sexta-feira, 5 de setembro de 2014

Marcelo Lartigue, um argentino gente boa

por BQVManchete
O boa-praça Marcelo Lartigue encerrou os trabalhos. Desde os anos 70, o jornalista argentino era uma referência de Búzios. Ainda não tinha criado o irreverente jornal Perú Molhado quando fez alguns frilas para a Fatos & Fotos. A partir de 1981, passou a frequentar a redação da Manchete, na rua do Russell, sempre que lançava uma edição do seu jornal bem-humorado e, ao mesmo tempo, uma publicação comunitária que sempre prestou bons serviços a Búzios.
Marcelo Lartigue. Reprodução 
Distribuía o "filho temporão do Pasquim", como diz Ancelmo Gois no texto acima reproduzido, em todas as redações. Com o tempo, tornou-se uma espécie de anfitrião de muitas equipes de jornalistas e fotógrafos que aportavam em Búzios, cidade que amava. Dava dicas, apresentava fontes, passava contatos. O argentino vai fazer falta: Lartigue, Búzios e Perú Molhado eram marcas (e jeito de viver ou estado de espírito) que andavam sempre juntas.



    

terça-feira, 2 de setembro de 2014

Em Moscou não se fala em outra coisa: o Miss Bumbum do Brasil está na mídia...

por Omelete
A Rússia vive dias tensos em função da crise na Ucrânia. Por isso, a matéria acima, publicada no Metro, de Moscou, deve ter desanuviado corações e mentes. O jornal, distribuído no metrô, que transporta milhões de passageiros diariamente, deu destaque a nada menos do que o concurso Miss Bumbum, o badalado evento brasileiro. Melhor do que armas e canhões. A final do concurso está marcada para o dia 17 de novembro. O que significa dizer que, mesma que aconteça aqui o segundo turno das eleições, o Brasil terá coisa melhor para acompanhar naqueles dias calorentos de primavera.    

Michael Ende: Brics na cabeça e uma câmera na mão... Fotógrafo alemão que mora no Rio joga, literalmente, uma luz no lixo do Brasil e da China.


