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segunda-feira, 15 de junho de 2015

"Não Rio mais, agora eu choro": Este é o título-desabafo de um artigo de Roberto Muggiati, ex-diretor da Manchete, publicado no Globo de hoje, sobre um tempo em que "arrastão" era apenas um tipo de pesca ou meia feminina...

por Roberto Muggiati (para O Globo) 
Comemoro este mês 50 anos de Rio de Janeiro. Comemoro não é bem a palavra. Rememoro, com um travo de remorso. Cheguei aqui no dia do centenário da Batalha do Riachuelo, que a iniciante ditadura militar fazia questão de festejar, foi até feriado. Eu vinha de três anos no Serviço Brasileiro da BBC e fui logo trabalhar na revista "Manchete". Morava no Leblon, pegava toda manhã o 433 (Barão de Drummond-Leblon) até a redação da Frei Caneca. Ao longo do caminho — Ipanema, Copacabana, Flamengo — o ônibus ia recolhendo colegas jornalistas e publicitários. Ninguém tinha carro, só os Bloch e o Justino Martins, diretor da “Manchete”, dono de um Karmann-Ghia estiloso em que só cabia um carona apertado. Éramos pobres, mas jovens e felizes. Eu morava na General Artigas, ao lado da padaria Rio-Lisboa. O Leblon, uma pequena aldeia, tinha um comércio suburbano — armarinhos, lavanderias, ferragens, barbeiros e manicures, estofadores, farmácias, botequins. Nada de shopping ou butique e a Dias Ferreira — com um La Mole inofensivo — ainda não se tornara o polo gastrointestinal do Rio de Janeiro. Havia boa comida no Real Astória, na Pizzaria Guanabara e nos novos bares-cabeça, o Alvaro’s e o Degrau. Na vizinha Ipanema faziam sucesso o Zeppelin e o Jangadeiro. O Helsingor — dinamarquês especializado em smorgasbord — e o pub inglês Lord Jim, com cottage pie e cerveja bitter, foram uma sensação nos anos 70.
Ia-se à praia impunemente, colhia-se tatuí para comer frito com caipirinha. À meia-noite do réveillon, alguns gatos pingados iam tranquilamente à orla de roupa branca celebrar Iemanjá. Arrastão era um tipo de pesca, canção de festival ou meia feminina. Todo esse mundo ruiu estrepitosamente algumas décadas atrás no “verão do arrastão”. Aconteceu de repente, num rutilante domingo de sol, céu azul e quarenta graus à sombra, com hordas de assaltantes ferindo impiedosamente velhos, crianças e grávidas.
A partir daí, a violência só fez crescer na cidade. Frequentador do Theatro Municipal, joia arquitetônica e templo da música, hoje vejo os elegantes cultores das sinfônicas europeias e dos solos de piano de Lang Lang e Keith Jarrett, saírem correndo antes do bis e disputarem a tapa o táxi que os leve ao teto salvador. Pouco tempo atrás, até que era chique ir ao Municipal de metrô. Os recentes arrastões noturnos em estações da Zona Sul, com os passageiros à completa mercê dos bandidos, desfizeram esse sonho de primeiro mundo.
Dois episódios recentes nos chocaram em particular. O da jovem Natália, de 27 anos, que em 15 dias teve um celular roubado, foi agredida por homofóbicos que, por seus cabelos curtos, a confundiram com um homossexual (quatro pontos na testa); e foi esfaqueada na mão e na barriga por um menino de 8 anos, apoiado por comparsas de 12 e 16. Natália vai deixar o Brasil para sempre.
O nadir nesta crônica da violência carioca foi a morte do cardiologista Jaime Gold na Lagoa. Os menores acusados do crime hediondo (as facadas cruéis, rascantes, evisceraram a vítima) fazem parte do “Coreto 155 do Jacarezinho”, um grupo de 20 jovens que se gaba nas redes sociais de “aterrorizar a Zona Sul.” Eles chegaram a postar no Facebook o logotipo do seu “bonde” exterminador: a foto de uma faca sobre um selim de bicicleta. Nem Goebbels seria tão criativo...
Já ouço pessoas pensando em se vingar à moda do Charles Bronson de “Desejo de matar”: você se faz de isca e, quando o pivete aparece, faca em punho, você estoura os miolos dele com um 38 ou um 45. Um gesto de desespero diante da completa ausência de proteção nas ruas desta cidade, outrora maravilhosa.
Alguma coisa tem de ser feita. Não sei o quê. Mas tem que cortar fundo — como uma faca afiada — o tecido social. Ou então, num gesto meramente simbólico, vamos fazer um apelo final ao Redentor, que a tudo assiste de braços abertos, impotente, lá do alto. E salve-se quem puder...
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quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Menos violência no Rio. É um sonho e uma promessa

