domingo, 1 de maio de 2022

Dois toques entre lendas do futebol

 

Reprodução Manchete Esportiva

O reencontro na inauguração da estátua de Roberto Dinamite
em São Januário.Foto de Daniel Ramalho/Vasco


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Roberto eternizado na Colina. Foto de Daniel Ramalho/Vasco

Na ultima quinta-feira, o Vasco inaugurou em São Jamuário uma estátua de Roberto Dinamite. Zico foi lá prestigiar a homenagem. Os dois jogadores protagonizaram duelos lendários entre Vasco e Flamengo. O Maracanã e as gerações que tiveram o privilégio de vê-los jogar serão eternamente gratas ao talento dessa dupla. Guerreiros em campos opostos, juntos na história do futebol brasileiro e mundial.

Fotografia - A imagem que resume uma guerra

Foto de Thomas Billhardt

O autor da foto, hoje. 

Em um dia como ontem, há 47 anos, o fotógrafo alemão Thomar Billhardt fez essa foto: um piloto americano capturado por uma guerrilheira vietnamita. Uma das imagens mais representativas do fim da guerra da poderosa máquina de guerra dos Estados Unidos contra a guerrilha vietnamita e as tropas do Vietnã do Norte. O dia 30 de abril de 1975 marcou a queda de Saigon, Houve outras imagens marcantes naquele dia. E o próprio Billhardt fotografou ao longo da guerra cenas extremamente dramáticas. A debandada dos americanos produziu cenas dramáticas como a correria para telhados onde helicópteros tentavam resgatar os retirantes. Ao largo do Vietnã tripulações de porta-aviões jogavam aeronaves ao mar para abrir espaço para a leva de helicópteros que deembarcava tropas e políticos do Vietnã do Sul que haviam colaborando com a invasão americana. A foto de Billhardt não retrata máquinas. Apenas a fragilidade da vietnamita resguardada pelo seu fuzil, baioneta calada, e o militar rendido. É leitura da guerra escrita por uma foto: o povo contra um império. 

Veja mais fotos de Thomas Billhardt AQUI 

De Ruy Castro para a Folha: cinearqueologia

 

Reprodução Folha de São Paulo - 1-04-2022.Clique na imagem para ampliar

O passado chegou...

 

Reprodução Twitter

Deu no G1 - Assessora bota "mordaça" no presidente do INSS e não deixa que ele responda pergunta da jornalista Monica Carvalho, da Rede Globo

Reprodução G1 (link abaixo)

O novo presidente do INSS -  Guilherme Serrano - dava entrevista à jornalista Monica Carvalho, via vídeo, e tudo ia bem até a repórter perguntar sobre análise de pedidos de benefícios em atraso em função da queda do número de servidores na instituição. Foi quando irrompeu na tela imagem da assessora de imprensa interrompendo de maneira intempestiva a fala do titular do INSS. Até então não havia indícios de que o entrevistado estava sob monitoramento. Serrano já pode enviar à ONU um pedido por  liberdade de expressão.

 Veja a matéria no G1. Clique em 

https://g1.globo.com/df/distrito-federal/noticia/2022/05/01/assessora-interrompe-entrevista-e-nao-deixa-novo-presidente-do-inss-responder-a-pergunta-sobre-reducao-do-quadro-de-servidores-video.ghtml

Folhetim de redação

por J.A. Barros 

Estamos acompanhando neste blog a extraordinária autobiografia de Roberto Muggiati, o mais duradouro editor da revista Manchete. Na verdade, é a  história de um paranaense que nasceu jornalista e que hoje, embora ainda atuante como tradutor e colaborador de alguns veículos, poderia estar gozando sua aposentadoria em Nice, na França. O conjunto de textos já publicados aqui mostra a trajetória de um verdadeiro profissional. Tão criterioso que, como tradutor de livros em inglês, montou uma ampla biblioteca de obras de consultas. Imagina, sei que na sua estante há até um livro, ilustrado, com nomes de tipos de selas de montaria. Como conhecedor da história do jazz, do rock e do fenômeno dos Beatles, Muggiati é autor de livros sobre esses assuntos.

Por trabalhar com Roberto Muggiasti durante alguns anos, descobri que a sua cultura não tem fim. Conhecedor da língua portuguesa, ele também domina os idiomas inglês, francês e italiano. 

O jornalista trablahou em Londres, na histórica Albion - como jornalista, claro - e em Paris. Nesta, já contou que visitou o "Père-Lachaise" onde viu de perto os túmulos de grandes figuras do passado como Oscar Wilde, Edith Piaff, além do mausoléu de Napoleão, (este no Panteão), e tantos outros famosos. A sua febre de saber, conhecer  e entender não cessou e até hoje, isso desde as vilas da São Clemente aos ares da Glicério. Sua velha Olliveti, há muito trocada por um computador, é testemunha do seu conhecimento da natureza humana. Roberto Muggiati, um homem, uma história de vida, de cultura, de conhecimento, de saber, talvez o único conhecedor na história do cinema norte-americano da existência de Sidney Guilaroff. Ele, grande cinéfilo saberá que me refiro a uma saborosa história já contada neste blog.  

Brasil: "análogo" a país

Os crimes de racismo estão em alta no Brasil. No futebol, por exemplo, houve uma explosão de casos nos últimos três anos. Racismo é crime inafiançável. Mas, na prática, isso é de mentirinha. O cidadão é vítima de racismo e resolve fazer um B.O. Sai de lá geralmente com um papel que fala em "injúria racial", Essa foi a brecha que os legisladores brasileiros bolaram para... não punir o racismo. 

Segundo a lei quase em efeito, o crime de racismo é configurado quando a ofensa é contra um grupo ou coletividade. Injúria é quando o agressor usa palavras depreciativas referentes a raça e cor. Ora, é imensa a zona de sombra nessas tipificações. A autoridade policial em quase 100% dos casos opta por "injúria". O racista paga uma fiança e sai pra outra. Quando condenado, se o for e se o processo andar, pega moleza de "prestãção de serviços" que ninguém fiscaliza. 

Um torcedor argentino imitou um macaco durante o jogo Corinthians x Boca Juniors, na Itaquerão, na última terça-feira. Torcedores filmaram a cena e chamaram a polícia. O "hermano" racista foi preso. Levado à delegacia, foi logo solto após pagar fiança. Nem ele desembolsou a grana, o consulado argentino providenciou a "plata". O torcedor virou heroi entre os "barra brava". A vítima de racismo acaba sofrendo humilhação tripla: no ato da agressão, ao se encaminhar à delegacia e ver que sua denúncia vira vento e, depois, se o caso for à justiça, quando o racisma recebe "penas" para divertidas como passar no mercado e levar um cesta básica para uma instituição qualquer. Fica barato.

