1950. Três deles, inclusive J.A.Barros, foram depois contratados pela Manchete

J.A.Barros à frente da equipe de diagramação do Cruzeiro. A foto foi feita na redação
 da revista na Rua do Livramento, no Rio de Janeiro. Arquivo Pessoal

por José Esmeraldo Gonçalves
A foto está reticulada mas vale muito como memória. Aí estão profissionais da diagramação de O Cruzeiro nos áureos tempos da revista nos anos 1950. No centro da imagem  - onde a maioria está engravatada - aparece J.A.Barros. À esquerda, sentado na mesa, Pedro Guimarães, o Pedrão; Nelson Gonçalves, em pé, ao lado de Barros. Os três foram depois contratados pela Manchete e assim tiveram a oportunidade de trabalhar nas duas maiores revistas ilustradas do Brasil. Nesse segmento O Cruzeiro não só fez história como foi a líder absoluta durante décadas. Só na virada dos anos 1960, reformada e modernizada pelo diretor Justino Martins, a Manchete se impõs e gradativamente passou a dominar o mercado. Em meados da década tornou-se a revista de maior circulação do país. 

Barros, com quem trabalhei nas revistas Fatos & Fotos, Fatos e Manchete aponta diferenças nos métodos de diagramação entre O Cruzeiro e a publicação da Bloch.

 "Na Manchete, projetávamos as fotos coloridas nos layouts e esboçavamos a lápis cada imagem, para marcar o corte. Nas fotos em preto e branco usávamos ampliações onde assinalávamos os cortes. Em O Cruzeiro marcávamos no layout apenas o espaço das fotos e mandávamos para o laboratório. Lá as fotos escolhidas eram ampliadas ou reduzidas de acordo com esse espaço pré-determinado e, em seguida, eram copiadas em papel. Nós colávamos as fotos no layout. As fotos coloridas eram colocadas sobre a mesa de luz e tinham os cortes de diagramação marcados com fita vermelha. Também eram copiadfas em papel. Assim, todas as páginas eram completamente montadas e podíamos avaliar o impacto visual da edição final, com texto, títulos, legendas e fotos. Era muito trabalhoso, caro e improdutivo. E levava mais tempo. Ganhei muito dinheiro em hora extra em função desse sistema (O Cruzeiro pagava em dobro as viradas de noite)".  

Frase do Dia: o visor, o sensor, o horror

"A guerra é como uma atriz, cada vez mais perigosa e cada vez menos fotogênica."

Robert Capa (1913-1954)

segunda-feira, 20 de junho de 2022

Calça arriada

 

Reprodução Twitter

por O.V.Pochê

As eleições nem chegaram ainda e o bolsonarista já está levando calça arriada em público. Ontem, no SBT, as calças de Silvio Santos caíram. Quem quer cueca?

domingo, 19 de junho de 2022

Mídia - o bolsonarismo envergonhado

 Os principais veículos jornalísticos do mundo classificam Bolsonaro como de ultra direita, o que ele é.  A mídia conservadora brasileira, não.  Provavelmente porque o rótulo pode respingar nos seus editoriais radicais e no currículo. Como apoiaram todos os golpes que o Brasil sofreu ao longo da história e como referendaram e fizeram campanha para Bolsonaro em 2018, são passageiros do mesmo barco. A penúltima cartada da mídia no campo da direita será sustentar  Simone Tebet.  A última - se a madame  de raízes bolsonaristas nas últimas eleições não decolar e a disputa final for entre Lula e Bolsonaro - será pedir crachá para participar das motociatas e repetir o apoio ao Bozo e ao seu debochado Tchutchuca da economia.  Não duvidem.

Mídia - Paulo Guedes é um vírus sem vacina

Não existe imunizante contra a incompetência, os interesses e as cepas de Paulo Guedes no desastre econômico que ele injetou no Brasil. 

Só pé na bunda nas próximas eleições. 

