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quarta-feira, 15 de maio de 2024

Reconhecimento facial: a tecnologia é fundamental para a segurança urbana, mas bancos de imagens ilegais e montados sem critérios ferem o Marco Civil da Internet. Já há vítimas da "vigilância" sem controle

O Globo de hoje informa que o sistema público de monitoramento por câmeras acoplado à tecnologia de reconhecimento facial e operado pela PMRJ possibilitou a captura de foragidos da justiça. Uma boa notícia para os cariocas. 

Aliás em três grandes eventos recentes (Réveilon, Carnaval e show da Maddona) o sistema teve impacto positivo nas estatísticas da violência. O efeito é positivo também durante aglomerações potencialmente sensíveis, como jogos de futebol. As câmeras em lojas e condomínios têm ajudado iguamente na identificação de elementos envolvidos em agressões e assaltos. 

O problema, segundo relato de vítima já registrado aqui, está em uma operação privada informal caracterizada por disseminação de fotos de "suspeitos" em um grande grupo no whatsapp popular entre seguranças de estabelecimentos comerciais. Uma vítima que nunca teve problema com a lei relata que após um ligeiro mal-entendido pessoal com um vigilante percebeu que foi fotografada por um garçom. Não deu maior importância ao fato, mas o registro fotográfico se repetiu em outras circuntâncias. Custou a perceber que suas imagens eram compartilhadas no tal grupo e, assim, tornou-se um "fichado" no whatsapp, provavelmente sem que os demais integrantes do grupo soubessem de qualquer motivo. Criou-se uma situação de risco aparentemente fora de controle. É ostensivamente vigiado e seguido em vários estabelecimentos. Não foi abordado, mas já percebeu que em duas ocasiões A PM e a Guarda Municipal foram acionadas, foi observado sem intervenção, até porque a vítima em questão nada deve à lei. A pessoa apenas pede orientação sobre o que é que aconselhável fazer para que suas imagens sejam retiradas do tal grupo. O relato foi compartilhado com o MPRJ e a Defensoria Pública. 

O assunto já foi abordado com mais detalhes nos links a seguir:

https://paniscumovum.blogspot.com/2024/01/reconhecimento-facial-o-uso-publico-e-o.html

https://paniscumovum.blogspot.com/2024/01/sabia-disso-rio-de-janeiro-tem-banco-de.html

     

quinta-feira, 13 de dezembro de 2018

Do Knight Center: Em meio a ameaças à imprensa, Brasil prepara lançamento de rede de proteção a comunicadores

Valério Luiz Filho (Instituto Valério Luiz), Emmanuel Pellegrini (MPF), Raiana Falcão (MDH) e Andrew Downie (CPJ) durante encontro em São Paulo. (Foto: Marina Atoji / Abraji). Reproduzida do Knight Center. 

por Carolina de Assis (do Knight Center for journalism in the Americas)

Um encontro realizado em São Paulo no começo de dezembro reuniu comunicadores, organizações pela liberdade de imprensa e representantes do Estado para debater as ameaças enfrentadas pela imprensa, as medidas que o Estado vem tomando para combater a impunidade nos casos de violência contra trabalhadores da categoria e os próximos passos para o lançamento de uma rede de proteção a comunicadores no Brasil.

O Encontro Nacional de Proteção a Comunicadores aconteceu na capital paulista nos dias 4 e 5 de dezembro e foi organizado pelo Instituto Vladimir Herzog, pela Artigo 19, Repórteres Sem Fronteiras (RSF), Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e pelo coletivo Intervozes.

O evento reuniu cerca de 50 pessoas de 11 Estados brasileiros para aprofundar o debate sobre a violência contra comunicadores e articular uma rede de proteção a estes profissionais que cubra os diversos contextos comunicacionais do país, disse Artur Romeu, da RSF, ao Centro Knight.

No primeiro dia do encontro, comunicadores de várias regiões do países participaram de mesas temáticas com membros das organizações e com representantes do Estado. Buba Aguiar e Gizele Martins, do Rio de Janeiro, Cláudio André, de Pernambuco, Cristian Góes, de Sergipe, e Valério Luiz, de Goiás, contaram casos vividos por eles de censura, criminalização, violência e impunidade em crimes que tiveram comunicadores como alvo.