Leis como essa, no Brasil, perdem a capacidade de punir. Aparentemente, não são levadas a sério. Em Brasília, um rapaz foi vítima de racismo, ontem, nas redes sociais. Denunciou, as agressoras foram identificadas e mídia já noticiou o caso como "injúria" antes mesmo da autoridade policial classificar o crime. A mídia, sei lá porque, costuma adotar eufemismos que mininizam crimes. Quer um exemplo? Casos de trabalho escravo também explodem no Brasil. Não para a mídia nepliberal, onde são chamados de "trabalho análogo à escravidão". Devem achar que se não tiver corrente nos pés e flagrante no tronco não é escravidão. Em outros casos, o de menores assassinos, a mídia copia e cola a expressão que a lei determina. Se um menor bandido comete um homicídio durante um assalto, não é homicídio, é "ato infracional análogo ao homicídio". O assassinado, coitado, jaz estendido no chão sem saber que foi morto, apenas estão em estado análogo à morte. 

O empresários sonegou? Não, diz o advogado, ele praticou "elisão fiscal". O deputado ofendeu a deputada? Nada disso, a suposta ofensa foi "tirada do contexto".  

O Bassil não precisa de George Orwell: já tem o eufemismo como novilíngua.    

Frase do Dia: remate

 “Não devemos servir de exemplo a ninguém. Mas podemos servir de lição.”

MÁRIO DE ANDRADE

sábado, 30 de abril de 2022

Na capa da IstoÉ: a conspiração

 

Bolsonaro usa as Forças Armadas como se fossem o seu partido político. Um "centrão" fardado e privê. A IstoÉ é otimista. Acredita que os ataques à Constituição ainda estão "no limite". Bolsonaro e suas  facões já ultrapassaram esses parâmetros várias vezes. Até riem e fazem piadas sobre a desenvoltura com que sapateiam sobre leis e instituições. Para a democracia brasileira esse assédio autoritário não é piada. Surpreende que parte da população, segundo pesquisas, junto com setores da mídia dominante,  do mercado, do agronegócio etc, aleguem "falta de opção" e se disponham a reeleger o sociopata. Pensando bem, não é  surpresa. Essas forças estiveram na raiz da ditadura, reagruparam-se no golpe contra Dilma Rousseff, manobraram (como atesta a ONU) para impedir a canditaduta de Lula em 2018. Fazem ordem unida agora para atacar o STF e o TSE. Em suma rasgam a Constituição.

Frase do Dia: sem suspense

 "A televisão é como as torradeiras: aperta-se o botão e sai sempre a mesma coisa.”

ALFRED HITCHCOCK


sexta-feira, 29 de abril de 2022

O melhor menu do mundo na Manchete • Por Roberto Muggiati

 “Somos um restaurante que por acaso também imprime revistas.”

   ADOLPHO BLOCH DEFININDO SUA EDITORA

Chef Severino Dias, do restaurante da Manchete

Às vezes me vem água na boca ao lembrar os almoços no restaurante de Bloch Editores. Particularmente agora, quando se fala muito do prato nacional da Ucrânia, o Frango à Kiev, recordo a primeira espetada de garfo gauche no empanado recheado e o esguicho de creme quente na gravata. A receita (veja no final do texto) vinha da babuschka de Jitomir e fora repassada a Severino Ananias Dias, o “inevolúvel” chef da Bloch (ele criara o adjetivo discursando em louvor de Adolpho). O empresário amava sua cozinha. Era preciso ver, nos momentos de descanso, as panelas de cobre reluzentes compradas em Paris penduradas na cozinha asseada como uma sala de cirurgia. Nos momentos de faina, os vapores e sabores pairavam convidativamente no ar. Meia hora antes do almoço, um núcleo duro de bacanas (editores, redatores, publicitários) se amontoava no balcão de mármore por onde sairiam as travessas de comida, para traçar algumas doses de vodca hipergelada. 

Embora tivesse morado dois anos em Paris e três em Londres (o restaurante da BBC, na temporada de caça, servia aves dignas dos Windsor, como a famosa grouse, um delicioso faisanídeo), vim a conhecer no restaurante do Adolpho sofisticados pratos da culinária internacional. Seu Gulash Húngaro era impecável, o Cassoulet à Francesa também. A pièce de resistance das sextas-feiras alternava numa semana a Feijoada à Brasileira (Sartre e Simone provaram na gráfica de Parada de Lucas) com o portentoso Cozido à Portuguesa na outra. Havia o Arroz de Braga, que provocou em 1969 uma crise com dois redatores de Fatos&Fotos, da qual eu era o editor. “Xiiii, é o Arroz de Praga, porra!”, bradou o Sérgio Augusto para o Paulo Perdigão, ou vice-versa, e deram meia-volta e foram almoçar fora. O Oscar Bloch, de tocaia atrás de uma coluna, assistiu ao acinte e foi aguardar na redação a volta dos culpados, que foram sumariamente demitidos. Acontece que o Perdigão tinha um tio general que era presidente do Supremo Tribunal Militar e foi prontamente readmitido. Sérgio Augusto, sorte dele, foi fazer uma bela carreira no Pasquim. Devo consignar que a implicância da dupla com o Arroz de Braga era mais ideológica do que gastronômica.

Como editor, eu participava também dos jantares de Pessach (Páscoa), rigorosamente alinhados com a tradição judaica, com a sopa de Matso Balls ou Kneidl, em iídiche ( bolinhos de pão ázimo, ovos e gordura), o Gefilde Fische e o Pato Kasher.


Uma noite destas, assistindo a um filme noir francês que adoro, Le Casse/Os ladrões, revi a cena em que o tira Omar Shariff encontra o meliante Jean-Paul Belmondo num restaurante de Atenas comendo um prosaico bife com fritas. Com cara de nojo, manda recolher o prato, senta-se à mesa com Bebel e lhe dá uma aula de culinária grega (fortemente influenciada pelo domínio turco, durante o Império Otomano). A cozinha inteira se mobiliza para agradar o policial, na sua boca-livre literal costumeira e, entre outras coisas, serve uma moussaka (Confiram a cena no anexo).  A Bloch também servia Moussaka, e das mais esmeradas. Senti uma vontade louca de comer moussaka, mas onde, no Rio, àquela hora? Ou melhor, nos tempos de hoje? A minha moussaka blochiana tinha ido se juntar, havia muito, à madeleine proustiana, na névoa do tempo.