O Globo de hoje publica matéria com dados da FGV, IBGE, Portal da Transparência e do próprio Governo Federal que demonstram que o Brasil regrediu até 30 anos em meio ambiente, bem-estar, educação, inflação e produção industrial. Fome e pobreza extrema estão de volta. 

A desculpa da pandemia não cola porque os índices já eram ruins antes da chegada do vírus e outros países evitaram os efeitos mais catastróficos. 

Agora ele se pendura na guerra da Ucrânia, já foi a estiagem, o excesso de chuvas, as marolas políticas, o STF, o TSE, a empregada doméstica que ia para a Disney, o filho do porteiro abusado que entrou pra faculdade. Ele só não reclama da gastança dos militares e do Centrão.

Curiosamente, mas não tanto, a mídia poupa o Guedes. A crítica ao seu desempenho medíocre jamais é relacionada à sua mediocridade. Colunas e matérias inteiras são escritas sem que o nome do sujeito seja citado. É como se o desastre da economia fosse coisa dos deuses.

sábado, 18 de junho de 2022

Caiu Joe Biden

 


Reprodução Twitter. Veja o vídeo.

https://twitter.com/eixopolitico/status/1538175723885711361?t=B0SkWt-hWNCYfCbiBgCynQ&s=19

Transamazônica: o marco zero da destruição da Amazônia

 

Foto Gil Pinheiro

Gil Pinheiro e Joel Silveira na Transamazônica em 1972

por José Esmeraldo Gonçalves

Há 50 anos, o repórter e escritor Joel Silveira e o fotógrafo Gil Pinheiro fizeram uma grande reportagem sobre a Transamazônica. A estrada em construção rasgava a floresta até então intocada. À medida em que as obras avançavam, a ditadura instalava "agrovilas ao longo do percurso. O projeto acelerava a migração de famílias do sul do país e do nordeste. As primeiras vítimas das "agrovilas" eram os indígenas, as árvores e os animais dizimados pela caça. Na sequência vieram os garimpeiros. A Transamazônica era o vetor da destruição. 

A reportagem da Manchete publicada em 1972 nada tinha de crítica ou de isenta. Era um desfile colorido de ufanismo, como o Brasil da época do regime militar. 

Não por acaso, a política deu voltas e voltou ao mesmo ponto. O Brasil vive hoje um regime virtualmente militar tantos são os milicos comandando o país em postos-chave. O governo Bolsonaro  retomou e deu ainda mais força à destruição da floresta agora ocupada também por organizações criminosas. 

O que indígenas, indigenistas e ecologistas conquistaram em governos menos predatórios e ignorantes - avanços significativos embora menores do que a imensidão do problema ambiental - se perde na política corrupta do favorecimento da era bolsonarista.  De militares a militares a estupidez fechou um círculo que custou centenas talvez milhares de vidas anônimas. Dom Phillips e Bruno Pereira, imolados, são o mais recente e infelizmente não o símbolo final da Amazônia que o Brasil destrói. 


sexta-feira, 17 de junho de 2022

Maria Lúcia Dahl: da sombra do Arco do Triunfo às madrugadas do Baixo-São João Baptista • Por Roberto Muggiati

Aos 20 anos, então Maria Lúcia Pinto, no palacete do embaixador Paulo Carneiro, em Paris.
Fotos: Arquivo Pessoal

Foram cinquenta anos de amizade, entrecortados por nosso Wanderlust em várias paragens mundo afora. Conheci Maria Lúcia Pinto em Paris, 1961, no palacete de Paulo Carneiro, nosso embaixador junto à Unesco, numa transversal de uma das grandes avenidas que irradiavam da Étoile do Arco do Triunfo. Tinha 19 anos e, para mim, era a mulher mais bonita e desejável do mundo. Elegante, sua griffe era Chanel, roupas e perfume.

