Em 1963, Jango, em viagem presidencial ao Chile e ainda em Santiago, recebe a edição da Manchete com parte da cobertura da visita. Foto de Nicolau Drei |
por José Esmeraldo Gonçalves
Há alguns dias, Roberto Muggiati, ex-diretor da Manchete, escreveu aqui sobre a tradicional agilidade da revista ao reabrir edições para acrescentar acontecimentos importantes, de última hora. As coleções mostram outro exemplo desse compromisso extremo com a notícia. Em 1963, Jango visitou o Chile. Foi uma das inúmeras viagens do então presidente em seu curto mandato. Foi a países da Europa, aos Estados Unidos, onde foi recebido por John Kennedy e desfilou em carro aberto na Quinta Avenida e, ainda como vice-presidente, foi à China, então país fechado e muito raramente visitado por nações ocidentais ou da América do Sul, como nós do Sul Global, como se corrige agora.
Já engajado na campanha golpista que resultou na ditadura a partir de 1964, O Globo mantinha fogo cerrado contra Jango. Manchete cobria bem as viagens do presidente brasileiro, com farta ilustraçãpo, embora a revista também abrigasse conspiradores na sua diretoria, como foi revelado em 1981 no livro "1964, a conquisa do Estado", de René Dreyfuss, com nomes e funções dos envolvidos no organograma da preparação do ataque fatal à democracia.
Na foto, Jango, ainda em Santiago, entrega um exemplar da Manchete ao presidente Jorge Alessandri, que ficou surpreso ao receber impressa em prazo recorde a cobertura de parte da visita presidencial. "No es posible, no es posible", disse o anfitrião, enquanto Jango brincava: "Eles querem concorrer com a televisão".
Em uma das páginas da edição aparece a primeira-dama Maria Teresa Goulart, que também era frequentemente atacada pelo Globo. Alessandri, aliás, disputaria nova eleição em 1970, quando perderia para Salvador Allende que, há 50 anos, foi assassinado por militares chilenos comandados por Pinochet e com apoio da ditadura brasileira e dos Estados Unidos.
O encontro do sorridente Jango com o chileno aconteceu há 60 anos. Manchete não mais existe, mas há coincidências históricas aí. O Grupo Globo em todas as suas plataformas está agora em forte e previsível campanha contra Lula. Editorialistas, comentaristas, colunistas parecem seguir ordens da cúpula e ampliam um jogral deturpado de "interpretações" sobre cada passo do governo. Tal qual os idos de 1963. Maria Teresa era alvo, assim como Janja é vítima, hoje. O que ela fala, veste, o que compra, tudo é ironizado pelo Globo.
O mais espantoso: o jornalão dos Marinho publicou recentemente um editorial pedindo "paz". Paz para os golpistas, bem-entendido. O Globo diz que o país tem que se reconciliar com a turba que depredou o Congresso, o STF e o Planalto. O elemento terrorista que tentou explodir uma bomba em um caminhão de combustível perto do aerooprto? Relevemos, sugere o editoriatista. O grupo que tentou e felizmente não consegui lançar um ônibus em cima de carros que conduziam pessoas que voltavam do trabalho? Esquece. Foi o calor do momento. Não sabemos ou sabemos das intenções do Globo. De golpe o jornal sabe tudo. A julgar pelo que escreve e fala, o Grupo não pretende se conciliar ou pelo menos ser jornalisticamente honesto com um governo que apenas uma semana depois de tomar posse foi vítima de uma tentativa de golpe. Vê-se em alguns bolsões que a tentativa foi apenas pausada. O Globo, assim como Estadão, Folha, Farialimer, neopentecostalismo, cacs, viúvas da Lava Jato, narcogarimpo, o agro pop e Roberto Jefferson etc procuram um candidato do "centro" para 2026. Ainda não encontraram e essa pretensão tem uma condicionante histórica: se não tem tu vai tu mesmo. "Tu mesmo" sendo o replay de 2018 com um "Paulo Guedes" garantidor, como os colunistas do Globo afirmaram na época, que vai preservar os privilégios econômicos seja quem for o tal meliante escolhido para representar o "centro" Quer apostar?