domingo, 25 de julho de 2021

Arles: do café de Van Gogh à Torre de Frank Gehry • Por Roberto Muggiati

Le Café de nuit,Van Gogh, Arles

Como bolsista do Centre de Formation des Journalistes de Paris, em 1961 – já rolaram 60 anos num piscar de olhos – fui escalado nas férias de Páscoa para estagiar no Midi Libre de Montpellier. Um redator do jornal, ex-aluno do CFJ, me despachou logo: não tinham tempo para me dar atenção, os fechamentos eram corridos e desgastantes. O diretor de redação assinou uma carta atestando que eu fizera um brilhante estágio e me liberaram. Além do estágio, eu devia escrever uma matéria sobre a região, o Hérault. Passei dois dias ouvindo funcionários locais e recolhendo farto material, escreveria quando voltasse a Paris. Sobrou muito tempo para fazer turismo no local, na época um destino de viagem quase virgem na França.

Visitei Carcassonne – cidade medieval preservada intacta – a região selvagem e pantanosa da Camarga – onde os ciganos da Europa fazem seu encontro anual em Les Saintes Maries de la Mer – e, na segunda-feira de Páscoa, fui até Arles – era dia de touradas – mas preferi procurar o café amarelo pintado por Van Gogh. Não existia mais, fora destruído por uma bomba na Segunda Guerra. (Nos anos 1990, reconstruíram algo no local simulando o “café Van Gogh”, atração turística que os incautos julgavam fosse o original.) Percorri os Alyscamps – também pintados por Van Gogh – necrópoles romanas: na língua da Ocitânia Alys Camps nada mais eram do que Campos Elísios... Depois de visitar em Paris a ilha da Grande Jatte – a obra-prima do pontilhista Seurat, que retrata um domingo de verão da belle époque, onde só encontrei lixo e ferro-velho – o Terraço do café à noite em Arles de Van Gogh foi outra que me ficaram devendo...

Luma Arles, de Frank
Gehry. Foto Divulgação
Um fato novo me leva àqueles tempos. Arles acaba de ganhar um museu fabuloso projetado pelo arquiteto canadense especialista em grandes museus, Frank Gehry – aquele do Guggenheim de Bilbao. A torre de sessenta metros não teria surgido sem o patrocínio da grande colecionadora suíça Maja Hoffman, herdeira das indústrias farmacêuticas do mesmo nome, em cujos laboratórios o cientista Albert Hoffman sintetizou em 1938 o ácido lisérgico, mais conhecido como LSD. Gehry disse que a inspiração da torre Luma foi a tela pintada por Van Gogh em Arles, Noite estrelada. Pelo visual da coisa, suspeito que ele possa ter recebido um “little help” psicodélico. Aliás, Van Gogh pintava como se tivesse tomado ácido. 

E, já que estou viajando, vamos ao prelúdio da Suite L’Arlesienne, dedicada à mulher de Arles, composta por Georges Bizet – sim, o pai da Carmen – adoro Bizet, pena que só viveu 36 anos, reparem o saxofone já no naipe de sopros, numa época em que a sinfônica esnobava o instrumento criado por Adolphe Sax.

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