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quinta-feira, 29 de agosto de 2019

É moratória! Parte da mídia brasileira fez malabarismos para não usar essa palavrinha na cobertura das trapalhadas econômicas de Maurício Macri

O Globo fez ginástica rítmica editorial para evitar a palavra moratória e buscou múltiplas opções:
"Renegociar", "revisão de prazos", "reescalonamento dos vencimentos" etc.

A Folha não é peronista mas foi honesta. Definiu a extensão de prazo para pagamento
com a palavra exata: moratória. 

O Diário de Pernambuco evitou sofismas, a palavrinha de origem grega que não
combina nem um pouco com jornalismo sério. É moratória.

O Valor, embora especializado em economia, não deu tanto destaque à crise argentina
na primeira página e também chama a suspensão de pagamentos apenas de "renegociação". 

O Estadão reconhece que a Argentina não vai pagar a dívida de curto prazo e analisa
que o pagamento ficará para o próximo presidente. Mas também poupa Macri do rótulo
 de autor da moratória. Estadão chama calote de "deixa de pagar".

Segundo o Houaiss, a definição de moratória é:
- Dilação do prazo de quitação de uma dívida, concedida pelo credor ao devedor para que este possa cumprir a obrigação além do dia do vencimento, disposição legal que prevê a suspensão dos pagamentos devidos a credores internacionais, quando um país se encontra em circunstâncias excepcionais, como guerra, grande calamidade, grave crise econômica etc.

Que fique claro que moratória não é só dar calote.

A Argentina tomou a decisão unilateral de adiar pagamentos ao FMI e a credores privados. A Argentina anunciou moratória.

O jornalismo criativo, por parte dos grupos editoriais neoliberais que saudaram a política econômica de Maurício Macri, dirigente alinhado com as exigências do mercado financeiro, fez todas as ginásticas vocabulares possíveis para evitar a palavra moratória. Às vésperas das eleições na Argentina, com as pesquisas dando o adversário de Macri, Alberto Fernandez, na frente, os apoiadores do atual presidente estão nervosos. A própria oposição argentina espera jogo sujo nas semanas que restam para as urnas, a exemplo do que aconteceu no Brasil desde o golpe que derrubou Dilma Rousseff. Sinais não faltam. O FMI, adepto da sustentação de Macri, concedeu-lhe o maior financiamento que a organização já liberou na história. O governo brasileiro já declarou que ajudará no que puder. Trump idem. A direita continental fará qualquer coisa para reeleger Macri.

Mas, no caso do anúncio da moratória,  os credores com dólares no fogo não quiseram saber da versão com o botóx político de parte da mídia brasileira: Wall Street, mais realista, vê os títulos argentinos derretendo no mercado.

ATUALIZAÇÃO EM 30/7/2019

Trecho do editorial do Globo em 30/7/2019: 48 horas para perceber
que a Argentina está em moratória.

Em editorial publicado nesta data O Globo cedeu ao óbvio e finalmente usou a palavra moratória relacionada à crise argentina. Aparentemente, o autor do editorial não leu o jornal do dia anterior. Se o tivesse feito veria que entre os "burocratas" citados acima (trecho do editorial) estava o próprio jornal que gastou palavras para fugir do fato: Argentina entrou em moratória. Também hoje, a agência de risco S&P informa que rebaixou a nota da Argentina de Mauricio Macri para "calote seletivo". Globo inaugura uma nova forma de ver moratórias: "é questão semântica". Eu, hein?

domingo, 9 de junho de 2019

Chernobyl e Fukushima: marcas das tragédias

por Flávio Sépia 

Filmes e séries que denunciam as terríveis consequências de acidentes nucleares são importantes para despertar consciências sobre os danos irreparáveis que causam ao meio ambiente, quando colapsam, e às populações atingidas. Valem também como alertas sobre os riscos permanentes e inerentes a esse tipo de geração de energia.

O problema é que a abordagem dessas tragédias - quando se transformam em entretenimento - vem invariavelmente contaminada por irradiações ideológicas.

Mais ou menos assim: Chernobyl, em 1986, foi acidente do "mal", produto da "burocracia socialista"; Fukushima foi um imprevisto lamentável que a mídia em geral apresenta como contido pela "eficiência capitalista".

Nenhuma da duas interpretações é verdadeira. Apesar da alegada segurança tecnológica, acidentes nucleares acontecem, como já demonstrado em usinas dos Estados Unidos, da França e da Alemanha.

A série Chernobyl, da HBO, tanto apresenta verdades como manipula, desloca e cria "fatos". Por exemplo, ao mostrar 400 mineiros trabalhando nus na descontaminação. Isso, segundo agências internacionais europeias que acompanharam - e até ajudaram a financiar a limpeza da área e a construção de sarcófagos - não foi constatado até hoje em nenhum relato de testemunhas nem antes nem depois do fim da União Soviética. A queda de um helicóptero sobre o reator, por ter se aproximado demais, também não aconteceu. Um helicóptero de fato que se chocou com um guindaste semanas depois do acidente e não no dia seguinte e em local afastado do reator. Além disso, há personagens inspirados em cientistas e técnicos que existiram e há outros criados pelos roteiristas da série.