“Trouxemos as principais violações que observamos com relatos em primeira pessoa de casos emblemáticos, para personalizar e gerar essa identificação, que funcionou bastante junto aos participantes”, contou Marina Atoji, gerente executiva da Abraji, ao Centro Knight. “Quando falamos em censura ou criminalização, parece uma coisa muito etérea. Mas quando contamos uma história e colocamos isso na figura de alguém, isso tem uma força maior.”

Os representantes do Estado, disse Atoji, trouxeram “a visão do Estado enquanto criador e executor de política pública”. Participaram Carlos Weis, da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, Emmanuel Pellegrini, do Ministério Público Federal (MPF), e Raiana Falcão, do Ministério dos Direitos Humanos (MDH) e coordenadora-geral do Programa de Proteção a Defensores de Direitos Humanos, Comunicadores Sociais e Ambientalistas.

LEIA A MATÉRIA COMPLETA E ACESSE OS LINK COMPLEMENTARES AQUI

sexta-feira, 16 de outubro de 2015

RODA G$GANT$ - Mais uma tentativa de transformar parte do Aterro do Flamengo em empreendimento comercial...

Ameaçado: o belo Aterro dos cariocas. Foto de Pedro Kirilos/Riotur

Aterro completa 50 anos mas é um "velhinho" cobiçado. Está sempre na mira de empreendimentos comerciais que sonham ocupar parte do Parque, cobrando ingressos ou "pedágio", claro. Foto de Pedro Kirilos/Riotur


O exemplo equivocado. A roda-gigante London Eye não foi construída em um parque público mas em terreno particular. Reprodução
  
O Aterro comemora 50 anos.  Um marco. Especialmente, porque em cinco décadas sobreviveu a vários ataques predatórios. E esses ataques são recorrentes.
Hoje, a coluna do Ancelmo, no Globo, dá notícia de mais uma dessas ofensivas. Um grupo tenta instalar um mafuá comercial no Aterro. Nada menos do que uma roda-gigante. Um pouco antes da Copa foi feita uma tentativa semelhante. Não se sabe se é o mesmo grupo que, na época, queria bagunçar a praia de Botafogo. Também não faz muito tempo, o concessionário do Rio's (que está devendo o aluguel à Prefeitura, como noticiado) tentou construir uma casa de shows ao lado do restaurante. Nessas investidas, o pessoal demonstra um certo marketing criativo, sempre tentando se associar a um nome ou instituição conhecidos. No caso da casa de shows, o projeto seria do Niemeyer, no fim da vida, ou do seu prestigiado escritório. Felizmente, e até que tentem novamente, o cabaré foi abortado.
Agora, planta-se a ideia da roda-gigante. Segundo a nota, iniciativa de um autodenominado Instituto Lotta (aparentemente recém-fundado, pois informa que ainda está "sendo organizado") e um certo Rio View. O instituto, segundo o Google, apresenta-se como um ONG batizada de Instituto Lotta de Cultura e Recreação, em homenagem a uma das idealizadoras do Aterro. Não sabe quem está à frente, já que a página não tem o tradicional "Quem Somos". Uma busca à Rio View mostra várias referências mas nenhuma relacionada a empresa estabelecida ou nomes de responsáveis. Não foi possível encontrar página ou maiores dados da suposta empresa ou instituição.