Eu era um bolsista pobre, mas tive a sorte de encontrar um hotelzinho no local mais charmoso de Paris, na Place Dauphine, na proa da Île de la Cité, onde as águas do Sena se bifurcam debaixo do Pont Neuf. O pai do surrealismo André Breton também morou lá e menciona o City Hôtel em seu romance-chave Nadja.  Eu recebia um dinheirinho de minha família de Curitiba e o reservava para concertos de jazz no Olympia e noitadas excepcionais no Blue Note. Maria Lúcia viajava com os pais, Mário e Regina, e com a irmã Marília. Tentei seduzi-la convidando para shows de jazz. SeLembro de uma noitada com o quinteto dos irmãos Adderley, Julian “Cannonball” e Nat no Olympia, depois do show nos juntamos a amigos que nos esperavam no Harry’s New York Bar: Marília, Joaquim Pedro de Andrade, duas ou três funcionárias da coorte de Paulo Carneiro na Unesco. Uma delas, Neusa Azambuja, tinha um carro. Depois de umas e outras, nos pusemos a tramar uma incursão a Bruxelas para sequestrar a estátua do Manneken Piss – o famoso Manequinho Mijão. Os vapores etílicos acabaram dissipando a brilhante ideia. Quando saímos do Harry’s, a manhã precoce de primavera já raiava, fomos passear no Jardim das Tulherias, Maria Lúcia mais inclinada pelo Joaquim Pedro, eu com Marília, que era noiva do filho do embaixador, Mário Carneiro, grande fotógrafo do Cinema Novo, com quem casaria depois. (Marília Carneiro tornou-se figurinista da TV Globo e uma das melhores do país.)

Corte rápido do Sena para o Tâmisa, às margens do qual eu morava em  1963. Depois de uma noitada num pub à beira-rio, levei um grupo para o meu apartamento no 8 Embankment Gardens. Eu ia passar um mês de férias na Itália e o decorador Rodrigo Argollo, que fazia parte da turma, queria sublocar meu apartamento. Maria Lúcia foi junto, toda de preto. Reparei um furo no seu suéter, a região da omoplata, e enfiei o dedinho nele. Era o detalhe do fim da farra: em breve todos nós, por absoluta falta de dinheiro, voltaríamos para o Brasil, pisando pela primeira vez no Rio da ditadura militar. Casado com a Lina, que conheci em Paris, e era amiga da Maria Lúcia, fomos visita-la e ao marido Gustavo Dahl, cineasta que ela conhecera em Roma, na casa de vila que ela ganhou do pai, o engenheiro e empreiteiro Mário Pinto. Na tarde do réveillon de 66 para 67, Mário morre de mal súbito. A viúva, Regina – outro golpe brutal para Maria Lúcia – suicida-se saltando do seu apartamento no Flamengo. No réveillon seguinte, na famosa festa na casa de Heloisa Buarque de Holanda, duas dezenas de casais se separaram, inclusive a anfitriã e Maria Lúcia, depois de tomar uns sopapos do enciumado Gustavo por ter dançado de rosto colado com um galã egípcio, ou coisa parecida.

Novo corte, para 1972 em Paris. Lina e eu visitamos Maria Lúcia, que está grávida de sua única filha, Joana, com o segundo marido, o líder estudantil exilado Marcos Medeiros.

Com Malu: bom humor no lançamento
do livro Aconteceu na Manchete,
na Travessa do Leblon, em 2008.
Foto: Jussara Razzé
E então um hiato enorme, até o final de 2008, quando – um dos 16 autores do livro Aconteceu na Manchete – estou na noite de autógrafos na Travessa do Leblon. Começo a visita-la na eterna casa de vila coberta por uma mangueira na São João Baptista, 41. Toda noite de sexta-feira, compareço com um vinho tinto chileno e uma pizza gigante (sem duplo sentido). Mal me sento no sofá esfarrapado, o gato Netuno vem sentar-se no meu colo, um grafite, uma gracinha. Vemos um filme (lembro uma noite, com uma grande amiga dela, assistimos àquela obra-prima do Fritz Lang, Metropolis.) Depois ficamos horas jogando conversa fora, fofocando, lembrando os velhos tempos. Saio de madrugada e a quadra final da rua ainda está tomada por um burburinho de mesas e cadeiras que avançam até a metade da pista naquelas loucas baladas eufóricas da década que seria liquidada pela Covid-19 (de 2019). Certa noite, vamos de táxi ao lançamento de um livro de frei Leonardo Boff no Colégio Bennett. Sugiro que, para encurtar o trajeto, a gente pegue a Travessa dos Tamoyos. “Prefiro não”, diz Maria Lúcia, “minha mãe se matou nesta rua.”