O último dia 11 de março marcou oito anos do desastre de Fukushima, que ocorreu em 2011, e é reconhecido como acidente nuclear de gravidade semelhante a Chernobyl. Não é uma competição, ambos são terríveis. E além disso, ao contrário que que se imagina, não foi contido: cerca de 300 toneladas de água contaminada continuam vazando diariamente para o Pacífico. O combustível nuclear derretido permanece entre as ruínas.

Inicialmente, a empresa Tepco (subsidiária da americana General Eletric), proprietária da usina, atribuiu o acidente ao tsunami que provocou o derretimento de três reatores. O tsunami existiu, o que não existiu e era exigido foi uma estrutura adequada e bem mais cara capaz de obrigatoriamente resistir a terremotos e tsunamis eventos que frequentemente atingem o Japão. A reação das equipes de contenção foi lenta, o trabalho de resfriamento dos reatores ineficaz e criticado por especialistas.

Há relatos de que a empresa sabia dos problemas dos reatores desde anos antes da tragédia, e não agiu. O desastre deixou mortos. É impreciso o número de vítimas ao longo dos anos em consequência da radiação de Fukushima. Em Chernobyl, 31 pessoas morreram imediatamente e muitos milhares, um cifra que talvez jamais seja conhecida, pereceram depois por exposição a material radioativo.

Assim como a nuvem radioativa de Chenobyl alcançou a Europa, a contaminação espalhada por Fukushima circulou na atmosfera. Lançada ao mar, alcançou pontos em 100 milhas ao largo da Califórnia.

Não há previsão de quando os técnicos japoneses controlarão o vazamento e recolherão o urânio derretido no interior das instalações.

Parte da província em torno de Fukushima tornou-se radioativa. São chamadas "zonas de exclusão". Há cidades e vilas fantasmas, sem presença humana.

Mesmo assim, o governo japonês pretende usar as Olimpíadas de 2020 como vitrine do trabalho de descontaminação. Áreas da região entrarão no marketing governamental. A cidade de Fukushima, que fica a 20 quilômetros da usina, receberá jogos de beisebol.

Enquanto isso, agências de turismo da Ucrânia, onde fica Chernobyl, informam que a série da HBO fez crescer em 40% o número de turistas que visitam Pripyat (sob determinadas condição, inclusive restrito tempo de permanência), a famosa cidade fantasma que restou como lembrança silenciosa do terrível desastre.

Haverá pacotes turístico para um tour olímpico em Fukushima?


Em 2016, a revista Galileu publicou uma matéria do fotógrafo Keow Wee Loong, da Malásia, que visitou a zona de exclusão de Fukushima. Você pode vê-la AQUI


No site da Magnum, você pode ver fotos de Chernobil e Pripyat feitas em 2017. AQUI 

sexta-feira, 8 de abril de 2016

"Workshop" discute diagramação de fotos e mostra como imagens históricas seriam publicadas pela mídia atual

por Omelete
O recente episódio em que um jornal parou as máquinas para mudar o corte de uma foto na primeira página, como noticiado em sites de análise do jornalismo e neste blog, gerou no meio profissional discussões sobre a motivação do veículo ao mandar limar a palavra "Força" que aparecia ao lado de uma imagem recente de Dilma na cabine de um avião da FAB.

Durante um workshop em um pé-sujo da Lapa, após acaloradas discussões, o recurso foi apontado como censura à diagramação e visto como um sinal desses tempos que vivemos no jornalismo.

A pergunta é: se o deputado Barreto Pinto, os presidentes JK e Jânio e o ditador João Figueiredo fossem fotografados hoje será que suas imagens icônicas - para usar uma palavra comum em workshops - passariam íntegras pela diagramação vigiada pelas direções dos veículos atuais?

Veja nas reproduções, ontem e hoje, exemplos comparativos da nova técnica da  "diagramação assistida". Um detalhe: três das fotos antológicas, abaixo, foram feitas para o saudoso Jornal do Brasil, cujos fotógrafos e editores tinham, em várias épocas, um olhar preciso para a foto que dispensava legendas.

Ontem: a foto do Barreto Pinto de cuecas foi publicada em O Cruzeiro, em 1946.
e custou o mandato do deputado. Reprodução/Foto de Jean Manzon. 

Hoje: com corte para evitar a leitura política. 

Ontem: a foto reproduzida acima rendeu a interpretação de que JK pedia dinheiro a Foster Dulles.
Foi publicada no Jornal do Brasil, em 1958. É de autoria do fotógrafo Antonio Andrade
Hoje: "Com jeitinho brasileiro JK argumenta questões diplomáticas". 

Ontem: às vésperas da renúncia, Jânio, em crise de indecisão
política,  troca os pés. Reprodução da foto de 1961 feita por Erno Schneider para o Jornal do Brasil.

Hoje: o ex-presidente é visto apenas "atendendo ao
chamado de um popular que o apoiava". 

Ontem: em plena ditadura, 1979, a menina recusa o cumprimento de Figueiredo.
Foto de Guinaldo Nicolaevski para o Jornal do Brasil.
Hoje: Figueiredo como sairia atualmente, provavelmente "cansado
das pressões da linha-dura".