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sexta-feira, 23 de dezembro de 2022

Fotomemória da redação - O hobby de Jango era a fotografia. Um dia ele interrompeu uma entrevista à Manchete para mostrar o equipamento que adquirira no exterior.

 

Jango e Jáder Neves, em 1962, na fazenda do ex-presidente em São Borja (RS).
Foto de Maria Tereza Goulart.


por José Esmeraldo Gonçalves 

A alegação dos militares para derrubar João Goulart foi a de que ele era um comunista desalmado que comeria criancinhas no almoço e no jantar. 

A História mostrou que quem torturou mães na frente de seus pequenos filhos foram os miliares, que assassinaram e perseguiram milhares de brasileiros opositores de uma ditadura que enriqueceu "batalhões' de 'patriotas".

Veja essa foto de publicada na Manchete e feita em São Borja, em 1962, há 60 anos. Naquela época já estava em curso a conspiração contra a frágil democracia brasileira. 

O que o então presidente João Goulart fazia no governo era propor reformas para modernizar o país, torná-lo mais justo e diminuir, ou pelo menos reduzir a níveis civilizados, os muitos privilégios das classes dominantes e ricas à custa dos cofres públicos. 

Esse era o "perigo vermelho" alardeado pelos golpistas. O desfecho, sabemos. Cerca de dois anos depois Jango foi derrubado, partiu para o exílio onde morreu 14 anos depois dessa foto feita pela sua mulher, Maria Tereza Goulart. Naquela reportagem da Manchete, ele dizia que ao sair da presidência "queria ser apenas um homem do campo".

Na mesma ocasião, Maria Teresa fotografou Jango usando a Hasselblad de Jáder Neves.
Foto Jáder Neves - Manchete
Enquanto, "gorilas", empresários,  fazendeiros e banqueiros (na época não havia as expressões "agronegócio" e "mercado") preparavam o golpe e recebiam um orçamento secreto dos Estados Unidos, o "perigoso" Jango estava preocupado em mostrar para Jáder Neves, fotógrafo da Manchete, o equipamento fotográfico que adquirira em uma das suas viagens ao exterior. Na mão direita do presidente, um novíssimo e sofisticado flash eletrônico ainda pouco conhecido no Brasil O primeiro a chegar aqui tinha sido importado pelo fotógrafo de publicidade Chico Albuquerque, em 1958. 

Na ocasião, Jango confessou a Jáder que gostava de fotografar, mas lamentou ter pouco tempo para se dedicar ao seu hobby. Ele mostrou curiosidade pela câmera Hasselblad e pela lente que o fotógrafo usava. Jango tinha a simplicidade dos estancieiros. A varanda onde ele aí aparece sentado no chão, sem qualquer formalidade, foi cenário de várias e marcantes fotos suas nesse estilo autêntico do gaúcho.          

domingo, 23 de junho de 2019

Fotomemória: uma lente sobre os caminhos de Chico Buarque. Por Guina Araújo Ramos

por Guina Araújo Ramos (do blog Bonecos da História)

No dia 19 de Junho de 2019, um dos assuntos mais comentados nas redes sociais no Brasil foi o aniversário de 75 anos de Chico Buarque. Parece que a grande maioria dos brasileiros se sente um pouco amigo de infância de Chico Buarque, até porque há muita História nisso... Eu, por exemplo, comecei a me interessar por Chico Buarque de Hollanda por volta dos meus 15 anos de idade, meados da década de 1960. O primeiro motivo foi, certamente, o espanto que me causou a música “Pedro Pedreiro”, com a sua estranha letra, meio minimalista na forma e meio absoluta no conteúdo.


Chico Buarque, Canecão, Rio - Foto: Guina Araújo Ramos, 1993

Pouco depois, lá estava ele nos “festivais da canção”, com praças e sabiás, quase sempre ganhando, sempre se destacando, aparecendo de forma brilhante naquele belo momento da cultura musical brasileira, já na defesa de uma produção musical independente em relação à poderosa indústria cultural americana, este poder que vinha de longe no país e que, nas décadas seguintes, o dominaria completamente.