Eu a chamo de Maria Lúcia Dahl-ou-desce! – incorrendo naquela piada-chavão machista. Malu também  tem humor, me contou uma história deliciosa. Idosos, com planos de saúde que nos tratam como debilóides (o meu, do Silvestre, fazia testes me obrigando a contar os dedos da mão, ou caminhar em linha reta de uma parede à outra do consultório, só faltava mandar fazer o 4...) – sua amiga Nelita Léclery, cujo primeiro casamento aos vinte anos foi com Vinícius de Moraes, foi sabatinada por um paramédico que, a certa altura, lhe perguntou, no item quesitos gerais para avaliar demência precoce: “A senhora sabe quem foi Vinícius de Moraes?” Responde Nelita: “Claro. Foi meu marido.” Só não a internaram porque era casada com o milionário francês Gérard Léclery. 

Siga em paz Maria Lúcia, daqui a pouco – quem sabe? – a gente se reencontra por aí...

Maria Lúcia Dahl (1941-2022): uma vida em cena

Foto; Divulgação
por Ed Sá 
Uma das mais belas atrizes brasileiras, Maria Lúcia Dahl morreu ontem, no Rio de Janeiro, aos 80 anos. Desde 2020 ela vivia no Retiro dos Artistas. A atriz sofria do Mal de Alzheimer e estava hospitalizada em função de complicações nos rins. 

A partir dos anos 1970, Maria Lúcia brilhou em novelas da Rede Globo. Participou de “Torre de Babel”, “Anos Rebeldes”, “Anos Dourados” e “Dancin’ Days”, "O Espigão", "Gabriela" e "Espelho Mágico" (1977). Em 2011 atuou em “Aquele Beijo”, sua última novela. 

Carioca, de família tradicional, Maria Lúcia se casou, em Roma, com  o cineasta Gustavo Dahl. Sua estreia no cinema aconteceu em "Bahia de Todos os Santos", de José Hipólito, em 1960. Vieram "Menino do Engenho", de Walter Lima Jr, "A Grande Cidade", de Cacá Diegues, "Pobre Príncipe Encantado", de Daniel Filho,  O Bravo Guerreiro" de Gustavo Dahl, "Cara a Cara", de Júlio Bressane e  "Macunaíma", de Joaquim Pedro de Andrade.

O segundo casamento de Maria Lúcia foi com o líder  estudantil Marcos Medeiros, o que a levou a se engajar na luta contra a ditadura e, em seguida, ao exílio em Paris.  De volta ao Brasil, tornou-se um dos simbolos sexuais na era da porchanchada. Dessa época são os filmes "O Gosto do Pecado" e "Mulher Objeto", mas ele não se limitou ao gênero e atuou em "Um Homem Célebre", de Miguel Faria Jr., "Guerra Conjugal", de Joaquim Pedro de Andrade, "Eu Matei Lúcio Flávio". Nos anos 1990 atuou em "Veja Esta Canção", de Cacá Diegues, "Quem Matou Pixote?", de José Joffily, e "O Gerente", de veterano Paulo César Saraceni, foi colunista do Jornal do Brasil e escreveu cinco livros, entre os quais "O Quebra Cabeças" e "A Bailarina Agradece". 

Maria Lúcia deixa uma filha, a atriz Joana Medeiros.