FRANGO À KIEV

INGREDIENTES

3/4 de xícara de margarina

1 colher (sopa) de salsinha picada

1 colher (sopa) de cebolinha verde picada

Sal e pimentadoreino a gosto

6 filés médios de frango

1/4 de xícara de farinha de trigo

1 ovo

1 colher (sopa) de água

Cerca de 3/4 de xícara de farinha de rosca

Óleo para fritar

MODO DE PREPARO

1. Misture a manteiga, a salsa, a cebolinha, o sal e pimenta e forme um retângulo; embrulhe-o em papel-manteiga e leve à geladeira.

2. Bata os filés de frango com o batedor de carne até que fiquem com 1/2 cm de espessura.

3. Corte o tablete de manteiga em 6 partes iguais e coloque um no centro de cada filé.

4. Enrole os filés, dobrando também as extremidades para cobrir completamente a manteiga.

5. Prenda com palitos e repita com os filés restantes.

6. Passe-os numa mistura de farinha de trigo e sal a gosto.

7. Bata o ovo com a água num prato fundo e coloque a farinha de rosca sobre uma folha de papel.

8. Passe os filés na mistura de ovo e por último na farinha de rosca.

9. Arrume os filés numa assadeira, numa só camada, cubra-os com uma folha de papel e leve à geladeira por 1 ou 2 horas, para permitir que a farinha de rosca seque na superfície.

10. Numa panela grande, esquente uma boa quantidade de óleo e frite 2 filés de cada vez.

11. Frite-os até que estejam dourados e firmes quando pressionados com um garfo.

12. Não os fure.

13. Retire os palitos e mantenha os rolinhos quentes, enquanto frita os restantes.

 

P.S • Rápido no gatilho, Sérgio Augusto me corrige: “O tio do Perdigão era almirante: alm. Armando Perdigão. A birra com o arroz não era ideológica; afinal sou português. Ele era ruim, daí porque o apelidei de ‘Arroz de Praga’”.

Na capa do Libération: Recado para o Brasil

 


Frase do Dia: paz

 "Creio no riso e nas lágrimas como antídotos contra o ódio e o terror.”

Charles Chaplin


 

quinta-feira, 28 de abril de 2022

Vai um ovo aí, freguês, uma banana, uma manga?

Reprodução Twitter

 

Tem "bolsonarista" no Reino Unido

 

O Mail on the Sun, versão digital no Sun, deu destaque a uma matéria misógina impulsionada por um deputado conservador e apoiador de Boris Jonhson. O sujeito acusou a deputada Angela Rayner, da oposição, que costuma debater com frequência com o primeiro- ministro, de ficar cruzando e descruzando as pernas para distrair Jonhson. O jornal comparou a cena à sequência famosa de Sharon Stone no filme Instinto Selvagem. Nos meios políticos de Londres foi grande a reação contra  a matéria, a atitude do deputado conservador e contra a misoginia do próprio jornal sensacionalista.

Jornalismo de "motociata". Mídia não associa Bolsonaro e Paulo Guedes ao desastre econômico.

Reprodução Twitter

Comentaristas de economia, economistas selecionados pelos canais e o governo que a mídia neoliberal ajudou a eleger dão a impressão de que se reúnem semanalmente antes de uma dessas motociatas para ensaiar o discurso e sincronizar as idéias. Segundo eles, pela ordem, crise política, escassez de chuvas, pandemia e, agora, Ucrânia X Rússia, são responsáveis por tudo o que acontece  no bolso roto dos brasileiros. Colunistas conseguem escrever artigos inteiros sobre o desastre sem citar uma só vez os nomes de Bolsonaro e Paulo Guedes. Omitem sistematicamente que a maioria dos países, inclusive vizinhos, estão se saindo melhor diante dos efeitos internacionais. Isso não e jornalismo, é linha auxiliar do marketng eleitoral da chamada terceira via onde todos os nomes cogitados são ex-bolsonaristas ou deram sua contribuição para para levá-lo ao Planalto. Não por a acaso eles também não ligam Bolsonaro ao caos econômico e poupam o Guedes. Um deles, despeja estatísticas, diz que tem está tudo errado mas não liga o c* com as calças e não dá os nomes de quemevacuou no país.


Frase do Dia: eternos buchas

"Quando os ricos estão em guerra, são os pobres que morrem."

Jean-Paul Sartre

terça-feira, 26 de abril de 2022

Neymar na prateleira?

 

Reprodução Twitter

Meus 35 anos de Manchete: improvisando soluções na ‘melhor da galáxia’ • Por Roberto Muggiati

 

A edição número 1 da Manchete foi para as bancas comn data de 26 de abril de 1952,
há exatos 70 anos..

Primeiro, uma explicação: a “melhor da galáxia” era a revista Manchete, megassuperlativo que ganhou do Presidente Juscelino Kubitschek num almoço-homenagem a Justino Martins em 1975. JK tomou a palavra e, empolgado, viajou, num recado particular ao amigo Adolpho: “És um homem feliz, Bloch. Tens a melhor revista do Brasil. Indisputavelmente da América Latina; tens a melhor revista do mundo – quiçá da galáxia!”, proclamou o Presidente Bossa Nova (nem tanto, a julgar pela oratória...)  

No dia seguinte, aguardávamos na redação os exemplares da Manchete que tinha ido às bancas naquela manhã. Com sua verve típica, Alberto de Carvalho perguntou: “Já chegou a melhor da galáxia?” E assim a revista passou a ser alcunhada, na base da gozação.

Essa história me concerne particularmente. Depois de lançar a Manchete em 1952, Adolpho Bloch penou anos para encontrar um editor digno desse nome. Os cronistas Henrique Pongetti e Otto Lara Resende não sacavam nada de jornalismo. O primeiro editor que deu certo foi Hélio Fernandes. Botou a semanal ilustrada nos eixos e começou a vender revista. Seu único defeito: queria ser independente. Proibiu a entrada dos irmãos Karamabloch na redação. Eram três, então, Arnaldo, Boris e Adolpho. Não só estavam em superioridade numérica, mas também eram os donos. Hélio Fernandes dançou. De repente, como num passe de mágica, Arnaldo e Boris morreram e o caçula Adolpho passou a reinar absoluto em 1959. Apostou no correspondente da Manchete em Paris, o gaúcho Justino Martins, e o chamou para dirigir a revista no Rio. Tarimbado, com cacife de revisteiro, Justino deu conta do recado e a Manchete deslanchou. Aí Freud explica. Por um daqueles estranhos mecanismos do inconsciente, Adolpho não conseguia engolir o sucesso do Justino. Consolidada a hegemonia da Manchete no mercado, tentou tirar da direção da revista o “Índio” (assim menosprezava seu desafeto). Uma primeira tentativa, em 1968, com o chefe de redação Zevi Ghivelder, cria da casa, não vingou. Em 1971, Justino voltou triunfalmente, com um bônus. Uma trama urdida com a estilista e perfumista Madame Grès, ua ex-amante – ela alegou que queria contratar Justino como seu RP em Paris – lhe valeu um adicional de mil dólares mensais, pagos por Adolpho em dinheiro vivo à vista de toda a redação.

