domingo, 25 de junho de 2023

O ócio é nosso • Por Roberto Muggiati

Lula e Domenico De Masi, em Roma. Foto de Ricardo Stuckert

Ao chegar a Roma, antes de visitar o Papa, o Presidente Lula caiu nos braços do sociólogo Domenico De Masi, 85 anos, autor de O Ócio Criativo (Sextante, 2000), livro em que sintetizou seu conceito polêmico segundo o qual “o homem que trabalha perde tempo precioso. ” De Masi visitou Lula em 2019, quando o petista estava preso em Curitiba e disse na época: “O fato de estar mantido aqui como preso político não mudou em nada o prestígio dele lá fora. Lula continua sendo uma grande liderança do mundo, talvez a maior de todas. ” 

Não, o Brasil não está interessado em importar ócio, nesse quesito o país de Macunaíma sempre foi pródigo. Lula e Domenico conversaram sobre o cenário internacional e as perspectivas de restabelecer a paz.

Entrevistadora de De Masi em O Ócio Criativo, Maria Serena Palieri resume assim a teoria do sociólogo: “O futuro pertence a quem souber libertar-se da ideia tradicional do trabalho como obrigação e for capaz de apostar numa mistura de atividades, onde o trabalho se confundirá com o tempo livre e o estudo. ” 

A ideia não é tão nova como parece. Em 1880, o franco-cubano Paul Lafargue (1842-1911), genro de Karl Marx, publicava o panfleto O direito à preguiça (Editora Unesp/Hucitec, 1999). Iniciava parafraseando o Manifesto Comunista, de Marx e Engels: “Uma estranha loucura apossa-se das classes operárias das nações onde impera a civilização capitalista. Esta loucura tem como consequência as misérias individuais e sociais que, há dois séculos, torturam a triste humanidade. Esta loucura é o amor pelo trabalho, a paixão moribunda pelo trabalho, levada até o esgotamento das forças vitais do indivíduo e sua prole. ”

Na introdução à edição brasileira do texto de Lafargue, a filósofa Marilena Chaui destaca a atualidade do direito ao ócio e afirma que, inspirados nele, os operários “lutarão, não mais, pelo direito ao trabalho, e sim pela distribuição social da riqueza e pelo direito de fruir de todos os seus bens e prazeres. ”

Eu ia esquecendo, mas “o Pregador” do Eclesiastes (circa VI a.C.) já fazia uma crítica contundente em A vaidade do trabalho:

“ 18 Também aborreci todo o meu trabalho, com que me afadiguei debaixo do sol, visto que o seu ganho eu havia de deixar a quem viesse depois de mim. 19 E quem pode dizer se será sábio ou estulto? Contudo, ele terá domínio sobre todo o ganho das minhas fadigas e sabedoria debaixo do sol; também isso é vaidade. 20Então, me empenhei por que o coração se desesperasse de todo trabalho com que me afadigara debaixo do sol. 21Porque há homem cujo trabalho é feito com sabedoria, ciência e destreza; contudo, deixará o seu ganho como porção a quem por ele não se esforçou; também isso é vaidade e grande mal. 22Pois que tem o homem de todo o seu trabalho e da fadiga do seu coração, em que ele anda trabalhando debaixo do sol? 23Porque todos os seus dias são dores, e o seu trabalho, desgosto; até de noite não descansa o seu coração; também isso é vaidade.”

PS •  O YouTube exibe na próxima terça-feira uma palestra com De Masi no link AULA MAGNA: O ÓCIO CRIATIVO COM DOMENICO DE MASI - 27/JUNHO ÀS 20H - YouTube

https://www.youtube.com/watch?v=P7bu1PyOqto

Um comentário:

Esmeraldo disse...

Com tanto robô em todas as atividades os terráqueos alcançarão em pouco tempo o direto ao ócio. Reta saber se sobreviverão. No Brasil certas categorias já chegaram ao ócio remunerando: certos políticos, juízes, militares, desembargadores, certos pastores, altos funcionários públicos, detentores de concessões públicas nega lucrativas, "donos" de partidos e dos seus fundos eleitorais, pessoal que fatura com o orçamento secreto etc etc