por José Esmeraldo Gonçalves - para a revista Contigo - (*)
O fotógrafo e documentarista Michael Ende, 55, frequenta a maior ponte-aérea do mundo. Mora no Rio de Janeiro e trabalha logo ali, na China, a 17.339 quilômetros. E seus próximos destinos são Rússia, Índia e África do Sul. Isso mesmo, o roteiro Brics. Nascido em Liepizing, na então Alemanha Oriental, em 1959 – quando ainda não existia Muro de Berlim – mudou-se com a família para Wuppertal, na Renânia do Norte-Vestfália. Morando no Brasil há quase trinta anos,  tornou-se um carioca adotivo. Casado há 18 anos com uma brasileira, a assistente social Isa Vidinho, 55, Ende mora em Santa Teresa, no centro do Rio, e passa uma boa parte do seu tempo em um sítio em Guapimirim, na região serrana fluminense. É onde relaxa entre uma e outra viagem. 
“Acordo cinco e meia da manhã, acendo incensos, faço uma meditação, limpo a casa, faço minha comida, meu pão, e estudo chinês”, conta. 
Mas os dias na serra são agora pausas não muito longas desfrutadas em meio à realização de um projeto fotográfico de vasto alcance. Depois de vasculhar todas as regiões do Brasil trabalhando para revistas alemãs, como Stern e Geo, Ende agora aponta suas câmeras para uma tarefa ambiciosa: retratar os Brics e conceder à sigla uma imagem humana. Juntos, os países que fazem parte do grupo reúnem uma população que supera três bilhões de pessoas. São economias em busca de novas alternativas para crescer, como seus líderes mostraram durante o 6º Encontro de Cúpula, em Fortaleza (CE), logo após a Copa. Os números dos Brics são conhecidos. Representam 19% do PIB , 41,6%  da população e 26% da área terrestre do planeta. Michael Ende, contudo, busca as populações e culturas que estão por trás das estatísticas impessoais. Mostra a cara e alma desses gigantes territoriais e transforma em imagens suas semelhanças e diferenças. O trabalho – que faz parte do projeto “Vizinhos Distantes” - é de grande dimensão e está apenas começando. Um primeiro capítulo já pôde ser visto na mostra “Brasil-China: luz no lixo” que esteve em cartaz no Centro Cultural da Justiça Federal, no Rio, durante a Copa do Mundo, e que deverá ser levada a outras capitais. Em fotos e vídeos, Ende espelha a atividade de catadores brasileiros e chineses. Mostra o lixo globalizado. Fará o mesmo nos demais Brics e, em seguida, abrirá suas lentes comparativas também para outros ângulos como a colheita não mecanizada, onde agricultores trabalham com as  próprias mãos, atividade ainda predominante nos quatros países, ou a forma como cada povo se comporta ao frequentar, por exemplo, uma praia, ou, ainda, revelará aspectos da culinária e tipos de beleza em cada região. 
Desvendar vizinhos distantes é quase uma constante na trajetória aventureira do fotógrafo. Desde jovem, ele sinalizava que queria ter o mundo na sua câmera. Nos anos 1980, quando a globalização nem era vocábulo, decidiu que Wuppertal era pequena demais para suas objetivas. 
“Escrevia uma coluna no jornal da cidade. Tinha 19 anos, falava de política local e outros acontecimentos. Fiz também matérias sobre música. Ainda na faculdade publiquei na revista Stern uma reportagem sobre metaleiros”, diz, acrescentando que é roqueiro e toca bateria. “Mal” – adverte. “Se tocasse bem seria músico”. 
Já na época, Ende planejava abrir horizontes. “Tinha essa visão. Lembro-me de que falei para os meus pais que um dia iria para o Brasil. Eles achavam que era apenas mania de grandeza. Mas logo depois fui para Portugal, me apaixonei pela cultura e pelo idioma e passei a estudar português”, relata. Enquanto colaborava com publicações alemãs, ele registrava cenas da vida local, quase sempre em preto e branco, o que levou um dos seus professores a identificar no seu estilo algo de Cartier Bresson. Portugal, o “laboratório” onde se desenvolveu como fotógrafo, acabou se tornando sua ponte para o Brasil. Lá o jornalista conheceu muitos brasileiros até casualmente receber de um deles, em 1985, um convite para atuar em projetos da Associação Brasileira de Municípios, em Brasília. “Meu primeiro contato com o Brasil foi uma maravilha. Tive que fazer uma conexão no Rio, o voo em que vinha de Frankfurt estava atrasado. Eu fui ao balcão da companhia aérea, agitado e supernervoso, temendo perder o avião para Brasília. E a primeira brasileira que conheci sorriu e disse “meu amor, calma, vai ter outro voo depois”. Tinha 25 anos e achei maravilhosa aquela voz doce e o primeiro contato com o conceito de ‘nada- funciona-mas-no-final-tudo-se-resolve’”,  recorda-se Ende que, hoje, “com a idade”, admite que já não leva tão na “esportiva’ situações como aquela. Logo constatou que o tal trabalho que desenvolveria em Brasília era um desses casos do tipo “nada funciona”. Não funcionou. “Parecia um cabide de emprego, era um nada”, diz ele. Mas já fascinado com o país, o fotógrafo partiu para conseguir um visto de permanência, retomou os contatos e “vendeu” para a Stern a ideia de uma reportagem sobre a espiritualidade no Planalto Central, onde atuava a médium Neyva Zelaya, líder de uma famosa comunidade mística conhecida como Vale do Amanhecer. Foi a primeira de muitas reportagens. Requisitado pelos editores das revistas ilustradas alemãs, fascinados com os temas que os trópicos ofereciam, Ende acabou deixando Brasília e fixando-se no Rio, em 1988, onde montou sua base. “Passei a fazer muitas reportagens e vídeos para revistas e TVs da Alemanha. Percorri toda a América do Sul, todos os estados do Brasil, reservas indígenas, fronteiras, viajei muito, muito, produzindo textos, fotos e documentários”, conta. Ele destaca uma reportagem que fez na Amazônia sobre o Santo Daime. Como uma espécie de tíquete para entrar naquele mundo místico em plena selva,  recomendaram-lhe que experimentasse o chá ayuasca, que faz parte do ritual do Daime e é feito de plantas nativas que potencializam a percepção. “Foi um choque. Você se sente ligado ao universo, reflete sobre sua vida. Pode ser doloroso. Não é um prazer, não recomendo. As pessoas falam que uma sessão de ayuasca substitui um ano de análise. Eu vejo dessa forma. É muito intenso, você direciona seus pensamentos para seus problemas”, conclui Ende, que transformou a experiência em um documentário de 116 minutos intitulado “O Vinho das Almas”. A relação com o Santo Daime parou aí. Ende pratica o budismo. “Como filosofia, não é uma religião propriamente. É uma maneira de ver a vida, um ensinamento, não me defino como budista. Mas acredito que existe uma coisa que não entendemos, não percebemos. Tenho um lado espiritual, uma ligação com natureza”, explica. Tráfico de drogas, bailes funks, travestis da Lapa, a perigosa rotina dos pilotos dos pequenos aviões que cruzam a imensidão da Amazônia foram outros temas nos quais o repórter-fotográfico mergulhou em dezenas de reportagens. “Eu adorava. Ao lado daqueles pilotos, por exemplo, conheci o voo “espanta macaco”, quando a pista é tão curta que o avião decola raspando nas árvores”, ri. Uma das motivações para abrir o horizonte rumo à China é, de certa forma – explica Ende-  sentir ter esgotado o Brasil. “Já estive em todo lugar. Tenho a impressão de que o Brasil muda muito devagar. As fotos que fiz há alguns anos, de carnaval, baile funk, por exemplo, podem ser publicadas hoje, quase nada mudou. Só apareceu mais um piercing na barriga da menina funkeira. Como fotógrafo, também não tenho mais curiosidade sobre a Alemanha. Hoje acho que uma realidade como a da China é mais excitante”, admite.
Curiosamente, o interesse pela China nasceu de uma motivação jornalística – a crescente importância do país – e ganhou um impulso afetivo extra. “Há alguns anos, eu havia recomendado à Bárbara , 29,  filha do primeiro casamento da Isa, que estudasse chinês. ‘Esquece o inglês’, brinquei. Ela até começou as aulas mas logo desistiu. Um dia Isa me deu como presente de Natal uma gramática chinesa toda riscada. Achei estranho, parecia só um presente barato. Era o livro que a filha tinha deixado de lado. Só que eu comecei a estudar. Isa se surpreendeu, não imaginava que iria levar tão a sério”. Ende admite que aprender o idioma foi fundamental para se movimentar na China já em busca de personagens locais e suas circunstâncias. “Estou no nível intermediário, escrevo meus emails, falo, me viro em qualquer situação. Continuo estudando todos os dias”. Desde a primeira visita – em 2008 - Ende foi aos poucos aprendendo a se movimentar na China. “Trabalhar no Brasil é mais fácil porque o meu português é bem melhor. O chinês, por outro lado, é mais aberto. Para mim isso foi uma surpresa. Em geral, as pessoas têm prazer em serem fotografadas. Lá não tem risco de segurança, a desconfiança é zero. Apenas uma vez tive problema com a polícia. Mas eles chegaram falando “com licença, o que vocês estão fazendo aqui”. Eu estava acompanhado da minha assistente e expliquei que registrava imagens de reciclagem. “Não pode. Posso convidar vocês para irem até a delegacia?”, disse o policial. Fomos, nos ofereceram chá. O delegado pediu para ver as fotos, explicou que a cidade, Yanji (na província de Jili, fronteira da Coréia do Norte), estava em campanha para melhorar a imagem. Perguntou se eu podia deletá-las. Deletei. Mais chá, pedidos de desculpas e saímos. Já na rua, minha assistente na China e na Rússia, a arquiteta e designer Daria Lisaya, que é filha de uma russa, o pai é da Moldávia, e trabalha comigo nem projetos nos dois países, reclamou: “’Você é burro. Podia ter deletado uma foto só. O delegado só queria mostrar serviço diante dos seus subordinados”. No dia seguinte, voltei ao local. Fiquei na cidade por duas semanas e não fui mais incomodado”, conta. São lições do “jeitinho chinês” que se acumulam desde 2008, quando Ende foi à China pela primeira vez. “Viajei com um grupo de estudantes brasileiros. Ficaria apenas quatro semanas mas logo nos primeiros dias mostrei fotos de uma série que chamei de “Rio by Night” e logo me convidaram para fazer uma exposição. Liguei para Isa e disse: ‘amor, vou te falar uma coisa, muito bom aqui, vou ficar uns meses’. Tudo aconteceu com uma rapidez enorme. Fiz a exposição, exibi o filme do Daime. Passei a ficar seis meses lá, seis meses aqui. Dei aulas de fotografia na Nanquim Communication University, por dois anos. E agora fui chamado pela Kennedy School, que leva mestres de várias áreas para ensinar na China”, revela.