Roda, roda, roda e avisa...
Os supostos empreendedores da roda-gigante informaram ao Globo que, no projeto original do Aterro, havia um local para "um grande brinquedo ao ar livre". Um vago argumento. E é até um risco, essa débil sugestão. O "grande brinquedo ao ar livre" poderia ser até um Godzila de 150 metros de altura. O prédio do atual Vivo Rio também estava no projeto original e, ao ser construído, prejudicou a bela perspectiva do MAM. Foi um erro ceder ao apelos comerciais e resgatá-lo fora de época. Já a Marina da Glória era, no projeto original, um ancoradouro público. O propósito foi deformado e, hoje, a Marina privatizada faz tentativas periódicas de construir edificações, shopping, centro de convenções e ampliações das instalações existentes, até com invasão - aparentemente contida, chegaram a cravar até estacas - do espelho d'água da Baía da Guanabara.
Essas tentativas, às vezes travestidas de "boa causa" (uma hora, para 'preparar' a cidade para a Copa ou para a Olimpíada, outra hora "homenagear" Niemeyer e por aí vai), são apenas empreendimentos comerciais com o propósito de privatizar mais um pedaço do Aterro, impedindo a população de frequentá-lo livre e gratuitamente. Nada contra empreendimento comercias, mas há outras áreas mais adequadas na cidade. Se um só desses "projetos" passarem, a porteira estará aberta e outras empreiteiras poderão justamente reivindicar espaço para casas de shows, igrejas, por que não?, circos ou ringues de MMA. Se bobear, vai aparecer gente querendo cercar o Aterro, botar catraca eletrônica e cobrar ingresso. Roda-gigante é a ponta-de-lança do mafuá. Os supostos empresários usam como argumento a London Eye, a roda-gigante de Londres. O argumento é meio colonizado mas vale acrescentar um dado que talvez eles não saibam: a London Eye foi construída em um terreno privado, particular, não se comprometeu um parque público ao instalá-la.
Aqui, quem pensa em comprar um terreno para seu empreendimento se pode tentar ocupar uma área pública?

Saudosa maloca 
A cidade já se livrou de uma espécie maloca ou mafuá: o Tivoli Park, na Lagoa. Claro que  muitos adultos têm boas lembranças dos brinquedos do Tivoli. Mas pergunte a qualquer um que frequente livremente o Parque dos Patins, as ciclovias, os deques (e não é privilégio da Zona Sul, basta ir lá para ver que há cariocas e filhos de outros bairros que desfrutam da bela área pública sem pagar ingresso) se quer trocar tudo aquilo pelo parque privado?
Para finalizar, um pouco de histórias urbanas: nos anos 50, quando da construção do Aterro, tinha dono de jornal sugerindo que, margeando as duas pistas, fosse permitida a construção de prédios residenciais. A "boa causa" era, com isso, vender os novos lotes e arrecadar dinheiro para a construção do parque. A mesma tentativa foi feita, anos depois, quando a Praia de Copacabana foi aterrada e voltou a "sugestão" e o lobby de se erguer mais uma linha de condomínios estilo miami à beira das novas pistas para ajudar a "financiar" a obra. Quer mais? Antes de o belo casarão do Parque Laje ser desapropriado pelo governo federal, uma construtora ligada a um grupo poderoso manobrou para comprá-lo. O projeto era construir no local um... cemitério vertical. São lembranças de velhos cariocas apoiados por antigas coleções de jornais da época.
Área livre no Arco Rodoviário
Que o Aterro, portanto, resista a mais essa nebulosa investida. Que o Iphan fique atento. Que o Ministério Público Federal, que anda ativo, ligue ainda mais antenas. Que os verdadeiros defensores do Aterro, os frequentadores em geral e os moradores do Flamengo, Catete, Laranjeiras, Glória, Santa Teresa. Lapa e Centro, em especial, defendam, como sempre fazem, a maior área de lazer da cidade.
E que "empreendedores" parem de encher o saco, deixem o Aterro em paz, e se aliem ao Rio, que deseja preservá-lo.
Há muitas áreas privadas, no Rio e Grande Rio, que seriam valorizadas com a instalação de uma roda-gigante até maior do que a London Eye. Dou uma ideia de graça: os milhares de hectares de terrenos livres, e a bom preço, às margens do Arco Rodoviário. Dá até para construir uma Disney. A cidade vai crescer para aqueles lados, nem tem muito engarrafamento pra chegar lá. Acham longe? Pois mesmo no novo Porto, em revitalização, há espaços degradados que sediariam de bom grado uma roda-gigante. E a vista também é sensacional. Basta esquecer a moleza de ocupar área pública e comprar um terreno.

segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

Motosserra está derrubando 300 árvores do Aterro do Flamengo. Alô, Ministério Público !