Chico Buarque - Rio, 1978 - Foto Guina Araújo Ramos
Ainda nesse tempo, no conturbado ano de 1968, me envolvi com um dos seus belos produtos musicais, embora sobre texto alheio: participei da montagem de Morte e Vida Severina, de João Cabral de Mello Neto, realizada pelo grupo de jovens da igreja de São Geraldo, no subúrbio carioca de Olaria, com Perfeito Fortuna no papel principal, e desde logo me ficou evidente que a música de Chico Buarque dava trabalho...
Envolvido com a sua obra, de certo modo o acompanhei (e a Marieta Severo) em seus tempos de exílio romano, vítimas todos nós da imbecilizante violência social imposta pela ditadura civil-militar do Golpe de 1964, ancorada, a partir de 1968, no AI-5, o maior asfixiador cultural que o Brasil já sofreu.
No final da década de 1970, então, é que minha trajetória profissional ganha, pretensiosamente, um ponto de contato tangencial à dele. No que entrei para a Bloch Editores, em 1977, e passei a fotografar para suas coloridas revistas, eis que, um dia (digo, uma noite) lá fui eu fotografar um show de Chico Buarque. Não tenho mais nenhum registro de quando e onde, mas tenho quase certeza de foi em 1978 e no Canecão. Nos meus sofridos arquivos, restou apenas uma foto, um slide, que recuperei até onde foi possível. Ainda neste período, em aproximação indireta, fotografei, em 1978, a primeira montagem da Ópera do Malandro, no Teatro Ginástico, no Centro do Rio, mas disso não tenho fotos.


Chico Buarque chega ao Ato - Lapa, Rio - Foto Guina Araújo Ramos, 2018

Só voltamos a nos encontrar pessoalmente quando Chico Buarque, retornando aos palcos, iniciou a temporada do show com as músicas do disco Paratodos, em 1993, de acordo com as parcas anotações nas minhas fotos. De novo, a convicção é de que este encontro aconteceu (embora não garanta e nem consegui confirmar) no Canecão, à época o mais importante palco musical do Rio de Janeiro, ele no palco, eu no “gargarejo”, entre as mesas da plateia e beira do palco... Destas fotos (para também não sei mais qual empresa jornalística) ficaram algumas sobras, também muito desgastadas pelo tempo.



Chico Buarque e Marieta Severo - Lapa, RioFoto Guina Araújo Ramos, 2018

Longas parábolas mútuas nos separaram no tempo. Apenas fotograficamente, é óbvio, que sempre diziam que jogava futebol (nisso, nunca achei que fosse tão bom assim) e que cada vez ficava melhor a sua impressionante obra, ampliada da Música e do Teatro para a Literatura, e logo para o Cinema. Nesse período, creio que o melhor exemplo do grau de criatividade que atingiu e que reconheci ficou marcada na preciosidade do livro e filme “Budapeste”.



Chico Buarque no Ato da Virada - Lapa, RioFoto Guina Araújo Ramos, 2018
Este reencontro, porém, ocorreu em outro tipo de espaço, não mais no palco da música, mas no da política. Entre tantas presenças marcantes na Lapa, Rio de Janeiro, em 23/10/2018, no chamado “Ato da Virada, Brasil pela Democracia”, na prática o derradeiro comício da campanha de Fernando Haddad à Presidência da República, lá estávamos nós, 25 anos depois: o mesmo Chico Buarque, agora mais curtido, mais grave, sempre lúcido, sempre combativo, exemplo de cidadão na defesa da democracia brasileira, e eu, já aposentado como fotojornalista, mas sempre disposto a registrar em fotos as minhas vivências.
Além da admiração pela sua postura política justa e serena,aumenta cada vez mais uma profunda admiração pela obra musical e literária, acima da média do panorama cultural brasileiro, em quantidade e qualidade. Não por acaso, Chico Buarque volta às mídias neste ano de 2019, ao ganhar, merecidamente, o Prêmio Camões de Literatura, para alegria de portugueses e brasileiros.
Não sei comparar, mas, se vamos por aí e se o Prêmio Nobel de Literatura de 2016 levou em consideração apenas as letras das canções do cantor e compositor Bob Dylan, estou desconfiado que Chico Buarque de Hollanda tem boas chances, embora se fale nas possibilidades de Lula, de ganhar neste ano mesmo o nosso primeiro e tão demorado Prêmio Nobel...