sexta-feira, 21 de julho de 2023

Mídia: Cadê o repórter que estava aqui? O Brasil tem mais "analistas" de notícias do que técnicos de futebol

Uma das salas vip do Aeroporto Fiumicino, em Roma: câmera é o que não falta.

por José Esmeraldo Gonçalves
A Polícia Federal deverá receber vídeos que registram cenas do ataque bolsonarista ao ministro Alexandre de Moraes em Roma. O caso ganhará então um novo capítulo na mídia. 

O que foi escrito até esse momento expõe a incapacidade dos jornalões e da TV brasileira em exercer uma função básica dos repórteres: apurar a notícia à margem das fontes oficiais e da prática declaratória preguiçosa onde cada um fala o que lhe interessa, sem questionamento ou contestação. 

Nenhum correspondente atuou no caso. Nenhum repórter tentou localizar testemunhas no Aeroporto Fiumicino, terminal europeu de alta segurança, que faz investigações próprias, além de produzir relatórios diários sobre eventuais incidentes no local. Nenhum repórter, pelo menos até ontem, falou com o adido policial brasileiro que entrou em contato com as autoridades italianas. Além disso, áreas vips costumam ter funcionários ligados a companhias aéreas. Alguém procurou fontes nesses setores? Nenhum repórter tentou contatar passsageiros do voo com destino a São Paulo e que estavam presentes no setor de embarque ou na sala vip. 

Deve ser instrução dos departamentos financeiros dos veículos preocupados em baixar custos.   

Do ponto de vista jornalístico, o ataque a Alexandre de Moraes demonstra a prioridade dos jornalões e canais de notícias: a opinião. Consiste em botar um sujeito ou dois ou três falando horas sobre um fato qualquer, geralmente divulgado por todos os veículos e, na maioria das vezes, relatados por repórteres que leem notas de assessorias e raramente têm tempo e instrução para ir além do oficial ou buscar fontes próprias e independentes. 

O Brasil é a pátria dos "técnicos" de futebol, tem milhões de torcedores entendidos em táticas, escalações e sistemas de jogo. Agora somos o país dos comentaristas e analistas de qualquer coisa. 

Nas rodas de conversa em estúdios e redações as notícias são desidratadas, levadas a um mixer e submetidas a tanta "interpretação" que, no fim, o público recebe uma massa disforme onde o fato, coitado, quase some diante da opinião do "analista". Você não recebe a notícia, mas o que alguém pensa sobre o que acha que aconteceu. Caricaturando o estilo, há coisas mais ou menos assim: "fulano, Lula vetou a pistola 9mm para uso de civis. O que isso significa?"; "sicrana, morreu o Tony Bennett, que mensagem essa morte passa?; "PF prendeu líder de invasões em 8/1. Você contextualiza pra gente?

 É tanto contexto que o texto é deixado de lado.           

Por isso, fugiu a esse padrão a velocidade com que alguns veículos logo levantaram duas "notícias" em paralelo a ataque em Roma. Uma, bastante compartilhada, dava conta de que um dos agressores havia sido candidato em chapa coligada ao PT, em 2004, pelo PL, atual partido de Bolsonaro. A notícia circulou inicialmente sem o adendo de que naquele ano, o PL era o partido de José Alencar, então vice-presidente no primeiro mandato de Lula. Essa tinha o objetivo de desvincular do bolsonarismo os autores de ataque. A   outra, também rapidamente lançada, dizia que Alexandre de Moraes  fora convidado para uma palestra em Siena, Itália, por um empresário bolsonarista acusado de divulgar fake news. As duas notas provavelmente pretendiam transformar o ministro de vítima em suspeito. 

Depois do que aconteceu na Lava Jato, quando jornalões e TVs foram pautados pelos "editores" Sérgio Moro e Deltan Dallagnol, pode-se aventar que a assessoria do rico empresário e seu  advogado trabalharam bem e conquistaram mais espaço na mídia para divulgar suas defesas do que mesmo o relato da vítima sobre o que aconteceu em Roma. Um "analista" chegou a classificar de "boa" a estratégia do advogado dos agressores. Isso foi dito em uma roda de conversa em que não foi "contextualizado" o relato de Moraes. Outro considerou "desproporcional" (conceito usado pelo advogado de defesa dos agressores) a reação do PF e do Ministério da Justiça em relação ao incidente em Roma.

Não se sabe qual será o desfecho desse caso, mas nessa primeira semana após o fato, Moraes ganhou solidariedade e perdeu a primeira batalha na mídia.           

Um comentário:

J.A.Barros disse...

Interessante a sua observação. Pelo o que entendi sobre o trabalho do repórter, no jornalismo, o repórter é a sua mola de seu trabalho. No acontecimento do fato o repórter, na sua pesquisa, vai procurar a origem do fato. Jornalismo,na minha opinião é entender o como e por que aconteceu o fato. O que vem acontecendo na maioria dos analíticos, comentaristas políticos, vejo que eles se limitam ao fato em si, sem ir à origem dele. O seu comentário fica então, meio vazio, sem muita expressão , negando ao telespectador, todo o conhecimento do que e o porque do fato. Nessa geleia de comentaristas políticos, um deles se destaca porque nos seus comentários procura sempre explicar porque aconteceu o fato politico e preciso citar o nome para esse meu comentário, não fique no vazio e seu nome é Fernando Gabeira