quarta-feira, 26 de outubro de 2022

De Leneide Duarte-Plon, de Paris, para o portal Fórum 21 - Diante do fascismo, a democracia brasileira é um hímen complacente


A  frágil democracia brasileira vem funcionando ultimamente como um hímen complacente, expressão que meu amigo Otto Lara Resende usava para significar excesso de condescendência em certas situações.

 Vemos tudo ser aceito e digerido por uma sociedade resignada, os limites ao exercício do poder são constantemente ultrapassados – quando quem governa é a direita – sem que haja quase nenhuma resistência por parte da sociedade ou da Justiça, cuja função numa democracia é garantir o bom funcionamento das instituições democráticas.

 Penso na complacência da sociedade diante do sigilo de 100 anos, do orçamento secreto, dos constantes cortes de verbas da saúde e da educação, do escândalo da tentativa de compra de vacinas superfaturadas, do viagra e das próteses penianas para os velhos militares… além de toda a série de horrores que a imprensa e as instituições foram normalizando nos últimos quatro anos.

  O Brasil avança para um pós-fascismo, misto de fundamentalismo neopentecostal e do projeto de poder totalitário e antidemocrático do bolsonarismo.

 Se os brasileiros não disserem claramente, dia 30 de outubro, que desejam outro modelo de país, o Brasil pode tornar-se uma teocracia fundamentalista que vem se construindo no ódio ao pensamento racional, à cultura, ao debate de ideias, às artes em geral. Com a caução dos militares que já dirigem o país desde 2018.

 O Brasil não vive o fascismo mussoliniano que a Itália conheceu de 1922 a 1943. Mussolini, o Duce, instalou um governo ditatorial em 1922 até ser demitido do cargo de primeiro-ministro pelo rei Vítor Emanuel II, em 25 de julho de 1943. O ditador foi preso, para ser libertado pelos alemães e « reinar » sobre uma « República Social Italiana » fantoche, em Salo, norte da Itália, ocupado pela Alemanha até 1945. Benito Mussolini foi morto por guerrilheiros resistentes.

 O fascismo mussoliniano não é um modelo copiado ao pé da letra no Brasil, mas vai sendo reinventado e adaptado ao século XXI ao Sul do Equador. Na conferência de Umberto Eco, “Reconnaître le fascisme” (Grasset, 2017) o grande semiólogo, filósofo e linguista escreve: “Pode-se jogar o fascismo de mil formas, sem que jamais o nome do jogo seja outro”. Em todas as formas de fascismo, diz Eco, a cultura é suspeita porque é identificada ao pensamento crítico.

 “No fascismo italiano o poder legislativo tornou-se uma ficção, o executivo controlava diretamente o poder judiciário e a mídia, promulgando diretamente novas leis (entre as quais as que faziam a defesa da raça com o apoio formal do Holocausto) “, escreve Umberto Eco.

 O domínio do Executivo sobre os outros poderes vem sendo tentado no Brasil desde 2018 e poderia se exacerbar num novo mandato.

 

 Bandeiras 

 Quando, em 2008, cheguei à casa do general Paul Aussaresses, na Alsácia, para entrevistá-lo para a Folha de S.Paulo – entrevista que se desdobrou em diversos encontros que viraram um livro (A tortura como arma de guerra - da Argélia ao Brasil) – vi em destaque na sua sala uma enorme bandeira francesa pregada na parede.

 Paul Aussaresses era coronel durante a guerra da Argélia e foi o temido chefe dos esquadrões da morte. Os militares franceses matavam e faziam desaparecer os corpos de resistentes e independentistas argelinos. Foram milhares de desaparecidos naquela guerra, na qual os franceses aperfeiçoaram diversas formas de enfrentar a Frente de Libertação Nacional, entre as quais o controle das populações civis e os interrogatórios sob tortura. A “escola francesa” foi, como mostro no livro, um modelo para a ditadura brasileira.

Aussaresses nunca deixou de ser anticomunista, racista e adorador de sua bandeira, ranço de todo fascista. Os neofascistas do partido Front National – que completou este mês cinquenta anos e foi fundado por Jean-Marie Le Pen, ex-torturador da Guerra da Argélia –– desfilam com bandeiras e as exibem em todos os comícios. O símbolo do partido na época da fundação era uma chama (inspirada na chama do partido fascista italiano) com as cores da bandeira francesa: azul, branco e vermelho. Aos poucos, o Rassemblement National, novo nome do partido de Le Pen, foi abandonando imagens associadas ao fascismo para tornar Marine Le Pen mais palatável ao eleitorado.

Em aliança com a Liga e com o Forza Italia, partidos de Matteo Salvini e de Berlusconi, o partido pós-fascista Fratelli d’Italia, obteve maioria nas eleições italianas de 25 de setembro levando Georgia Meloni ao poder. Esta denominação de pós-fascista é a que está sendo mais usada pelos jornais franceses e italianos para designar os novos seguidores de Mussolini, que Meloni elogiou alguns anos atrás. Os vídeos estão aí para mostrar sua admiração pelo Duce.

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