Em setembro, Ende embarca de novo na ponte-aérea para a China. Embora entusiasmado com mais um capítulo do projeto “Vizinhos Distantes”, admite que passar tanto tempo não é fácil, sobretudo em relação ao casamento. “É difícil. De um lado é bom porque não cai na rotina. Isa é mais tranquila. Eu gosto de descobrir coisas novas, me sinto deslumbrado por viver a cultura do país. Mas Isa já foi à China umas cinco vezes. E esteve ao meu lado no aterro sanitário de Gericinó. Gosta da Bola Preta mas sacrificou o carnaval e me ajudou muito na produção das fotos”, finaliza.
(*) Texto com trechos extras

Racismo no futebol: Alô, jogadores, hora de sentar na bola e parar o jogo...

por BQVManchete
Já há alguns anos, este blog se manifesta favorável a uma campanha para sensibilizar os jogadores de futebol a interromper a partida sempre que vierem das arquibancadas ofensas racistas. Sentam na bola e esperam a polícia e os cartolas agirem, identificarem os racistas, botarem os canalhas pra fora e prendê-los devidamente.
Obviamente, esse tipo de campanha não vai partir de jornais, TVs e emissoras de rádio que têm interesses no futebol. O goleiro Aranha bem que tentou parar o jogo mas o juiz fingiu que não ouviu. Os colegas demonstraram solidariedade mas seguiram tocando a bola.
Um jogador sob bombardeio de ofensas e até de objetos lançados por racistas perde as condições psicológicas para continuar jogando, pode até perder a cabeça, partir para as arquibancadas e tentar resolver a questão no braço. E, se o fizer, não poderá ser criticado por isso. Retirá-lo de campo é premiar o racismo. Então, só resta uma atitude decente e segura: interromper o jogo.
A sociedade tem que se mexer. O Bom Senso Futebol Clube também. Chega de campanhas, faixas, apelos. Já se viu que nada disso tem funcionado. Ou a lei é imposta ou o Brasil, a CBF, a Fifa e as Federações estaduais, além dos dirigentes do clubes, Ministério dos Esportes, ministério da justiça, Ministério Público, seremos todos cumplicies de racismo.
O site Viomundo publica um texto bem fundamentado sobre o assunto. Leia.

RACISMO, FUTEBOL E O LIVRE MERCADO DO ÓDIO
por Silvio Luiz de Almeida*
Os gritos de “macaco” e “preto fedido” dirigidos ao goleiro Aranha, do Santos – um dos poucos goleiros negros nos times de ponta do futebol mundial – colocaram, mais uma vez, o racismo no esporte no centro do debate público.

Vítima de ofensas racistas por parte da reincidente torcida do Grêmio, Aranha contou em entrevista concedida após o fim da partida que tentou alertar o árbitro, mas foi ignorado. Na súmula do jogo não foi feita menção ao episódio e o assistente, por sua vez, relatou que “nada houve de anormal”.

Assim que o caso ganhou repercussão nacional, as reações do público, da imprensa e das entidades esportivas seguiram o scriptusual: declarações de dirigentes, treinadores e jogadores condenando a atitude racista da torcida do time gaúcho; o árbitro emendando posteriormente a súmula para incluir o ato racista, com o intuito de se precaver de críticas e de eventual responsabilização jurídica; o linchamento moral de uma torcedora em particular que, para seu azar, foi flagrada pelas câmaras de TV enquanto gritava na direção do goleiro santista.

A isso se seguiram reportagens mostrando o quanto a atitude da jovem torcedora gremista surpreendeu seus “amigos negros” (nestes casos, quase sempre aparecem amigos negros para relativizar o racismo), além, é claro, de especulações sobre como a justiça desportiva trataria “esse” caso, como se casos de racismo fossem ocorrências inusitadas.
Para se entender a dinâmica macabra com que estes eventos vêm se repetindo, é necessário entender que o racismo é um processo e não um ato ou conjunto de atos isolados.

Assim, os atos racistas são apenas o modo como o racismo, enquanto processo que reafirma a inferioridade de negros e negras, manifesta-se na vida social. Por isso, é possível identificar determinados atos de violência, ainda que isolados, como manifestações de um tipo específico de relação de dominação a que chamamos de racismo.
Mesmo ocorrendo cotidianamente, é curioso que atos de racismo sejam tratados como atos isolados. É com freqüência que a imprensa nacional e internacional noticia casos de jogadores de futebol negros que são agredidos por torcedores.

E apesar do relato de diversos atletas de que nas partidas ofensas raciais são corriqueiras, as entidades organizadoras, as autoridades governamentais, a imprensa e até os próprios jogadores tratam os sucessivos episódios como “casos isolados”, que jamais “refletem a postura dos clubes e da maioria da torcida”.

Todavia, a ideia de excepcionalidade das agressões racistas não resiste a uma simples olhadela no noticiário: o caso do goleiro santista é mais um dos inúmeros “atos isolados” de agressão racial no futebol ocorrido somente este ano.

Tratar atos racistas como isolados revela-nos um dos efeitos mais nefastos do racismo: a ocultação e a negação de seu caráter processual e sistêmico. Com isso, o racismo aparece enganadoramente como tendo origem no sujeito que pratica o ato racista e não como um elemento estruturante das relações sociais.

Surge então a tendência a fulanizar o racismo, a atribuir culpa individual, a julgar o problema como inerente à natureza humana ou creditá-lo a um desequilíbrio momentâneo do sujeito racista, sem que se cuide da forma como as relações sociais são permeáveis ao racismo.

Esse tipo de abordagem do racismo equivale a tratar apenas o sintoma sem pensar na doença. E o sujeito racista é um sintoma do racismo. Portanto, não é simplesmente o racista que dá origem ao racismo, mas é o racismo que cria o racista.

Com isso quero dizer que o racismo se reproduz porque encontra condições favoráveis para isso. Não é só a violência de quem chama negros e negras de macacos que configura a processualidade do racismo, mas, igualmente, a omissão de quem nada faz para interromper o andamento desse processo.

