Rio, 1960: Sartre e Simone de Beauvoir. Foto de Gil Pinheiro/Manchete |
Simone de Beauvoir não gostou de ser flagrada. Foto de Gil Pinheiro/Manchete |
por José Esmeraldo Gonçalves
Em 1960 o fotógrafo Gil Pinheiro, da Manchete, foi escalado para seguir os passos de Jean-Paul Sartre e Simone de Beauvoir, no Rio. Depois de algumas horas de plantão no hotel, Gil acompanhou o casal em direção à orla de Copacabana. Sartre havia visitado o parque gráfico da Bloch, em Parada de Lucas, onde foi fotografado em ambiente interior e entrevistado pelo diretor da revista, Justino Martins. Apesar disso, a Manchete precisava - para uma segunda reportagem, de Paulo Mendes Campos - de imagens externas em um cartão postal carioca. Avessos a fotos, eles não toparam. Daí, a solução foi partir para um paparazzo, digamos, culto, dos escritores. A revista não era muito adepta do gênero, preferia fotos mais trabalhadas, em cores. Mesmo assim, se fosse preciso, adotava o recurso de fazer flagrantes, geralmente de atrizes, em visita ao Rio. Naquela década, publicou fotos de, entre outras estrelas, Mylène Demongeot, o então monumento francês, na praia. Claudia Cardinale e Brigitte Bardot também foram seguidas e retratadas, mas nunca um filósofo havia merecido a atenção de um fotógrafo ao estilo paparazzo. O fotojornalista Gil Pinheiro cumpriu a missão, clicou o casal, que saiu do hotel duas vezes, mas não conseguiu trabalhar com discrição, como a redação lhe pediu. Foi descoberto por Simone de Beauvoir. Em uma das fotos acima, vê-se que a escritora não escondeu sua irritação.
A internet é indispensável, mas não há como negar que deixa terra arrasada em costumes, comportamentos, funções, instrumentos, empregos, equipamentos e métodos. Uma das vítimas é o paparazzo. Câmeras de rua e celulares captam milhões de imagens e, com frequência registram cenas jornalísticas. Celebridades - que eram um alvo preferencial dos paparazzi - agora fazem seus próprios "flagras" e poses íntimas que postam em seus canais nas redes sociais.
Para os fotojornalistas sobram os fatos e a capacidade de registrá-los com talento como fez o fotógrafo Evan Vucci, da Associated Press, autor da foto icônica e histórica de Donald Trump de punho fechado, bandeira tremulando e traços de sangue no rosto logo após tomar um tiro na orelha. A foto de Vucci ilustrou praticamente todos os veículos do mundo, do New York Times ao Times, da Tribuna de Anta Gorda ao Voiz du Burundi, mas não foi obra de um paparazzo e sim uma clássica foto de oportunidade onde a agilidade e a intuição do fotojornalista, além da sensibilidade para captar a imagem tecnicamente perfeita, foram elementos decisivos. Claro que ele disparou o obturador dezenas de vezes, mas o que há de extraordinário naquela foto é o enquadramento exato de todos os elementos que passaram a mensagem essencial do atentado.
Já o paparazzo, aquele que se especializou em fazer plantão por horas e dias à espera do seu alvo, entrou em processo de extinção. Por dois motivos principais: as mudanças radicais no mercado jornalístico, que abalam o consumo e a cotação de fotos do tipo e a mediocridade do alvos atuais que são influenciadores, modelos fitness, sobreviventes de reality show e subcelebridades em geral.
Se Sartre e Simone de Beauvoir caminhassem no calçadão do Leblon, hoje, correriam muito mais o risco de serem assaltados do que encontrar um paparazzo que os incomodassem.
P.S- Quer saber mais sobre a era de ouro dos paparazzi, os guerrilheiros da imagem? Leia matéria publicada neste blog. Basta clicar no link abaixo.
https://paniscumovum.blogspot.com/2015/04/guerrilheiros-de-imagens-nos-55-anos-do.html
Um comentário:
Concordo que a foto é tecnicamente perfeita. Mas a mensagem que passa é a da dominação e arrogância dos Estados Unidos, a violência presente. Trump foi vítima de algo que defende a ampla disseminação de armas. O patriotismo fascista. A raiva.E o machismo do cowboy racista e opressor.
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