É aí que eu entro em cena. Jornalista desde 1954 na Gazeta do Povo de Curitiba, com dois anos de estudos no Centre de Formation des Journalistes de Paris, depois três anos em Londres no Serviço Brasileiro da BBC, voltei ao Rio e comecei como repórter especial na Manchete em 1965. Em 1968-69, fiz parte em São Paulo da equipe inicial da Veja, como editor de Artes e Espetáculos. De volta ao Rio, fui editor da Fatos&Fotos em 1969, depois chefe de redação do EleEla em 1971. Em 1972, Justino me chamou para ser o seu “segundo” na Manchete. Cinéfilo, viajava todo ano para o Festival de Cannes (ganhou até o apelido de “Cidadão Cannes”). Na sua ausência, eu editava a revista. Adolpho sentiu firmeza no meu trabalho e em 1975 e me colocou no lugar do Justino. Cinicamente comunicou ao “Índio” que ele fora promovido e iria editar uma nova revista... de jardinagem. E organizou uma feijoada de quatrocentos talheres em sua homenagem. A partir daí, merecer uma feijoada na Bloch equivaleria a uma forma sutil de defenestração. (Outro código blochiano: quando queria se livrar de um visitante importuno, Adolpho ordenava ao "escravo" mais próximo: “Traga para ele o melhor carro da casa...”)

Entre idas e vindas, na minha participação em 73% da existência da Manchete, acabei me tornando o editor que durou mais tempo no cargo. Justino voltou em 1981 para sua morte de um câncer fulminante dois anos depois, uma morte simbólica coincidindo com o lançamento da Rede Manchete de Televisão, o novo brinquedo que deixaria as revistas da Bloch à deriva. Voltei a ser editor da revista em 1984, doze anos depois fui trocado por uma troika paulistana, que durou pouco mais de um ano. Voltei à chefia em 1997, no Dia das Bruxas, para sair definitivamente em maio de 1999. Bloch Editores já caminhava então inexoravelmente para a falência, em 1º de agosto de 2000.

O trabalho numa revista semanal não era tão frustrante como aquele num jornal diário. Quando chegava às bancas já estava desatualizado e seu destino era embrulhar peixe. Esse dilema aumentou com a TV e com a internet. Já o hebdomadário criava seu próprio tempo. Namorava a notícia, é claro, mas fazia um jornalismo mais interpretativo e aprofundado. A Manchete tinha basicamente dois fechamentos: do “miolo”, às quintas-feiras; e da atualidade, às segundas. Nossa estratégia consistia em colocar no “miolo” matérias frias, culturais, entrevistas com pessoas que não corressem o risco de morrer antes do fechamento da edição na segunda (só faltava exigir atestado médico). Já na sexta adiantávamos a outra metade da revista, a parte traseira, deixando a metade dianteira do caderno para os acontecimentos do fim de semana e até da própria segunda. E havia ainda aquela margem de risco entre o fechamento na redação na segunda e o início da impressão na gráfica na terça. No golpe militar do Chile que assassinou Salvador Allende – em 11 de setembro de 1973 – tivemos de reabrir a revista. Já no assassinato de John Lennon numa noite de segunda-feira em Nova York, em 1980, optamos por não mexer na revista e anexar um caderno especial dedicado ao Beatle.

Mortes trágicas de celebridades sempre exigiram uma cobertura especial. Meu batismo de fogo foi o avião da Varig cheio de famosos que pegou fogo e caiu num campo de cebolas em Paris poucos minutos antes de pousar no aeroporto de Orly. Na véspera do embarque, Justino recebeu a visita da belíssima Regina Rozemburgo Léclery, acompanhada do ator Dominique Ruhle, ambos morreriam no acidente. Na noite de sexta-feira 13 de julho de 1973 aguardávamos as fotos, que vieram em malote especial da Varig, para antecipar o fechamento da edição. O pouso forçado sobre um campo de cebolas não teria causado um arranhão sequer nos passageiros. Eles morreram asfixiados pela fumaça a bordo e, atrelados a seus assentos, tiveram os corpos carbonizados quando o incêndio se alastrou tão forte que consumiu parte do teto. As imagens resultantes eram muito fortes. Justino se deixou levar por seu instinto animal de editor de fotos e publicou tudo. A reação da Varig foi imediata: cortou toda a publicidade nas publicações da Bloch e também o serviço de malotes.

Algo parecido me aconteceu na cobertura da morte dos Mamonas Assassinas quando seu jatinho caiu na Serra da Cantareira, nos arredores de São Paulo, pouco antes da meia-noite de 2 de março de 1996. No dia seguinte, domingo à noite, antecipávamos o fechamento daquela edição. A mata densa, de difícil acesso, prejudicou a cobertura fotográfica. Em compensação, graças a nosso ótimo relacionamento com a divulgadora da EMI-Odeon, Marília Van Boekel Cheola (nobre como seu nome), tínhamos fotos fabulosas do grupo, que adorava posar com roupas coloridas e histriônicas. Pela primeira vez usamos telefotos em cor de jornais paulistas. O que recebíamos na redação eram quatro imagens nas versões ciano, magenta, amarelo e preto, que seriam combinadas na gráfica para compor uma foto em cores. Pelas chapas individuais, não podíamos visualizar a foto final. Os técnicos da gráfica simplesmente fizeram o seu trabalho, com tal esmero que a imagem saiu com uma qualidade rara para uma telefoto. Mostrava os corpos mutilados de alguns dos Mamonas. Os milhares de fãs não nos perdoaram e saímos com a fama de sensacionalistas inescrupulosos.

