segunda-feira, 17 de outubro de 2022

Mídia - O colapso do modelo transforma debates presidenciais em plataformas de fake news


por José Esmeraldo Gonçalves

Pode fechar a conta e passar a régua: o formato dos debates presidenciais está ultrapassado, morto e cremado. 

Em 2020, segundo o Reuters Digital News Report, as redes sociais m a superaram a TV, pela primeira vez, como fonte de informação para 67% dos brasileiros, enquanto 66% tinham a TV como fonte principal. O poder da TV não sumiu, claro, continua alcançando grndes audiências, assim como o rádio. Apenas perdeu a hegemonia, para o bem e para o mal. 

No caso das campanhas presidenciais, os debates se tornaram uma espécie de rascunhos das redes sociais. Praticamente repercutem as polêmicas compartilhadas por milhões a cada hora no Twitter, You Tube, Instagram, Telegram, Whatsapp, Facebook, sites, blogs, portais e podcasts. Se o conteúdo dos debates passa a imitar as tempestades da web, a TV sai perdendo e, principalmente, abre mão da chance de informar aos eleitores sobre ideias e planos dos candidatos. 

Em qualquer boteco, ouvimos discussões semelhantes aquelas que os debates exibem. Faltam só o chope e as brigas, sendo que embates agressivos e ameaças de porradaria já ocorreram nos bastidores em recentes debates. 

Sabe-se que estrategistas da extrema direitas ligados a Donald Trump recomendaram durante a sua campanha vitoriosa, em 2016, que mentiras e fake news fossem utulizadas à exaustão sob o argumento de que a mentira é um coelho, o desmentido é uma tartaruga. Por isso, espalhar fake news é um crime que compensa largamente. 

E essa é a razão principal da inadequação dos atuais debates. Até aqui, todos os debates foram usados como plataformas de lançamentos de fake news. Os próximos também o serão. Dentro da sua estratégia, Bolsonaro mentiu em praticamente todas as intervenções. O candidato à reeleição nega o que diz em vídeos autênticos, muitos gravados por ele mesmo; diz que não assinou documentos oficiais que estampam sua assinatura; jura que o chamado orçamento secreto não foi sua invenção, quando o projeto saiu do seu gabinete e atravessou a praça rumo à Câmara dos Deputados; nega os múltiplos casos de corrupção emseu governo;  garante que não imitou, como se fosse um sádico, a morte de paciente sufocados por falta de oxigênio; e quer que o Brasil admita que ele não boicotou vacinas e não atrasou compras de imunizantes. Esses são apenas alguns exemplos do modo Bolsonaro de debater segundo a cartilha de Steve Bannon, o Joseph Goebbels de Trump. Sim, Bannon e Bolsonaro não estão inovando: a große Lüge, grande mentira, expressão criada pelo próprio Hitler, foi o pilar-mestre da propaganda do nazismo.

Os debates, no atual e exaurido modelo, não têm armas contra a mentira. 

Ou melhor, a arma existe, mas não é utilizada. 

As agências de checagem surgiram no mundo e no Brasil para tirar o jornalismo do atoleiro das fake news. Em geral, fazem um bom trabalho, no Brasil inclusive. Por ignorar essa ferramente, os debates atuais viraram um poderoso instrumentos de propagação de fake news. Bolsonaro mente e sai impune. Mesmo candidatos que não adotam a "grande mentira" podem errar dados importantes que também não são corrigidos. 

Para evitar isso, a estrutura dos debates deveria incluir uma bancada de checadores para ação imediata. Corrigir fake news 24 horas e se comportar como uma tartaruga muito mais lenta do que La Fontaine imaginou. E a 5G está aí mesmo para dar velocidade às buscas. 

A Ciência de Dados avançou muito. Não se trata de uma prosaica busca no Google, envolve computação, inteligência artificial, matemática aplicada, busca de padrões, análise, habilidade para acessar todas as portas dos bancos de dados públicos e autononia de voo para visitar as mais complexas nuvens. O mediador poderia dar a palavra à bancada de checadores logo após a fala mentirosa do candidado. Possíveis diálogos como esses que se seguem seriam muito esclarecedores.  

- Candidato, o senhor mentiu. Temos o decreto, temos o vídeo, aqui está sua live. 

- Candidato, nesse dia citado o senhor estava em Brasília, não  no Guarujá. 

- Os extratos bancários reunidos pelo do MPF, veja no telão, mostram o oposto, candidato. 

- Por favor, candidato, veja no telão, no vídeo periciado pela PF, o  senhor aparece ao lado do acusado, ao contrário do que disse.  

    Os espectadores-eleitores agradeceriam se os debates e debatedores deixassem de tratá-los como otários. 

3 comentários:

Norões disse...

Irresponsabilidade dos organizadores torna debates um risco à democracia. Mentiras devem ser desmascaradas na hora

Anônimo disse...

Além da grosse Lüge, Goebbels gostava de sacar a grosse Luger, adepto também, como o nosso ZZ, do conceito da "Pátria Armada"...

Ebert disse...

Debate é de ideias e projeto de governo. A regra deveria ser se o candidato não responde a pergunta sobre seus planos perde vez, desliga o microfone. E jornalistas devem fazer mais perguntas para evitar jogo combinado. Do jeito que está concordo que incentiva fake news mentiras e calúnia.