quarta-feira, 12 de junho de 2019

VazaJato - Do Intercept Brasil para a mídia conservadora: seu vazamento é melhor do que o meu?

O escândalo VazaJato desperta um debate paralelo: é legítimo o uso jornalístico de informações de autoridades públicas envolvidas em irregularidades e obtidas por hackers?

Nem deveria existir essa dúvida. É.

No curso da Lava Jato, os vazamentos se tornaram até uma rotina. Havia até uma espécie de revezamento entre veículos que publicaram massivas reportagens baseadas em material obtido "secretamente".

Jornalismo comparado: as duas primeiras páginas do Globo, acima reproduzidas, circulam nas redes sociais. A da esquerda, mostra o que o jornal considerou um vazamento "bom"; a da direita, é o vazamento "do mal", rotulado como um caso de polícia. Reprodução Twitter

Os jornais publicaram até conteúdo de interceptação telefônica ilegal, claramente criminosa, autorizada e divulgada pelo então juiz Sergio Moro. O Globo, na época, deu com prazer a reprodução dos diálogos em destaque na primeira página. Agora, no caso VazaJato, levou dois dias para considerar realmente jornalístico o novo escândalo e quando o fez foi para abrir palanque de defesa para os responsáveis pela conspiração judicial. Não que surpreenda, vindo do Globo. Historicamente, o jornalão carioca alinhado com a direita apoiou inúmeras conspirações que romperam a constitucionalidade do país. República do Galeão, golpe de 1964, apoio irrestrito à ditadura, ofensiva massiva contra Brizola (chegando ao ponto, como exemplo, de combater até os Cieps com a virulência de quem i nvestia contra "bocas-de-fumo"), rejeição às Diretas Já, engajamento na campanha de Fernando Collor, o que resultou em famosa denúncia de manipulação ao noticiar debate de candidatos, golpe jurídico-parlamentar contra Dilma Rousseff  etc.

Nesse episódio da VazaJato, o Globo prefere cobrar apuração da ação de um suposto hacker e até considerou "normal", em editorial, o tipo de diálogo conspiratório entre o juiz e um procurador.

No interesse da sociedade, a mídia não só pode como tem até obrigação de publicar vazamentos que envolvam casos e figuras públicas envolvidas em parcerias inusitadas e que desafiam as leis.

O caso Watergate tomou forma porque os repórteres do Washington Post obtiveram informações confidenciais de uma fonte inicialmente anônima e que mais tarde revelou-se um agente do FBI com acesso a relatórios oficiais.

Os famosos Pentagon Papers, também publicados pelo Washington Post durante o governo Nixon, foram vazados por um analista militar. Eram sete mil páginas secretas que provavam as mentiras oficiais sobre a guerra do Vietnã e o que as autoridades escondiam da opinião pública.

O massacre de My Lai, brutal operação do exército americano contra civis em uma aldeia vietnamita, não foi desmascarado por notas oficiais, nem presses releases, nem coletivas com back drop, mas pela denúncia de um soldado e, em seguida, pelo trabalho de jornalistas que obtiveram material confidencial de um fotógrafo também militar.

No Brasil, o Caso Parasar - oficiais que planejaram uma série de atentados no Rio de Janeiro, com o objetivos de atribuir as mortes decorrentes aos "comunistas" e assim desmoralizar a oposição à ditadura - foi desmascarado porque o capitão Sérgio Ribeiro, o Sérgio Macaco, se recusou heroicamente a participar do plano terrorista bancado por militares da linha-dura e fez uma denúncia aos seus superiores. O plano previa explosões em áreas e equipamentos públicos, incluindo o Gasômetro, e o assassinato de 40 políticos, entre os quais Carlos Lacerda, JK e Jânio Quadros.  Os terroristas ficaram impunes, mas a atitude de Sérgio Macaco abortou o plano. Ao fim de um inquérito manipulado, o capitão foi punido com o afastamento. Anos depois da restauração da democracia, apesar de pressões de setores remanescentes do autoritarismo, ele foi reabilitado e promovido.

Há centenas de casos que demonstram a relação entre jornalismo investigativo e vazamentos de maracutaias públicas.

As conversas entre Sergio Moro e Dallagnol não tinham nada de privadas.

Vazamentos de questões de interesse público são, portanto, no Brasil e no mundo inteiro,  instrumentos legítimos da apuração jornalística.

4 comentários:

Kadu disse...

Sem dúvida, as conversas mostram irregularidades, haccjear é ilegal mas a imprensa divulgar as conversar não e ilegal e jornalismo puro.

Tonton disse...

Moro pode fazer o que quiser, manda prender e manda soltar, é governo que vai enjaular comunista e quem não for cristão.

Leila disse...

O Brasil se envergonha com essas autoridades venais

SODRÉ disse...

A imprensa de grandes empresas envergonha com comportamento nesse episódio onde obedeceu ao complô do juiz e seus procuradores. Vergonha total