por Gonça
Uma das qualidades do bom cronista, além de escrever bem, claro, é captar sentimento, ser uma antena parabólica a dar voz a milhões de vozes. O texto do escritor Ruy Castro (Folha de São Paulo, hoje) é um desses momentos: o cronista como porta-voz de sensações que não lhe são exclusivos. Ruy, como muitos jornalistas, era um frequentador de bares e botequins do Rio de Janeiro desde os tempos da Ipanema mítica. Bares e botecos, como bem sabemos, têm alma, além de mesas, cadeiras e paredes. "Você sente que o mundo mudou quando, ao voltar a seu bar favorito depois de longa folga, não reconhece ninguém ao redor", escreve Ruy.
Devo dizer que não abandonei os bares, nem os bares me abandonaram. Frequento pé-sujos tradicionais, que ainda resistem no Rio, mas gosto de conhecer botequins novos. O problema, a essa altura, é, como diz o Ruy, voltar a um bar dos velhos tempos, pedir um chope e olhar em volta. Vem na pressão mas com um colarinho de saudade. Ué, cadê a turma? Aquela mesa era a preferida do Henrique Diniz, o Riff gostava de ficar na entrada, o Sergio de Souza, o mais perto possível dos tira-gostos, o Monteirinho ficava falando sobre os títulos de sacanagem que bolara naquele dia para o jornal popular que editava, para o Lulu, que morava em Paris, o importante era o chope bem tirado no verão carioca, o qual não perdia um. E os garçons? Cadê o Mesquita, gente boa que nos atendia e a quem apelidamos de "o pior garçom do Rio de Janeiro"? Boas lembranças e boa turma, que pediu a saideira mais cedo e foi embora de vez sem pedir licença. Outros mudaram de bares ou simplesmente cantaram, como Zeca Pagodinho, o "deixa a vida me levar". Mudaram, casaram, trocaram a cidade grande pelo interior, cansaram da agitação dos botecos... Márcia, Christina, Denise, Tânia, Graça... querem mais é paz, deletaram a mesa do bar e estão logadas no facebook. Alguns e algumas, muitos, resistentes, mantêm a rotina. Vida que segue. Nos vemos no sábado, no Braca, no Chico&Alaíde, no Belmonte, no Devassa, no Bar Luís, no Bar Brasil, no Cosmopolita, na Academia da Cachaça, no Capela, no Lamas, no Planalto, na Taberna, na Adega. Por aí...
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