Vivíamos tempos estranhos em 1976. Em abril, morreu num acidente de automóvel suspeito a estilista Zuzu Angel, opositora tenaz da ditadura (teve um filho torturado e morto). Em agosto, correu um alerta falso da morte de JK num desastre de automóvel. Quinze dias depois, me liga o chefe de reportagem, João Luiz de Albuquerque, com a notícia da morte de JK quando seu carro se chocou com um ônibus na Via Dutra. Agora era para valer. Meia-noite de domingo pego um táxi e corro para a redação. Editor da revista, ocupo minha cadeira diante da mesa em L. A revista já estava com 80% de suas páginas fechadas, o “miolo” impresso. Retiramos todas as matérias que não fossem essenciais e ficamos com uns 40% daquele número para ser dedicado a JK. Recebo uma procissão de colaboradores, redatores e repórteres para refazer a pauta. Adolpho Bloch, Carlos Lacerda, David Nasser e Josué Montello escrevem artigos especiais. Eu só podia sair para ir ao banheiro quando a necessidade estivesse já no limite. Vagamente soube do velório de JK e do seu motorista Geraldo oito andares abaixo, no saguão de entrada do prédio. Vi pelas janelas quando o cortejo partiu para o aeroporto levando JK para ser enterrado em Brasília. Anoiteceu, de vez em quando me traziam um sanduíche com refrigerante para matar a fome. E muito cafezinho para turbinar a adrenalina. Adolpho e Cony voltaram de Brasília com as fotos do funeral, ainda a serem reveladas. A edição, fechada às três da manhã de terça-feira, foi uma maratona de 27 horas, durante as quais só me afastei da redação poucas vezes para ir ao banheiro. A última imagem que guardo do episódio foi a do Cony, de terno azul marinho, dormindo em posição fetal no banco de jacarandá maciço no hall dos elevadores. 

Na célebre foto de Gervásio Baptista na edição que registrou a inauguração de Brasília, em 1960, JK virou canhoto. Não por culpa do fotógrafo, mas do diretor de Arte que preferiu inverter a imagem em nome de uma suposta composição gráfica mais equilibrada.    


O erro foi corrigido 16 anos depois na capa da edição especial sobre a morte de JK.

Além do feito, digno do Livro Guinness, orgulho-me de ter corrigido um erro histórico e colocar na capa JK acenando a cartola com a mão direita na inauguração de Brasília. A foto de Gervásio Baptista publicada na capa da revista em abril de 1960, por uma destas regras idiotas de diagramação, foi invertida e um JK “canhoto” acenou a cartola com a mão esquerda.

Outro agosto, dois anos antes. Estamos saindo para o fim de semana quando Richard Nixon renuncia ao vivo pela TV, no rastro do escândalo de Watergate. Justino, com a bolsa da Air France a tiracolo, já estava mirando na sua piscina na Joatinga. Zevi Ghivelder chega e me diz: “Adolpho deu o OK, vamos fazer uma edição extra sobre o Nixon.” Dito e feito. Eu morava em Copacabana, dias antes cruzara na rua com o Heron Domingues, o icônico Repórter Esso. No Jornal Internacional da TV Globo, Heron pediu o adiamento das férias para noticiar a queda de Nixon. Um emocional. Morreu no dia seguinte de enfarto fulminante. 

Domingo, 1º de maio de 1994, nove da manhã, me refestelo (é le mot juste) num sofá do térreo, a família toda dormindo no andar de cima, para ver o GP de San Marino de Fórmula 1. Quando Ayrton Senna bateu na curva do Tamburello, me dei conta: acabou o domingo para mim, acabou a Fórmula 1, também. Segui para a redação, à tarde a correspondente em Roma Ivy Fernandes confirmava no hospital de Bolonha a morte do piloto. Antecipamos o fechamento naquela noite, a revista chegou às bancas na terça. Acordei cedo para ver o desembarque do corpo em São Paulo às seis da manhã de quarta-feira. Senti a comoção brutal que tomara conta do país. Propus uma edição extra, que fechamos depois do funeral na quinta.

Ainda 1994, manhã de quinta-feira 8 de dezembro. O divulgador de Tom Jobim, Marquinhos – eu o chamava de “Mosquitinho elétrico” – aparece na redação, o maestro teve um probleminha de saúde em Nova York, uma obstrução de artéria que requer “um simples Roto Rooter, ele vai tirar de letra”. Depois do almoço Marquinhos me comunica a morte do Tom. Abrimos imediatamente uma edição extra em homenagem ao compositor do século, Villa-Lobos no clássico, Jobim no popular. Editei comovido aquela homenagem, mas não posso omitir que  o Tom guardou muito tempo uma bronca comigo. Cobrindo a Noite Brasileira em Montreux-86, que se resumiu a uma briga de foice entre João Gilberto e Tom Jobim, cometi um pecadilho. Aderi à torcida pelo João, sozinho com seu banquinho e violão – e voz, é claro – contra a Banda Nova do Jobim, dez figuras, incluindo as dinastias Jobim (Tom, Paulo, Ana Lontra e Beth), Caymmi (Danilo e Simone) e Morelenbaum (Jacques e Paula) e não resisti a adjetivar o grupo de “nepotista”. Às vezes as palavras ferem mais do que agressões físicas. Mas Tom era um doce de pessoa e o tempo apagou qualquer ressentimento.

Outro fechamento histórico foi o de domingo, 4 de setembro de 1977. Como as bancas fechavam por causa do feriado na quarta, tínhamos de antecipar o lançamento da revista para a terça-feira. O assunto do momento era a morte da jovem Cláudia Lessin Rodrigues. O repórter Tarlis Baptista se considerava, com justiça, o dono da matéria. Dois meses antes, voltando de uma reportagem na Barra com o fotógrafo Adir Mera, viu uma aglomeração de bombeiros e policiais nas pedras da Avenida Niemeyer. Era o resgate do corpo de Cláudia, Manchete fez fotos exclusivas da morta, totalmente nua sobre as rochas beijadas pelas ondas. Adolpho, Jaquito e Oscar foram brincar de jornalista na redação. O fechamento se arrastou, naquele domingo quente, Tarlis telefonou dizendo que tinha um furo. Voltou às nove da noite de um encontro numa churrascaria do Meier com o detetive Jamil Warwar, encarregado do caso. Trazia um dossiê completo, incriminando o jovem Michel Frank e o cabeleireiro Georges Kour pela morte de Cláudia e pela tentativa de ocultação do corpo. O pai de Michel, Egon Frank,  era dono dos relógios Mondaine, grande anunciante da Bloch. Entendi a presença do Oscar no fechamento e ele confirmou minhas suspeitas ao ligar do meu telefone, na minha cara: “Meu caro Egon, o detetive nos deu com exclusividade o resultado da investigação. Fique tranquilo, não vamos publicar nada.” O Tarlis só faltou se jogar do oitavo andar. Frustração geral. Na semana seguinte, Valério Meinel da Veja publicou o dossiê Warwar e ganhou o Prêmio Esso de Reportagem daquele ano. Tempos depois, o David Klajmic, da publicidade, se aproximou solerte de mim e disse: “Muggiati, tem aqui um presentinho pra você.” Era um estojo contendo um autêntico Mondaine, recompensa por ter compactuado com a censura do Oscar. Em 2015, quando morreu o David, consignei em ata nesse Panis um dos grandes vexames por que passei como editor da Manchete: “Meu caro David, muito obrigado pelo reloginho Mondaine que, como todo relógio popular se esfacelou em poucos meses. Obrigado, mais do que tudo, pela lição de jornalismo – e de vida.” 

