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segunda-feira, 11 de setembro de 2023

Memórias da redação: Há 50 anos, “Salvador Allende, presente!” • Por Roberto Muggiati

 



Era terça-feira, 11 de setembro de 1973, e a Manchete estava fechada quando soubemos do golpe no Chile. A magnitude do fato exigia um registro imediato. Com grande parte da revista já impressa, optamos por um encarte de oito páginas. A relativa proximidade geográfica permitiu-nos obter material fotográfico dos trágicos acontecimentos que culminaram com o suicídio de Salvador Allende e o massacre de seus apoiadores, acuados no Palácio de la Moneda e bombardeados pela artilharia, tanques do exército e aviação, comandados pelo general Augusto Pinochet. Massacradas também foram as forças da resistência civil, formadas por bravos, mas mal equipados grupos estudantis e operários. Revivi agora aquele momento histórico vendo pela primeira vez o filme de Helvio Soto Chove em Santiago (1975), que descreve as últimas horas do governo Allende.

Mesmo sendo uma semanal ilustrada de assuntos gerais, com forte ênfase no mundo do entretenimento, a Manchete sempre manteve um compromisso com a cobertura da atualidade. Não foram poucos, nas décadas seguintes, os acontecimentos que exigiram a reabertura da revista às terças-feiras. Lembro o assassinato do Rei Faisal da Arábia Saudita por seu sobrinho em 25 de março de 1975. 


Em 1974, quando o presidente norte-americano Richard Nixon renunciou na onda do Escândalo de Watergate, na sexta-feira, 9 de agosto de 1974, fizemos uma edição extra em preto-e-branco que chegou às bancas em menos de 24 horas.


O assassinato de John Lennon em 8 de dezembro de 1980 – nas primeiras horas da terça-feira 9 de dezembro, horário de Brasília – nos levou à produção de um encarte na edição de quarta-feira e a atualização com uma chamada enorme ocupando quase metade da capa de gala de Pelé, já praticamente impressa.


Na segunda-feira, 30 de março de 1981, o presidente Ronald Reagan sofreu um atentado a bala em Washington. Tivemos de esperar a chegada das fotos pelo malote de Nova York para paginar a matéria de abertura e a capa na manhã de terça-feira. Três coisas a destacar:

• Semanas depois, em 13 de maio, na Praça de São Pedro, no dia de Nossa Senhora de Fátima, o Papa João Paulo II sofria um atentado.

• O atentado contra Reagan foi cercado de conotações cinéfilas, ele próprio tendo sido um galã de Hollywood. A cerimônia de premiação do Oscar, marcada para aquela noite, foi cancelada. O agressor, um adolescente perturbado, atirou contra o Presidente para chamar a atenção da atriz Jodie Foster, que despertou nele uma paixão obsessiva ao vê-la no filme Taxi Driver, cujo tema era justamente um atentado político.

•  O autor das melhores fotos do atentado contra Reagan foi o brasileiro Sebastião Salgado, da agência Magnum, que vinha na cola do presidente para registrar seus primeiros 100 dias de governo. Salgado, com o dinheiro da venda das fotos, conseguiu se dedicar ao seu projeto de documentação da natureza e da ocupação humana voltado para a preservação do planeta.


Numa terça-feira especial de março de 1985, Carlos Heitor Cony, com sua vocação de portador de más notícias, me ligou de Brasília no meio da noite: “Muggiati, como editor da Manchete você precisa saber: o Tancredo não toma posse amanhã. ” Dito e feito. A cobertura da doença do primeiro presidente civil pós-ditadura se estenderia por mais de cinco semanas de trabalho desgastante para os jornalistas, principalmente os da imprensa diária. Com Gervásio Baptista como fotógrafo oficial da presidência – escolha de Tancredo confirmada por Sarney – tivemos a primeira foto exclusiva do presidente após sua hospitalização: com dona Risoleta e o corpo médico em Brasília. Foi capa, com a chamada triunfalista TANCREDO: A VOLTA POR CIMA. Às seis da manhã da terça-feira toca meu telefone de cabeceira. O chefe de reportagem, Cesarion Praxedes, esbaforido, me avisava que Tancredo acabara de ser transferido para o InCor, em São Paulo. Com as fotos da remoção do Presidente atualizamos a matéria de abertura. A foto da capa ficou ainda mais atual, com uma nova chamada: TANCREDO: O DRAMA DO PRESIDENTE. Seria a última foto de Tancredo Neves vivo.

Outra terça-feira 11 de setembro ocuparia os noticiários, a de 2001, com a explosão das Torres Gêmeas em Nova York. Ficamos fora dessa, os jornalistas da Manchete. As Torres Gêmeas do Russell já haviam caído, em 1º de agosto de 2000. Significativamente, uma terça-feira...

PS • O 11 de Setembro do Bem 

Foto da sessão de gravaçã de Love me do, em 11 de setembro de 1962 na capa da partitura.