Foto: Reprodução de matéria publicada no Globo de hoje. 
por BQVManchete (comentário do blog)
Recentemente, uns e outros jogaram um "balão de ensaio" na mídia sobre a privatização do Aterro do Flamengo, um patrimônio dos cariocas frequentemente ameaçado. Não é de hoje. Quando do início do aterro, nos anos 50, um jornal carioca queria que fosse liberada a construção de prédios no local. Felizmente, a campanha de grilagem não vingou. Mas o jornal não desistiu. No fim dos anos 60, a Praia de Copacabana começou a ser ampliada, com a Av. Atlântica ganhando duas pistas e, sob o pretexto de baixar os custos, foi sugerido que se permitisse a construção de uma segunda muralha de prédios à margem da nova pista. Prevaleceu o bom senso e a picaretagem não foi adiante. Não faz muito tempo, os concessionários de um restaurante no Aterro chegaram a encomendar um projeto de uma casa de show para ser construída ao lado. Aparentemente, a ideia idiota foi arquivada mas é bom ficar de olho. Agora, surge a denúncia de que os concessionários da Maria da Glória vão passar a motosserra em 300 árvores do Aterro. O projeto teria sido aprovado pelos órgãos "competentes". Discute-se há alguns meses a adaptação da Marina para receber a Olimpíada. Dizem que tudo foi "discutido" com a sociedade. Mas os moradores dos arredores e os usuários do Parque jamais ouviram falar nesse desmatamento de 300 árvores. Há até um sujeito que diz que "as árvores a serem cortadas não afetam espécies do projeto paisagístico original". E daí?" Árvore é árvore. E tudo isso para construir estacionamentos destinado a atrair ainda mais público para mafuás de shows e pajelanças marqueteiras. Isso acontece em apenas uma parte do Aterro. Agora imagine o que aconteceria, ou acontecerá, quanto todo o Aterro for privatizado, como uns e outros começam a defender? O pretexto, agora, é a "boa causa", a Olimpíada, mas a consequência é a deturpação da finalidade de uma das mais belas e queridas áreas de lazer do cariocas. No caso, parece que não adianta mais se queixar às autoridades. Segundo a matéria, as árvores do Aterro já estão sendo Marina - um previa construções até no espelho d'água da Baía, - foram barrados pela Justiça, mas esse segue navegando com todas as velas enfunadas. Esse será um dos "legados olímpicos" que o Rio vai receber. Um "presente" para os 450 anos da Cidade Maravilhosa. Alô, Ministério Público.

terça-feira, 2 de setembro de 2014

Racismo no futebol: Alô, jogadores, hora de sentar na bola e parar o jogo...

por BQVManchete
Já há alguns anos, este blog se manifesta favorável a uma campanha para sensibilizar os jogadores de futebol a interromper a partida sempre que vierem das arquibancadas ofensas racistas. Sentam na bola e esperam a polícia e os cartolas agirem, identificarem os racistas, botarem os canalhas pra fora e prendê-los devidamente.
Obviamente, esse tipo de campanha não vai partir de jornais, TVs e emissoras de rádio que têm interesses no futebol. O goleiro Aranha bem que tentou parar o jogo mas o juiz fingiu que não ouviu. Os colegas demonstraram solidariedade mas seguiram tocando a bola.
Um jogador sob bombardeio de ofensas e até de objetos lançados por racistas perde as condições psicológicas para continuar jogando, pode até perder a cabeça, partir para as arquibancadas e tentar resolver a questão no braço. E, se o fizer, não poderá ser criticado por isso. Retirá-lo de campo é premiar o racismo. Então, só resta uma atitude decente e segura: interromper o jogo.
A sociedade tem que se mexer. O Bom Senso Futebol Clube também. Chega de campanhas, faixas, apelos. Já se viu que nada disso tem funcionado. Ou a lei é imposta ou o Brasil, a CBF, a Fifa e as Federações estaduais, além dos dirigentes do clubes, Ministério dos Esportes, ministério da justiça, Ministério Público, seremos todos cumplicies de racismo.
O site Viomundo publica um texto bem fundamentado sobre o assunto. Leia.

RACISMO, FUTEBOL E O LIVRE MERCADO DO ÓDIO
por Silvio Luiz de Almeida*
Os gritos de “macaco” e “preto fedido” dirigidos ao goleiro Aranha, do Santos – um dos poucos goleiros negros nos times de ponta do futebol mundial – colocaram, mais uma vez, o racismo no esporte no centro do debate público.