Prosseguindo com o anedotário: em 1982, Myrian Rios, casada com Roberto Carlos, encenou e estrelou O sonho de Alice, baseado na obra de Lewis Carroll. Dei matéria na Manchete e caprichei no título. Jô Soares tinha um quadro em Viva o Gordo com o bordão “Eu vou dar uma de Alice!” Intitulei a matéria A FAVORITA DO REI DÁ UMA DE ALICE. Sai a revista, o telefone toca na redação. Era Myrian Rios de São Paulo (o Salomão Schvartzman me entregou) contestando o título: “Olha aqui, Sr. Roberto Muggiati, sou a esposa legítima do Sr. Roberto Carlos, nenhuma favorita de harém, e não estou dando uma de Alice, e sua mãe ****” e por aí vai...

Mas a pior roubada aconteceu quando uma repórter mau-caráter, para conseguir emplacar uma notinha na seção “Gente”, que se resumia a uma foto e dez linhas, fez a Beatriz Segall trazer para o estúdio do Rio seu genro e filha – que faziam uma peça em São Paulo, enquanto ela começava uma novela no Rio – tudo por conta da Beatriz, prometendo que a foto seria capa da Manchete! Quando saiu a revista, recebi um telefonema, elegante, mas severo, da Beatriz, transmitindo-me sua indignação, bastante compreensível. Tentei explicar o jogo sujo da repórter e que na nossa pauta se tratava de uma matéria para a seção “Gente”, mas não havia como remediar tamanha injustiça. Coincidiu que Beatriz Segal estrelava na novela Vale Tudo, que passou meses girando em torno do enigma “Quem matou Odete Roitman?” Odete Roitman era ela. A mídia vivia à sua caça. Recebia a todos cordialmente, menos aos veículos da Bloch. Quantas capas Manchete e Amiga perderam por causa da desonestidade de uma repórter?

Justino Martins dizia: “Escrever é fácil, ou impossível.” Ele mesmo ilustrava sua máxima tentando escrever no dia do fechamento as 15 linhas da “Conversa com o leitor”, aquele textículo da página 3 em que o editor fazia uma síntese da edição. Pouca gente se dá conta do papel do telefone no trabalho de um editor de revistas. É uma ferramenta tão importante como a máquina de escrever ou a câmara fotográfica. E o editor não pode deixar de atender. Oitenta por cento das chamadas são chatices, pedidos de matéria, papo ocioso, mas uma das ligações pode ser uma informação preciosa de uma fonte confiável. Em meio à paginação das últimas matérias na segunda-feira, à leitura e correção do texto e das legendas dos leiautes a serem liberados para a gráfica, Justino sentava-se à máquina para escrever, datilografava duas ou três palavras e era interrompido por uma ligação. E assim ao longo de todo o fechamento.

Distanciado, como seu “segundo”, sem a trabalheira do chefe de redação, que era o Maurício Gomes Leite, eu ia aprendendo com as vicissitudes do Justino. Quando assumi o seu posto, procurei ser um pouco mais organizado. Tendo cursado até o quarto ano da faculdade de engenharia da Universidade Federal do Paraná – onde fui colega do Jaime Lerner – embora trabalhasse como jornalista desde os dezesseis anos, eu me iludia com a ideia de que talvez não tivesse perdido de todo uma “visão científica” das coisas. Talvez tivesse ficado algum resíduo na minha cabeça das aulas de cálculo infinitesimal ou de cálculo vetorial... Com relação à “Conversa com o Leitor”, minimizei o  estorvo dos telefonemas das segundas-feiras escrevendo-a no fim de semana, com geralmente de 70 a 80% da revista já definida.  Em casa, acordando cedo no dia do fechamento, podia ainda acrescentar três ou quatro linhas em função dos acontecimentos do sábado e do domingo. Aprendi também que a apresentação da revista não precisava necessariamente ser uma espécie de sumário, podia migrar para a crônica ou assumir um viés filosófico. Um bom exemplo é esta de 2 de junho de 1973.

"Conversa com o Leitor". Clique na imagem para ampliar

Libriano de 6 de outubro – num ninho de librianos que incluía Adolpho (8), Jaquito (10), Murilo Melo Filho (14), Vera Gertel (7), George Gurjan (4), Layrton Cabral (5), Jader Neves (13) – sempre procurei unir os opostos e criar com Adolpho e companhia estratégias para aumentar a venda da revista. De uma edição de Carnaval que vivia só dos três dias, criamos a edição pré-Carnaval, com destaque para o baile do Iate Clube “Uma Noite no Havaí” (produção exclusiva da Manchete, vamos abrir o jogo, com as melhores periguetes da praça), e a edição pós-Carnaval, com a capa produzida em nosso estúdio reunindo os destaques da folia. 

Roberto Muggiati entrega edição da Manchete com destaque para a Suíça ao embaixador Giovanni Enrico Bucher em 1967. Seria o terceiro embaixador sequestrado no Rio nos Anos de Chumbo e trocado, em janeiro de 1971, por 70 presos políticos.

As edições em língua estrangeira também faziam sucesso e traziam imenso prestígio. O grande hit foi a edição em russo, que o Presidente José Sarney entregou a Mikhail Gorbachev no Kremlin em 1986. 

É muita coisa para contar, vou fechar o meu relato com dois feitos da Manchete que humilhavam os jornais diários pela velocidade da cobertura e, ainda mais, pela pujança das cores.