O racismo está principalmente nos silêncios, nas ausências e nos “não-ditos”. Diante da ofensa racista, o rosto que se vira covardemente para o lado contrário, a cabeça que se abaixa na vergonha conveniente e o sorriso de cumplicidade formam o “vazio” por onde escorre o sangue da vítima que nutre o monstro do racismo. É a hesitação diante do pedido de socorro e é o calar-se diante da ofensa que permite ao racismo se enraizar nas relações, normalizando a destruição do corpo e o tormento da alma.

Nesse sentido, pode-se dizer que o futebol profissional se alimenta do racismo e da violência. O estímulo à competitividade sem limites e a busca de lucros extraordinários são parte da realidade do esporte contemporâneo, romantizada pela falácia do “amor à camisa”, do fair play e pelas pífias declarações de “diga não ao racismo”, como se racismo fosse uma questão moral e não uma questão de poder.

As inúmeras denúncias de corrupção nas principais entidades organizadoras, assim como a persistência do racismo, demonstram que se está diante de um problema que deita suas raízes mais profundas nas grandes disputas políticas e econômicas do nosso tempo.
Nas análises da relação entre o racismo e as práticas esportivas tem-se freqüentemente desconsiderado as relações com a ordem econômica.
Há que se observar que a mercantilização do futebol empurrou a disputa esportiva para além dos campos. O torcedor-consumidor é mobilizado pelo clima de disputa e não pela beleza do futebol. A rivalidade entre torcidas que, em última instância, é a extensão da concorrência mercantil entre clubes e empresas patrocinadoras, faz com que acima da vitória de seu time, o torcedor busque seu maior regozijo na derrota e no lamento adversário, transformado em inimigo por narrativas que, repetidas à exaustão, criam rivalidades aparentemente irracionais e insuperáveis: corintianos x palmeirenses, brasileiros x argentinos, flamenguistas x vascaínos, atleticanos x cruzeirenses, colorados x gremistas etc.
Muitas destas rivalidades, tão úteis para aumentar a audiência de jogos e “mesas redondas”, além, é claro, dos lucros, são ideologicamente sustentadas por antagonismos de classe, de raça e de origem social, surgidos fora dos campos de futebol.

É desse modo que nacionalismos, regionalismos e racismos ajudam a demarcar a diferença entre torcidas, cujos integrantes pagarão ingressos caríssimos para adentrar as “arenas” cada vez mais exclusivas e elitizadas, com suas camisetas e acessórios e com seus hinos e cânticos, para eventualmente fazer de modo livre o que não seria visto com bons olhos na vida cotidiana, como, por exemplo, chamar de “macaco” um desconhecido que nunca lhe fez mal e que, provavelmente, nunca mais encontrará na vida.

Também é interessante notar que nos países do capitalismo central, sofisticados aparatos de vigilância e repressão conseguem limitar a externalização de impulsos mais extremos por parte da torcida; mas ao mesmo tempo em que parte da violência física entre torcidas está contida, o racismo se torna um problema cada dia mais presente.

O futebol deu ao racismo um tom “recreativo”, na feliz expressão do professor Adilson Moreira, ao se referir a um tipo de violência racial vista como natural e aceitável em momentos de descontração. Assim, o xingamento da torcida passa a fazer parte do jogo.

O futebol cria, assim, um espaço próprio, uma espécie de livre mercado do ódio em que a ofensa racial se torna a expressão do torcedor apaixonado, que pagou o ingresso justamente para ter o “direito” de extravasar seus piores sentimentos.

o jogador negro que se cale, pois está sendo pago para jogar (bem) e para suportar os insultos de ambas as torcidas (o que entender quando o árbitro ignorou a reclamação do goleiro Aranha?). E a fim de evitar que esse processo de catarse seja interrompido por quem desconhece a lógica desse consenso às avessas que impera no futebol, até o julgamento dos conflitos é tratado de modo distinto: cabe aos tribunais desportivos resolver conflitos conforme as regras do mundo encantado e “livre” do futebol.

Por esse motivo é muito raro que atos de racismo ocorridos no campo, salvo os de enorme repercussão, sejam tratados pelas leis penais. E mesmo quando alcançados pelas leis penais, restringem-se ao tipo da injúria racial, que faz parecer que o racismo, mais uma vez, é tão somente uma questão moral. Tratar os casos de racismo no âmbito desportivo é uma forma sutil de dizer que no futebol o racismo é permitido, mas desde que com certos limites.

Porém, muitos daqueles que agora demonstram indignação com as atitudes de parte dos gremistas, em particular da infeliz torcedora enxovalhada até com ofensas machistas, estão com ela e com os demais torcedores racistas acumpliciados. São igualmente racistas porque sustentam-se, servem-se e garantem seu modo de vida com o sofrimento de negros e negras, dentro e fora dos gramados, seja por ação, seja por omissão.

São cúmplices e, portanto, racistas, a FIFA, as federações de futebol, os clubes, as comissões de arbitragem e as comissões técnicas que com sua leniência, incentivam a violência racista nos estádios e fora deles. Não custa lembrar que os dirigentes destas entidades são na sua maioria homens brancos, o que ajuda a explicar em parte a total insensibilidade para com o racismo no futebol.

São cúmplices do racismo, dentro e fora dos campos,  as autoridades do Estado, com destaque especial para membros do Judiciário e do Ministério Público, que quando não são omissos, mostram-se, muitas vezes, condescendentes com atos racistas, ajudando a legitimar, legalizar e a propagar a violência racial travestida de “liberdade de expressão”.
São cúmplices do racismo as redes de comunicação, bem como seus jornalistas, cronistas esportivos e apresentadores que ajudam a reforçar a visão individualista e idealista do racismo como “ação isolada” e problema moral, fabricando falsas rivalidades geradoras de violência e concorrendo para a interdição do debate político tanto em relação à importância social do esporte, quanto em relação ao racismo.

São cúmplices do racismo os treinadores – quase todos brancos, o que reforça a imagem do negro como comandado e subalterno –, além dos jogadores de futebol, em especial, os grandes astros, negros e brancos, que poderiam e deveriam interromper as partidas e até mesmo abandonar o campo diante de casos de racismo.

Isso teria um forte impacto, muito mais do que comer bananas lançadas no campo por torcedores racistas, ato que só reafirmou o caráter recreativo do racismo no futebol e propicia algum lucro e momentos de fama nas redes sociais aos mesmos racistas e oportunistas de plantão.