Vítima de ofensas racistas por parte da reincidente torcida do Grêmio, Aranha contou em entrevista concedida após o fim da partida que tentou alertar o árbitro, mas foi ignorado. Na súmula do jogo não foi feita menção ao episódio e o assistente, por sua vez, relatou que “nada houve de anormal”.

Assim que o caso ganhou repercussão nacional, as reações do público, da imprensa e das entidades esportivas seguiram o scriptusual: declarações de dirigentes, treinadores e jogadores condenando a atitude racista da torcida do time gaúcho; o árbitro emendando posteriormente a súmula para incluir o ato racista, com o intuito de se precaver de críticas e de eventual responsabilização jurídica; o linchamento moral de uma torcedora em particular que, para seu azar, foi flagrada pelas câmaras de TV enquanto gritava na direção do goleiro santista.

A isso se seguiram reportagens mostrando o quanto a atitude da jovem torcedora gremista surpreendeu seus “amigos negros” (nestes casos, quase sempre aparecem amigos negros para relativizar o racismo), além, é claro, de especulações sobre como a justiça desportiva trataria “esse” caso, como se casos de racismo fossem ocorrências inusitadas.
Para se entender a dinâmica macabra com que estes eventos vêm se repetindo, é necessário entender que o racismo é um processo e não um ato ou conjunto de atos isolados.

Assim, os atos racistas são apenas o modo como o racismo, enquanto processo que reafirma a inferioridade de negros e negras, manifesta-se na vida social. Por isso, é possível identificar determinados atos de violência, ainda que isolados, como manifestações de um tipo específico de relação de dominação a que chamamos de racismo.
Mesmo ocorrendo cotidianamente, é curioso que atos de racismo sejam tratados como atos isolados. É com freqüência que a imprensa nacional e internacional noticia casos de jogadores de futebol negros que são agredidos por torcedores.

E apesar do relato de diversos atletas de que nas partidas ofensas raciais são corriqueiras, as entidades organizadoras, as autoridades governamentais, a imprensa e até os próprios jogadores tratam os sucessivos episódios como “casos isolados”, que jamais “refletem a postura dos clubes e da maioria da torcida”.

Todavia, a ideia de excepcionalidade das agressões racistas não resiste a uma simples olhadela no noticiário: o caso do goleiro santista é mais um dos inúmeros “atos isolados” de agressão racial no futebol ocorrido somente este ano.

Tratar atos racistas como isolados revela-nos um dos efeitos mais nefastos do racismo: a ocultação e a negação de seu caráter processual e sistêmico. Com isso, o racismo aparece enganadoramente como tendo origem no sujeito que pratica o ato racista e não como um elemento estruturante das relações sociais.

Surge então a tendência a fulanizar o racismo, a atribuir culpa individual, a julgar o problema como inerente à natureza humana ou creditá-lo a um desequilíbrio momentâneo do sujeito racista, sem que se cuide da forma como as relações sociais são permeáveis ao racismo.

Esse tipo de abordagem do racismo equivale a tratar apenas o sintoma sem pensar na doença. E o sujeito racista é um sintoma do racismo. Portanto, não é simplesmente o racista que dá origem ao racismo, mas é o racismo que cria o racista.

Com isso quero dizer que o racismo se reproduz porque encontra condições favoráveis para isso. Não é só a violência de quem chama negros e negras de macacos que configura a processualidade do racismo, mas, igualmente, a omissão de quem nada faz para interromper o andamento desse processo.

O racismo está principalmente nos silêncios, nas ausências e nos “não-ditos”. Diante da ofensa racista, o rosto que se vira covardemente para o lado contrário, a cabeça que se abaixa na vergonha conveniente e o sorriso de cumplicidade formam o “vazio” por onde escorre o sangue da vítima que nutre o monstro do racismo. É a hesitação diante do pedido de socorro e é o calar-se diante da ofensa que permite ao racismo se enraizar nas relações, normalizando a destruição do corpo e o tormento da alma.