• Para sair nas bancas na quarta-feira com uma cobertura completa da premiação do Oscar, que acontecia nas noites de segunda para a madrugada de terça, paginávamos na abertura da revista as fotos dos cinco principais indicados, os filmes na primeira página dupla, os atores principais e coadjuvantes numa segunda página dupla, e os prêmios de direção, música, etcetera numa terceira página dupla, com mais espaço para o texto. Todo esse material fotográfico era adiantado para a impressão. O texto era sempre mais fácil de processar, podia ficar para o final. À meia-noite da segunda-feira eu seguia para a redação com um redator especializado – primeiro Wilson Cunha, depois, quando ele foi para a TV, Celso Arnaldo vinha de São Paulo, eram ambos feras. Às seis da manhã, com os textos finalizados, íamos para casa dormir o sono dos justos.

• A eleição presidencial nos Estados Unidos era sempre na primeira terça-feira de novembro, data ingrata para a Manchete. O resultado só saía na madrugada de quarta-feira. Como explicar que Manchete, nas primeiras horas da manhã, chegava às bancas com o vencedor na capa e na matéria de abertura? Um segredo muito simples – que nunca revelamos – deixando a concorrência atônita. Tratava-se de uma escolha binária. Por exemplo, em 1992, a confrontação foi entre George Bush, pai, que tentava a reeleição, e Bill Clinton. A redação aprontou duas capas, a matéria de abertura de seis páginas com o perfil do vencedor. Os cilindros foram gravados na gráfica e ficaram prontos para rodar. Opção A, Clinton. Opção B, Bush. Confirmado o resultado, nosso correspondente Sérgio Alberto da Cunha ligou diretamente de Nova York para a gráfica em Parada de Lucas e mandou rodar a opção A, Clinton. Os cilindros do derrotado iriam para o lixo, mas valia o investimento, do ponto de vista jornalístico. (Tenho uma prova impressa preciosa da capa e da matéria do Bush, o vencido, posando como Presidente, o dia que encontrar mostro no Panis). Os coleguinhas dos jornais não podiam acreditar como eles iam às bancas sem o resultado da eleição, enquanto a Manchete ostentava vitoriosa o Bil Clinton na capa. Quanto aos leitores, muitos deviam suspeitar de alguma operação mediúnica – uma revista com a velocidade instantânea da televisão...

Na minha visão pessoal e afetiva, a Manchete acabou na hora certa. Não me vejo fazendo uma edição sobre a tragédia das Torres Gêmeas e de todas as desgraças deste novo século infeliz. Hoje eu me sinto à vontade escrevendo sobre o que quero, à hora que quero, ou não escrevendo nada.

A vida é tão rica que ninguém jamais conseguirá aprisiona-la numa página rabiscada de meras palavras.

PS • A memória é um animal curioso. Das 2519 edições semanais publicadas da Manchete, devo ter feito umas 1500. Feito no sentido físico, um trabalho de ourivesaria, artesanal, como aquele descrito por Benvenuto Cellini em sua autobiografia Vita – embora seja pretencioso comparar algo descartável como uma revista com as joias que Cellini fazia para os papas e aristocratas. Se tivesse agora diante de mim uma coleção completa das revistas, eu seria capaz de evocar – como Proust com a sua madeleine – o que acontecia em minha vida no momento em que cada Manchete estava nas bancas. Até mesmo aqueles primeiros exemplares a partir de 1952, comprados em Curitiba por meu pai, que eu guardava em meu quarto na casa do alto da Alameda Carlos de Carvalho, aos catorze anos. Nas páginas sobre a morte de John Lennon vejo o nascimento iminente de meu primeiro filho, em final de dezembro de 1980. Na revista de 8 de maio de 1985 – os primeiros tempos da infausta presidência Sarney, depois de 21 anos de ditadura militar, deveria – lembro a manhã silenciosa da sexta-feira anterior em que chego cedo, o Alberto pouco depois – a redação na penumbra, poucas luzes acesas – e ele me diz “Nasceu e morreu.” Em momentos de comoção falava para dentro. Ou eu não quis ouvir. “Pô, Alberto! Quem nasceu e morreu?” Então ele fala clara e pausadamente: “Muggiati, o Narceu morreu.” Narceu de Almeida, 52 anos, um santo homem, companheiro de noites de jazz na Swinging London, foi ele quem me fez entrar para a Manchete. A revista de julho de 1984 com Michael Jackson na capa. Lena tinha perdido as gêmeas, e eu, reconduzido à direção da revista, ganhei um presente de grego do Jaquito, uma “viagem-piscina” (expressão justiniana, vai, bate a mão na outra borda e volta), um voo na sexta à noite para Miami, conexão sob ameaça de tufão para Jacksonville, no extremo  norte da Flórida, o megashow da turnê Victory (o Michael Jackson triunfal de Thriller dando uma mãozinha para os irmãos), um domingo inteiro apascentando no aeroporto de Miami, a volta num voo noturno para o Rio e o fechamento de segunda, fazendo as vezes de editor e repórter. 

Enfim, pequenos dramas familiares, a perda dos pais, o nascimento da filha, aporrinhações com o fisco e, como dizia o Bardo, “dores do coração e as mil mazelas naturais a que a carne é sujeita”, estão grudados às páginas da revista como em papel pega-mosca.

Fechando tudo, de volta ao Bardo, via Aldous Huxley:

 “But thought's the slave of life, and life time's fool; And time, that takes survey of all the world, Must have a stop”.

“Mas o pensamento é escravo da vida e a vida é a tola do tempo; E o tempo, que cobre o mundo inteiro, Tem de parar”.


70 anos - Em um dia como hoje, em 26 de abril de 1952, a revista Manchete chegava às bancas pela primeira vez.

 

A Manchete deixou de circular em agosto de 2000. Oito anos depois, um pequeno grupo de ex-funcionários da editora lançou o livro Aconteceu na Manchete, as histórias que ninguém contou (Desiderata). São relatos autênticos onde cada um, no seu próprio estilo, conta sua vivência nas revistas da Bloch Editores. Não são histórias oficiais. É a visão livre de colegas de vários setores. O livro também aborda o capitulo histórico de lancamento da revista em 1952, as dificuldades iniciais, a evolução jornalistica, a admirável qualidade gráfica. Manchete cresceu com o Brasil que se industrializava, falou com a classe média que crescia e consumia no ambiente de uma democracia que chegou a vencer graves crises desde 1954 mas sucumbiu em um golpe militar, o de 1964, que amordaçou o pais durante 21 anos. Como a maior parte dos principais veiculos jornalísticos, Manchete apoiou o golpe. O Aconteceu na Manchete não esconde esse perfil desfavorável, nem esse, nem outros, nem deixa de reconhecer a importância da empresa que se tornou uma das maiores editoras de revistas do país e se impôs pela qualidade dos seus conteúdos jornalísticos e gráficos. A coletânea é um mapa do caminho para desvendar os bastidores do complexo de prédios da Rua do Russell, no Rio de Janeiro. 