Mas que jogadores terão a coragem necessária de dar esse passo e entrar para história depois de enfrentar os clubes, as entidades, parte da imprensa e, principalmente, os interesses políticos e econômicos que se formam em torno do racismo?

Nesse momento, seria interessante saber dos líderes dos movimentos Bom Senso Futebol Clube e Atletas pelo Brasil se há propostas para coibir o racismo. Persistindo o silêncio, já se poderá concluir que a lógica racista do futebol profissional interdita qualquer espécie de bom senso.
* Presidente do Instituto Luiz Gama. Doutor em Direito pela USP. Professor de Filosofia e Teoria Geral do Direito e de Ciência Política das Faculdades de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie e da Universidade São Judas Tadeu.

Conheça o site Viomundo, clique AQUI

   

Marjorie Estiano lança álbum. Além de faixas autorais ela canta Tahí, de Joubert de Carvalho, sucesso na voz de Carmen Miranda


Marjorie Estiano na foto de Marcio Simnch, de divulgação do álbum "Oito". 
por Omelete
A cantora Marjorie Estiano lança seu terceiro disco, em setembro, com participações de Gilberto Gil e Mart'nália. “Oito”, nome do álbum tem faixas autorais e uma regravação especial: Tahi, de Joubert de Carvalho.  
 o Perdão”. "Oito" já está em pré-venda no iTunes: https://itunes.apple.com/us/album//id914292573
Além de participar da primeira fase da novela "Império", como a vilã Cora, Marjorie não deixa de investir na carreira de cantora e compositora. Recentemente percorreu Brasil em uma turnê em homenagem aos Beatles, ao lado de Liminha, João Barone, Toni Platão, Leoni, sandra de Sá, Dado Villa-Lobos, Paulo Miklos e André Frateschi. Não faz muito tempo, foi capa das revistas Trip e Vip. 

Foto Vip/Divulgaçao


No novela "Império", como Cora. Foto TV Globo/Divulgação






segunda-feira, 1 de setembro de 2014

Era para ser um avanço tecnológico, mas o photoshop faz coisas inimagináveis nas atuais capas de revistas. Melhorou, mas só que não....

por BQVManchete
Durante décadas, as revistas da extinta Bloch seguiam um ritual para a escolha das suas capas. Os tempos eram das fotos em cromo. No oitavo andar, havia uma cabine apropriada para a seleção da imagem que as bancas estampariam. Ressalte-se que a sensibilidade dos jornaleiros era muito importante para Adolpho Bloch. Se o jornaleiro gostasse do assunto e da foto de capa e pendurasse vários exemplares da Manchete, por exemplo, e de preferência escondendo a concorrente, a edição tinha tudo para vender. Muito antes do ibope, o velho Adolpho fazia sua "pesquisa" de banca e valorizava a opinião do jornaleiro. Se algum "italiano" da banca começasse a repetir que a venda andava caindo ou definir com um certeiro "já foi melhor" determinada revista, pode crer que a cabeça do respectivo editor estaria a prêmio. Dizia-se na Bloch que a empresa nunca investiu pra valer na venda de assinatura porque Adolpho não queria se indispor com o "sindicato" que mandava nas bancas e que, muitas vezes, lhe adiantou dinheiro para pagar a "folha". O fato é que selecionar a foto de capa das revistas tinha algo de solene. Havia um projetor de slides e uma "tela" banca de fórmíca na parede. No caso da Manchete, a foto era projetada sobre um caixote no formato da revista, com logo e tudo, o que dava a impressão de um rústico 3D, mas que de fato passava melhor a ideia de como ficaria a capa "pendurada" na banca. A foto sobre o tal caixote "saltava" aos olhos da plateia. Sim, era uma plateia. O secretário de redação Alberto Carvalho, operava o projetor. Na fila do gargarejo, além da presença do Adolpho, o "cerimonial" de escolha da capa incluía o diretor da revista, redatores e fotógrafos. Não raro, visitantes eram convocados a palpitar. "O que você acha", perguntava Adolpho a qualquer um. A plateia, claro, se manifestava. Se um desses visitantes que tivesse ido ao Russel filar o almoço se sentisse na obrigação de fazer alguma "crítica inteligente" - e o pior é que quase sempre tiravam onda de entendidos - uma "crise" estourava no escurinho da cabine. Muitas vezes cabia ao editor da revista defender "sua" capa, a foto e razão jornalística, e argumentar como se estivesse em um tribunal. Algumas batalhas foram ganhas e muitas, talvez mais, foram perdidas naquela cabine do oitavo andar do prédio da rua do Russell. Mas a verdade é que com tantas pessoas vendo a foto projetada, entre palpites e opiniões abalizadas, parecia mais fácil identificar eventuais defeitos na imagem.
Anos depois, mas quase na reta final,  a Bloch começou a trabalhar com computadores, photoshop, fotos digitais e a salinha escura e o projetor de slides foram aposentados. Mas quem tiver coleções antigas pode conferir. São raros os erros grosseiros na composição de capas das revistas da Bloch na época em que essa escolha era quase artesanal. Tanto na Bloch quanto nas boas editoras concorrentes daqueles tempos. Por isso, fica difícil entender como é possível escapar erros tão impressionantes, e até em revistas de alto nível, como esses que o site photoshop disaster recolhe do mundo inteiro diariamente. Veja abaixo alguns exemplos.
A revista quis "vender" a matéria da mulher sexy acima dos quarenta. Para isso, exagerou no photoshop no rosto da Nicole Kidman que ficou com cara de manequim de loja. E ainda transformou o braço direita da atriz em um filete esquelético. 

A Elle tentou "desconstruir" a modelo com ombros, postura e cintura improváveis.

A Glamour, parece, dividiu Anne Hathaway em partes e remontou e porções desproporcionais. 

Tudo bem que a revista quis mostrar a barriga chapada do modelo. Mas precisava deslocar o braço quase em fratura exposta para rasgar a camisa? 

A Maxim mandou photoshop no "cofrinho" da modelo mas esqueceu de fazer o esmo na foto interna. 

Essa aí foi passada em um moedor digital que espremeu ombros e quadris. 

Essa mão esquerda colada por photoshop sobre o logo "V" é bizarra.
 
