quinta-feira, 3 de fevereiro de 2022

A criminalização de Moïse Mugenyi: um roteiro anunciado

por José Esmeraldo Gonçalves

O assassinato de Moïse Mugenyi é mais uma dessas tragédias cariocas. A crueldade no Rio é randômica, um ciclo onde um crime bárbaro logo é substituido por outra selvageria na maioria das vezes cometida por facções criminosas que dominam áreas da cidade. A polícia ainda apura a barbaridade que foi cometida no quiosque Tropicália, na Barra da Tijuca. Por enquato não há conclusões sobre ligação dos assassinos do congolês com o crime organizado. 

O que já está em curso é o que parece ser uma antiga estratégia para criminalizar a vítima. 

Nos anos 1970, um advogado que atuava como assistente de acusação em um crime de muita repercussão revelou - em conversa informal com um jornalista da Fatos & Fotos -, o que poderia ocorrer na sombra que muitas vezes encobre um fato criminal. 

A primeira atitude seria criar confusão, fomentar versões, levantar antecedentes da vítima, confundir a opinião pública, coordenar depoimentos de autores dos crimes e, se possível, encontrar testemunhas com novas e conflitantes versões. Criminalizar a vítima seria o resultado final dessa estratégia no mínimo antiética por estimular a ficção. Mais tarde, completava o advogado, já com um crime fora da mídia mas ainda em fase final de inquérito, abria-se espaço para uma nova etapa, digamos, mais confortável para as estratégias da defesa, sem o incômodo de uma opinão pública vigilante a cobrar justiça e com a mídia distante, provavelmente ocupada com outro crime mais "quante".

Basta acompanhar na mídia a repercussão de um desses crimes bárbaros que dá para identificar as marolas plantadas. Em pouco tempo, o congolês corre o risco de virar uma espécie de autor do seu próprio assassinato. "Mereceu morrer", é o que se extrai dos primeiros depoimentos. 

Se não fossem a mobilização da família e amigos e o vídeo que registra passo a passo a ação dos assassinos o caso Moïse seria apenas mais um corpo desovado, sem história, sem direito, sem culpados. Tanto que um dos autores do linchamento preocupou-se em saber se as câmeras do quiosque estavam ligadas. Diante da negstiva, ficou aliviado. Comemorou cedo demais. O vídeo, um dos mais brutais já vistos, apareceu e tornou-se público. 

Um comentário:

Anônimo disse...

Vai dar em nada como quase todos os assassinatos no Brasil miseravel