Aconteceu no ano de 1962 em Londres, nos estúdios de Abbey Road, quando os Beatles gravaram o seu primeiro single: Love Me Do/P.S. I Love You. Foi uma tarde tumultuada. 

O produtor da EMI, George Martin, considerava Ringo Starr um baterista de bailes e preferiu se garantir com um escolado baterista de estúdio, Andy White. Mas, pressionado por John, Paul e George, Martin resolveu dar uma chance a Ringo. Usou alternadamente os dois bateristas para escolher a melhor take. Só a 17ª tentativa, com Ringo à bateria, agradou seus exigentes padrões. Àquela altura John já estava com os lábios anestesiados de tanto soprar o riff na gaita-de-boca. Finalmente, depois de tanta luta, os rapazes de Liverpool conseguiam gravar seu primeiro disco. Coincidência histórica: 11 de setembro de 1962 também caiu numa terça-feira.



sexta-feira, 15 de novembro de 2019

Marighella: o filme sem tela pode virar série na TV

por José Esmeraldo Gonçalves 

Para Carlos Marighella, a luta continua.

Executado há 50 anos, o líder revolucionário, fundador da Aliança Libertadora Nacional (ALN), enfrenta, in memoriam, uma batalha para chegar às telas de cinema do Brasil.

"Marighella", de Wagner Moura, exibido no exterior e premiado em vários festivais, deveria estrear no dia 20 de novembro, a próxima quarta-feira, Dia da Consciência Negra. Em nota recente, a produtora O2 Filmes informou que o lançamento do filme, que tem no elenco, entre outros, Seu Jorge, Adriana Esteves e Humberto Carrão, foi cancelado porque a produção não conseguiu “cumprir os trâmites” exigidos pela Agência Nacional de Cinema.

E, aparentemente, não se fala mais nisso.

Assim como os golpes de Estado, a censura no Brasil agora atua travestida de inúmeros pretextos. Basta ler notas semelhantes das mais diversas instituições a propósito de apreensão de livros, de vetos a exposições, a palestras em universidades, de barreiras políticas, morais ou religiosas no acesso a financiamentos públicos e até agressões, intimidações e invasões de espaços culturais por milícias neofascistas.

A justificativa para o cancelamento da estréia de "Marighella" parece apenas uma versão construída para disfarçar o que já era esperado no atual ambiente político do Brasil. Aliás, "versão" é um recurso de dissimulação e fake news que tanto os órgãos de segurança da ditadura quanto o baronato da grande mídia, na época, usou para desconstruir os fatos na vida do guerrilheiro.

Em 2012, o fotógrafo da Manchete, Sérgio Jorge, denunciou na Istoé, a farsa montada pelo delegado Sérgio Fleury, que era uma espécie de capo executor oficial da ditadura, ao criar a versão oficial para a morte de Marighella, em São Paulo, no dia 4 de novembro de 1969.  "Eu vi os policiais colocando o corpo no banco de trás do carro", revelou o fotógrafo sobre a montagem da cena de confronto.  Segundo dois frades dominicanos que iriam encontrar o guerrilheiro, este foi executado no meio da rua, a queima-roupa. Não houver confronto. Marighella estava desarmado e foi fuzilado ao se encaminhar para o Fusca onde os policiais haviam colocado os dominicanos e onde seu corpo foi depositado em seguida. Os frades foram protagonistas involuntários da segunda farsa montada pela ditadura e divulgada pela mídia: a versão da "traição", segundo a qual os religiosos foram os responsáveis por dedurar Marighella.

A jornalista e escritora Leneide Duarte-Plon publicou semana passada na Carta Maior o artigo "50 anos da execução de Marighella e a farsa da "traição" dos dominicanos", que desmonta mais essa fake news da ditadura em parceria com os jornais. Conta a jornalista: "Logo depois da execução de Marighella, cujo corpo foi colocado dentro do carro depois de morto para compor a narrativa das fotos que a imprensa receberia, os órgãos de segurança da ditadura começaram uma sórdida campanha, bombardeando a mídia com fake news, atribuindo aos dominicanos uma suposta 'traição'. Eles teriam traído o antigo aliado, dando informações que permitiram a morte de Marighella. O que hoje chamamos de fake news sempre existiu. Os regimes totalitários desde sempre utilizaram a mentira para justificar invasões de territórios, prisões de dissidentes políticos ou mesmo para convencer a população que uma reforma traz benefícios quando, na verdade, representa perda de direitos. No Brasil de hoje, a mentira (fake news) é o combustível de toda ação governamental. Na época da ditadura não era diferente. No nosso livro "Um homem torturado, nos passos de frei Tito de Alencar", lançado em 2014, Clarisse Meireles e eu reconstituímos o episódio da prisão dos dominicanos e da mentira de Estado, que se impôs através dos órgãos de imprensa da época".