Responda rápido: quantas mãos entrelaçadas essa capa da Caras mostra?


O "dentista" da Viva exagerou no airbrushing e no photoshop da arcada dentária. 

Essa aí não foi capa mas foto interna do Globo: não sai ninguém, roubaram um dos dedos da mão esquerda. 


Matéria sobre receita light? "Tá resolvido: vamos vestir a moça com uma folha de alface"


Outra foto interna. Jennifer Aniston virou menos do que uma mulher-tronco. 

O Photoshop Disaster sacaneou essa foto publicada na Paris Match. "De quem é essa perna atrás do Sarkozy? Do Toulouse Lautrec? 


Pescoço para um lado, cabeça para outro. alguma coisa não combina aí.

O pé esquerdo vai ficar na bunda da modelo e atrapalhar a chamada? Sem problema, corta o pé!




A vida não era fácil para eles. Conheça os empregos, alguns até bizarros, de escritores famosos...

O Huff Post publicou um texto curioso sobre os empregos de escritores célebres antes da fama. Muitos usaram nas suas respectivas literaturas as experiências de assalariados em funções diversas Confira: 
William S. Burroughs - Dispensado do exército dos Estados Unidos por motivos psiquiátricos, Burroughs foi exterminador de ratos e baratas. Exerceu seu ofício em Chicago. 
Agatha Christie - Foi assistente de perfumista. E usou o conhecimento em essências em aventuras policiais de Hercule Poirot  
Charles Dickens - Trabalhou como colador de etiquetas em potes de produtos alimentícios. A função não inspirou romances mas ele usou o nome de Bob Fagin, um dos seus colegas de trabalho, em um dos seus livros. 
Fyodor Dostoyevsky - Era engenheiro. Chegou a trabalhar na função logo após se formar e traduzia romances franceses nas horas vagas.  
Arthur Conan Doyle - Era cirurgião. Foi médico a bordoe de um baleeiro, depois montou consultório e passou a clinicar. 
James Joyce - Era o encarregado da projeção de filmes no primeiro cinema de Dublin, em 1909.
Franz Kafka - Foi vendedor de seguros. Especializou-se em cobertura de acidentes de trabalho. Diz-que que inventou o capacete de proteção para operários em fábricas e obras de construção civil. Foi sócio de uma fábrica de amianto. 
Jack Kerouac - Foi lavador de pratos, guarda noturno, frentista em posto de gasolina, guarda-freio em ferrovia, e selecionador de fibras de algodão. 
Jack London - Com a ajuda de um barco emprestado, ele invadia furtivamente fazendas de ostras e vendia o produto do roubo em mercados nas proximidades da Baía de São Francisco. Depois, ironicamente, tornou-se fiscal de pesca, Trabalhou também em uma fábrica de beneficiamento de juta. 
Vladimir Nabokov - Foi curador da coleção de borboletas de um museu de zoologia. Costumava fazer longas viagens para caçar borboletas.
George Orwell - Oficial de polícia imperial indiana. Contraiu dengue, abandonou a polícia e foi se curar em Londres, onde começou a escrever. 
JD Salinger - Coordenou atividades a bordo de navios de luxo na Caribe, uma espécie de animador. Durante a Segunda Guerra, serviu na contra-inteligência.  
John Steinbeck - Foi guia de turismo, zelador em uma incubadora de peixes, montou uma fábrica de manequins de gesso no mesmo ano em que seu primeiro livro foi publicado. Quando o negócio faliu, arriscou estabelecer-se como escritor.    
Bram Stoker - Trabalhava como crítico de teatro. Depois, foi gerente de uma casa de espetáculos. 
Kurt Vonnegut - Foi vendedor de carros, jornalista esportivo (foi demitido porque ao escrever sobre um cavalo que tentou fugir do hipódromo, mandou algo assim: "o cavalo pulou uma cerca alta pra caralho"), trabalhou no setor de relações-públicas da GE, montou uma loja para vender veículos da Saab, foi professor de inglês e corretor de publicidade. 

Uma biblioteca só com livros digitais

Foto: Florida Polytechnic University
A Universidade Politécnica da Flórida, nos Estados Unidos, inaugurou nessa semana, na cidade de Lakeland, sua nova biblioteca com 135 mil livros, todos em formato digital. O acervo pode ser acessado por tablets, leitores digitais ou computadores. Se quiserem, os alunos podem levar lívros físicos para ler na biblioteca.  