Este modesto blog nasceu um 2009 com o propósito de ser uma extensão do livro na internet. Tem procurado cumprir essa missão de preservar memórias jornalísticas. Uma grande perda para a história da Manchete foi, como se sabe, o sumiço do arquivo fotográfico, leiloado e arrematado por um advogado. Não se sabe o que foi feito do acervo, um dos maiores  da imprensa brasileira. Se foi picotado e vendido a quilo, por exemplo, se está largado em um galpão qualquer ou se, diria um otimista, está escondido mas preservado e um dia ressurgirá das cinzas. De qualquer forma, a notícia ruim felizmente foi amenizada pela Biblioteca Nacional ao digitalizar para o setor de períodicos da instituição a coleção da Manchete. Evitou-se a perda totalE o livro Aconteceu na Manchete - as histórias que ninguém contou está esgotado, mas é possível encontrá-lo em sebos digitais e também tornou-se uma fonte de consulta para universidades, pesquisadores e novas gerações curiosas sobre o jornalismo pré-internet.  

E se a SAF sifu?

 

por O.V.Pochê

A notícia está no Globo de hoje. Claro que o dono do Cruzeiro deverá recorrer, negociar a dívida para pagar em 50 anos, como empresários costumam fazer nesses casos. Afinal, o Refis está aí pra dá moleza pra quem pode.

Só como exercício de imaginação, especulemos que a pendência chegue ao extremo e a Receita Federal desapropie o Cruzeiro como garantia ao pagamento da dívida. Viraria Leão Futebol Clube? Ou o Cruzeiro SAF revendido para o rico Centrão? 

O torcedor pode enviar perguntas para a Toca da Raposa. E descobrir afinal porque ela tem esse nome. 



Bala perdida agora é oficial

 





Reproduções Twitter

Frase do dia: só mudando

 "A mudança não virá se esperarmos por outra pessoa ou outros tempos. Somos a mudança que procuramos."

Barack Obama

segunda-feira, 25 de abril de 2022

Carnaval 2022 - Os orixás e a cultura negra levam o samba de volta à passarela carioca

 

Exu no topo do mundo da Grande Rio. Foto de Gabriel Monteiro/Riotur/Divulgação.

Paolla Oliveira, de Pomba Gira reinando na terra. Foto de Gabriel
Monteiro/Rio Tur/Divulgação


...A atriz ousou na avenida. Foto de Gustavo Domingues/Riotur/Divulgação



Depois de dois anos a plateia do Sambódromo carioca pós-pandemia voltou a abraçar o samba da Imperatriz. Foto de Marco Antonio Teixeira/Riotur/Divulgação

A cantora Iza em foto de Marcelo Piu para a Riotur/Divulgação. Por todos os motivos, ela foi o símbolo... 

da Imperatriz na alegria reconquistada após o cancelamento dos desfiles em nome da saúde. Foto de Marco Antonio Teixeira/Riotur/Divulgação



Por falar em alegria, a Viradouro contou a vibração do carnaval de 1919, após a pandemia mundial de Gripe Espanhola naquele ano. Foto de Douglas Shineidr/Riotur/Divulgação 

O lado tragicômico também compareceu. Foto de Douglas Shineidr/Riotur/Divulgação

No voo da ficção da Viradouro, a chave do Rio de Janeiro chegou via drone para o Rei Momo daquele ano. Foto de Rodrigo Gorosito/Riotur/Divulgação



Um trio imbatível de gênios da Mangueira (Jamelão, Cartola e Delegado) reviveu na avenida através de sósias perfeitos. Foto de Douglas Shineidr/Riotur/Divulgação

A Mangueira reocupa a passarela, agora com nova iluminação.
Foto de Fernando Maia/Riotur/Divulgação

Samba tem consciência. Veja o recado da Baija Flor na foto de Douglas Shineidr
para Riotur/Divulgação 



Vila Isabel celebrou Martinho da Vila. E a plateia delirou. Foto de Marco Antonio Teixeira/Riotur/Divulgação

E a mesma Vila plena e colorida no sambódromo carioca. Foto de Marco Antonio Teixeira/Riotur/Divulgação



Vivane Araújo, grávida, no Salgueiro. Foto de Douglas Shineidr/Riotur/Divulgação

Lucinha Nobre e a bandeira da Portela. Foto de Gustavo Domingues/Riotur/Divulgação



Na capa da IstoÉ: quando o crime é piada para o novo governo militar



domingo, 24 de abril de 2022

Na capa do Libération: Lição francesa

A vitória de Emmanuel Macron sobre a representante da extrema direita Marine Le Pen é um alívio. A notícia ruim é o aumento do apoio ao fascismo na França. O risco permanece. Macron tem agora a responsabilidade de reconquistar a confiança da população e corrigir erros cometidos no primeiro mandato. A aposta no liberalismo e a insensibilidade diante de questões sociais foram fatores explorados pela extrema direita. Há semelhanças com o Brasil. Aqui também o neoliberalismo selvagem criou as bases para o surgimento de uma líder fascista.
Macron admitiu no discurso da vitória que muitos franceses votaram nele não como aval ao seu governo mas para proteger a democracia ameaçada. Várias correntes de pensamento se uniram para afastar a ameaça que Le Pen representa. É  a lição translúcida que o resultado eleitoral na França oferece ao Brasil. Em outubro também votaremos para defender a democracia e afastar as milícias fascistas. Aqui também a união contra trogloditas será decisiva.

Frase do dia: segunda chance


"Se, pelo menos, pudéssemos viver duas vezes: a primeira vez, para cometer todos os inevitáveis erros; a segunda, para lucrar com eles.”

D.H. Lawrence

Virou réptil

 

Veja "o fascista que vira jacaré no samba em SP. Clique no link.
https://twitter.com/senadorhumberto/status/1518181908630364160?t=d3PZdXyIwpSacJhXsBYsiQ&s=19

sábado, 23 de abril de 2022

Frase do Dia: anotação

 Do Diário de Franz Kafka, dia 2 de agosto de 1914, início da Primeira Guerra Mundial:

"A Alemanha declarou guerra à Rússia. - À tarde, natação."