Nesse sentido, pode-se dizer que o futebol profissional se alimenta do racismo e da violência. O estímulo à competitividade sem limites e a busca de lucros extraordinários são parte da realidade do esporte contemporâneo, romantizada pela falácia do “amor à camisa”, do fair play e pelas pífias declarações de “diga não ao racismo”, como se racismo fosse uma questão moral e não uma questão de poder.

As inúmeras denúncias de corrupção nas principais entidades organizadoras, assim como a persistência do racismo, demonstram que se está diante de um problema que deita suas raízes mais profundas nas grandes disputas políticas e econômicas do nosso tempo.
Nas análises da relação entre o racismo e as práticas esportivas tem-se freqüentemente desconsiderado as relações com a ordem econômica.
Há que se observar que a mercantilização do futebol empurrou a disputa esportiva para além dos campos. O torcedor-consumidor é mobilizado pelo clima de disputa e não pela beleza do futebol. A rivalidade entre torcidas que, em última instância, é a extensão da concorrência mercantil entre clubes e empresas patrocinadoras, faz com que acima da vitória de seu time, o torcedor busque seu maior regozijo na derrota e no lamento adversário, transformado em inimigo por narrativas que, repetidas à exaustão, criam rivalidades aparentemente irracionais e insuperáveis: corintianos x palmeirenses, brasileiros x argentinos, flamenguistas x vascaínos, atleticanos x cruzeirenses, colorados x gremistas etc.
Muitas destas rivalidades, tão úteis para aumentar a audiência de jogos e “mesas redondas”, além, é claro, dos lucros, são ideologicamente sustentadas por antagonismos de classe, de raça e de origem social, surgidos fora dos campos de futebol.

É desse modo que nacionalismos, regionalismos e racismos ajudam a demarcar a diferença entre torcidas, cujos integrantes pagarão ingressos caríssimos para adentrar as “arenas” cada vez mais exclusivas e elitizadas, com suas camisetas e acessórios e com seus hinos e cânticos, para eventualmente fazer de modo livre o que não seria visto com bons olhos na vida cotidiana, como, por exemplo, chamar de “macaco” um desconhecido que nunca lhe fez mal e que, provavelmente, nunca mais encontrará na vida.

Também é interessante notar que nos países do capitalismo central, sofisticados aparatos de vigilância e repressão conseguem limitar a externalização de impulsos mais extremos por parte da torcida; mas ao mesmo tempo em que parte da violência física entre torcidas está contida, o racismo se torna um problema cada dia mais presente.

O futebol deu ao racismo um tom “recreativo”, na feliz expressão do professor Adilson Moreira, ao se referir a um tipo de violência racial vista como natural e aceitável em momentos de descontração. Assim, o xingamento da torcida passa a fazer parte do jogo.

O futebol cria, assim, um espaço próprio, uma espécie de livre mercado do ódio em que a ofensa racial se torna a expressão do torcedor apaixonado, que pagou o ingresso justamente para ter o “direito” de extravasar seus piores sentimentos.

o jogador negro que se cale, pois está sendo pago para jogar (bem) e para suportar os insultos de ambas as torcidas (o que entender quando o árbitro ignorou a reclamação do goleiro Aranha?). E a fim de evitar que esse processo de catarse seja interrompido por quem desconhece a lógica desse consenso às avessas que impera no futebol, até o julgamento dos conflitos é tratado de modo distinto: cabe aos tribunais desportivos resolver conflitos conforme as regras do mundo encantado e “livre” do futebol.

Por esse motivo é muito raro que atos de racismo ocorridos no campo, salvo os de enorme repercussão, sejam tratados pelas leis penais. E mesmo quando alcançados pelas leis penais, restringem-se ao tipo da injúria racial, que faz parecer que o racismo, mais uma vez, é tão somente uma questão moral. Tratar os casos de racismo no âmbito desportivo é uma forma sutil de dizer que no futebol o racismo é permitido, mas desde que com certos limites.

Porém, muitos daqueles que agora demonstram indignação com as atitudes de parte dos gremistas, em particular da infeliz torcedora enxovalhada até com ofensas machistas, estão com ela e com os demais torcedores racistas acumpliciados. São igualmente racistas porque sustentam-se, servem-se e garantem seu modo de vida com o sofrimento de negros e negras, dentro e fora dos gramados, seja por ação, seja por omissão.