Irene Ferraz: ensinando cinema

Reprodução/Contigo

Reprodução/Contigo
por José Esmeraldo Gonçalves (para a revista Contigo)
 “Pensando e Fazendo Cinema no Brasil”.  A frase na parede de um dos estúdios da Escola de Cinema Darcy Ribeiro, no Centro do Rio de Janeiro, diz mais do que parece. Em letras pretas sobre fundo branco, como se fosse uma tela, está escrito o recado simples e direto que além de revelar o espírito da instituição, traduz muito do jeito de Irene Ferraz, 55, ver a vida. Fundadora e diretora da escola e não por acaso autora do lema, responsável pela produção de longas como “Leila Diniz” e “Exu-Piá, coração de Macunaíma” e de documentários institucionais dirigidos por Sílvio Tendler (64) e Nelson Pereira dos Santos (85), entre outros, Irene dedica-se há 13 anos à escola. Nesse período, foram formados cerca de 6 mil profissionais entre brasileiros e estrangeiros, que já realizaram cerca de 400 filmes. Quando revela esses números, Irene se entusiasma. “Aqui o importante é o aluno, o trabalho dele, sua trajetória. Tenho uma grande alegria de falar que em todo o país há produtores, diretores, fotógrafos já no mercado. Muito lindo”, orgulha-se ela, que se prepara para lançar um núcleo de criação para a TV.
Irene Ferrraz se envolve com energia nas escolhas pessoais e profissionais. Veste a camisa. Curiosamente, a escola da qual fala com tanta vibração é resultado de paixões assim intensas. E em dobro. O gosto pelo cinema somou-se ao amor pelo parceiro que a ajudou a idealizá-la: o antropólogo e escritor Darcy Ribeiro, com quem viveu por pouco mais de dez anos até a sua morte, vítima de câncer, em 1997, aos 75 anos. “Foi muito bonito esse encontro com o Darcy. Era uma pessoa muito singular e a gente viveu isso com muita alegria. Eu era muito nova, mas era uma jovem que já tinha uma produtora de cinema e havia realizado muita coisa. Quando eu o conheci, em 1986, estava lendo um dos seus livros com o meu namorado. Os dois admirávamos Darcy pelo romancista que era, pela personalidade. Eu o encontrei em uma livraria. Achei muito simbólico, a literatura nos aproximou. Meu então namorado queria mostrar um filme ao Oscar Niemeyer e ao próprio Darcy. Conversamos, trocamos telefones. A gente se entusiasmou já naquele momento. Darcy era cativante”, conta Irene. Cativante e rápido. Menos de dois meses depois, o antropólogo ligou para a produtora. Conversaram, riram e, a certa altura, Darcy indagou se ela não poderia encontrá-lo. O primeiro encontro acabou acontecendo na casa dele. Com uma particularidade típica dos apaixonados: durou exatos três dias. Ela foi recebida em uma sexta-feira e saiu na segunda-feira. Como Darcy escreveu em “Confissões”, lançado pouco antes da sua morte, “amor sem desejo é confluência é fervor, bem querer, ou o que se queira. Mas amor não é”. No caso, amor e desejo uniram, a partir daquele fim de semana prolongado, Irene, então, com 27 anos, e Darcy, aos 64. Durante um ano, os dois mantiveram um relacionamento discreto, como Irene é, até hoje, ao revelar um pouco da sua história com o antropólogo. “Darcy trouxe muita alegria na minha vida e eu levei muita alegria à vida dele”.  E foi por esse amor que Irene sofreu para tomar, no começo dos anos 90, uma decisão que seria importantíssima para seu futuro profissional. O cinema brasileiro vivia a crise provocada pelo corte de incentivos durante o governo Collor, quando o diretor Luiz Carlos Lacerda, 69, a indicou para um curso na famosa Escuela Internacional de Cine y Television de Santo Antonio de Los Baños, em Cuba. Irene relutou, passaria dois anos fora. “Foi um conflito, claro, eu estava apaixonada, mas era tentador, a escola reunia gente do mundo inteiro”, justifica. Topou e o sacrifício foi compensado. Durante o curso, Irene assumiu a direção de projetos especiais e a coordenação de produção da escola. Uma experiência profissional que a levaria, em 1998, à criação do Instituto Brasileiro de Audiovisual, instituição sem fins lucrativos que seria mantenedora da Escola de Cinema Darcy Ribeiro. Já doente, Darcy incentivou e apoiou Irene nos primeiros contatos para viabilizar a escola. Mas não viveu para ver o projeto realizado. Os últimos anos ao lado de Darcy podem ter sido difíceis para Irene, mas não tristes. Desalento era coisa que não vencia o mineiro de Montes Claros. Ele surpreendeu ao ocupar o tempo que lhe restava tornando-se poeta. Darcy escreveu “Eros e Tanatos”. “Erótico demais”, como ele mesmo definia, irônico. De fato, as poesias são uma celebração ao sexo. “Quero um amor alucinado, depravado, tarado/Amor inteiro, de corpo-a-corpo, enlaçados/Amor sem reserva, que a tudo se entrega, lancinante/Quero você assim, abrasada, pedindo gozo (...). Muitos desses poemas teriam sido dedicados a Irene. “Eu fiz várias poesias para ele”, lembra, embora evite confirmar que foi a musa preferencial do livro. Para ela, ultrapassar a porta da escola batizada com o nome de Darcy equivale a reencontrar parte desse passado de lembranças, ao mesmo tempo em que vive um presente de intensa dedicação à instituição, onde passa muitas horas por dia. “Antigamente, eu ficava aqui de manhã, tarde e noite”, ri. “Estava quase trazendo um colchonete. Mas agora resolvi diminuir um pouco o ritmo. Tento aproveitar as manhãs, caminho na praia, faço pilates, introduzi a musculação na minha vida, me dei esse tempo. Estou adorando”. Provocada, Irene conta que até encontrou tempo para namorar. Mas não revela o nome. “Gosto de ler, ter amigos, pessoas que posso acessar quando preciso. Acho que tenho uma vida simples, e a vida simples é muito sofisticada”, completa, rindo.
Se a carga horária diminuiu, o comprometimento com a escola continua para quem parece funcionar à base de metas e já elegeu um novo objetivo. Com o impacto da Lei do Conteúdo Nacional, que expande o mercador do setor audiovisual, a escola está lançando um núcleo de produção para a TV. “Tínhamos um gargalo, que era o da exibição. Mas precisamos de formação de qualidade para que o conteúdo seja de qualidade. Já existem incentivos à produção, estamos aguardando a liberação de um fundo setorial para a formação audiovisual, que está para sair. Manoel Rangel, presidente da Ancine, prometeu liberar esse fundo importantíssimo. Com esse investimento poderemos devolver à sociedade profissionais qualificados”, entusiasma-se. A carioca que se tornou executiva da área cultural começou a se formar ainda na adolescência. “Meu pai (João Ferraz) era um empreendedor, muito ativo, tinha um bar, granja, foi proprietário de uma empresa de ônibus. Em casa, éramos oito filhos e mais um, adotivo. Fui criada em um sítio na Avenida Brasil, lá tínhamos plantações, fazíamos sabão. Meu pai e minha mãe (Maria José) sempre cobraram um comprometimento com o fazer. Aprendi a pensar nas contas, quem paga, como é que paga. E se seles erraram em alguma coisa, foi no excesso. Aprendi muito trabalhar, só não aprendi a brincar. Talvez por isso eu tenha sido uma workaholic. Mas agora estou me curando”, avisa.