por Eli Halfoun
Se depender das promessas e dos repetitivos discursos de fim de ano, 2010 chega para nos livrar da violência que se instalou no Rio e sempre mandou ver, inclusive “peitando” as autoridades. A Secretaria Estadual de Segurança garante que está empenhada em livrar 330 mil moradores de comunidade carentes do comando dos narcotraficantes. Esse número, segundo cálculos da própria secretaria, representa 30% da população municipal.. Não é só: logo no início de em 2010 o governo planeja ocupar as favelas da Tijuca (leia-se morros do Borel e Salgueiro) para instalar Unidades da Polícia Pacificadora que, não se pode negar, trouxeram alívio para a população dos morros Dona Marta, Chapéu Mangueira e Ladeira dos Tabajaras. Os morros da Tijuca são meta prioritária porque o bairro está localizado próximo ao Maracanã e Maracanãzinho que abrigarão a Copa do Mundo 2014 e a Olimpíada 2016. Se conseguir realmente acabar ou pelo menos diminuir bastante a violência também na Tijuca e, depois, em outros bairros, o governador Sergio Cabral tem tudo para reeleger-se, se quiser, é claro, governador do Rio. Para desespero do ex-prefeito César Maia.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Maioria massacrada

Por Eli Halfoun
Não é preciso nenhuma estatística do IBGE para saber que a maioria da população que vive no Rio, (incluindo os que por injustiça social são obrigados a ocupar barracos caindo aos pedaços nos muitos morros - hoje favelas - que nos cercam) é de gente boa e honesta. Essa certeza joga pro alto a velha teoria de que a maioria sempre vence a minoria. Não é o que estamos vendo: os bandidos vencem – e de goleada – a maioria. Viramos prisioneiros de meia dúzia de marginais que nos fazem assustados reféns de nossa conquistada (mas, como se vê, nem tanto) liberdade de ir e vir. Não é possível que não haja uma maneira de nos livrarmos dessas algemas invisíveis. Não dá mais para ficar esperando por um milagre.A impressão que se tem é a de que governantes e alguns policiais graduados até gostam desses confrontos: é inegavelmente uma maneira de aparecer no noticiário, fazer mais e mais discursos demagógicos que se repetem há anos. Mas solução que é bom.... Até quem tem o dever (afinal, pagamos por isso) de nos proteger, ou seja, a polícia é cruelmente assassinada. E se violência gera violência, certamente não será com gentileza e muito menos com discursos que conseguiremos um pouco - pelo menos um pouco - de paz. Há sempre os que argumentam que é fundamental respeitar os direitos humanos, mas como fazer realmente isso se essa covarde minoria (só age em grupo e nunca mostra a cara) não se importa e não tem o mínimo de respeito por nossos direitos. Ora, também somos humanos. E a maioria. Quando se pede a intervenção das Forças Armadas o argumento de é o de que Exército, Marinha e Aeronáutica são para garantir a segurança de nossas fronteiras. Não seria, então, o caso de estabelecer fronteiras nos morros (quase todos) dominados pelo inimigo. Afinal, estamos (e não há como negar isso) em guerra. Outro argumento é de que não se pode invadir morros porque muita gente boa e honesta mora (mora?) neles. Não é o caso de tirar dos morros essa gente boa e honesta que tem servido como uma espécie de trincheira para os marginais? Aí combate ficaria bem mais fácil e justo. O que não se pode é continuar permitindo que a minoria vença a maioria. Até porque isso não tem lógica.

(na reprodução, a repercussão da guerra carioca no jornal italiano La Stampa)