Testemunhos como o de Sérgio Jorge, livros como o de Leneide e Clarisse, além da obra de Mário Magalhães,  "Marighella, o Guerrilheiro que Incendiou o Mundo", em que se baseou o filme,  recolocam os fatos diante da história.  O brasileiro tornou-se uma referência revolucionária em todo o mundo. Seu livro "Manual da Guerrilha Urbana" virou um tutorial famoso para muitos focos de luta popular. Que o diga Sebastião Salgado, que também trabalhou para a Manchete. Em matéria publicada na revista MIT, quando entrevistou Salgado, o jornalista Roberto Muggiati conta  como Marighella indiretamente salvou a vida do fotógrafo. Leia o recorte abaixo.


Enquanto "Marighella" permanece sem data de lançamento nos cinemas, a Rede Globo anuncia sua transformação em uma série de quatro episódios a ser exibida no ano que vem.

Caso "entraves" burocráticos não atropelem o projeto. 

PARA LER A REPORTAGEM COM SÉRGIO JORGE NA ISTOÉ, CLIQUE AQUI

PARA LER O ARTIGO DE LENEIDE DUARTE-PLON NA CARTA MAIOR, 
CLIQUE AQUI

terça-feira, 1 de novembro de 2016

Sebastião Salgado: "“A fotografia está acabando porque o que vemos no celular não é a fotografia. A fotografia precisa se materializar, precisa ser impressa, vista, tocada..."



(do site Uai) 

Sebastião Salgado apareceu mancando e de muletas. O fotógrafo brasileiro rompeu o menisco em sua última viagem à Amazônia, onde retrata comunidades indígenas há três anos. Mas, vestido de gala para receber um prêmio, senta-se e dispara: “A fotografia está acabando”.

Aos 72 anos, um dos melhores fotógrafos dos séculos 20 e 21 se sente tão desconectado da tecnologia, dos celulares e aplicativos tipo Instagram quanto as tribos que está imortalizando nos últimos meses. “Eu não sei nem ligar um computador”, confessa, com um sorriso.

O homem que imortalizou a pobreza e a natureza selvagem em todo o mundo continua trabalhando como fazia antes: com negativos e impressões, que revê e toca. Mas agora produz suas fotos com uma câmera digital. “Eu me adaptei um pouco, como os dinossauros antes de morrer”, brinca, diante de um pequeno grupo de jornalistas na entrega do Prêmio Personalidade da Câmara de Comércio França-Brasil, no Rio de Janeiro.

Mas Sebastião Salgado não tem Instagram nem “nada” disso. “Eu não gosto. Sei que os jovens gostam, mas eu não consigo”, confessa. Às vezes, explica ele com sua voz arrastada, olha o celular de seus sobrinhos e fica horrorizado ao ver como os aplicativos para compartilhar fotos acabam servindo para “exibir toda a sua vida, para que todos a vejam”.

“Olha, às vezes tem fotos interessantes, mas para fotografar você tem que ter uma boa câmera com uma lente adaptada, tem que ter uma série de condições, a luz... não pode ser um processo automatizado”, explica.

Autor de livros antológicos, como Trabalhadores (1996), Outras Américas (1999), Êxodos (2000) ou Gênesis (2013), Salgado acredita que a fotografia tem que passar pelo papel. “A fotografia está acabamos porque o que vemos no celular não é a fotografia. A fotografia precisa se materializar, precisa ser impressa, vista, tocada, como quando os pais faziam antes com os álbuns de fotos de seus filhos”, afirma. “Estamos em um processo de eliminação da fotografia. Hoje temos imagens, mas não fotografias”, insiste.


LEIA A MATÉRIA COMPLETA NO SITE UAI, CLIQUE AQUI

quarta-feira, 11 de setembro de 2013

Sebastião Salgado e Muggiati: o reencontro

Reprodução. Clique para ampliar
por José Esmeraldo Gonçalves
A revista Contigo que chega hoje às bancas traz uma entrevista do fotógrafo Sebastião Salgado ao jornalista e escritor Roberto Muggiati. Sergio Zalis, diretor da revista, relembra na sua carta ao leitor os tempos da Manchete. O prédio do Russell, onde ficava a redação, no Rio, é um ponto na trajetória profissional dos três. No caso do Muggiati, um megaponto: foi o diretor que mais tempo ficou à frente da revista, um recorde de mais de duas décadas. Sebastião Salgado foi colaborador da Manchete, para a qual fez suas primeiras viagens pelo interior do Brasil. Sergio trabalhou no estúdio fotográfico da Bloch, antes de ser repórter fotográfico da Manchete, correspondente em Israel e, depois, editor de fotografia da revista Fatos. Na foto, o reencontro. Sebastião Salgado mostra ao amigo Muggiati o livro "Genesis", que acaba de lançar.
No texto, Sergio relata o que aprendeu com o ex-diretor.
Há algo da Manchete nas bancas, hoje.