Mesmo que você não concorde com todos os argumentos, vale ler a análise do Josias. É uma boa contribuição ao debate...


por Josias de Souza (Blog do Josias - UOL)
O ‘Plano A’ era declarar guerra à elite branca do PSDB, fingir que a ruína econômica tem causas externas, pintar o país de rosa na propaganda eleitoral e conquistar mais quatro anos de Poder. O ‘Plano B’ era, era, era… Não havia um ‘Plano B’. O generalato do PT não tinha considerado a hipótese de o ‘Plano A’ dar errado. Ninguém podia imaginar que a morte de Eduardo Campos ressuscitaria a cafuza Marina Silva.
Agora, Dilma Rousseff e seus operadores buscam uma saída que os redima do fiasco. Neste sábado, num comício organizado pelo PMDB, Dilma adotou um ‘Plano B’ que seu vice, Michel Temer, improvisara em cima da perna. “Numa democracia, quem não governa com partidos está flertando com o autoritarismo”, disse a ex-favorita, ecoando um discurso que o vice fizera na véspera, em Porto Alegre. “Não existe um único lugar em que haja regime democrático e que não haja partido.”
Nessa formulação, Marina e sua promessa de governar com “as melhores pessoas” da República seria uma ameaça à normalidade democrática. “As pessoas não podem ser colocadas acima das instituições”, disse Temer, no pronunciamento que inspirou Dilma. “Quando isso aconteceu no mundo, nós fomos para o autoritarismo. Nós temos exemplos dramáticos no mundo, não quero nem mencioná-los!”
A nova estratégia evidencia o desnorteio do conglomerado governista. O que fez de Marina uma alternativa real de poder foi justamente a insuportável normalidade que permeia a democracia brasileira. Oito em cada dez eleitores desejam que o próximo presidente adote providências diferentes das atuais, informa o Datafolha. Ou, por outra: 79% do eleitorado acha que algo de anormal precisa suceder. Sob pena de passar por natural o que é absurdo.
Quem quiser compreender o que está acontecendo deve levar em conta o seguinte: os últimos presidentes brasileiros —FHC, Lula e Dilma— foram prisioneiros de um paradoxo: prometeram o avanço sem chutar o atraso. Pregaram o novo abraçados ao velho. Presidiram a ilicitocracia enrolados na bandeira da moralidade. E terminaram confundindo a plateia. Uma parte acha que são cínicos. A outra avalia que são cúmplices.
Hoje, os quase 80% que estão sedentos por mudança dividem-se em dois grupos. Os que duvidam de tudo enxergam os últimos presidentes como cínicos. Os que não duvidam de mais nada os vêem como cúmplices. As duas alas se juntam na percepção de que, à margem dos avanços econômicos e sociais, proliferou um sistema político-partidário caótico, um mal cada dia menos necessário.
Aos olhos de muita gente, o PT virou um projeto político que saiu pelo ladrão. O PMDB e seus congêneres tornaram-se organizações partidárias com fins lucrativos, todas elas financiadas pelo déficit público. E o PSDB é a mesma esculhambação, só que com doutorado na USP. Se a economia vai bem, o acúmulo de fraudes é tolerado. Se a inflação aperta, a roubalheiras salta às retinas.
Num Brasil remoto, a análise política exigia meia dúzia de raciocínios transcendentes. Era necessário decidir se o pragmatismo do PSDB seria melhor do que o puritanismo do PT, se a social-democracia responderia às dúvidas do socialismo, se a ética da responsabilidade prevaleceria sobre a ética da convicção… Hoje, a coisa é bem mais simples.
Karl Marx e Max Weber tornaram-se descartáveis. Falidas as ideologias, o templo da política abriga uma congregação de homens de bens. Vigora no Executivo, no Legistivo e, por vezes, até no Judiciário a lógica do negócio. Tudo se subordina a ela, inclusive os escrúpulos. A integridade dos ovos não vale mais nada. Importa apenas o proveito do omelete.
Já nem é preciso varrer as cascas para debaixo do tapete. A generalização da desfaçatez, hoje espraiada da Esplanada à Petrobras, tornou a anomalia normal. Tudo parecia tranquilo nessa democracia anestesiada até que as ruas decidiram roncar em junho de 2013. Ao despencar do olimpo das pesquisas, Dilma virou uma espécie de porta-voz do asfalto.
O que os manifestantes querem é o mesmo que o governo deseja, disse ela na época. “O meu governo está ouvindo essas vozes pela mudança. Está empenhado e comprometido com a transformação social”, declarou, antes de acrescentar que passeata é uma coisa normal, que ela mesma já participou de muitas.
Por muito pouco Dilma não jogou uma mochila nas costas e foi à Avenida Paulista cobrar a melhoria dos serviços públicos, ao lado de herois da resistência como Sarney e Renan. “Essa mensagem direta das ruas contempla o valor intrínseco da democracia”, ela festejou. “Essa mensagem é de repúdio à corrupção e ao uso indevido de dinheiro público.”
Candidata de um partido cuja cúpula se encontra na cadeia, Dilma soou esquisito. Não se deu conta de que o excesso de cadáveres políticos dera origem a um defunto mais, digamos, ilustre: o próprio PT. Morreu também o pobre. De suicídio. E, suprema desgraça, não foi para o céu. A ex-petista Marina Silva é o purgatório do ex-PT. Ela se tornou uma espécie de repositório do ‘voto saco cheio’.
É nesse estágio que o país se encontra agora. De saco cheio das alianças espúrias e da tolerância presidencial para com os maus hábitos. De saco cheio da teia de chantagens e exigências feitas em nome da pseudo-governabilidade. De saco cheio do mês que dura sempre mais do que o salário. De saco cheio de tudo isso que está aí.
Ao dizerem que ninguém governa sem os partidos, Dilma e Temer tentam aproximar Marina Silva da figura de Fernando Collor, a “nova política” que terminou em impeachment. O problema é que, tomada pela biografia, ela está mais para Lula, em sua versão 2002, do que para caçadora de marajás. Com uma diferença: foi digerida pelo mercado sem precisar assinar nenhuma carta aos brasileiros.

Para se manter no topo das pesquisas até outubro, Marina talvez não precise fazer nada além de desviar dos laranjas do jato de Eduardo Campos e cuidar das suas boas maneiras. Prevalecendo a bordo do PSB e de sua coligação diminuta, chegaria ao Planalto sem dever nada a ninguém, exceto aos donos dos votos. Diz-se que pode terminar em desastre. Mas o eleitor, de saco cheio, parece cada dia mais disposto a assumir o risco de, no mínimo, cometer um erro diferente.
LEIA O BLOG DO JOSIAS, CLIQUE AQUI

Lagoa, domingo...

A exuberância do manguezal da Lagoa Rodrigo de Freitas. Um trabalho quase heroico do biólogo Mário Moscatelli, Há 25 anos, ele começou a recuperar a vegetação original de um dos mais belos locais do Rio de Janeiro. Foto. J.E.Gonçalves

A moldura verde...
...Lagoa...


...é hoje uma atração à parte. Fotos J.E.Gonçalves

Regata e...

...concorrência na pescaria. Fotos J.E.Gonçalves