São cúmplices e, portanto, racistas, a FIFA, as federações de futebol, os clubes, as comissões de arbitragem e as comissões técnicas que com sua leniência, incentivam a violência racista nos estádios e fora deles. Não custa lembrar que os dirigentes destas entidades são na sua maioria homens brancos, o que ajuda a explicar em parte a total insensibilidade para com o racismo no futebol.

São cúmplices do racismo, dentro e fora dos campos,  as autoridades do Estado, com destaque especial para membros do Judiciário e do Ministério Público, que quando não são omissos, mostram-se, muitas vezes, condescendentes com atos racistas, ajudando a legitimar, legalizar e a propagar a violência racial travestida de “liberdade de expressão”.
São cúmplices do racismo as redes de comunicação, bem como seus jornalistas, cronistas esportivos e apresentadores que ajudam a reforçar a visão individualista e idealista do racismo como “ação isolada” e problema moral, fabricando falsas rivalidades geradoras de violência e concorrendo para a interdição do debate político tanto em relação à importância social do esporte, quanto em relação ao racismo.

São cúmplices do racismo os treinadores – quase todos brancos, o que reforça a imagem do negro como comandado e subalterno –, além dos jogadores de futebol, em especial, os grandes astros, negros e brancos, que poderiam e deveriam interromper as partidas e até mesmo abandonar o campo diante de casos de racismo.

Isso teria um forte impacto, muito mais do que comer bananas lançadas no campo por torcedores racistas, ato que só reafirmou o caráter recreativo do racismo no futebol e propicia algum lucro e momentos de fama nas redes sociais aos mesmos racistas e oportunistas de plantão.

Mas que jogadores terão a coragem necessária de dar esse passo e entrar para história depois de enfrentar os clubes, as entidades, parte da imprensa e, principalmente, os interesses políticos e econômicos que se formam em torno do racismo?

Nesse momento, seria interessante saber dos líderes dos movimentos Bom Senso Futebol Clube e Atletas pelo Brasil se há propostas para coibir o racismo. Persistindo o silêncio, já se poderá concluir que a lógica racista do futebol profissional interdita qualquer espécie de bom senso.
* Presidente do Instituto Luiz Gama. Doutor em Direito pela USP. Professor de Filosofia e Teoria Geral do Direito e de Ciência Política das Faculdades de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie e da Universidade São Judas Tadeu.

Conheça o site Viomundo, clique AQUI

   

sábado, 12 de abril de 2014

Apartheid no aeroporto? Guenta, cambada

(da Redação)
Foi intensa, e continua, a campanha para privatizar os grandes aeroportos brasileiros. Só os rentáveis, claro, porque a maioria, nas cidades mais distantes ou de menor movimento, vai ficar mesmo na conta pública da Infraero. Aeroportos devem mesmo ser de operação privado. O ideal era que os concessionários cuidassem sozinhos, até construíssem, sem recorrer a dinheiro público. Mas isso é difícil. No Brasil, o empresário privado precisa ser urgentemente... privatizado. Alguns aeroportos já privatizados estão fazendo obras. Será para o público em geral ou apenas para privilegiados? Há dúvidas. O aeroporto de Guarulhos, por exemplo., está investindo em uma área vip para as classe mais altas. Custa caro para entrar lá. O pessoal endinheirado terá privilégios e prioridades. Os manés vão continuar na galera. Diz a Folha que quem pagar a grana preta para entrar no espaço Vip terá "cerimonial" para check in, despacho de bagagens etc. A ANAC deve, se é que quer, fiscalizar isso porque a "preferência" pode facilmente se transformar em fura-fila, lugar em vôo quando os mortais comuns não conseguirão, facilidade para embarcar antes etc. Quem vai gostar é aquela famosa colunista que deixou de viajar para o exterior porque até o porteiro dela tinha ido para a Europa. "Perdeu a graça", segundo ela. No espaço vip, pelo menos, não terá que cruzar com o povão que passou a viajar de avião. E, vale lembrar, taxas de embarque para a turma pé-no-chão já aumentaram e vão aumentar mais. Segura, peão! Pode isso, Arnaldo?
LEIA NA FOLHA, CLIQUE AQUI